Discurso no Senado Federal

QUESTIONANDO O GOVERNO FEDERAL ACERCA DA CRIAÇÃO DA COMPANHIA NACIONAL DE PRODUTOS PETROQUIMICOS, FORMADA PELA ELEKEIROZ S.A., DO GRUPO ITAU, A ULTRAPAR PARTICIPAÇÕES S.A., DO GRUPO ULTRA, E A OPP - PETROQUIMICA S.A., DO GRUPO NORBERTO ODEBRECHT. ANUNCIANDO O INGRESSO DE AÇÃO JUNTO AO CADE PARA ANALISAR O CONTRATO CELEBRADO ENTRE A PETROBRAS E ESSAS EMPRESAS, QUE ESTABELECE NA POSIÇÃO DE S.EXA., MONOPOLIO PRIVADO DA AREA PETROQUIMICA NO BRASIL.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDUSTRIAL.:
  • QUESTIONANDO O GOVERNO FEDERAL ACERCA DA CRIAÇÃO DA COMPANHIA NACIONAL DE PRODUTOS PETROQUIMICOS, FORMADA PELA ELEKEIROZ S.A., DO GRUPO ITAU, A ULTRAPAR PARTICIPAÇÕES S.A., DO GRUPO ULTRA, E A OPP - PETROQUIMICA S.A., DO GRUPO NORBERTO ODEBRECHT. ANUNCIANDO O INGRESSO DE AÇÃO JUNTO AO CADE PARA ANALISAR O CONTRATO CELEBRADO ENTRE A PETROBRAS E ESSAS EMPRESAS, QUE ESTABELECE NA POSIÇÃO DE S.EXA., MONOPOLIO PRIVADO DA AREA PETROQUIMICA NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 19/09/1997 - Página 19627
Assunto
Outros > POLITICA INDUSTRIAL.
Indexação
  • CRITICA, CONTRATO, CRIAÇÃO, GRUPO, INDUSTRIA PETROQUIMICA, MOTIVO, OBSTACULO, FLEXIBILIDADE, MONOPOLIO, PETROLEO, RESTRIÇÃO, PARCERIA, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
  • ANALISE, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, SETOR, PETROQUIMICA, BRASIL, CRITICA, FALTA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), CONCESSÃO, PRIVILEGIO, EMPRESA NACIONAL, EFEITO, CONCENTRAÇÃO.
  • ANUNCIO, AÇÃO JUDICIAL, AUTORIA, ORADOR, ENDEREÇAMENTO, CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONOMICA (CADE), ANALISE, CONTRATO, AMBITO, MONOPOLIO, INICIATIVA PRIVADA.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (BLOCO/PT-SE. Como Líder. Para uma comunicação de interesse partidário.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, durante a discussão da quebra do monopólio do petróleo nesta Casa, os principais argumentos apresentados pelo Governo na defesa de seu projeto, tanto com relação à emenda constitucional quanto à lei que veio regulamentar a modificação na Constituição, eram a necessidade do crescimento da competitividade para aumentar as possibilidades no setor de petróleo, no setor petroquímico, e para retirar amarras da Petrobrás que, de acordo com o modelo institucional vigente, impossibilitavam que a empresa estabelecesse parcerias, enfim, que atraísse novos investimentos para o Brasil.

Soubemos, pela imprensa, da constituição da Companhia Nacional de Produtos Petroquímicos formada pela Elekeiroz S.A. (Grupo Itaú), a Ultrapar Participações S.A. (Grupo Ultra) e a OPP-Petroquímica S.A. (Norberto Odebrecht), que em nosso entendimento vão na contramão do que foi prometido à Nação quando da discussão da flexibilização do monopólio do petróleo. O contrato de constituição da Companhia Nacional de Produtos Petroquímicos estabelece que as parceiras da Petrobrás nesse empreendimento - os Grupos Itaú e Ultra e Norberto Odebrecht - terão que ser consultadas antes de qualquer investimento futuro da estatal nessa área, fora da CNPP. Ou seja, existe esse acordo no âmbito da região de Paulínia entre Petrobrás e as empresas acima referidas. Devido a esse contrato, se a Petrobrás quiser estabelecer outra parceria na Região Nordeste, por exemplo, terá que consultar e se submeter ao voto qualificado dessas parceiras na Companhia Nacional de Produtos Petroquímicos.

"A cláusula oitava do contrato é claríssima sobre esse ponto:

      (...) as partes evitarão participar, isoladamente, de novos investimentos ou negócios que sejam conflitantes com os empreendimentos petroquímicos organizados nos termos deste contrato (...) O contrato tem prazo de vigência de 30 anos."

Relacionado a esse processo, que entendemos muito estranho, essa forma de parceria que a Petrobrás está estabelecendo com algumas empresas, gostaríamos de tecer alguns comentários sobre o que vem acontecendo no setor petroquímico brasileiro a partir do início da sua privatização, em 1992.

Desde 1992, com o leilão da Petroflex - que foi a primeira empresa -, o Governo Federal vem promovendo um processo de privatização das indústrias do setor petroquímico, reestruturando um complexo parque industrial montado há mais de 20 anos com base em uma tríplice participação: Estado, capital nacional e capital externo. Nas centrais de matéria-prima, a Petrobrás, por intermédio da Petroquisa, controlava duas empresas, a Copesul e a PQU, e dividia o controle acionário da terceira, a Copene, com a Norquisa, empresa formada pela associação dos principais consumidores da produção da central, com maior participação da Conepar, que hoje integra os ativos do Banco Econômico liquidados pelo Banco Central. Das 35 empresas incluídas no programa de privatização (incluídas as centrais de matérias-prima), 25 já foram vendidas até o momento, levando ao agrupamento do setor em torno de seis grandes grupos: Grupo Odebrecht, Mariani, Suzano, Conepar, Unipar (grupo que conta com a participação da Odebrecht e Grupos Vila Velha) e Ipiranga.

O BNDES manifestou-se por diversas vezes mostrando-se favorável, até indutor desse processo de concentração do setor petroquímico. Alega, freqüentemente, que se faz necessário criar meios para que os grupos nacionais tenham condições de competir em pé de igualdade com os grandes grupos internacionais, como a Dupont, Exxon, Union Carbide e Shell Oil, entre outros. Os instrumentos utilizados para induzir essa concentração, no entanto, contemplam benefícios muito pouco transparentes. O uso de moedas podres, até o final de 1995, deu-se em maior grau na privatização das empresas do setor petroquímico (92,2%), se comparado com as demais empresas (83,4%). Deve-se observar que o BNDES define, em cada leilão, o valor mínimo que terá que ser pago em moeda corrente. Como resultado, o valor nominal dos títulos recebidos pela Petroquisa nos leilões atingiram R$3,5 bilhões, enquanto o valor de mercado dos mesmos não chega a R$1,8 bilhão.

O uso de moedas podres nos leilões de privatização é assunto controverso porque, teoricamente, o livre acesso a esses ativos (o que não ocorre) poderia conferir maior grau de competição, elevando o preço de venda das ações ofertadas. No setor petroquímico, onde houve maior complacência do BNDES com relação ao uso das moedas podres, essa concorrência é inibida pois o estatuto constitutivo das empresas dá preferência aos demais sócios no caso de venda de ações ordinárias por um dos participantes do controle acionário. O BNDES é obrigado a oferecer as ações ordinárias (com direito a voto) aos parceiros da Petroquisa, definindo também o percentual que terá que ser pago com moeda corrente.

Nos leilões de ações ordinárias de empresas do setor petroquímico, a ocorrência de ágio só foi observada em três privatizações, exatamente as três que estavam entre as primeiras, todas elas realizadas em 1992. De lá para cá, os leilões de privatização das empresas da área petroquímica não tiveram nenhum ágio. Se o leilão é necessariamente direcionado, e o ágio um acidente de percurso, o uso de moedas podres é livremente arbitrado pelo BNDES e financiado de forma extremamente favorável aos participantes dos leilões. O BNDES vende debêntures da Siderbrás e dívida securitizada da Portobrás (ambas extintas), que estão na carteira desse BNDES, financiadas pelo banco com dois anos de carência, pagamento de 12% do principal nos primeiros cinco anos, os 88% restantes em parcelas semestrais do sexto ao décimo-segundo ano e juros equivalentes a TJLP mais 3% a.a., incidente sobre o saldo devedor, pagos semestralmente.

Observamos, novamente, que o BNDES privilegiou o setor petroquímico com maior fluxo de financiamento. Entre as 17 empresas privatizadas entre junho de 1992 (quando foi introduzida essa forma de financiamento) e final de 1995 (último dado disponível), as 5 empresas em que o financiamento do BNDES foi mais significativo são todas do setor petroquímico, a saber:

- Nitriflex - Valor de venda: U$26,2 milhões - Valor financiado pelo BNDES: U$26,2 milhões, ou seja, 100% - Beneficiado: Itap S.A.;

- Álcalise - Valor de venda: U$49,2 milhões - Valor financiado pelo BNDES: U$46,9 milhões, ou seja, 96% - Beneficiado: Cia. Industrial do R.N.;

- Polialden - Valor de venda: U$16,8 milhões - Valor financiado pelo BNDES: U$13,9 milhões, ou seja, 82% - Beneficiado: Conepar;

- Politeno - Valor de venda: U$44,8 milhões - Valor financiado pelo BNDES: U$35,8 milhões, ou seja, 80% - Beneficiados: Suzano e Conepar;

- Ciquine - Valor de venda: U$23,7 milhões - Valor financiado pelo BNDES: U$18,9 milhões, ou seja, 80% - Beneficiado: Conepar.

Quase esgotado o processo de privatização do setor, a política deliberada de favorecimento chegou ao resultado esperado pelo BNDES, ou seja, a concentração. Considerando o faturamento observado em 1994 e a participação acionária após as privatizações, o Grupo Odebrecht figura no topo da lista de faturamento do setor, com U$954 milhões/ano, seguido do Grupo Econômico (Conepar), com U$300 milhões; Grupo Ultra, com U$253 milhões; Grupo Suzano, com U$196 milhões; Grupo Vila Velha, com U$125 milhões; Grupo Ipiranga, com U$100 milhões e Grupo Mariani, com U$89 milhões. Nesse contexto de concentração, a Petrobrás anuncia novos investimentos no setor, dentro de um "novo modelo" que passaria a orientar a constituição das empresas a serem instaladas no pólo petroquímico do Planalto Paulista, em Paulínia (SP). Nas centrais de matérias-primas, a Petrobrás deterá o controle do capital, com 70% das ações ordinárias. Nas empresas secundárias (de transformação da matéria-prima) a Petrobrás ficaria com 30% e seus parceiros com 70%.

Petrobrás, Elekeiroz S.A. (Grupo Itaú), Ultramar Participações S.A. (Grupo Ultra) e OPP-Petroquímica S.A. (Grupo Odebrecht) assinaram contrato de constituição da Cia. Nacional de Produtos Petroquímicos. Alguns grupos que altruisticamente empenharam esforços e recursos (conseguidos com algumas facilidades) para tirar o Estado do setor, demonstram agora uma espírito de coletividade sem igual ao comprometer, em prol do Brasil, seus patrimônios em uma associação com esse parceiro ineficiente e perdulário - o Estado. De acordo com a adjetivação inclusive desses grupos.

Infelizmente, a Petrobrás parece não ter se importado com as cláusulas restritivas constantes nos estatutos das empresas privatizadas, que inibiram a competição nos leilões por preverem o direito de preferência aos demais sócios. Essas restrições foram perigosamente ampliadas, pois os sócios terão que ser consultados quanto a participação em "novos investimentos ou negócios que sejam conflitantes com os empreendimentos petroquímicos organizados nos termos desse contrato..." A Petrobrás não poderá associar-se a qualquer outro grupo para realizar investimentos no setor petroquímico, pois antes terá que oferecer o negócio, nas mesmas condições, aos seus parceiros. Caiu o monopólio da Petrobrás na exploração do petróleo, mas algumas empresas, três explicitamente, adquiriram o monopólio sobre os investimentos da Petrobrás no setor petroquímico. Quer dizer, é esse o modelo de concorrência prometido ao Brasil!

Queremos registrar que vamos impetrar uma ação junto ao Cade para analisar esse contrato celebrado entre a Petrobrás e essas empresas. No nosso entendimento, ele estabelece claramente um monopólio privado da área petroquímica no Brasil.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/09/1997 - Página 19627