Discurso no Senado Federal

EXPECTATIVA COM A CHEGADA, AMANHÃ, DO PAPA JOÃO PAULO II AO RIO DE JANEIRO PARA O 2 ENCONTRO MUNDIAL COM A FAMILIA.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA.:
  • EXPECTATIVA COM A CHEGADA, AMANHÃ, DO PAPA JOÃO PAULO II AO RIO DE JANEIRO PARA O 2 ENCONTRO MUNDIAL COM A FAMILIA.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 02/10/1997 - Página 20663
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, VISITA OFICIAL, JOÃO PAULO II, PAPA, ENCONTRO, AMBITO INTERNACIONAL, FAMILIA, REALIZAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).

A SRª BENEDITA DA SILVA (BLOCO/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar gostaria de agradecer ao Senador Bernardo Cabral por ter atendido a minha solicitação de ocupar o lugar de primeiro orador inscrito após a Ordem do Dia. Quero agradecer porque sei que S. Exª também apoiará de antemão o que vou dizer da tribuna nesta tarde.

Professo uma religião protestante, mas gostaria de manifestar-me neste momento porque o Estado do Rio de Janeiro estará recebendo amanhã o Papa João Paulo II para o II Encontro Mundial com a Família. Católicos daquele estado estão se preparando para recebê-lo; peregrinos de todas as partes, pessoas de todos os lugares têm comentado a importância da vinda do Papa para os católicos no Brasil.

Como o respeito à independência das religiões faz parte do convívio democrático dos diferentes - entendemos que o desrespeito à fé e à crença merece repúdio de todos nós -, quero também colocar minha participação nas homenagens que estão sendo prestadas ao Papa pela sua presença no Estado do Rio de Janeiro. A primeira coisa que quero dizer é que o Evangelho tem sua sustentação na tolerância e no respeito mútuo, tanto que nós do Conselho das Igrejas Cristãs e Ortodoxas estaremos presentes à festa-testemunho que vai se realizar no Maracanã, no meu Estado.

Quero fazer uma retrospectiva da vinda do Papa ao Brasil. Pude compartilhar dos preparativos que antecederam sua chegada, em 1980, quando João Paulo II visitou a Favela do Vidigal. O Vidigal é uma favela sofrida, com as dificuldades de tantas outras favelas, mas, pelo fato de ter sido a anfitriã da visita papal, recebeu alguns melhoramentos. Lamento que as melhorias da época não sofreram continuidade, por tudo quanto aquela população do Vidigal tem contribuído para o Estado do Rio de Janeiro. Também em 1980 pude acompanhar a conversa do Papa com os operários de São Paulo. Já naquela época, eles expunham suas dificuldades e suas reivindicações. Lembro-me que, nesse ano, o Papa pediu a reforma agrária ao Presidente João Figueiredo.

Eu quis fazer essa retrospectiva porque entendo que o momento é oportuno. Naquela época já se pedia a reforma agrária, a igreja católica já se manifestava em relação a isso, e não apenas os chamados Partidos de esquerda. É bom lembrar que o Papa retorna ao País após 17 anos e vai encontrar o Movimento dos Sem-Terra clamando por reforma agrária, por justiça na terra e paz no campo.

Em 1991, quando o Papa de novo esteve no Brasil com o objetivo de intensificar as atividades religiosas, S. Santidade pôde discutir e colocar aos católicos a necessidade da propagação do Evangelho e, naquele momento, desejava que a Igreja tivesse um crescimento não apenas espiritual, quero crer, mas também social, porque para intensificar atividades religiosas era necessário também assumir compromissos sociais. E nós tivemos várias manifestações: o crescimento das chamadas Comunidades Eclesiais de Base, de que fiz parte por muitos anos na luta e na conquista dos direitos dos menos favorecidos, dos meninos de rua, dos favelados, do que nós buscávamos, naquele momento, o chamado uso-capião.

Em 1997, o Papa chegará ao Brasil para falar de um tema que considero relevante e importante: a família, célula fundamental. E diz:

      "A sociedade não pode prescindir da instituição familiar pela simples razão de que ela própria nasce nas famílias e recebe consistência das famílias". João Paulo II.

Gostaria de falar um pouco sobre como o Papa vai encontrar a família brasileira; essa que S. Santidade considera a célula fundamental.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Senadora Benedita da Silva, permite-me um aparte?

A SRª BENEDITA DA SILVA (PT-RJ) - Com prazer, Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Senadora Benedita da Silva, em primeiro lugar gostaria de fazer uma observação relativamente ao tema que V. Exª abordou no início de seu pronunciamento: o Congresso Mundial das Assembléias de Deus. Tive a oportunidade de acompanhá-la ao Campo de Marte, domingo último, em São Paulo, ocasião em que centenas de milhares de pessoas ali estiveram reunidas em importante demonstração de fé. Embora não pertença à Assembléia de Deus, na medida em que inúmeras pessoas nos convidaram para estar lá e sendo V. Exª membro dessa igreja, me dispus a acompanhá-la. Gostaria de comentar episódio lá ocorrido, especialmente durante a presença do Senhor Presidente Fernando Henrique Cardoso. Na ocasião, o Presidente das Assembléias de Deus, o pastor José Wellington Bezerra da Costa, ao saudar o povo, fez duas observações com as quais não concordei. Sobre elas gostaria de fazer o seguinte comentário: Primeiro, quando ele se dirigiu ao povo e disse que o importante é alcançar o reino dos céus e não tanto a terra - e o Presidente Fernando Henrique inclusive olhou-nos - será que isso ficou estampado? Eu perguntei para o pastor Bezerra da Costa: será que V. Sª quis dizer alguma coisa contra o Movimento dos Sem-Terra que tanto vem lutando pelo direito à terra? Ele assegurou-me que absolutamente não era essa a sua intenção. Mas convém registrar que até o Presidente da República nos olhou de uma forma que as palavras do pastor poderiam dar a entender aquela interpretação. O segundo ponto foi quando o pastor José Wellington mencionou que veria com bons olhos mais quatro anos para o Presidente Fernando Henrique. Fiz questão de transmitir a S. Sª que estava em desacordo com as suas afirmações uma vez que preferiria que o Presidente da República seguisse os passos de Nelson Mandela que não se candidatou, embora tivesse o direito de fazê-lo. Essa foi a decisão de Mandela, na África do Sul: não se candidatar para não sofrer o desgaste comum a todos os chefes de Estado que teimam em permanecer no poder. Acredito que são importantes as observações que V. Exª está fazendo relativamente à vinda do Papa João Paulo II.

O SR. PRESIDENTE (Gilberto Miranda) - Senadora Benedita da Silva, peço que V. Exª encerre seu pronunciamento porque terminaremos a sessão em um minuto.

A Srª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ) - Não haverá tempo para dar aleluia ao Senhor Fernando Henrique Cardoso, mas Glória a Deus.

Sr. Presidente, peço que V. Exª prorrogue a sessão para que eu possa concluir o meu pronunciamento, porque estou fazendo, de certa fora, uma deferência a uma personalidade que chegará ao nosso País - o Papa. Gostaria, como representante do Estado do Rio de Janeiro, poder manifestar-me a respeito da vinda de Sua Santidade.

O SR. PRESIDENTE (Gilberto Miranda) - Senadora Benedita da Silva, vamos prorrogar a sessão até às 18h40min. V.Exª tem oito minutos para concluir.

A Srª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ) - Muito obrigada, Sr. Presidente.

Senador Eduardo Suplicy, não vou fazer nenhum comentário sobre o aparte de V. Exª porque o tempo não me permite, mas gostaria de dizer que a alusão feita pelo Pastor Bezerra nada tem a ver contra o Movimento dos Sem-terra, porque recebemos, desde Gênesis, o ensinamento: "Ide, multiplicai e enchei a face da Terra". Deus mandou que trabalhássemos, colhêssemos e frutificássemos com o suor do nosso rosto o produto da terra. Portanto, de Gênesis a Apocalipse, a terra pertence ao homem e está a seu serviço.

A família brasileira receberá o Papa: as mães solteiras, os pais solteiros, os irmãos órfãos, as famílias desagregadas, a miséria, a pobreza, filhos prostituídos, drogados, marginalizados, excluídos socialmente. Se é verdade que o futuro da humanidade passa pela família, temos de reconhecer que as atuais condições sociais, econômicas e culturais, freqüentemente, tornam mais árdua e penosa a tarefa da família a serviço da vida. Para poder realizar sua vocação, é necessário e urgente que a família, como tal, seja ajudada e apoiada. Essas são palavras do Papa João Paulo II.

Houve mudanças no mundo, nas religiões, no Brasil. Quero crer que o Papa João Paulo II vai refletir sobre essas mudanças porque, ao chegar no Brasil, encontrará realmente um País diferente. O mundo está mudado. Sua Santidade pôde ver a guerra entre Irã e Iraque; o genocídio na ex-Iugoslávia; a derrubada do Muro de Berlim; o fim da ditadura e início do processo democrático no Brasil; o impeachment; os conflitos políticos dos sem-terra, sem-teto, sem-emprego e o crescimento dos pentecostais. São desafios a serem enfrentados na América Latina.

O Papa João Paulo II certamente falará a uma família muito diferente daquela a que teve oportunidade de falar em 1980 e 1991. Sua Santidade tem de enfrentar o desafio dessas mudanças e deverá saber que temos temas polêmicos que são mundialmente discutidos, mas que fazem parte do cotidiano da vida das pessoas.

Diz um coro das Assembléias de Deus: "Nas lutas e nas provas a Igreja segue caminhando." Nossas inquietações não devem ser maiores do que as tarefas atribuídas aos cristãos. A felicidade e a paz da família brasileira não é somente uma tarefa da Igreja Católica. É de todos nós.

Como representante do Estado do Rio de Janeiro desejamos, dentro do espírito de confraternização dos povos, que esse evento seja bem sucedido. É com o respeito às crenças alheias que se descobre espaço para a manifestação, a alegria. Que o encontro mundial do Papa com as famílias faça renascer as esperanças de um compromisso maior com a solidariedade e que o dom do Espírito Santo se manifeste em cada ação.

Quero repetir palavras que não são de protestantes, não são do Papa, são do Padre Zezinho em um trecho da oração pela família:

      "Que nenhuma família se abrigue debaixo da ponte; que ninguém os obrigue a viver sem nenhum horizonte. Abençoa, Senhor, as famílias. Amém. Abençoa, Senhor, a minha também."

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/10/1997 - Página 20663