Pronunciamento de Nabor Júnior em 02/10/1997
Discurso no Senado Federal
DISCRIMINAÇÃO ODIOSA QUE SE PRATICA ROTINEIRAMENTE CONTRA A AMAZONIA. COMENTARIOS SOBRE O SERIO E SUBSTANCIOSO DOCUMENTO ENVIADO AO PRESIDENTE DO BNDES PELAS FEDERAÇÕES DAS INDUSTRIAS DOS ESTADOS DA AMAZONIA, SOB O TITULO DE 'AÇÃO PRO-AMAZONIA'.
- Autor
- Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
- Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
- DISCRIMINAÇÃO ODIOSA QUE SE PRATICA ROTINEIRAMENTE CONTRA A AMAZONIA. COMENTARIOS SOBRE O SERIO E SUBSTANCIOSO DOCUMENTO ENVIADO AO PRESIDENTE DO BNDES PELAS FEDERAÇÕES DAS INDUSTRIAS DOS ESTADOS DA AMAZONIA, SOB O TITULO DE 'AÇÃO PRO-AMAZONIA'.
- Publicação
- Publicação no DSF de 03/10/1997 - Página 20780
- Assunto
- Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
- Indexação
-
- CRITICA, TRATAMENTO, GOVERNO FEDERAL, DISCRIMINAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA.
- ANALISE, DOCUMENTO, MANIFESTO, EMPRESARIO, INDUSTRIAL, ASSINATURA, JOÃO OLIVEIRA DE ALBUQUERQUE, PRESIDENTE, FEDERAÇÃO, INDUSTRIA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), PROTESTO, ABANDONO, GOVERNO FEDERAL, BUROCRACIA, TECNICO, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), PREJUIZO, REGIÃO AMAZONICA, FAVORECIMENTO, REGIÃO SUL, REGIÃO SUDESTE, BRASIL.
O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB-AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a discriminação odiosa que se pratica rotineiramente contra a Amazônia tem atingido níveis insuportáveis e revoltantes, despertando reações firmes e radicais até mesmo em quem se faz notório por sua serenidade. Isso porque é impossível assistir passivamente a tal tratamento desidioso e insensível, dispensado a uma Região que representa mais de metade do território nacional e que desperta a cobiça de nações, povos e entidades do Exterior.
O empresário João Oliveira de Albuquerque, Presidente da Federação das Indústrias do Estado do Acre, é uma pessoa que se adapta com perfeição àquele conceito de serenidade e equilíbrio que destaquei há pouco, aliando, em sua conduta de líder empresarial, fatores como firmeza e cortesia, inerentes às suas qualidades de homem educado e cidadão exemplar. É por isso que merece atenção especial o documento por ele assinado, em conjunto com os demais presidentes das Federações da Indústrias da Amazônia: um ofício ao Presidente do BNDES, protestando contra o tratamento dispensado pelo Banco à Região.
Sob o título de "Ação Pró-Amazônia", o manifesto dos industriais abre a declaração de inconformismo com uma acusação formal: "Definitivamente, o BNDES não conseguiu cumprir sua missão de chegar à Amazônia". Habilmente, procura isentar as principais autoridades federais, desde os Presidentes da República até Ministros e os próprios Presidentes do BNDES nos últimos Governos - afirmando que "todos se empenharam, cada um em sua época", mas "não estão sendo suficientemente capazes de vencer a cultura de caráter elitista, predominante na massa crítica do Banco, à exceção de alguns diretores, para desenclausurar as iniciativas dessa instituição presumivelmente nacional, para arredá-la além do seu raio de ação dos eixos do Sul e Sudeste do País".
Esperanças não faltaram; confiança nas promessas do Governo também não!
O documento das Federações amazônicas lembra que em 1994 houve um esforço conjunto de lideranças governamentais e empresariais do Norte, ajudadas pelos Parlamentares da área, movimento coroado em agosto daquele ano com o lançamento do "Programa para a Amazônia Integrada - PAI", reforçado e alardeado sob o slogan patrocinado pelo BNDES: "A AMAZÔNIA É DA NOSSA CONTA".
Em termos concretos, essa proposta envolvia créditos que atingiriam US$1 bilhão nos primeiros três anos, deixando aberta a perspectiva de ampliação nos períodos subseqüentes, com um singelo rebate de 1% em relação às demais áreas do País.
Não era nenhum favor; não se fez nenhuma concessão espúria.
Havia, naquele projeto, apenas o primeiro passo para o Brasil resgatar uma pequena parcela da imensa dívida com os patrícios que conquistaram, consolidaram e integraram a Amazônia, lutando contra todas as adversidades em busca de seu progresso. E, se compararmos o valor trianual dos investimentos ao que se aplica nas demais áreas, são números modestos, aceitáveis apenas como o que representariam: um passo inicial no resgate do muito que a nacionalidade está a dever aos habitantes de suas regiões pioneiras.
Mesmo assim, os líderes do empresariado amazônico se mostraram entusiasmados com as perspectivas. Como eles mesmos afirmam, em seu manifesto, "prenunciavam-se sinais de novos tempos. Pensava-se, a partir de então, que surgiria novo momento de atenções e sensibilidade à conta da Região Norte.
Os empresários e o povo reuniram-se nos auditórios da Fiepa e da Fieam para assistirem ao lançamento do PAI. O povo confraternizou-se de uma forma alegre, como se fosse o seu encontro primeiro com o almejado e esperado futuro promissor.
Simbolizava a todos um momento novo, um renascimento de esperanças."
Diz o consagrado adágio que a "esperança é a última que morre"- e é fato: nem mesmo as dificuldades burocráticas e má-vontade da tecnocracia conseguiram arrefecer o trabalho de materializar projetos específicos, desdobrar propostas, colher sugestões da sociedade e de suas lideranças. Do outro lado, muita gentileza e obsequiosa atenção, como admitem os próprios empresários: "Não podemos nos queixar, todos foram incansáveis. Sempre demonstraram atenção e cordialidade, principalmente nas reuniões de trabalho e nas visitas, embora raras, à nossa Região.
Porém, o programa e os seus recursos nunca puderam ajudar a Região na amplitude e na escala esperadas. Ou melhor, não mais do que 10% das expectativas".
E é nesse ponto que reside todo o problema: o descompasso entre as promessas, as reuniões nos gabinetes refrigerados, ante a brutal realidade de atraso, abandono, distanciamento e menosprezo com que a Amazônia continuou a ser efetivamente tratada.
Não sei, sinceramente, se existe ironia na análise que os empresários da Amazônia fazem à conduta e às práticas do BNDES em relação à Região. Acredito que não; prefiro pensar que em suas palavras só encontro a gentileza e a compreensão que sempre marcam os pronunciamentos e os contatos pessoais entre os amazônidas e deles com os brasileiros de outras partes. Ouçamos, uma vez mais, o que dizem: "Somos todos razoáveis para compreender que é muito difícil para um técnico que se propõe a analisar um projeto ou uma linha de crédito ter que ficar dois ou três dias na cidade do Norte, enfrentado o clima hostil, tropical e equatorial, afastado das suas rotinas. Entretanto, temos a consciência de que o Brasil e as instituições muito têm a fazer para resgatar a sua pobreza repugnável e as gritantes desigualdades regionais".
Numa coisa os técnicos e dirigentes do BNDES foram pródigos: as desculpas e os pretextos sobre as dificuldades para implantar as diretrizes do estabelecimento e cumprir as promessas do Governo nas regiões mais distantes, como os Estados do Norte.
Os líderes regionais, aos poucos, foram colecionando os porquês dos tecnocratas e da sólida burocracia da Instituição, chegando a um número cabalístico: são sete as alegações básicas para torpedear tudo que represente progresso social e desenvolvimento econômico para a Amazônia:
"1 - O BNDES não é um banco de primeira linha, trabalha através de agentes financeiros;
2 - O BNDES não tem estrutura de pessoal para operar diretamente nas diversas cidades e regiões;
3 - O risco tem que ser do agente financeiro que está mais próximo da base e do cliente;
4 - O BNDES tem toda boa vontade, mas não abre mão de que é, antes de tudo, um "BANCO". Isto é, o "B" deve predominar sobre as demais letras, principalmente ao "N" de Nacional e ao "S" de Social";
5 - Banco foi feito para dar lucro;
6 - O Norte deve ter os seus agentes financeiros para assumir os riscos;
7 - O Banco opera com limites de R$5 milhões. Não tem condições de analisar projetos abaixo desse limite.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é importante que se dê ênfase à generosa compreensão com que os amazônidas sempre reagiram e continuam reagindo às sevícias políticas econômicas que sofrem ao longo dos séculos. Chegam, até mesmo, a justificar os autores dessas atitudes deletérias, atribuindo ao BNDES apenas "atos incontestáveis ao nível da cultura bancária" - o que, todavia, não resiste à análise objetiva dos fatos: todo o chamado "Programa para a Amazônia Integrada" não custaria, em três anos, 1/25 avos, não consumiria mais de 4% que foi queimado com o Proer e os bancos quebrados nos grandes centros econômicos do País.
"A visão bancária da vida é bem estranha, quando observada sob a ótica da justiça social. O BNDES tem como principal fonte de o FAT - Fundo de Assistência ao Trabalhador. Deduz-se que são recursos dos trabalhadores e para benefícios dos mesmos. É pacífico e indiscutível que a melhor assistência que se pode colocar à disposição daqueles que estão na idade de trabalhar é o emprego. No Brasil, a População na Idade de Atividade - PIA" é de 98 milhões e na Amazônia de 3 milhões. Portanto, os trabalhadores do Norte estão órfãos de assistência, posto que a instituição financeira gestora desses recursos (o BNDES) estabeleceu um patamar determinado e não se preocupa em ir ao encontro das necessidades das populações. Pela sua cultura bancária de excessivo cuidado com o risco, esperam que as populações das regiões periféricas, no caso do Norte, cheguem até eles e atendam aos seus padrões de exigência, no mais perfeito requinte de excelência e proeminência."
Mas, como dizem os empresários da Amazônia, "são conceitos cristalizados e o Banco deve continuar com eles". Mas, ao mesmo tempo em que evitam agredir os donos do BNDES, as Federações mostram que não se iludem, afirmando:
"Estamos rigorosamente convencidos de que este BNDES, nas condições atuais, não serve para o Norte. O seu perfil não é condizente para atender as empresas e ter a conta de uma região periférica como a Amazônia. Há um grande fosso entre a estatura do BNDES e a realidade do Norte, principalmente no que se refere ao ônus do risco que o BNDES insiste em transferir para os agentes, ao desconhecimento das peculiaridades da Região e à burocracia que aniquila o ânimo dos tomadores distantes. Sem falar no custo real e de oportunidade, a ser percorrido entre a decisão de investir e o empréstimo, que são desperdiçados entre 6 e 12 meses, em tratativas burocráticas.
Muito pouco nos adianta fingir ter um programa com o título faustoso, solene e desse porte, tentando camuflar uma realidade insustentável, difícil de integrar e conciliar a cultura do Banco e as necessidades da realidade amazônica."
O sério e substancioso documento enviado ao Presidente do BNDES pelas Federações das Indústrias dos Estados da Amazônia tem em seus últimos tópicos uma das verdades mais sérias e menos enfrentadas deste País: o contraste entre o tamanho e a importância da Região e o interesse materialmente efetivo que recebe. Como afirma o manifesto enviado ao Presidente do BNDES, "a Amazônia Legal, que representa 5/8 do território nacional, com todas as suas riquezas potenciais, a sua biodiversidade, uma população com pouco mais de 10% e um PIB de 5% do País, poderá deixar de ser da conta do BNDES. A partir daí, sem o ônus desta região figurar no passivo do Banco, os líderes regionais poderão discutir um outro programa, que seja mais real e menos faz-de-conta do que este, com o legítimo e justo objetivo de promover o seu desenvolvimento, para os seus 17 milhões de habitantes."
A conclusão do documento dos empresários amazônicos ao BNDES não poderia ser diferente daquele que efetivamente expressa: uma renúncia digna, altaneira e consciente às miragens e às promessas vãs com que a Região vem sendo tratada pelo Estabelecimento. É uma afirmação digna de constar, com destaque, nos Anais do Congresso Nacional e para cujos termos encareço a particular atenção dos Srs. Senadores:
"Os empresários, através de suas lideranças da indústria, através desta Ação Pró-Amazônia, que congrega as Federações dos Estados do Norte, por unanimidade, ao persistirem as condições vigentes, retrocitadas, agradecem e RENUNCIAM ao BNDES, de forma pacífica, cordial, sem traumas, desejando continuado sucesso para essa instituição."
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, faço questão de confiar numa solução para a crise instalada nas relações entre o Governo Federal, por intermédio do BNDES, e os empresários da Região Amazônica. Pensar o contrário seria aceitar a amarga afirmação que o S de BNDES seria de SUL, significando Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico DO SUL, posto que sua atenção, seus projetos e seus investimentos se concentram quase absolutamente nas zonas que já são as mais desenvolvidas e ricas do território nacional.
Concluindo, peço permissão a V. Exªs para reafirmar aquele ponto que ressaltei no início deste discurso: é preocupante vermos pessoas equilibradas e ponderadas como o Presidente da FIEAC, João Albuquerque, assinando um documento tão firme e contundente - porque vemos, nisso, um grito de desespero e de inconformismo que precisa ser ouvido pelo Governo, acordando os que habitam os gabinetes confortáveis e bem-pagos do BNDES.
Muito obrigado.