Discurso no Senado Federal

INCONFORMIDADE COM O TRATAMENTO QUE VEM SENDO DISPENSADO PELA CAMARA DOS DEPUTADOS AOS PROJETOS ORIGINADOS NO SENADO FEDERAL, QUE TRAMITAM LENTAMENTE NAQUELA CASA, CONFORME DADOS FORNECIDOS PELA SECRETARIA-GERAL DA MESA, EM ATENDIMENTO A SOLICITAÇÃO DE S.EXA.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • INCONFORMIDADE COM O TRATAMENTO QUE VEM SENDO DISPENSADO PELA CAMARA DOS DEPUTADOS AOS PROJETOS ORIGINADOS NO SENADO FEDERAL, QUE TRAMITAM LENTAMENTE NAQUELA CASA, CONFORME DADOS FORNECIDOS PELA SECRETARIA-GERAL DA MESA, EM ATENDIMENTO A SOLICITAÇÃO DE S.EXA.
Publicação
Publicação no DSF de 08/10/1997 - Página 21099
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • CRITICA, DEMORA, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, SENADO, ANALISE, ESTATISTICA, LEVANTAMENTO, SECRETARIA GERAL DA MESA.
  • SOLICITAÇÃO, ATUAÇÃO, MESA DIRETORA, PRESIDENTE, CONGRESSO NACIONAL, ENTENDIMENTO, CAMARA DOS DEPUTADOS, MELHORIA, PRAZO, APRECIAÇÃO, PROJETO DE LEI, SENADO.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Brasil, desde o seu início como País independente, como Nação, na organização de suas instituições, na divisão dos Poderes, tem praticado o regime do bicameralismo no Congresso. Temos uma Câmara dos Deputados, que, em princípio, representa os eleitores, os cidadãos; e temos o Senado, que representa os Estados.

Esse modelo institucional, esse modelo de organização política foi inspirado justamente no modelo americano, onde há o bicameralismo, onde a representação está devidamente tipificada em cada Casa, além do que o Senado guarda para si certas prerrogativas exclusivas. No Brasil, temos a prerrogativa de examinar a escolha de autoridades, como embaixadores, dirigentes do Banco Central, CADE e ainda limites de endividamento, operações de crédito dos Estados, Municípios. São atribuições específicas, exclusivas do Senado.

Na elaboração das leis, a nossa Constituição determina que todas as proposições tramitem nas duas Casas, funcionando uma como revisora da outra, e os projetos de lei de iniciativa do Poder Executivo, quer dizer, do Presidente da República, devem obrigatoriamente entrar pela Câmara dos Deputados. Mas, nessa revisão, um projeto originado na Câmara, alterado pelo Senado, volta ao exame da Câmara, que dá a palavra final e vice-versa.

O que temos observado, Sr. Presidente - e aqui não têm faltado pronunciamentos sobre o assunto; lamento que não esteja presente o Senador Pedro Simon, que é um dos que mais têm denunciado esse fato -, é que os projetos de iniciativa dos Srs. Senadores não tramitam na Câmara dos Deputados com a celeridade, com a velocidade que seria desejável, ao contrário do que acontece no Senado com os projetos originados na Câmara.

Não quis ficar apenas nessa visão impressionista, que poderia ser fruto de um equívoco, de uma impressão falsa, que não encontrasse abrigo na realidade. Por isso mesmo, solicitei a colaboração da Secretaria-Geral da Mesa do Senado, para que promovesse um levantamento sobre como tem sido a tramitação no Senado de projetos que são oriundos da Câmara e como tem sido a tramitação na Câmara de projetos oriundos do Senado, na atual Legislatura, ou seja de 1995 ao dia 25 de setembro de 1997.

Verifiquei, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, lamentavelmente, a acolhida que os projetos do Senado têm tido na Câmara não é a mesma que o Senado dispensa aos projetos da Câmara que aqui tramitam. Em grande número, os projetos do Senado na Câmara ou são rejeitados, ou são arquivados, ou se arrastam em uma longa e interminável tramitação inconclusiva.

Senão, vejamos: em 1995, por exemplo, o Senado recebeu 141 projetos da Câmara, dos quais o Senado aprovou 50, que foram enviados à sanção do Presidente da República; emendou e devolveu à Câmara nove; rejeitou doze; considerou dois prejudicados; dois foram retirados de tramitação; e continuam em tramitação no Senado, 66.

Em 1996, o Senado recebeu 108 projetos da Câmara; aprovou e mandou à sanção do Presidente da República 44; emendou e devolveu à Câmara seis; não rejeitou nenhum; e 56 continuam em tramitação.

Até o dia 25 de setembro de 1997, o Senado recebeu 50 projeto oriundos da Câmara; aprovou e remeteu à sanção doze; emendou e devolveu à Câmara dois; retirado de tramitação, um; continuam em tramitação, 35. Quer dizer, neste ano, até o dia 25 de setembro, o Senado não rejeitou nenhum projeto de origem da Câmara dos Deputados.

Portanto, o resumo desses dois anos e nove meses é o seguinte: como o Senado tratou os projetos da Câmara? Recebeu para revisão 299 projetos oriundos da Câmara; tiveram finalizada a sua tramitação no Senado, 142; continuam em tramitação, 157. Portanto, tiveram sua tramitação finalizada no Senado, no período de 1995 a 25/09/97, 47,49% dos projetos recebidos daquela Casa para revisão. Quer dizer, quase 50% dos projetos que aqui chegaram, vindos da Câmara, tiveram a sua conclusão aqui no Senado, sendo raríssimos os que foram desaprovados.

O que ocorreu com os projetos do Senado enviados à Câmara dos Deputados no mesmo período? Nos três últimos anos, 1995, 1996, até o dia 25 de setembro de 1997, o Senado encaminhou à revisão da Câmara dos Deputados 138 projetos de lei; tiveram sua tramitação finalizada naquela Casa, 30. Quer dizer, dos 138 projetos enviados pelo Senado nesse período, a Câmara apenas finalizou 30 projetos. Vejam que o percentual é muito baixo.

Continuam em tramitação na Câmara dos Deputados 108 desses projetos.

Chamamos a atenção, por exemplo, para o fato de que, em 1995, o Senado enviou à Câmara 43 projetos; desses, foram aprovados 4 e rejeitados 17.

Em 1996, o Senado enviou à Câmara 49 projetos, foram aprovados dois; emendados e devolvidos ao Senado, dois; e rejeitados, cinco. Desses 49 projetos, 40 continuam em tramitação.

Este ano, até 25 de setembro, o Senado enviou 46 projetos à Câmara. Todos estão em tramitação. A Câmara não deliberou, nem aprovando nem rejeitando, sobre nenhum deles.

No período de 1995 a 25 de setembro de 1997, a Câmara só finalizou a tramitação de 21,73% dos projetos enviados pelo Senado.

Há, portanto, evidentemente, uma desigualdade enorme de tratamento. A que poderíamos atribuir isso? Sinceramente, não sei. Certamente não será devido à qualidade dos projetos do Senado. Não creio que os projetos do Senado possam ser de qualidade inferior à daqueles elaborados pela Câmara, a ponto de que merecerem esse alto índice de desaprovação.

De qualquer sorte, a desaprovação ainda seria uma forma de deliberar. Poderia até não os agradar. Mas o que assusta é justamente o fato de que os projetos de iniciativa do Senado não tramitam ou tramitam com uma lentidão enervante na Câmara. Seria por que o Senado é conservador? Ou seja: os projetos do Senado estariam em dissonância com os tempos modernos, com o sentimento de liberdade, de contestação, de mudança, de transformação que se deseja no País? Será que o Senado não está em sintonia com a sociedade, com a opinião pública? Não creio, não acredito! Por quê?

Faço uma homenagem ao Senador Geraldo Melo, que hoje preside a sessão. No início da nossa legislatura, tomamos uma decisão - lembro-me do nome de S. Exª, porque foi um dos que votou favoravelmente à regulamentação da taxa de juros de 12% ao ano, o que aparentemente é um anseio da sociedade, vitimada pelos juros elevados e escorchantes. A Câmara deliberou rápido em relação a esse tema, mas desta vez para arquivar o projeto que veio do Senado.

Enviamos recentemente não um projeto do Senado, mas do Poder Executivo sobre crimes ambientais. O Senado aprovou-o em julho, durante a convocação extraordinária. Na Câmara, faz-se um silêncio enorme, segundo dizem, graças a lobbies poderosos que se estão fazendo para impedir a tramitação da proposta. Também há o projeto que regulamenta a edição de medidas provisórias. O Senado teve a iniciativa de elaborar um projeto para alterar esta situação contra a qual nos rebelamos aqui permanentemente: trata-se do abuso na edição ou reedição de medidas provisórias. Esse projeto está há meses na Câmara, e essa Casa não delibera sobre ele.

Sr. Presidente, acho que há, pelo menos aparentemente - e aí faço coro principalmente com o Senador Pedro Simon, um dos que mais têm abordado essa questão, e outros Srs. Senadores -, descaso em relação aos projetos do Senado. Mesmo a tramitação, por exemplo, da Lei Eleitoral, da qual fui Relator, enfrentou problemas. Propus inúmeras alterações, das quais o Senado aceitou umas e rejeitou outras. A proposta voltou para a Câmara, que modificou em grande parte o projeto que recebeu do Senado. Isso é absolutamente democrático, absolutamente correto e razoável. Afinal de contas, o sistema bicameral existe para isto, para que a Casa tenha o direito e o dever de fazer revisão. No entanto, em nenhum momento - e esse assunto tomou muito a atenção do Senado e da imprensa - levei a minha voz, de qualquer maneira que fosse, para criticar o Relator do projeto na Câmara dos Deputados. Não. Fiz as mudanças que achei necessárias e que deveriam ser realizadas para compatibilizar o projeto com o instituto da reeleição, que tínhamos aprovado. Em nenhum momento, procurei atingir a Câmara como Instituição ou o autor do parecer que foi apreciado pela Câmara dos Deputados. Isso não aconteceu com relação ao Senado.

Concluo minhas palavras, mencionando esses dados, que falam por si mesmos e que pedem um exame a seu respeito, Sr. Presidente. Peço a V. Exª, Vice-Presidente do Senado e ilustre membro da Mesa Diretora, que leve o problema ao exame da Mesa Diretora do Senado, ao Presidente do Senado, Senador Antonio Carlos Magalhães, que tem sido sempre um guardião indômito na defesa da figura, da imagem do Senado e da Instituição do Senado Federal. Seria interessante que o Presidente Antonio Carlos Magalhães, em entendimento com o Deputado Michel Temer, pudesse mostrar-lhe esses dados que revelam, de fato, que as proposições que têm início no Senado tramitam na Câmara com muita dificuldade. Isso não colabora para a maior harmonia entre as duas Casas que constituem o Congresso Nacional.

Creio que essa diligência do Presidente do Senado pode ajudar muito, pode colaborar, na medida em que S. Exª manifeste, se esse for o entendimento do Plenário do Senado, um desconforto com o tratamento que essas proposições vêm tendo lá na Câmara. Essa atitude pode colaborar para uma maior sinergia entre as duas Casas que constituem o Poder Legislativo brasileiro.

Devo dizer mais: muitos Senadores têm-se queixado - já ouvi de vários Senadores - de que projetos do Senado, ao chegarem à Câmara, ficam nas gavetas dos Parlamentares ou das Comissões, enquanto proposições semelhantes ou assemelhadas que surgem na Câmara passam a tramitar com uma velocidade enorme que, muitas vezes, implicam no arquivamento da iniciativa do Senado, desconsideração daquela proposta ou, no máximo, anexação como iniciativa de caráter secundário com relação a outras que nascem na Câmara dos Deputados.

Portanto, peço a V. Exª, como membro da Mesa Diretora, no momento presidindo os trabalhos no Senado, que leve - pelo menos é a minha voz, e creio que faço eco ao sentimento de muitos outros Srs. Senadores - ao Presidente Antonio Carlos Magalhães essa nossa inconformidade com o tratamento que esses projetos do Senado vêm tendo na Câmara, pedindo para que se confira não uma importância excepcional, extraordinária, especial aos projetos do Senado, mas pelo menos aquela importância que deve receber toda proposição que lá tramite, de iniciativa desta ou da outra Casa do Parlamento brasileiro.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/10/1997 - Página 21099