Discurso no Senado Federal

COMENTANDO A VOTAÇÃO DO SUBSTITUTIVO A PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 33, DE 1996 (33/95, NA CAMARA DOS DEPUTADOS), DE INICIATIVA DO PRESIDENTE DA REPUBLICA, QUE MODIFICA O SISTEMA DE PREVIDENCIA SOCIAL, ESTABELECE NORMAS DE TRANSIÇÃO E DA OUTRAS PROVIDENCIAS, PRINCIPALMENTE EM RELAÇÃO A APOSENTADORIA DOS MILITARES. HISTORIANDO A PARTICIPAÇÃO DO PT NA APRECIAÇÃO DA PROPOSTA DE REFORMA DA PREVIDENCIA. (COMO LIDER)

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • COMENTANDO A VOTAÇÃO DO SUBSTITUTIVO A PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 33, DE 1996 (33/95, NA CAMARA DOS DEPUTADOS), DE INICIATIVA DO PRESIDENTE DA REPUBLICA, QUE MODIFICA O SISTEMA DE PREVIDENCIA SOCIAL, ESTABELECE NORMAS DE TRANSIÇÃO E DA OUTRAS PROVIDENCIAS, PRINCIPALMENTE EM RELAÇÃO A APOSENTADORIA DOS MILITARES. HISTORIANDO A PARTICIPAÇÃO DO PT NA APRECIAÇÃO DA PROPOSTA DE REFORMA DA PREVIDENCIA. (COMO LIDER)
Publicação
Publicação no DSF de 15/10/1997 - Página 21948
Assunto
Outros > PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • REGISTRO, ATUAÇÃO, ORADOR, PROCESSO, VOTAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIA SOCIAL, ESPECIFICAÇÃO, DEBATE, SITUAÇÃO, FUNCIONARIO MILITAR, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, TRABALHADOR, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT), DIREÇÃO, UNIFICAÇÃO, ASSISTENCIA PREVIDENCIARIA.
  • NECESSIDADE, SEPARAÇÃO, DEBATE, PREVIDENCIA SOCIAL, POLITICA SALARIAL, FUNCIONARIO MILITAR, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, SENADO, LIMITAÇÃO, APOSENTADORIA, MILITAR, EXTINÇÃO, PRIVILEGIO.
  • AVALIAÇÃO, VOTAÇÃO, SENADO, EMENDA CONSTITUCIONAL, PREVIDENCIA SOCIAL, PROGRESSO, DIREÇÃO, AUMENTO, DEMOCRACIA, EXPECTATIVA, CONTINUAÇÃO, DEBATE, LEGISLAÇÃO PREVIDENCIARIA.

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, passado o calor da sessão que debateu aqui a Reforma da Previdência, gostaria de fazer alguns comentários, particularmente sobre a questão dos militares.

A partir da votação daquele destaque de nossa autoria, aprovado pelo Plenário, criou-se um clima quase de histeria em relação ao resultado da votação no Senado. Penso que isso aconteceu, em primeiro lugar, por falta de maiores informações mas também porque sempre surgem aqueles profetas do apocalipse tentando pescar em águas turvas.

Sr. Presidente, primeiramente eu queria historiar nossa participação nesse debate sobre a Reforma da Previdência, para demonstrar que o destaque apresentado naquela sessão não surgiu do nada. É lógico que o destaque foi apresentado também para aproveitar o clima criado naquela sessão, na qual tivemos um senso de oportunidade em relação àquele momento da votação.

No entanto, na discussão sobre os militares, pelo menos para nós, sempre se colocava a necessidade de incluí-los no debate sobre a Reforma da Previdência. Isso pode ser comprovado, em primeiro lugar, pelo próprio projeto original de reforma global que apresentávamos. Como sempre fizemos questão de registrar, apresentamos um projeto de sistema único e universal da Previdência Social, no qual estariam incluídos os militares. E esta visão de incluir não só os militares, mas também os servidores públicos, enfim, de incluir todos os brasileiros em um regime universal, está concatenada com outro aspecto importantíssimo do projeto de regime único - o da democratização, o da participação, na gestão do Sistema de Previdência Social no Brasil, de todos os agentes interessados.

É por isso também que o projeto de regime único inclui como premissa fundamental a gestão quadripartite da Previdência Social, para que ela deixe de ser meramente estatal e passe a ser uma previdência pública.

Nessa gestão quadripartite, estão incluídos como agentes: o Governo, os empresários, os trabalhadores da ativa e os representantes dos aposentados. Nesse processo de fortalecimento e de controle social da Previdência no regime único, é importante que participem desse regime único categorias que tenham influência na sociedade, como os militares, servidores públicos, juízes, porque, se isso acontecer, esses setores terão a preocupação de introduzir mecanismos que impeçam a sonegação da Previdência, que façam com que os recursos a ela destinados não sejam aplicados em outras áreas, fato comum na história deste País. Esse é um dos fundamentos também da presença desses setores em um regime único de Previdência Social.

Fomos derrotados nesse projeto de regime único, mas, entre as emendas de plenário e de comissão que apresentamos - particularmente as de plenário, mesmo reconhecendo que aquele § 9º do art. 42, como estava proposto pelo Senador Beni Veras, que estabelecia que uma lei complementar trataria de um regime previdenciário próprio para os militares, apresentamos uma emenda - a nº 15, que dizia:

      "Altere-se o § 9º do art. 42, proposto pelo art. 1º.

      § 9º Lei complementar específica disporá sobre o regime previdenciário próprio para os servidores e militares, que deverá refletir suas peculiaridades profissionais, observado, no que couber, o disposto nos §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 8º e 9º do art. 40"*.

Portanto, em relação aos militares, entendemos que se admite a expressão "no que couber". Por isso, para nós, quando se procura bombardear a proposta de regime único ou o destaque aprovado no Senado, alegando-se que existem especificidades de tempo de aposentadoria para os militares, concordamos plenamente. E isso está escrito na própria justificação dessa emenda que apresentamos em 13 de agosto e que estabelece:

      "O sistema previdenciário dos servidores militares deve obedecer, no que couber, às mesmas regras aplicáveis aos servidores civis. As peculiaridades dos militares devem ser contempladas na legislação, notadamente as regras relativas à aposentadoria compulsória e especial que compensem as características próprias do serviço em atividade militar efetiva".

Então, quando dizem que não existe soldado com 60 anos e outras coisas do gênero, concordamos totalmente. Mas, dessa mesma forma, também afirmamos, por exemplo, que igualmente não existem trabalhadores com 60 anos em subsolo. Entretanto, nem por isso se utiliza essa especificidade de trabalho em subsolo ou no de mergulhadores para justificar a existência de um sistema especial de aposentadoria para esses trabalhadores, porque eles já estão contemplados por essa especificidade dentro do Regime Geral de Previdência Social, no art. 201.

O referido artigo estabelece que trabalhadores em atividades específicas que colocam em risco a vida, a saúde, terão regras diferenciadas de aposentadoria na forma da lei, a qual estabelecerá o tempo de contribuição e a idade mínima de aposentadoria para esses trabalhadores. Da mesma forma, ocorrerá em relação aos servidores militares. Não há, portanto, nenhum catastrofismo, que ocorreria se deixássemos de levar em consideração essa especificidade dos militares.

Essa emenda também não foi aprovada e era a que listava, no nosso entendimento, todos os parágrafos do art. 40 (1º, 2º, 3º, 4º, 8º e 9º), aos quais os militares deveriam estar inseridos. Chegamos ao segundo turno da votação. Regimentalmente, não podíamos mais pedir destaque da emenda de mérito apresentada em primeiro turno. Restava, portanto, a alternativa de deixarmos passar em branco essa discussão, fazendo-o apenas em relação à especificidade dos magistrados. A meu ver, o Senado estaria perdendo uma oportunidade para recolocar na discussão a aposentadoria dos militares - ou encontraríamos uma forma, que não seria a ideal, mas que traria de volta essa discussão.

A forma encontrada foi o destaque do § 9º do art. 42 - que estabelece que lei complementar iria tratar de regime especial de previdência social próprio para os militares - e a supressão de parte do art. 16, que, na redação do Senador Beni Veras, revogava o § 10 do art. 42 da Constituição.

O § 10 do art. 42* da Constituição atual diz: "Aplica-se aos servidores a que se refere este artigo, e a seus pensionistas, o disposto no art. 40, §§ 4º, 5º e 6º". Quer dizer, suprimimos o parágrafo que - diziam - iria criar um regime especial para os militares e retomamos o inciso X , §§ 4º, 5º e 6º.

Teríamos um problema material para resolver, levantado pelo Senador Hugo Napoleão, quando da votação do destaque: o atual art. 40 tem apenas 6 parágrafos, enquanto o art. 40 proposto e aprovado pelo Plenário do Senado tem 11 parágrafos.

Mesmo assim, entendemos que era importante aprovar esse destaque, já que haveria duas alternativas: a primeira delas seria permanecer o § 10 do art. 42, fazendo referência aos §§ 4º e 5º do art. 40, já que o § 6º tratava dos professores. Não fazia sentido fazer referência a ele, haja vista que os professores nada têm a ver com os militares. Essa era a interpretação que considerávamos a mais correta, motivo pelo qual levantamos uma questão à Mesa na sessão da última quinta-feira.

A segunda alternativa, a que acabou sendo acolhida pela redação final, fez referência aos §§ 1º, 8º e 9º do art. 40, que regeriam os militares com relação à Previdência Social.

Fizemos uma análise no sentido de saber se valeria à pena ou não levantar uma questão de ordem à Mesa invocando erro material, a fim de que viesse a ser decidida essa remissão. No entanto, chegamos à conclusão de que, como não era possível retomar a integralidade da emenda apresentada no primeiro turno, ou seja, os militares obedecerem aos §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 8º e 9º, deveríamos aceitar a redação proposta pelo Senado, a qual faz referência aos §§ 1º, 8º e 9º, por alguns motivos.

O § 1º do art. 40 da proposta aprovada pelo Senado faz referência à contribuição dos militares e civis. Na medida em que essa parte da contribuição também vai viger sobre os militares, isso, por si só, vai forçar uma rediscussão do Estatuto dos Militares, particularmente no que diz respeito à contribuição deles para a Previdência Social. O caput do art. 40, embora não esteja diretamente relacionado aos militares,- diz o seguinte:

      Art. 40 - Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado o regime de previdência de caráter contributivo, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

Já que passa a valer para os civis e, por extensão, para os militares o princípio de que é necessário garantir o equilíbrio financeiro e atuarial, não tenho a mínima dúvida de que o Congresso Nacional vai ter de rever o processo de contribuição e benefícios de militares para acabar, por exemplo, com o fato de os militares, ao passarem para a reserva, serem promovidos - na prática, eles têm um aumento salarial quando se aposentam; vai ter de acabar com as pensões para filhas solteiras de militares e, também, vai ter de rever a contribuição deles para a Previdência Social; caso contrário, o dispositivo não vai estar de acordo com o princípio de manter o equilíbrio financeiro e atuarial.

O § 8º, que trata do benefício da pensão, faz referência ao disposto no § 4º. E o que diz o § 4º? Estabelece o redutor para aposentadoria. E aí, embora não esteja explicitado que os militares vão obedecer ao § 4º, a pensão vai obedecer ao § 8º, que faz referência ao § 4º.

E aqui gostaria de ressaltar a questão do redutor. Temos recebido muitas reclamações de militares, alegando que não poderiam ter um regime igual de aposentadoria, visto que os seus salários estão defasados e há uma situação de penúria na caserna.

Concordamos plenamente com essas afirmações; todavia, entendemos que não se deve discutir essa questão com subterfúgios ou encontrando uma forma marginal, qual seja: resolver o problema dos salários dos militares, discutindo a questão previdenciária. Creio que não é por aí que vamos resolver o problema.

Estamos abertos a discutir a reestruturação salarial para a carreira militar. Concordamos plenamente que os salários estão absurdamente defasados, não só para os militares, mas também para os civis, que estão completando mais de mil dias sem reajuste. Mas, especificamente em relação à carreira militar, há agravantes.

Vamos, então, ter a coragem de discutir salário para os militares, mas não vamos nos aproveitar dessa defasagem salarial para colocar penduricalhos na Previdência e na aposentadoria. Se queremos discutir salários de militares, vamos discutir. Estamos abertos a isso, mas não podemos nos utilizar do subterfúgio de que o salário está baixo para justificar um regime diferenciado de aposentadoria.

O motivo principal que nos fez concordar em manter o que foi aprovado e não apresentar qualquer recurso com relação à redação feita pelo Senado foi a existência de um parágrafo que, a meu ver, terá aplicação imediata a partir da promulgação da lei e servirá para atacar alguns privilégios que nem estão diretamente relacionados com os militares, mas com vários coronéis da Polícia Militar de vários Estados do Brasil que, por uma série de piques, repiques e artifícios, conseguiram se aposentar com R$20 mil, R$25 mil. Alguns governadores resolveram tomar a iniciativa de cortar esses benefícios, mas foram impedidos. Cito como exemplo o que ocorreu no Espírito Santo, onde um coronel de Polícia recebia aposentadoria de R$35 mil e o Governador Vitor Buaiz resolveu cortar essa aposentadoria e pagar apenas o teto do Estado. O cidadão recorreu à Justiça invocando direito adquirido e ganhou a causa.

A partir do destaque aprovado no Senado, a aposentadoria dos militares deve observar o disposto no art. 37, inciso XI, que é o teto. Penso que é muito importante essa decisão que o Senado tomou, pois logo a partir da promulgação dessa emenda, os Governadores que tiverem coragem poderão reduzir o valor absurdo das aposentadorias dos coronéis das polícias militares. Feito isso, eles não terão como invocar direito adquirido, porque a Constituição diz que tem de ser respeitado o teto, e, segundo a interpretação de vários juristas, não há como invocar direito adquirido contra a Constituição.

Considero importantíssimo esse aspecto da decisão do Senado, que terá efeito imediato: acabar com privilégios que existem. Nos caso das aposentadorias, como já disse, os privilégios não são dos militares propriamente, mas de policiais militares de vários Estados.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não há a mínima razão para essa histeria. O Senado tomou essa decisão, mas a Câmara pode recolocar a discussão em novas bases, levando em consideração as especificidades da carreira militar, porque, volto a dizer, e isso está dito na emenda que apresentamos, nunca houve qualquer intenção absurda de igualar os militares aos civis, porque as especificidades da carreira militar são óbvias. Mas, como já disse, tais especificidades não podem ser utilizadas como argumento para que eles tenham um regime especial de previdência. Pelo menos as regras gerais não podem ser diferentes das estabelecidas para os demais servidores civis. Eles vão ter de contribuir como os civis e não poderão, da mesma forma que os civis, receber, na aposentadoria, proventos que excedam os salários da ativa. Na minha opinião, também vão ter redutor ou teto, se for o caso. As diferenças relacionadas ao seu tipo de atividade - idade mínima, tempo de contribuição, etc. - estão contempladas na lei própria, que já existe, que é o Estatuto dos Militares. Como eu já disse, o texto aprovado no Senado, na Câmara dos Deputados, terá de ser adaptado porque senão o Estatuto dos Militares estará ferindo, na minha opinião, a Constituição, se ele for mantido com o texto que foi aprovado no Senado.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero aproveitar este momento, quando já passou o clima passional das disputas dos destaques, para mostrar que o Senado deu um grande passo, embora não tenha aprovado o projeto que defendíamos. Volto a confirmar o que eu já havia dito: vou reapresentar a Emenda de Regime Único de Previdência Social, mesmo que ela fique engavetada um certo tempo.

Tenho certeza de que daqui a três ou quatro anos a previdência social será novamente debatida no Brasil. Como nessa época ainda devo estar nesta Casa, terei, mais uma vez, oportunidade de discutir essa emenda de reforma da Previdência que, volto a dizer, acaba com todos os privilégios, com todos os tratamentos não-igualitários, e aponta, inclusive, para maior democratização da Previdência Social. Hoje categorias de grande peso, como a dos servidores públicos, a dos militares e a dos juízes, que têm influência na formação da opinião pública pouco se importam com o que acontece ao INSS, pois lá estão só os trabalhadores da iniciativa privada, os que ganham salário mínimo. Então, para tais categorias tanto faz se esse regime terá viabilidade atuarial ou não, se há sonegação ou não. Esses setores acabam sempre obtendo recursos da União para cobrir suas aposentadorias, por isso não estão preocupados com o impedimento da sonegação ou com o fato de que recursos da Previdência Social venham a ser aplicados em outras áreas. Penso que vamos contribuir para fortalecer a discussão sobre privilégios, que é importante, mas, como fiz questão de registrar - e até como justificativa para meu voto contra -, o simples fato de um projeto acabar com alguns privilégios não significa que seja justo. O correto seria retirar os privilégios e utilizar essa parcela para fazer com que pessoas que recebem salários menores ascendam um pouco ou, ao menos, que haja a integração daqueles que não estão integrados. Não o conseguimos, mas ainda penso que esse é o caminho natural que o Brasil irá percorrer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/10/1997 - Página 21948