Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DAS EMPRESAS DE FACTORING QUE EXERCEM ATIVIDADES DE MERCADO NO PAIS. LEMBRANDO QUE AS EMPRESAS DE FACTORING COMEÇARAM NA INGLATERRA E HOJE ESTÃO EM 50 PAISES E NO BRASIL, MOVIMENTANDO CERCA DE 1,5 MILHÃO DE DOLARES MENSAIS. APOIANDO PROJETO DO SENADOR JOSE FOGAÇA SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DAS EMPRESAS DE FACTORING.

Autor
Bello Parga (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Luís Carlos Bello Parga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DAS EMPRESAS DE FACTORING QUE EXERCEM ATIVIDADES DE MERCADO NO PAIS. LEMBRANDO QUE AS EMPRESAS DE FACTORING COMEÇARAM NA INGLATERRA E HOJE ESTÃO EM 50 PAISES E NO BRASIL, MOVIMENTANDO CERCA DE 1,5 MILHÃO DE DOLARES MENSAIS. APOIANDO PROJETO DO SENADOR JOSE FOGAÇA SOBRE A REGULAMENTAÇÃO DAS EMPRESAS DE FACTORING.
Publicação
Publicação no DSF de 29/10/1997 - Página 23113
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • DEFESA, ATIVIDADE, EMPRESA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, OPERAÇÃO MERCANTIL, ATENDIMENTO, PEQUENA EMPRESA, MEDIA EMPRESA.
  • NECESSIDADE, REGULAMENTAÇÃO, OPERAÇÃO MERCANTIL, PREVENÇÃO, FRAUDE, MERCADO FINANCEIRO, APOIO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, JOSE FOGAÇA, SENADOR, TRAMITAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA.

O SR. BELLO PARGA (PFL-MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tecerei algumas considerações acerca de importante atividade econômica, de grande utilidade social, sobre a qual, no entanto, incide ainda certa polêmica. Refiro-me ao factoring, essa moderna modalidade de transação que, embora possuidora de bases sólidas em nosso sistema legal, ainda desperta determinadas dúvidas e equívocos, situação que precisa ser superada por uma regulamentação legal mais incisiva e específica.

O factoring é uma atividade empresarial especializada, constituindo-se numa empresa que compra de outras os créditos que possuem como resultado das vendas de seus produtos e serviços. É, pois, uma atividade de reposição de capital. O fabricante - ou a loja - de posse das faturas que, por intermédio das duplicatas por ela emitidas, se transformariam em dinheiro somente dentro de certo prazo, pode capitalizar-se de imediato, vendendo esses créditos à empresa de factoring. Esta, detentora de conhecimentos técnicos de gestão de vendas e riscos, adquire esses créditos da empresa-cliente e, além disso, dá-lhe assessoria na condução de seus negócios.

Como se configura aí um adiantamento de recursos, há uma tendência de ver no factoring uma modalidade de financiamento. Essa é uma visão equivocada. À medida que se ganha experiência com a prática do factoring e à medida que se conhece como é praticado o factoring internacionalmente, vai-se clareando a compreensão da especificidade dessa atividade e vai-se desfazendo o equívoco de vê-la como atividade financeira.

Na verdade, o factoring não é atividade financeira, mas atividade mercantil, e essa definição faz muita diferença do ponto de vista jurídico, comercial e econômico. Essa diferenciação é importante, tanto que a tendência inicial era traduzir factoring como "faturização", o que enfatizava o aspecto da cessão de créditos; agora, mais e mais, traduz-se factoring como "fomento mercantil". É a expressão adequada para o nosso universo comercial. As empresas de factoring são sociedades de fomento mercantil. 

Há algumas diferenças decisivas entre factoring e financiamento, ou empréstimo, ou desconto bancário. O factoring funciona como uma ação continuada, regida por um contrato entre a empresa de factoring e a empresa-cliente, que é geralmente pequena ou média. Essa empresa, ao contrário do banco ou da financeira, não capta dinheiro público, não efetua intermediação financeira, opera com recursos próprios. A empresa de factoring, isto é, a verdadeira só tem negócios com pessoas jurídicas, não compra títulos de pessoas físicas.

E, finalmente, a empresa de factoring é não somente uma compradora de créditos, mas uma prestadora de serviços a sua empresa-cliente. Efetivamente, no factoring, a compra de créditos, até mesmo para que sejam reduzidos os riscos, tem de ser combinada com uma assessoria à empresa-cliente nas questões de contabilidade, informações comerciais e modernização da gestão em geral.

Essa combinação de atividade de reposição de capital com a atividade de assessoramento tem raízes na própria origem histórica da atividade do factoring, que começou quando representantes comerciais ingleses nas colônias americanas - vejam bem, Srs. Senadores, o quanto é remoto o passado dessa atividade - prestavam às manufaturas da metrópole informações sobre o mercado consumidor e sobre a solvabilidade dos compradores, atividade essencial de cadastro. Logo passaram os representantes a ampliar sua atividade, fazendo adiantamentos por conta dos negócios e mesmo garantindo-os. Com o tempo, firmou-se a combinação de assessoramento com a compra de créditos, nascendo daí o factoring.

Hoje, o factoring é praticado em 50 países, na sua forma bem específica, bem particular. No Brasil, são cerca de 700 empresas que têm como clientes cerca de 50 mil empresas outras, geralmente pequenas e médias. O factoring movimenta cerca de R$1,5 bilhão por mês, movimento que se origina em 85% dos setores de indústrias e de serviços e apenas em 15% do setor de comércio.

A necessidade de bem definir a atividade de factoring sempre esteve em pauta. Tanto que na Convenção Diplomática de Ottawa, em 1968, o Instituto Internacional pela Unificação do Direito Privado determinou que só existe factoring quando se concretiza a combinação de pelo menos dois dos seguintes serviços: gestão de crédito, administração de contas a receber e a pagar, cobrança, proteção contra riscos de crédito e fornecimento de recursos financeiros.

As incertezas com relação à atividade de factoring ocorrem não apenas aos leigos, mas às próprias autoridades que têm a atribuição legal de regulamentá-la. Por muito tempo, o Banco Central e a Receita Federal relutaram em reconhecer que o factoring não é atividade do mercado financeiro e, sim, atividade mercantil. Hoje, finalmente, o reconhecem. Acontece com o factoring, por ser forma de transação nova e moderna, o que já aconteceu antes com o leasing, o arrendamento mercantil. O leasing, uma técnica de venda, combina características de aluguel e venda, aparentando às vezes ser operação de financiamento. Hoje, no entanto, já se reconhece a especificidade mercantil do leasing.

Assim, também o factoring já vai sendo melhor entendido nas suas características de atividade de fomento mercantil. Vale lembrar, a propósito, as bases legais do factoring. Antes de mais nada, o factoring se firma sobre o Código Comercial, nos seus arts. 191 a 220, que tratam de vendas mercantis. Subsidiariamente, tem base no Código Civil, em seus arts. 1.065 a 1.078, que versam sobre cessão de crédito, e 1.216, que trata da prestação de serviços. No nível de lei, o factoring é coberto pela Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995 - edição recente, portanto - em seu art. 15, § 1º, inciso III, alínea d, bem como pela Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, em seu art. 58. A primeira delas substituiu, ou ratificou, o que já afirmava o art. 28 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995. Operacionalmente, o factoring é regido pela Resolução do Conselho Monetário Nacional nº 2.144, de 22 de fevereiro de 1995, e pela Circular do Banco Central nº 2.715, de 28 de agosto de 1996.

A atuação das empresas de factoring é orientada pela Anfac - Associação Nacional de Factoring - e pela Febrafac - Federação Brasileira de Factoring -, entidades que estabelecem padrões éticos de comportamento para as afiliadas e recomenda um modelo de contrato de fomento mercantil a ser firmado com a empresa-cliente.

No entanto, Sr. Presidente e Srs. Senadores, ainda falta à atividade de factoring uma regulamentação legal mais específica, mais precisa, que, com mais nitidez, delimite e estabeleça os parâmetros de sua atuação no mercado. Prova disso é que, periodicamente, o campo de atuação das legítimas empresas de factoring é invadido por agentes de frágil capacitação técnica e duvidosa honestidade, duvidosa idoneidade.

Foi assim que, com o Plano Real, muitas pessoas passaram a oferecer serviços de compra dos cheques pré-datados que inundaram o mercado, cobrando taxas extorsivas e apresentando-se como empresas de factoring, o que não eram e nem poderiam ser. O amadorismo, a ganância e a inadimplência consectária têm quebrado grande número dessas falsas empresas de factoring. A maioria delas sobrevive poucos meses, essa é a verdade. Como saldo, fica manchada a imagem do factoring em nosso País.

Outra agressão sofrida pelo factoring verificou-se por ocasião dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito dos Títulos Públicos de Precatórios, quando se constatou que várias das empresas que operavam fraudulentamente - e estavam envolvidas na negociação daqueles títulos - ostentavam a placa de empresas de factoring, que não tem nada a ver com a real acepção do termo.

Recentemente, o factoring esteve novamente no noticiário, quando a imprensa revelou que boa parte do financiamento de automóveis está sendo feita com a cobertura de falsos contratos de factoring, que simulam um negócio entre uma casa bancária e o vendedor de automóveis; na verdade, financiam a pessoa física compradora do carro. Tudo isso, para caracterizar atividade mercantil a fim de desfrutar da isenção de Imposto sobre Operações Financeiras. É uma contrafação que tem de acabar; por isso, esperamos a ação enérgica e firme do Banco Central.

Ora, factoring não é comprar cheque pré-datado, não é financiar pessoa física. Esses e outros desvirtuamentos da atividade de factoring precisam ser combatidos. Factoring é atividade de fomento mercantil, que eleva o padrão de gestão da empresa-cliente, ajuda-a a ter sucesso, dá a ela liquidez, beneficiando capilarmente toda a economia, já que atinge uma multidão de pequenas e médias empresas. Essas empresas precisam desse apoio, não só para reposição de capital de giro, mas também para melhor administrar suas contas a receber e a pagar, seus estoques, seu relacionamento com fornecedores e compradores.

Por tudo isso, é evidente, claríssimo mesmo, que o setor de factoring está a exigir uma regulamentação definitiva. O Poder Executivo deveria fazer algo nesse sentido, em caráter de urgência. Quanto a uma legislação mais permanente, é preciso lembrar que o Senado já deu o primeiro passo: o ilustre Senador José Fogaça apresentou um excelente projeto de lei sobre a questão, que já foi aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos e hoje está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Tal projeto define muito bem o factoring como atividade de fomento mercantil, que deve incluir um contrato de fomento mercantil, nesse previsto, além de aquisição de créditos, a prestação contínua de serviços de assessoria à empresa-cliente. O projeto de lei diferencia muito bem a atividade mercantil da atividade financeira, vedando à empresa de factoring captar recursos junto ao público - o que as autênticas empresas de factoring nunca fizeram nem fazem. Um aspecto importante da proposição é a criação de um Conselho Federal de Fomento Mercantil com poderes para disciplinar as atividades relacionadas com o factoring.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o factoring legítimo é atividade de grande utilidade econômica. As empresas que o praticam fazem-no assumindo os riscos empresariais naturais da atividade. Como não são empresas do setor financeiro, e portanto não captam dinheiro do público, não destroem a poupança popular, no caso de um insucesso empresarial, como ocorreu com alguns bancos - e ainda pode ocorrer -, não houvesse já aquela rede de segurança que é o Proer.

As empresas de factoring podem atuar sem a necessidade de eventual intervenção saneadora por parte do Banco Central, operação sempre onerosa para os cofres públicos. O que se faz necessário, com urgência, é a regulamentação definitiva da atividade, para que dela sejam eliminados os desonestos, os incompetentes e os que se apresentam falsamente como empresas de factoring.

Se isso ocorrer, Sr. Presidente, estará assim bem servido o País, pois poderá prosperar essa modalidade útil e moderna de transação econômica que só benefícios traz à cadeia produtiva e à circulação de mercadorias no mercado brasileiro.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/10/1997 - Página 23113