Discurso no Senado Federal

DESMANDOS DO GOVERNADOR DO PARA EM EXERCICIO, DR. HELIO GUEIROS JUNIOR, EM VIRTUDE DO AFASTAMENTO DO TITULAR, DR. ALMIR GABRIEL, POR MOTIVO DE DOENÇA.

Autor
Coutinho Jorge (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando Coutinho Jorge
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO ESTADUAL.:
  • DESMANDOS DO GOVERNADOR DO PARA EM EXERCICIO, DR. HELIO GUEIROS JUNIOR, EM VIRTUDE DO AFASTAMENTO DO TITULAR, DR. ALMIR GABRIEL, POR MOTIVO DE DOENÇA.
Publicação
Publicação no DSF de 28/10/1997 - Página 22948
Assunto
Outros > ESTADO DO PARA (PA), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, HELIO GUEIROS JUNIOR, GOVERNADOR, INTERINO, ESTADO DO PARA (PA), PERIODO, AFASTAMENTO, ALMIR GABRIEL, TITULAR, MOTIVO, DOENÇA.
  • COMENTARIO, UNANIMIDADE, IMPRENSA, POLITICO, PAIS, REPUDIO, ATO, VICE-GOVERNADOR, ESTADO DE RORAIMA (RR), EXONERAÇÃO, SECRETARIO DE ESTADO, PRESIDENTE, BANCO ESTADUAL, ROMPIMENTO, ACORDO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD).
  • REGISTRO, MOVIMENTAÇÃO, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO PARA (PA), APROVAÇÃO, ALTERAÇÃO, CONSTITUIÇÃO ESTADUAL, GARANTIA, MANUTENÇÃO, EXERCICIO, FUNÇÃO, GOVERNADOR, OPORTUNIDADE, AFASTAMENTO, CURTO PRAZO, DESNECESSIDADE, TRANSFERENCIA, PODER, VICE-GOVERNADOR.

      O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, lamentavelmente o Pará ocupa, mais uma vez, espaço privilegiado da mídia nacional, expondo para o País inteiro as incoerências e mazelas de sua política interna. Desta vez, a notícia não foi causada por problemas agrários, climáticos ou financeiros e, sim, pelo próprio gestor interino na administração do Estado.

      Quero lembrar que, na penúltima sexta-feira do mês, o Governador Almir Gabriel foi acometido de um aneurisma na aorta do estômago e obrigado a se deslocar de Belém até o Incor, em São Paulo, sendo submetido a uma intervenção cirúrgica pela equipe do Dr. Adib Jatene. Neste período em que ele, evidentemente, se restabelece desse grave problema de ordem física, assume o Governo, atendendo à disposição da Constituição do Estado do Pará, o Vice-Governador.

      No período em que o Governador Almir Gabriel está absolutamente impedido de tomar alguma decisão, de reagir a algum equívoco ou ato cometido pelo Vice-Governador, passa este, então, a tomar uma série de decisões, lembrando, entre outras, a exoneração de cinco Secretários de Estado mais importantes da administração pública, dois titulares da administração indireta, assessores do Governador e diretoria de estatais; rompimento de acordos com a Vale do Rio Doce, suspendendo por decreto uma série de incentivos que há muito vinham sendo concedidos pela então Vale estatal; exoneração ilegal do Presidente do Banco do Estado do Pará, entre outros atos que podem ser citados e já são conhecidos pela imprensa nacional. E tudo isso causando, é claro, um caos administrativo do Estado, enquanto o Governador, impedido de qualquer reação, está internado no Incor, em São Paulo. Causou realmente celeuma, assombro nacional, como mostra a mídia, em vários programas, desde a sexta-feira anterior.

      Na verdade, o que está ocorrendo? Qual é o papel do vice? O vice, no nosso entender, tem que assumir a direção do Estado durante, é claro, impedimento temporário do Governador, dando continuidade à administração. Isso deve ser feito de forma que não haja solução de continuidade nos negócios do Estado e que a população não seja surpreendida ou prejudicada por atos casuísticos, inconseqüentes ou intempestivos.

      Na verdade, o vice-governador, vice-prefeito ou vice-Presidente da República substitui o titular, mas não o sucede, salvo caso de sucessão definitiva - como foi o caso, por exemplo, do Sarney, que substituiu o Tancredo Neves por morte, e Itamar Franco, que substituiu Collor por impeachment. No nosso caso, é uma mera substituição por motivo superior, de doença grave. O vice não deve, portanto, cometer atos radicais que possam mudar a direção do Governo em curto espaço de tempo. O bem comum e o interesse público devem vir em primeiro lugar, mesmo que não exista afinidade política entre governador e o vice-governador, isso é lógico, sobretudo nas circunstâncias a que me refiro. O vice não deve usar o cargo que ocupa temporariamente, por alguns dias, para retaliações e demonstrações de poder. Todos sabem que o poder é inerente ao cargo, não é preciso demonstrá-lo com medidas descabidas, incoerentes, ilegais, com bravatas irresponsáveis.

      O melhor exemplo de vice que podemos citar é o do nosso Vice-Presidente, Marco Maciel. O Presidente Fernando Henrique Cardoso viaja para o exterior, mas continua na vida nacional. O vice ocupa cargos sem causar traumas ou danos: sanciona leis, assina decretos, permite que a administração flua sem percalços, porque a substituição é transitória, de curto prazo.

      Não queremos dizer que a figura do vice seja meramente decorativa, pois, ao contrário, cabe a ele uma responsabilidade e uma ética incomensuráveis. Substituir o titular com dignidade, sem pretender angariar benefícios próprios ou para grupos, envolve um desprendimento que nem todos possuem. Claro que não é fácil tal papel.

      Agora tudo isso fica mais claro com o caso do Pará, mas pode acontecer em qualquer Estado do Brasil. Infelizmente, nosso Governador está muito distanciado do papel que acabamos de descrever.

      O caso mais gritante da exoneração cometida por esse Vice-Governador foi a exoneração do Presidente do banco do Estado, uma sociedade de economia mista que está obrigada a obedecer a critérios legais, a rituais próprios para substituição de um Presidente. É necessário convocar, por edital, os acionistas com oito dias de antecedência e submeter o novo nome ao Banco Central. Todavia, o Vice-Governador não fez nada disso. Simplesmente baixou um decreto, exonerando o Presidente do banco e nomeou um qualquer do banco para substituí-lo. O Banco Central não aceitou a decisão do Vice-Governador e considerou que o Presidente era aquele anterior, aprovado por assembléia geral.

      Chegamos ao ponto incoerente de ter dois presidentes do banco do Estado. Creio que o Vice-Governador não ignora essas obrigações e atos legais que existem.

      O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Permite-me V.Exª um aparte?

      O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA) - Concedo a palavra, com muito prazer, ao Senador Jeffersom Péres.

      O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Senador Coutinho Jorge, imagino com que constrangimento V.Exª sobe à tribuna para abordar esses tristes acontecimentos em seu Estado. O que está acontecendo no Pará é um desatino, uma agressão ao mais elementar bom senso. É triste que isso possa acontecer em pleno estado de direito, em um País civilizado, como pretendemos que seja o Brasil. Mas isso nos leva a uma reflexão sobre a figura do Vice-Presidente. Já é tempo de pensarmos seriamente em modificarmos a Constituição para que o Vice-Presidente seja apenas um sucessor ou substituto em caso de licenças prolongadas. O simples afastamento do Governador ou do Presidente por alguns dias não deveria afastá-los do cargo, à semelhança do que ocorre com o Presidente dos Estados Unidos, que, mesmo no exterior, continua no pleno exercício de suas funções, não transferindo o poder para o seu vice. Creio que alguma medida de ordem institucional deve ser tomada para que casos lamentáveis como esse ocorrido no Estado do Pará não se repitam.

      O SR. COUTINHO JORGE (PSDB/PA) - Senador Jefferson Péres, quero lembrar também que, no particular, as Constituições estaduais divergem, são diferentes entre si quanto ao afastamento temporário do Governador e o ato de assunção do vice. No meu Estado, por exemplo, basta que o Governador se ausente do Estado que o vice assume automaticamente. No caso de São Paulo, não. Inclusive, o Governador Mário Covas, em visita ao Governado Almir Gabriel no Incor, disse que, no seu Estado, tinha quinze dias para poder se afastar, dentro do País, sem que o vice assumisse.

      A meu ver, há um erro de origem que deve ser corrigido. E é por isso que a Assembléia Legislativa, por intermédio de seus Deputados, preocupados com o caos administrativo e político do Estado, já iniciou a mudança da Constituição estadual. E o importante é que o Governador Almir Gabriel foi alertado de que deveria mudar. Talvez o Pará seja o único caso em que se exija a substituição imediata do Governador pelo vice. Já o Governador, por um princípio ético, disse que não iria fazer isso, uma vez que poderia parecer que estaria tentando retalhar o seu vice. Decidiu manter assim porque acreditava na seriedade do seu vice. Embora tenha a maioria absoluta da Assembléia, e pudesse ter feito isso há muito tempo, não o fez por princípio ético, porque, realmente, era um coligado. Unido a outroa partido, foi eleito governador.

      Portanto, hoje, a Assembléia está realmente rebelada, consciente de que tem de mudar a Constituição. A Constituição do Estado do Pará está sendo mudada neste sentido. Já houve a votação em primeiro turno - praticamente, unânime - e vai haver a votação em segundo turno, já que emenda constitucional estadual precisa ser votada em dois turnos.

      Temos certeza de que o Vice-Governador não ignora todos esses fatos éticos, legais, como também não ignora que todos os atos de exoneração, nomeação, rompimento de acordo não terão efeito algum a médio prazo. Na prática, todos poderão ter o seu efeito alterado, após o retorno do Governador, que corrigirá os erros cometidos pelo Vice-Governador.

      As atitudes tomadas podem dar uma satisfação para o ego do Vice-Governador, mas trazem conseqüências danosas para o Estado, não temos dúvida alguma. Além da repercussão negativa na imprensa nacional, a Administração fica engessada, impedida de fazer com que decisões importantes sejam tomadas no Estado.

      O nosso Governador Almir Gabriel tem um projeto de governo. Até o final do seu mandato, não pode sofrer solução de continuidade, paralisações ou adiamentos, sob pena de prejudicar o Estado. S. Exª recebeu o Estado com dificuldades gravíssimas. Em dois anos, conseguiu restabelecer a seriedade, a ética da Administração Pública paraense. S. Exª realiza um programa importante de implantação da infra-estrutura econômica e social no Estado e, sobretudo, monta um programa realmente audacioso de mudança da base produtiva do meu Estado. Realiza, portanto, obra importante que mudará o curso do desenvolvimento do Pará.

      O Pará, hoje, é um grande canteiro de obras. Quem chega a Belém, vê programas importantes que estavam engavetados, como o Programa de Recuperação das Baixadas de Belém, que, ainda como prefeito, negociei com o BID. Hoje, o Governador Almir Gabriel o implanta e vai beneficiar mais de 500 mil pessoas, para dar um exemplo do trabalho sério que S. Exª desenvolve.

      Portanto, tudo está cronometrado, dentro de uma programação, de um planejamento que não pode sofrer paralisações ou atitudes irresponsáveis como as que estão ocorrendo.

      Dessa forma, nossa Assembléia Legislativa, seus Deputados, conscientes de seu papel, estão realmente alterando a Constituição, tomando uma série de medidas cabíveis.

      Existe, na verdade, uma unanimidade na imprensa nacional, no meio político estadual e nacional de repudiar os atos do Governador. O Presidente do Congresso Nacional, Senador Antonio Carlos Magalhães, achou um absurdo o que estava sendo feito, sobretudo na situação em que o Governador estava: no hospital, no Incor, impedido de qualquer reação, nem conhecimento podia tomar, pois podia prejudicá-lo gravemente. Esse é até um ato desleal e antiético, que chegou a ser motivo de chacota nacional. Eu estava em São Paulo e verifiquei que os jornalistas, a imprensa em geral, referiam-se a esses atos que estavam ocorrendo no Pará. Todos os jornais nacionais publicaram páginas inteiras de avaliação e de críticas. O jornal O Estado de S.Paulo, como vários outros, publicou edital muito duro, em que ridiculariza e questiona esse ato do Vice-Governador. Com o título: "Caso para Camisa de Força", o articulista sintetiza a sua posição. Vários jornais têm demostrado que a imprensa tem cumprido o seu papel de vigiar, de fiscalizar o Poder Público, os políticos. A imprensa tem colocado o dedo nas feridas e denunciado os equívocos cometidos por políticos irresponsáveis que não honram o mandato que receberam.

      O apoio que o Dr. Almir Gabriel vem recebendo é também uma demonstração de que a sociedade brasileira não aceita mais atos de autoritarismo exacerbado, de oportunismo extemporâneo, incoerência administrativa, atitudes antiéticas, bravatas inconseqüentes e irresponsáveis como as que têm ocorrido em meu Estado.

      O povo paraense merece respeito. O povo paraense está constrangido com toda essa celeuma provocada por um Vice que quer usar o cargo para vinganças pessoais.

      Na verdade, não é outra a explicação.

      Temos certeza de que o retorno do Dr. Almir Gabriel, que deverá ocorrer na próxima terça-feira, colocará um ponto final nessa situação. Mas a lição ficará para sempre, e os prejuízos políticos dificilmente serão recuperados. As alianças e acordos que o Governador pretendia para o bem do Estado talvez estejam irremediavelmente comprometidas, não sejam realizadas, gerando perdas irreparáveis.

      Sr. Presidente, a política, por ser uma arte, uma ciência e uma técnica do processo de tomar decisão em uma sociedade, precisa de princípios éticos, legais racionais e lógicos. O homem público é o agente mais importante do processo político, é responsável por impactos positivos e negativos à sociedade.

      O vice, seja ele de presidente, governador ou prefeito, tem tanto compromisso quanto o seu titular em relação à sociedade, a qual tem obrigação de servir com dignidade. Na verdade, o homem público deve sempre utilizar o bom-senso como arma na sua postura e maneira de ser. Sobretudo, deve trabalhar pelo bem-esta da população a quem tem o privilégio de servir.

      As primeiras palavras pronunciadas ontem pelo Senador Almir Gabriel, em entrevista dada no Incor aos jornalistas após sua cirurgia, foram: "Comigo estarão voltando a paz, o trabalho e a segurança para conduzir o meu Estado".

      Temos certeza de que isso continuará a ocorrer, porquanto S. Exª tem sempre feito o que prometeu ao nosso povo

      O Governador vai levar a paz, o trabalho, a capacidade e a segurança para o povo do Pará. Ele assim o disse, assim tem feito e assim o fará.

      Que isso tudo sirva de exemplo para que todos nós, políticos e sociedade que elege os homens públicos, reflitamos melhor na importância da política, na importância do homem público! Mas que também sejamos inflexíveis para com aqueles que não sabem honrar sua missão do homem público, que é de servir à comunidade, dando de si o melhor, de forma coerente, responsável e até idealista. Esse é o papel do político.

      O que ocorreu no Pará é um exemplo daquilo que o homem público nunca deve fazer.

      Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/10/1997 - Página 22948