Discurso no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRAMITAÇÃO NO SENADO DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 8, DE 1995, QUE DA NOVA REDAÇÃO AO INCISO X DO PARAGRAFO 2 DO ARTIGO 155 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DA QUAL S.EXA. E O PRIMEIRO SIGNATARIO.

Autor
Geraldo Melo (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RN)
Nome completo: Geraldo José da Câmara Ferreira de Melo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRAMITAÇÃO NO SENADO DA PROPOSTA DE EMENDA A CONSTITUIÇÃO 8, DE 1995, QUE DA NOVA REDAÇÃO AO INCISO X DO PARAGRAFO 2 DO ARTIGO 155 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DA QUAL S.EXA. E O PRIMEIRO SIGNATARIO.
Aparteantes
Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 28/10/1997 - Página 22951
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • COMENTARIO, DEMORA, TRAMITAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, APRESENTAÇÃO, ORADOR, SOLICITAÇÃO, EXTINÇÃO, PROIBIÇÃO, INCIDENCIA, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), OPERAÇÃO, DESTINAÇÃO, PETROLEO, ENERGIA ELETRICA, ESTADOS.
  • ESCLARECIMENTOS, PENALIDADE, ESTADOS, PRODUTOR, PETROLEO, ENERGIA ELETRICA, PROIBIÇÃO, ARRECADAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), AUMENTO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, DESIGUALDADE REGIONAL.

      O SR. GERALDO MELO (PSDB-RN. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Senador Jefferson Péres, Srªs e Srs. Senadores, vim a esta tribuna no dia de hoje para fazer um apelo a esta Casa. Peço-lhe identificar-se com a importância para o meu Estado e para muitos outros que se encontram em situação semelhante da apreciação de uma Emenda Constitucional cuja iniciativa de apresentação foi minha mas que foi apresentada tendo eu a honra da companhia dos seguintes eminentes Srs. Senadores que a subscreveram: Senadores Fernando Bezerra, José Agripino, José Ignácio, Osmar Dias, Bernardo Cabral, Carlos Wilson, Pedro Simon, Antonio Carlos Magalhães, Beni Veras, Antonio Carlos Valadares, Ronaldo Cunha Lima, Josaphat Marinho, Lúcio Alcântara, José Fogaça, Roberto Requião, Joel de Hollanda, Roberto Freire, Gilberto Miranda, Waldeck Ornelas, Lucídio Portella, Freitas Neto, Casildo Maldaner, Mauro Miranda, Coutinho Jorge, Carlos Patrocínio, Leomar Quintanilha, Esperidião Amin.

      Apresentei ao Senado Federal essa proposta de emenda à Constituição no dia 13 de março de 1995.

      Tomei posse como Senador da República no dia 1º de fevereiro, passando a participar de uma sessão legislativa que se iniciou a 15 de fevereiro. Na realidade, menos de 30 dias depois de iniciado meu mandato, apresentei a proposta a que venho referir-me.

      Ela foi lida no dia 13; despachada à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania no dia 14; distribuída ao Senador Esperidião Amin naquela Comissão, como Relator, no dia 21 de março; foi feita juntada ao processado, por sugestão do Senador Roberto Requião oferecida em plenário, no dia 21 de junho de 1995, a proposta foi devolvida pelo Relator com parecer favorável; no dia 26 de setembro, sem que tenha sido apreciada, foi retirada de pauta para reexame pelo Relator Esperidião Amin; e, enfim, no dia 23 da maio de 1997, devolvida pelo Relator à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, encontrando-se em condições de ser apreciada.

      Não posso dizer que haja da parte de nenhum dos Srs. Senadores qualquer tipo de má vontade, pois a única manifestação formal que existe em relação a esse assunto é a do Relator, Senador Esperidião Amin, no seu primeiro relatório. Depois, S. Exª o retirou para reexame e deu parecer favorável à emenda.

      Apesar disso e da extrema boa vontade com que o Presidente da CCJC, Senador Bernardo Cabral, tem lidado com o assunto, gerenciando uma pauta enorme em cada uma das reuniões da Comissão, o fato é que estamos no final de outubro de 1997, a caminho do terceiro ano após a apresentação da PEC ao Senado Federal, sem que haja nenhuma decisão.

      Essa proposta, na realidade, interessa a todos os Estados brasileiros produtores de petróleo - como o Rio Grande do Norte, que tenho a honra de representar, e o Paraná, representado com tanta competência pelos seus três Senadores, um deles aqui presente, o Senador Roberto Requião -, bem como aos Estados produtores de energia elétrica para consumo fora do seu território.

      O que há em relação a esse assunto? Permito-me narrar ao Senado, em primeiro lugar, uma pequena história. Quando o arcabouço tributário incorporado à Constituição de 1988 estava sendo discutido eu era Governador de Estado. Como muitos Governadores, principalmente de Estados pequenos, defendia, naquela fase, a instituição de um imposto, qualquer que fosse seu nome, a ser cobrado na ponta do consumo, diferentemente dos chamados impostos sobre valor agregado, que vão sendo cobrados na cadeia produtiva, etapa por etapa, à semelhança do ICMS.

      Nossa opinião, entretanto, que era a da maioria dos chamados Estados periféricos, não prevaleceu. Valeu muito o conjunto de ponderações que fazia, naquela oportunidade, o Estado de São Paulo, no sentido de que, como grande abastecedor do mercado brasileiro e exportador de produtos para outros Estados, teria uma perda tributária extremamente importante. Por isso, os Governos Estaduais e os representantes dos demais Estados no Congresso Nacional preferiram abrir mão de sua tese de instituição de impostos de consumo e aceitar a concepção, que terminou prevalecendo, do atual Imposto sobre Circulação de Mercadorias e de Serviços - ICMS. Essa foi a opção do Constituinte; essa é regra que se aplica a tudo, exceto a petróleo e energia elétrica.

      Defensor contumaz da criação de políticas especiais de incentivo quando haja prioridade da sociedade para isso; defensor persistente de políticas especiais de desenvolvimento regional capazes de contrabalançar desequilíbrios crônicos no processo de desenvolvimento do Brasil, não vim aqui para dizer que tenho qualquer tipo de repugnância ética, moral, intelectual ou técnica ao estabelecimento de exceções às regras gerais, quando elas tenham uma razão de ser. Na realidade, a Constituição abriu duas exceções à regra geral de cobrança do ICMS, e, havendo razões do interesse público que as justifiquem, não existiria motivo para que alguém se indignasse com isso. Entretanto, a grande questão é que, até o dia de hoje, absolutamente ninguém explicou ao País por que foram feitas essas exceções.

      Sobre isso, eu me permitiria ler parte do texto que acompanhou a proposta de emenda à Constituição, pois isso dispensaria um esforço de criação que seria feito neste momento. Eu dizia que a alínea b do inciso X do § 2º do art. 155 da Constituição Federal veda a incidência de ICMS "sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica".

      À primeira vista, poderia um consumidor desavisado dizer que estou aqui para criticar uma exceção tributária que acabaria por beneficiar o consumidor. Como todos sabem, isso não é verdade; o ICMS termina sendo um valor percentual constante - agora, existem alíquotas diferentes - cobrado sobre cada produto. Se se cobram 17% sobre o algodão que será remetido para as tecelagens, quando o tecido sai da tecelagem para a indústria de confecções, cobram-se 17% sobre o valor do tecido menos o valor que tenha sido pago sobre o algodão contido naquele tecido. De forma que, na camisa que se entrega ao consumidor no balcão, haverá um componente de 17% sempre. Não importa saber se a alíquota é de 17%, de 20% ou de 25%; não importa se esses 25% foram pagos apenas pelo comerciante que vendeu, porque cada pagamento ocorrido na cadeia produtiva foi descontado do seguinte.

      O que estou discutindo não é a alíquota do imposto, pois não pretendo que ela se altere, mas onde fica cada pedaço do imposto pago. Se num litro de gasolina existe determinado componente de ICMS que foi pago apenas pela refinaria e depois pelo posto de gasolina, o meu desejo era o de que esse mesmo valor contido no litro de gasolina tivesse sido pago também no meu Estado, que produziu o petróleo.

      Não há motivo, Sr. Presidente, para se ter criado a exceção de se cobrar ICMS de todas as matérias-primas, menos de petróleo ou de energia elétrica. O único efeito dessa norma constitucional é o de proibir o pagamento do ICMS no Estado onde os bens - petróleo e energia elétrica - são produzidos, antes que sejam remetidos para outros Estados, ou seja, o de criar uma exceção à regra geral que é o pagamento no local onde todas as operações se realizam. Isso em nada beneficia o usuário final dos produtos derivados de petróleo, de gás ou de energia elétrica.

      É ressabido que o ICMS é um imposto "não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação... com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal, conforme dispõe em seu § 2º, inciso I, o mesmo art. 155.”

      Vale dizer que o montante total do ICMS contido no preço final de qualquer produto não se alterará, independente de uma parte maior ou menor desse montante ter sido paga neste ou naquele Estado, nesta ou naquela etapa da cadeia de beneficiamento e de comercialização. Portanto, para o usuário, para o consumidor, o pagamento ou não do imposto ao produtor é indiferente.

      Já a partição entre os diversos Estados do valor total do ICMS pago se altera profundamente se existe ou se é eliminada essa exceção que a Constituição acolheu. Não há, portanto, interesse direto do consumidor, pois o componente tributário é o mesmo, mas há um profundo interesse por parte dos vários Estados em cujo território a cadeia produtiva se processa.

      Enquanto o consumo de petróleo e seus derivados e o de energia elétrica variam em razão direta do nível de renda (e, obviamente, do tamanho da população), a localização das jazidas de onde será extraído o petróleo ou o gás, assim como das quedas d'água, que são as grandes produtoras de energia elétrica no Brasil, não têm nada a ver com o nível de renda ou de desenvolvimento. Pelo contrário: pode ser, e freqüentemente é, em regiões distantes, de população rarefeita e baixo nível de renda.

      O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - V. Exª me permite um aparte?

      O SR. GERALDO MELO (PSDB-RN) - Com muito prazer, Senador Jefferson Péres.

      O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Senador Geraldo Melo, já por duas ou três vezes abordei V. Exª para perguntar sobre essa sua proposta de emenda constitucional, e a sua resposta era sempre a mesma: de que estaria parada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

      Eu lhe fiz essas indagações, Senador Geraldo Melo, porque o meu Estado é um dos produtores de petróleo e derivados do País - em Manaus existe a única refinaria da Região Norte - e com perspectiva a curto prazo de se tornar um grande exportador para outros Estados, porque vai produzir 40 mil barris de diários de petróleo refinado; e refinado no Estado. Portanto, vamos ser muito penalizados com essa isenção dada, não sei por que até hoje, pela Constituição Federal.

      Como V. Exª salientou muito bem, com a clareza habitual, não queremos que nossos Estados sejam privilegiados, os únicos a cobrar; queremos que participem também da receita desse imposto, porque produzimos o recurso.

      Parabéns pelo seu pronunciamento, e espero que realmente seja a sua proposta discutida por este Senado.

      O SR. GERALDO MELO (PSDB-RN) - Agradeço a V. Exª por um aparte dessa qualidade, partindo de um homem que tem autoridade não só moral e política mas a autoridade técnica de V. Exª nessa matéria.

      Na realidade, estamos acostumados a ver o punir-se, o criticar-se um Estado, principalmente nas regiões mais atrasadas do País, quando ele reclama algum tipo de atenção especial em relação aos seus problemas econômicos, sob a alegação de que é passado o momento de se vir aqui gerar com lágrimas a emoção de ninguém.

      Não estamos querendo derramar lágrimas nem pedir caridade. Não estamos pedindo aqui que se faça nenhum tipo de política especial em favor dos Estados produtores. Não estamos pedindo que se faça nenhum tipo de exceção em nosso favor. Estamos, pelo contrário, pedindo que seja extinta uma exceção feita contra os Estados mais pobres, por serem, por coincidência, os produtores de petróleo e de energia elétrica; contra alguns Estados mais pobres sem qualquer justificação.

      Ao punir o Estado produtor, proibindo-o de arrecadar o tributo, e ao transferir para o Estado consumidor toda a receita, a Constituição - em razão da distribuição espacial dos consumidores que estão nas áreas de nível de renda mais alto e os produtores que, por coincidência, são em geral os Estados mais atrasados - consagra absurdamente um mecanismo permanente de transferência de renda das regiões mais pobres para as mais ricas, sem gerar qualquer benefício para a sociedade.

      O princípio geral do tributo é o da sua universalidade. Pode-se admitir que sejam abertas exceções se elas forem necessárias para atender a interesses superiores do País. Precisariam ser muito grandes, muito "superiores" mesmo os interesses do País atendidos por essa exceção, para que se pudesse tolerar um mecanismo constitucional tão escandalosamente concentrador de renda, quando todos sabemos ser a má distribuição da renda nacional uma das mais importantes causas dos problemas sociais de que padece o Brasil contemporâneo.

      Não se conhece até hoje qualquer explicação que revele ao País quais são os interesses superiores do povo brasileiro que justificaram essas exceções.

      Do ponto de vista puramente tributário, a norma da alínea b, isto é, a exceção a que me refiro, assemelha o ICMS sobre petróleo e derivados e sobre energia elétrica a uma espécie de imposto de consumo, que a Constituição não quis adotar, descaracterizando-o como um imposto sobre a circulação de mercadorias, que foi o tributo escolhido pelos contribuintes.

      Finalmente, com a leitura desse texto, que é a justificação da nossa proposta, quero repetir para que fique bem marcado este ponto: ao propor a eliminação dessas exceções que foram introduzidas na Constituição sem qualquer motivo, não se estará criando qualquer tipo de favor, de subsídio, de ajuda ou estímulo especial em benefício dos Estados produtores de petróleo e seus derivados ou de energia elétrica, sejam eles ricos ou pobres. Ao contrário: o que se está propondo é exatamente que seja abolido um subsídio que hoje existe em favor dos Estados consumidores desses produtos, e que vem sendo rigorosamente apenas pago com dinheiro dos Estados produtores de petróleo e energia elétrica. Sinto-me no dever de insistir nesse ponto, fazendo justiça à atenção do Senador Bernardo Cabral e dos nossos colegas da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Mas sinto-me no dever de vir à tribuna para tratar deste assunto e formular este apelo, pois aqui represento um pequeno Estado deste País.

      Peço a V. Exªs que meditem sobre a importância deste assunto para o meu Estado apenas diante da seguinte informação: há pouco, o Senador Jefferson Péres falava sobre a possibilidade de o Amazonas vir a produzir, dentro de pouco tempo, alguma coisa como 40 mil barris de petróleo por dia. Meu pequeno Estado do Rio Grande do Norte produz alguma coisa como 120 mil barris de petróleo por dia. É o segundo produtor de petróleo do Brasil - maior do que ele, apenas o Estado do Rio de Janeiro.

      Faço este apelo na esperança de contar com a solidariedade de toda a Casa e, em particular, com o interesse e a atenção dos Estados produtores de petróleo e de energia elétrica; do meu Presidente, Senador Antonio Carlos Magalhães, representante do Estado da Bahia, grande e tradicional produtor de petróleo no nosso País; do Senador José Eduardo Dutra, do Estado de Sergipe, produtor de petróleo; do Senador Roberto Requião, do Estado do Paraná, grande produtor de energia elétrica; dos Senadores que representam aqui o Estado do Rio de Janeiro, maior produtor de petróleo do Brasil. Enfim, de todos os Senadores, de todos os Estados, interessados em fazer não apenas justiça e nem enxugar as lágrimas de quem tenha vindo aqui para fazer choradeira ou estender o pires a quem quer que seja, mas interessados em fazer com que a norma jurídica que inspirou a elaboração do sistema tributário deste País seja aplicada para todos.

      Foi o que eu vim dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/10/1997 - Página 22951