Discurso no Senado Federal

REVERENCIA A PASSAGEM DO CENTENARIO DE NASCIMENTO DO GRANDE HOMEM PUBLICO MATO-GROSSENSE, MEDICO, POLITICO E JORNALISTA, DR. AGRICOLA PAES DE BARROS.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • REVERENCIA A PASSAGEM DO CENTENARIO DE NASCIMENTO DO GRANDE HOMEM PUBLICO MATO-GROSSENSE, MEDICO, POLITICO E JORNALISTA, DR. AGRICOLA PAES DE BARROS.
Aparteantes
Carlos Bezerra, Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 05/11/1997 - Página 23921
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, AGRICOLA PAES DE BARROS, MEDICO, POLITICO, JORNALISTA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT).
  • REGISTRO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, LENINE DE CAMPOS POVOAS, JORNALISTA, ELOGIO, ATUAÇÃO, AGRICOLA PAES DE BARROS, MEDICO, SAUDE PUBLICA.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Nobre Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, eu não poderia deixar de ocupar a tribuna desta Casa, no dia de hoje, para registrar o centenário de nascimento do grande homem público mato-grossense, do grande médico, político e jornalista, Dr. Agrícola Paes de Barros, que nasceu em Cuiabá no dia 04 de novembro de 1897 e faleceu na nossa capital, aos setenta e sete anos de idade, no dia 09 de maio de 1969.

Hoje, todo o Estado de Mato Grosso reverencia a passagem do centenário do nascimento de Agrícola Paes de Barros, que foi um visionário além do seu tempo. Em suplemento especial do jornal do meu Estado, Folha do Estado, registram-se vários tópicos da sua vida. Era tido no meio da imprensa mato-grossense como "a metralhadora giratória", pois, nos jornais por ele fundados - "A Luz", "O Fifó", "Brasil Oeste", "A Plebe" - ele, durante longos anos, defendia os interesses dos mais humildes de Mato Grosso.

Como médico humanitário, também foi o médico dos pobres. Durante sua longa vida, dedicou-se à saúde pública desde a sua formatura pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Quando retornou para Cuiabá, no dia 26 de abril de 1924, passou a dedicar-se à Medicina. Trabalhava não só no serviço público, onde ocupou cargos como o de Diretor da Saúde Pública do Estado, como também foi médico do Instituto Médico Legal e da Escola Agrícola do São Vicente, escola que formou muitos mato-grossenses ilustres, dentre eles o nosso colega de Bancada Federal, Senador Jonas Pinheiro, que se formou por aquele estabelecimento de ensino onde o Dr. Agrícola foi médico dos estudantes durante tanto tempo.

O eminente jornalista Lenine de Campos Póvoas escreveu, após a morte do Dr. Agrícola Paes de Barros, um belíssimo artigo intitulado "Um médico popular", que faço questão de ler para registro nos Anais desta Casa.

Além de médico, foi um político de vanguarda, moderno, um dos fundadores do PTB. Justamente aos 38 anos de idade iniciou sua vida pública, elegendo-se Vereador de Cuiabá. Em seguida, em 1935, passou a integrar a Assembléia Legislativa do Estado do Mato Grosso como Deputado Estadual. Em 1945, por ocasião da redemocratização do Brasil, o Dr. Agrícola Paes de Barros foi eleito Deputado Federal à Assembléia Nacional Constituinte como dos mais votados Parlamentares da história do Mato Grosso. Como Deputado Federal, teve um desempenho exemplar na Câmara dos Deputados no Rio de Janeiro. Foi um dos primeiros políticos mato-grossenses a reivindicar a construção da estrada de ferro para Mato Grosso.

Os Anais da Câmara dos Deputados registram que, na Sessão de 26 de maio de 1946, o Deputado Agrícola Paes de Barros batalhava pela construção da estrada de ferro. "O melhor sistema de colonizar é fazer estrada de ferro", dizia.

O progresso de um país está na razão direta da proporção que existe entre os quilômetros quadrados do território para os quilômetros da estrada de ferro. Os mais adiantados e ricos países do mundo são os que possuem maior percentagem de vias férreas. A Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, que há mais ou menos 30 anos avançou de Bauru até Porto Esperança, às margens do Rio Paraguai, em Mato Grosso, transformou as vilas de Araçatuba e Campo Grande em gigantescas cidades e fez surgir muitas outras não só em São Paulo como em Mato Grosso, não só às margens das estradas mas em um raio de muitos quilômetros da via férrea, influenciando beneficamente em um raio de ação maior do que a destruição produzida pela mais poderosa bomba atômica.

Voltou a ocupar novamente a tribuna no dia 15 de junho de 1946, quando disse: "Não importa, Mato Grosso, que falem o mal que quiserem. Para a frente, pelo Brasil, aguardamos a grande via férrea de penetração Campo Grande-Cuiabá, o que o nosso conterrâneo e nosso Presidente - e todos os brasileiros -, General Eurico Gaspar Dutra irá fazer." Essa idéia fixa de Agrícola Paes de Barros pela ferrovia como solução para o desenvolvimento de Mato Grosso o fez até mudar de Partido para o bem de seu Estado.

Diz um documento em seu poder que, em 1946, justamente no dia 11 de outubro de 1946, reclamava ele uma providência com relação a essa estrada ao então Presidente Eurico Gaspar Dutra.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT/SP) - Permite-me V.Exª um aparte, Senador Júlio Campos?

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - Com muita honra.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT/SP) - No instante em que V.Exª faz uma homenagem ao centenário do ex-Deputado Agrícola Paes de Barros, encontra-se visitando a Tribuna de Honra do Senado, aqui à direita, o filho de Pixinguinha, cujo nome era Alfredo da Rocha Viana Filho. Pixinguinha está, por coincidência, sendo homenageado pela Câmara dos Deputados pelo seu centenário, ocorrido em 23 de abril desse ano. Está aqui também presente o neto de Alfredo da Rocha Viana Filho, que tem o mesmo nome do avô Pixinguinha, acompanhado do Deputado Inácio Arruda, do Pc do B do Ceará. Pixinguinha é autor dos clássicos “Carinhoso”, “Rosa” e “Lamento”. Certamente, V. Exª também é um apreciador desse extraordinário e genial compositor e cantor da música popular brasileira. Avaliei que seja importante aqui assinalar a visita de seus ilustres parentes, no momento em que o Congresso Nacional homenageia Pixinguinha no seu centenário; aliás, é também ele homenageado pelo Governo, pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) -É muito justo o aparte de V. Exª, nobre Senador Eduardo Suplicy. Associo-me à homenagem que o Congresso Nacional presta à figura inesquecível de Pixinguinha, um grande artista e grande compositor brasileiro. Tenho como sua canção símbolo, a de que mais gosto, “Carinhoso”. Meu coração se emociona e quero estender a seu filho, a seus familiares, minhas homenagens e a do povo mato-grossense.

O Dr. Agrícola Paes de Barros, que está fazendo hoje cem anos, também foi um homem que se dedicava à arte e à poesia. Tenho certeza que S. Exª, quando Deputado, deve ter-se encontrado no Rio de Janeiro com esse grande artista que foi Pixinguinha. Meus respeitos e os sentimentos carinhosos de todos nós, membros do Congresso Nacional.

Prosseguindo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero relembrar que o então Deputado Agrícola Paes de Barros era tão fanático, tão entusiasmado para levar a estrada de ferro para Mato Grosso que no ano de 1947 filiou-se ao PST - Partido Social Trabalhista, agrupando-se à corrente política que apoiava o seu conterrâneo, nosso coestaduano Eurico Gaspar Dutra, então no exercício da Presidência da República, por achar que era chegada a hora de Mato Grosso ganhar finalmente a sua estrada de ferro. Organiza o PST, conclamando a todos os mato-grossenses para tomar lugar nas fileiras desse novo partido o então deputado Agrícola Paes de Barros e cobrado pelos seus pares da antiga UDN quanto à mudança de partido, assim se expressou o Dr. Agrícola no dia 4 de dezembro de 1948: “...entrei para a UDN, melhor, fui um de seus fundadores... Lutei pela UDN, e desde a sua fundação, gastei perto de cem mil cruzeiros!... Mais tarde fui obrigado a deixar a UDN, e os motivos publiquei-os largamente... Entrei para o PST porque vi no general Eurico Dutra um homem de ação, honrado e notei que Getúlio já iniciava a luta contra o General Dutra..."

Ele recebeu, posteriormente, no dia 17 de janeiro de 47, uma carta do então Presidente Dutra nos seguintes termos.

O Sr. Carlos Bezerra (PMDB-MT) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - Com muita honra, nobre Senador Carlos Bezerra.

O Sr. Carlos Bezerra (PMDB-MT) - V. Exª fala sobre uma das figuras mais notáveis da política mato-grossense. Mato Grosso tem a grande vantagem de ser um Estado com uma estratificação cultural e social muito grande, de onde surgiram excepcionais vultos, inclusive um presidente da República como o General Eurico Gaspar Dutra, médico e nosso conterrâneo. Durante nossa juventude, quando éramos líderes estudantis em Cuiabá, era uma espécie de exemplo para todos nós. O Dr. Agrícola Paes de Barros liderou em Cuiabá as campanhas nacionalistas de O Petróleo é Nosso e outras. Eu, quando ainda garoto, constantemente vivia em sua casa conversando com ele e ouvindo suas lições e seus exemplos. Ele era o grande patrono da juventude de Cuiabá. Homem idealista, tinha diálogo constante com a juventude. Ajudou na formação de toda uma geração de cuiabanos e de mato-grossenses, sendo uma figura importante nesse processo. Portanto, venho aparteá-lo para parabenizá-lo pelo seu pronunciamento e por trazer ao conhecimento do Brasil, através da tribuna do Senado da República, essa importante figura, que foi para Mato Grosso o Dr. Agrícola Paes de Barros.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - Muito obrigado nobre Senador Carlos Bezerra. V. Exª lembrou muito bem. Eu era estudante do colégio Salesiano de São Gonçalo e fazia questão de passar em sua residência, próxima ao Colégio dos Padres, para ouvir esse homem, que, já velho, incentivava a juventude cuiabana, a juventude mato-grossense e, principalmente, aqueles jovens que tinham o ideal de serem políticos.

Lembro-me de que, em frente a sua residência, havia um poço de petróleo, perfurado por ele, simbolicamente, para a defesa de O Petróleo é Nosso.

O Sr. Carlos Bezerra (PMDB-MT) - Morreu com espírito jovem, com espírito de garoto. A matéria envelheceu, mas o seu espírito continuou jovem, idealista, patriótico sempre.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - O Dr. Agrícola Paes de Barros foi membro da campanha nacionalista pelo estabelecimento do monopólio do petróleo, campanha esta que recebeu o nome de O Petróleo é Nosso, nas pegadas de figuras como Artur Bernardes, Orlando Dantas, Landulfo Alves. Lutou pela perspectiva de nacionalização da economia, até que, após uma longa e agitada campanha, no dia 03 de outubro de 1953, viu criada a Petrobrás, através da Lei nº 2.004.

Defensor dos índios, em discurso na Câmara Federal, ao tomar conhecimento de que o padre Carletti costumava hastear na aldeia as bandeiras brasileira e italiana, cantando o Hino Nacional e a Giovanezza, o Dr. Agrícola foi categórico: “Eu desejava que o Brasil soubesse apresentar aos elementos suspeitos que se vão infiltrando nos seus sertões e nas fronteiras, falando aos nossos índios em linguagem diferente da do nosso povo, celebrando diante deles cerimônias estranhas ao nosso civismo, deslumbrando com, o hasteamento de bandeiras nacionais diferentes da nossa ao som da música Giovanezza. Não é pelo amor, mas pelo interesse às riquezas do Brasil”. Ele chegou a combater qualquer mudança na cultura indígena no nosso País, em especial no Estado de Mato Grosso.

Homem de imprensa, lutou muito para manter os seus jornais e dentre eles o Jornal Brasil Oeste, A Plebe, o jornal O Fifó, A Luz circularam durante muitos anos em Cuiabá, como paladino da democracia e da defesa dos mais humildes.

Na lápide de seu túmulo, no Cemitério de Cuiabá, existe a seguinte frase: "Abafa-se a voz, mas nunca o pensamento" - Agrícola Paes de Barros - 1897 a 1969.

Como médico popular, ele atendia de graça praticamente a toda a população carente. Homem probo, digno, dedicou-se com carinho à medicina. Ele saía visitando seus pacientes, todos os doentes a que dava assistência a pé, a cavalo ou de carro, quando esse veículo chegou a Cuiabá.

Por isso, nesta oportunidade, eu não poderia deixar de relembrar a sua figura. Há alguns pensamentos de pessoas que o conheceram. Elas deram um depoimento sobre a personalidade de Agrícola Paes de Barros. Um deles é o Professor Aecin Tocantins, ex-Prefeito de Cuiabá, ex-Ministro do Tribunal de Contas, que diz: "Exercia a profissão com verdadeiro sacerdócio, com o mesmo carinho e dedicação atendia, sem distinção de classe, a todos que dele necessitassem, seja em seu consultório, seja na residência do enfermo. Dos carentes nada cobrava e ainda os ajudava na obtenção dos medicamentos.

Como homem público foi um verdadeiro idealista e coerente nas suas atitudes. Nada o afastava desse procedimento. Exercia a militância política com correção, honradez e dignidade, virtudes essas que o transformaram em um líder querido e admirado principalmente pela classe humilde.

Foi um precursor na luta em defesa dos interesses dos justos anseios da classe operária. Culto, estudioso, inteligente, corajoso e humanitário, legou-nos um passado que nos orgulha e engrandece a história social e a política da nossa terra.”

Outros depoimentos foram importantes, como o do próprio membro da Academia do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso.

Avelino Tavares, na sua coluna "Janela do Tempo", no dia 4 de novembro de 1997, diz:

"Centenário

Agrícola Paes de Barros, o médico humanitário, espírita e espiritualista que escreveu e vivenciou e manteve no seu consultório um quadro interpretando Jesus na Medicina onde se lia: o médico medica; quem cura é Deus."

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não poderíamos deixar de, nesta data, trazer ao conhecimento do Senado Federal, da Tribuna desta Casa do Congresso Nacional as nossas homenagens pelo centenário do brilhante ex-Parlamentar federal e ex-Deputado Agrícola Paes de Barros.

Ele, um poeta em defesa das camadas marginalizadas da sociedade, talvez pudesse repetir o que disse um dia Pablo Neruda: "O povo não está só; há um poeta que pensa em seu sofrimento".

No Rio de Janeiro, já médico formado, reviveu sua infância, sua vida em nossa querida Cuiabá escrevendo uma poesia, no dia 28 de agosto de 1949, quando exercia o mandato de Deputado Federal.

Para encerrar meu pronunciamento, deixo aqui minhas homenagens a esse grande brasileiro, a esse grande mato-grossense, Dr. Agrícola Paes de Barros, lendo o final do artigo do Professor Lenine C. Póvoas:

"A 9 de maio de 1969, o povo cuiabano chorou a perda de um de seus mais estimados clínicos e líderes políticos: Agrícola Paes de Barros.

Inclinado também para a literatura, o "médico do povo" foi autor de várias poesias, das quais destacamos uma, que é a fiel descrição da Cuiabá de outras eras.

Agrícola Paes de Barros

Ao longe, muito ao longe, em retirados anos,

Em Cuiabá nasci, em leitos paulistanos...

Bem neste ponto vejo e sinto ter morado!

Aquele rio ao longe, aquela serra, o prado...

Escuto aqui bem perto, risos conhecidos,

De velhos bandeirantes, bravos destemidos!

Flechando peixe junto à pedra do remanso.

Escuto voz e grito de bugrinho manso

Distingo os conterrâneos, filhos do lugar,

Tentando com valor o mundo a conquistar!"...

Finalizo com a sua última estrofe:

      "... Toda a Vila desperta na luta do dia:

      Trabalho é força, é canto, é vida, é harmonia.

      Canto o carreto, o carro, a prensa de farinha;

      Canto o martelo, a lima, a forja da tendinha;

      Enxadão, pá, enxada e ferros da Inglaterra.

      Canto em nosso campo a revolver a terra!..."

Meus agradecimentos à família Paes de Barros por ter feito circular, no jornal Folha do Estado de hoje grande homenagem a esse grande médico, a esse gande poeta, a esse grande político, a esse grande mato-grossense que foi o Dr. Agrícola Paes de Barros. As homenagens da Bancada de Mato Grosso.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/11/1997 - Página 23921