Discurso no Senado Federal

INEXISTENCIA DE UMA LEGISLAÇÃO RIGOROSA QUE PUNA O CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO NO PAIS. VEEMENTE APELO AOS DEPUTADOS PARA QUE OS PROJETOS DE LEI QUE TRAMITAM EM CONJUNTO NAQUELA CASA, REFERENTES A LAVAGEM OU OCULTAÇÃO DE BENS, DIREITOS E VALORES, SEJAM AGILIZADOS NA SUA ANALISE E VOTAÇÃO.

Autor
Francelino Pereira (PFL - Partido da Frente Liberal/MG)
Nome completo: Francelino Pereira dos Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • INEXISTENCIA DE UMA LEGISLAÇÃO RIGOROSA QUE PUNA O CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO NO PAIS. VEEMENTE APELO AOS DEPUTADOS PARA QUE OS PROJETOS DE LEI QUE TRAMITAM EM CONJUNTO NAQUELA CASA, REFERENTES A LAVAGEM OU OCULTAÇÃO DE BENS, DIREITOS E VALORES, SEJAM AGILIZADOS NA SUA ANALISE E VOTAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/1997 - Página 24586
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, CONGRESSISTA, EMPENHO, AGILIZAÇÃO, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, EXECUTIVO, JOSE FORTUNATI, DEPUTADO FEDERAL, REPRESSÃO, INGRESSO, SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL, DINHEIRO, ORIGEM, ILEGALIDADE, ATIVIDADE ECONOMICA, OCULTAÇÃO, BENS, DIREITOS, VALORES.

O SR. FRANCELINO PEREIRA (PFL-MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste momento em que a Nação está apreensiva diante das decisões tomadas pelo Governo - alguns dominados pelo sentimento de confiança e otimismo; outros, pelas preocupações com o destino da vida econômica do País -, manifestamos a nossa posição favorável a que se agilize, na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, mais particularmente naquela Casa, projeto da mais absoluta importância para a economia brasileira.

Alguns crimes, Sr. Presidente, assumem formas e proporções que preocupam o mundo inteiro, e o Brasil em particular. Refiro-me, entre esses crimes, à lavagem de dinheiro, operações aparentemente lícitas que buscam dar transparência ao dinheiro de origem criminosa.

E como elas ocorrem?

As formas mais visíveis são as praticadas por associações criminosas internacionais, como a máfia e os narcotraficantes. Consistem, basicamente, em investir o dinheiro oriundo da venda de drogas e de assaltos em atividades industriais, comerciais e de serviços, organizadas rigorosamente dentro das normas legais, realizando operações financeiras e pagando tributos como qualquer outro negócio. A diferença está apenas na origem criminosa do dinheiro.

Ainda recentemente, a mídia deu destaque a uma informação oriunda de São José, na Costa Rica, segundo a qual a fraudadora Jorgina, que fugiu do Brasil levando R$100 milhões do INSS, teria utilizado a rede de narcotraficantes para "lavar" o dinheiro roubado e, dessa forma, aparentemente legalizar várias transações.

Mas a "lavagem" de dinheiro pode assumir formas mais sofisticadas e aparentemente imunes à lei.

Quando esteve na Comissão de Assuntos Econômicos desta Casa, submetendo-se à sabatina com vistas à aprovação de seu nome para a Presidência do Banco Central, o economista Gustavo Franco, com sua larga experiência na área cambial, considerou a lavagem de dinheiro um dos principais desafios em sua nova função.

Lembrou que o assunto nunca esteve no centro das preocupações das nossas autoridades, em virtude do controle absoluto que se tinha sobre a política cambial. Agora, porém, com a liberalização cambial, que contempla um regime de liberdade com identificação, não mais se justificam certas operações, como as que envolvem o chamado câmbio paralelo.

Quando a regulamentação cambial era absolutamente proibitiva, vicejava o conhecido black, um mercado de câmbio paralelo, no qual as pessoas e até as empresas se serviam dos chamados "doleiros" para adquirir moeda estrangeira de liberação regular difícil ou até mesmo vedada.

As coisas, contudo, mudaram. Hoje, qualquer cidadão brasileiro poderá dirigir-se a qualquer agência bancária e, numa operação rápida e sem burocracia, mandar dinheiro para o exterior e realizar um sem-número de outras operações.

Nesse contexto, quem precisa recorrer ao mercado paralelo de câmbio? Muito provavelmente ou quem está completamente desinformado sobre a vigência do regime de liberalização cambial, que chegou com o Plano Real, ou quem precisa lavar dinheiro de origem suspeita.

Infelizmente, Sr. Presidente, essa prática criminosa não se restringe aos países pobres ou em desenvolvimento, aos países que ainda não possuem uma moeda internacionalmente forte. Nos Estados Unidos, a economia mais forte do mundo, que tem a moeda mais forte do mundo, que é o dólar, existe um mercado paralelo de dólar.

A descoberta foi feita pelo Fundo Monetário Internacional, o FMI, em recente estudo. E o que isso demonstra? Demonstra que o black não é apenas um mercado onde se troca moeda local por moeda estrangeira. É, na verdade, um mercado de moeda "suja", de origem criminosa, que tenta "limpar-se" para ingressar sorrateiramente no mercado financeiro legalizado.

Por essa razão, concordamos com o Presidente do Banco Central, Gustavo Franco, quando ele afirma que "o black, hoje, não é o preço do dólar em espécie, é o preço de se lavar dinheiro. O "doleiro" é essencialmente hoje uma lavanderia".

O mais grave, Sr. Presidente, é que o País não dispõe ainda de uma legislação rigorosa para punir o crime de "lavagem" de dinheiro. Se a autoridade monetária é informada de que um "laranja" realiza operações ilegais de câmbio em algum ponto da fronteira, a única providência que pode ser tomada é determinar ao banco o encerramento da conta. Nem mesmo uma medida mais punitiva ao gerente ou ao funcionário que aceitou fazer a operação pode ser tomada.

No entanto, desde dezembro de 1995 tramita na Câmara projeto de iniciativa do então Deputado José Fortunati, dispondo sobre "a repressão ao ingresso, no sistema financeiro, de dinheiro oriundo de atividades ilícitas".

Mais recentemente, em dezembro do ano passado, o Poder Executivo enviou projeto ao Congresso tratando da mesma matéria e chamando-a pelo nome apropriado: "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores.

O projeto Fortunati diz que "as instituições financeiras são obrigadas a prestar informações cadastrais de seus clientes, depositantes ou aplicadores às autoridades policiais, fiscais ou judiciais, toda vez que forem realizadas transações suspeitas, qualquer que seja o valor".

Além disso, obriga as instituições financeiras, as incorporadoras e construtoras, as imobiliárias, as entidades sem fins lucrativos, as casas lotéricas e de bingo a exigirem de seus clientes, depositantes ou aplicadores, declaração de origem de recursos, por escrito, sempre que forem realizadas transações de valor igual ou superior a R$10 mil.

O projeto considera "suspeitas as transações em que o montante de dinheiro movimentado, a declaração de sua origem ou a incompatibilidade com a situação financeira e profissional dos aplicadores ensejem dúvidas sobre a licitude desses recursos".

Os presidentes, diretores e administradores das instituições financeiras e outras empresas que infringirem as normas previstas estarão sujeitos a pena de três a cinco anos de reclusão.

Porém, o projeto do Executivo, resultante de uma Exposição de Motivos conjunta dos Ministros da Justiça, Fazenda e Relações Exteriores e do Ministro Chefe da Casa Militar da Presidência da República, é mais completo, mais abrangente e mais rigoroso nas penas.

Considera crime de "lavagem" ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes direta ou indiretamente de crime de tráfico de drogas, de terrorismo, de contrabando ou tráfico de armas, de extorsão mediante seqüestro ou ainda de crime contra a administração pública e o sistema financeiro nacional, assim como dinheiro oriundo de crime praticado por organização criminosa.

A pena é de reclusão de três a dez anos e multa, nela incorrendo quem utilizar o dinheiro de origem criminosa para convertê-lo em ativos lícitos; importar ou exportar bens e valores não correspondentes aos verdadeiros; utilizar, na atividade econômica ou financeira, bens que sabem ser de procedência criminosa; e participar de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crime.

Para viabilizar a investigação, o projeto cria, no âmbito do Ministério da Fazenda, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - Coaf, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar, identificar e investigar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas.

A iniciativa do Executivo reflete compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no âmbito da Convenção contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e de Substâncias Psicotrópicas, aprovada em Viena, em 20 de dezembro de 1988 e ratificada pelo Governo brasileiro em 26 de junho de 1991.

Em maio de 1992, o Brasil foi um dos países que aprovaram o "Regulamento Modelo sobre Delitos de Lavagem Relacionados com o Tráfico Ilícito de Drogas e Delitos Conexos", criado no âmbito da Vigésima Segunda Assembléia-Geral da Organização dos Estados Americanos.

Em dezembro de 1995, em Conferência Ministerial sobre Lavagem de Dinheiro e Instrumento do Crime, realizada em Buenos Aires, o Brasil firmou Declaração de Princípios relativa ao tema, inclusive quanto à tipificação do delito e sobre regras processuais especiais.

Ainda no mês passado, durante a Sexagésima Sexta Assembléia Geral da Interpol, realizada em Nova Délhi, na Índia, a lavagem de dinheiro foi objeto das preocupações da entidade, que definiu esse crime como "qualquer tentativa ou atividade de ocultação ou disfarce de fundos obtidos ilegalmente, com o objetivo de fazê-los parecer de origem legal."

O nobre Senador Romeu Tuma, que participou do evento como integrante da delegação brasileira, mencionou, neste plenário, em discurso pronunciado no dia 29 de outubro último, as resoluções adotadas no evento, recomendando a adoção de leis específicas pelos diversos países, assim como um fortalecimento da cooperação policial internacional.

O que se viu em Nova Délhi foi a determinação de dezenas de países de participarem de um movimento mundial de combate à "lavagem" de dinheiro, o que só faz reforçar o interesse em que a Câmara dos Deputados acelere a apreciação das matérias.

O projeto, de iniciativa do Executivo, foi anexado ao de autoria do então Deptuado José Fortunati. Os dois, tramitando em conjunto, estão sob a análise da Sub-Comissão de Matéria Penal, criada no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça daquela Casa do Congresso.

Desta tribuna, formulo um veemente apelo aos eminentes Parlamentares que estão examinando a matéria, para que, atentos ao crescente clamor público contra a desfaçatez com que os criminosos agem em nosso País e em todo o mundo, internando, impunemente, dinheiro resultante de atividade criminosa, eles possam ser exemplarmente punidos.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/1997 - Página 24586