Discurso no Senado Federal

OBSERVAÇÕES SOBRE AS MEDIDAS ADOTADAS PELO GOVERNO PARA AMENIZAR AS REPERCUSSÕES NA ECONOMIA ADVINDAS COM AS QUEDAS DAS BOLSAS DE VALORES, E SUAS CONSEQUENCIAS PARA O BRASIL. NECESSIDADE DE SE APOIAR O GOVERNO NA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS DO PACOTE FISCAL, RESSALTANDO A IMPORTANCIA DA CRITICA COMO UMA FORMA DE CONTRIBUIÇÃO.

Autor
Josaphat Marinho (PFL - Partido da Frente Liberal/BA)
Nome completo: Josaphat Ramos Marinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • OBSERVAÇÕES SOBRE AS MEDIDAS ADOTADAS PELO GOVERNO PARA AMENIZAR AS REPERCUSSÕES NA ECONOMIA ADVINDAS COM AS QUEDAS DAS BOLSAS DE VALORES, E SUAS CONSEQUENCIAS PARA O BRASIL. NECESSIDADE DE SE APOIAR O GOVERNO NA APLICAÇÃO DAS MEDIDAS DO PACOTE FISCAL, RESSALTANDO A IMPORTANCIA DA CRITICA COMO UMA FORMA DE CONTRIBUIÇÃO.
Aparteantes
Gerson Camata, José Roberto Arruda, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 19/11/1997 - Página 25110
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, SELEÇÃO, MEDIDAS ADMINISTRATIVAS, NATUREZA ECONOMICA, PROMOÇÃO, AJUSTE FISCAL, GARANTIA, MANUTENÇÃO, PLANO, ESTABILIZAÇÃO, ECONOMIA, REAL.
  • CRITICA, FALTA, PREPARAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, CRISE, FUGA, CAPITAL ESPECULATIVO, MERCADO FINANCEIRO, PAIS.
  • DEFESA, APOIO, GOVERNO FEDERAL, ADOÇÃO, MEDIDAS ADMINISTRATIVAS, NATUREZA ECONOMICA, COMBATE, CRISE, BOLSA DE VALORES, SIMULTANEIDADE, CRITICA, POLITICA, GOVERNO, IMPLANTAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PROVOCAÇÃO, DESACELERAÇÃO, ECONOMIA, COMPROMETIMENTO, PRODUÇÃO, PAIS.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, refleti e observei durante alguns dias, antes de dar qualquer palavra a respeito do conjunto de medidas anunciadas pelo Governo. Refleti para não precipitar juízo; observei no sentido de colher a percepção que o mundo em geral vinha tendo das medidas propagadas e, sobretudo, no propósito de colher a informação ou a palavra dos especializados no assunto.

Refletindo, observando e colhendo informação, chego evidentemente à conclusão de que, quaisquer que sejam as nossas divergências, cumpre ajudar o Governo a sair das dificuldades. Se se anuncia pela palavra oficial que em jogo estão os interesses desta Nação, não nos cabe previamente contestar o Governo nem lhe negar a colaboração possível, menos no seu interesse do que em defesa da solução dos problemas do País.

Com esse estado de espírito, entendo que se deva ver o problema das medidas, já agora postas em prática, pelo menos em princípio, sem que se desatente, entretanto, no dever de ponderar e, se for preciso, criticar. A melhor colaboração que se pode dar ao Governo é, quando possível, aplaudi-lo e, quando necessário, ponderar-lhe ou mesmo criticá-lo.

É o que, aliás, a história universal nos indica como caminho mais seguro. Cabe não esquecer, por exemplo, que, em plena Segunda Guerra Mundial, se Roosevelt pleiteou a reeleição, fê-lo sob a vigilância, a luta dos seus adversários e as críticas cabíveis ao seu Governo.

Naquele mesmo período, se Winston Churchill desempenhava o notável papel, na Inglaterra, de comandante na guerra, nem por isso os representantes do parlamento inglês deixavam de criticá-lo e o governo que dirigia.

Não há por que termos procedimento diferente, sobretudo quando a crise presente não tem a dimensão daquela verificada no curso de uma guerra universal. Assim, a primeira observação que me parece cabe ser feita é sobre, não diria a extensão, mas o número das medidas adotadas. São 51. Ora, se se trata de enfrentar uma crise, não parece razoável que o Governo o faça misturando providências de longo alcance com pequenas providências. Umas e outras envolvendo mais de 50 medidas, assim indicativas de que não estava o Governo preparado para adotar um conjunto de práticas racionalmente planejadas. Para uma crise como a que o próprio Governo anuncia, cabia-lhe fazer a seleção, distinguir entre as grandes e as pequenas soluções, para não criar diante desta Nação a idéia de pânico

A verdade, porém, é que tudo indica que o Governo, não obstante as advertências que haviam sido feitas, não se preparou para medidas sistematizadas, planejadas, vistas dentro de um conjunto de circunstâncias graves, porém variáveis.

É o próprio Secretário Executivo do Ministério da Fazenda, o Sr. Pedro Parente, que faz esta confissão:

"As medidas foram definidas somente na tarde do último domingo".

E acrescenta:

"Sem dúvida nenhuma, nós não tivemos as condições ideais para uma preparação, negociação e divulgação dessas medidas".

Há de perguntar-se, entretanto, como não teve o Governo condições do preparo adequado? Desde a primeira ebulição nas Bolsas asiáticas que correligionários ou adversários do Governo o advertiram de que a situação poderia agravar-se. Entre outros que ponderaram, convém lembrar a advertência de um economista que, nem por não ser partidário do Governo, tem menos relevância no que diz o Sr. Paulo Nogueira Batista Júnior:

           "Os riscos resultantes da política econômica brasileira agora se materializaram. As conseqüências estão sendo ou serão sentidas na forma de instabilidade financeira, juros estratosféricos, desaceleração econômica, desequilíbrios fiscais e desemprego crescente. Não se pode dizer que tenha sido por falta de aviso. Economistas das mais variadas tendências teóricas e ideológicas advertiram, durante anos, para os riscos a que estava sendo exposto o País. As críticas e advertências eram respondidas de modo arrogante ou irônico".

           Adiante, ele observa, exatamente para significar que os que se prepararam devidamente não sofreram os mesmos efeitos, o seguinte:

           “Nos países mais sólidos e com políticas mais adequadas, a instabilidade ficou circunscrita basicamente às bolsas de valores. Só nos países mais vulneráveis e submetidos a políticas temerárias é que a situação macroeconômica degenerou rapidamente.”

           Mas, ao mesmo tempo, acrescenta uma observação que vale como advertência a todos nós e ao Governo, a respeito de como devemos ver as medidas adotadas nas atuais circunstâncias:

           “Ninguém pode, em sã consciência, imaginar que as reformas administrativa, previdenciária ou tributária sejam capazes de resolver os problemas provocados pela sobrevalorização cambial”.

           E lembra até que quem o disse, bastante antes, que assim ocorria, foi o Presidente Fernando Henrique Cardoso, na entrevista dada à Veja, de que ele reproduz um trecho. Disse o Presidente:

           “Desde o começo me bati com a equipe econômica para não dar tanta ênfase à necessidade das reformas constitucionais. Elas são importantes, mas dizer que o Real depende delas é mentira.”

           Assim, o problema tem que ser posto em termos que não alarmemos a Nação e não nos alarmemos, perdendo o poder crítico. É preciso ajudar, mas ajudar raciocinando, ponderando, opondo os argumentos necessários em face do que for ocorrendo.

           Tanto as medidas adotadas não significaram um plano adequado, que um economista, não adversário do Governo, e que, como parlamentar o apóia, o Deputado Roberto Campos, fez a seguinte observação em artigo de 16 de novembro:

           “O Pacote 51 foi acolhido com frieza na finança internacional e ceticismo nas bolsas brasileiras.”

           Não é a palavra de um adversário do Governo. É o raciocínio de um economista conhecedor de problemas internacionais e de quem se pode divergir, e eu tanto dele divirjo, mas a quem se há de reconhecer relevante competência. O que ele observa corresponde, aliás, ao que assinala a imprensa, como há pouco o fez O Estado de S. Paulo, mostrando a falta de comunicação devida do Governo no trato das medidas anunciadas. Dir-se-á - e o Governo diz pelas medidas adotadas e pela voz dos seus intérpretes - que fomos atacados pela especulação. Precisamente isso é o que diz, em entrevista publicada no dia 16, o Diretor de Política Monetária do Banco Central, Sr. Francisco Lopes:

           "Fomos atacados. Foi um movimento selvagem”.

           Não tenho elementos suficientes para reconhecer tal, nem tal contestar".

           Mas cumpre ver que, nesse momento preciso, o Deputado Delfim Netto, economista e ex-Ministro, declara que não fomos atacados pela especulação das Bolsas. Em verdade, não nos preparamos para enfrentar a questão. O certo é que, desatentos, sofremos os efeitos da ebulição na Bolsa, muito além do que deveríamos experimentar, se conselhos de diversas origens houvessem sido atendidos pelo Governo.

           Veja-se que um outro economista, que não é igualmente um adversário do Governo, mas que pensa com muita liberdade, nos dá este testemunho:

           "Desejo que o pacote consiga espantar a especulação cambial", diz o Sr. Luiz Gonzaga Belluzzo. Não é possível argumentar que o investimento crescerá na mesma propulsão, que a modernização acontecerá na mesma velocidade, vamos passar por um ano assim. Este Governo está cravado na âncora cambial e não vai mudar, vai ser obrigado a desvalorizar, sofrerá ataques especulativos cada vez mais severos, até que ocorra o definitivo. Nesse contexto, o Brasil continuará perdendo reservas num ritmo perigoso.

O Sr. Gerson Camata (PMDB-ES) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHo (pfl-ba) - V. Exª tem o aparte.

O Sr. Gerson Camata (pmdb-ES) - Ilustre Senador Josaphat Marinho, acompanho as colocações bem lúcidas que V. Exª faz e lembro-me que V. Exª, atualmente Senador, exerceu, ao longo de sua vida, vários cargos junto ao Poder Executivo, e, tenho certeza, observou o comportamento dos governantes dos quais V. Exª foi emérito assessor e auxiliar. V. Exª deve ter percebido que os governos não fazem o que querem. Se eles fizessem o que realmente querem, o Brasil seria uma beleza e o mundo, uma maravilha. É claro que, para o Presidente Fernando Henrique, seria muito melhor, em vez de sobretaxar o Imposto de Renda, anunciar uma redução; em vez das medidas duras, das demissões, que Sua Excelência anunciasse a criação de mais 200 mil empregos públicos e, em vez de dizer que vai cortar 70 mil cargos não ocupados, que dissesse que vai criar mais 140 mil cargos e neles colocasse os amigos, os inimigos e todos os que estivessem precisando de emprego. Então, o Governo não faz o que quer, e sim o que pode fazer, nas circunstâncias que enfrenta. É claro que o próprio Presidente da República, por várias vezes - ouvimos dos Ministros que vieram às tribunas e às comissões -, fez veementes apelos ao Congresso Nacional para que houvesse maior rapidez na apreciação das reformas que para cá foram remetidas desde o Governo Collor. Não são todas de iniciativa do Presidente Fernando Henrique. Ele as reformulou e, na verdade, eram reformas que visavam corrigir o desastre que foi a Constituição de 1988 na área econômica e política, pois ela criou uma série de direitos e não disse onde buscar os recursos para resolver os problemas e os direitos criados. Havia necessidade da correção da Constituição. Aliás, o primeiro Presidente que nos advertiu para isso foi o próprio Presidente José Sarney, que conviveu com os anos finais da Constituinte e que disse: - Com esta Constituição, o Brasil é ingovernável. Logo a seguir, o Presidente Collor remeteu ao Congresso vários itens, solicitando a reforma da Constituição, para os quais o Congresso fez ouvidos moucos. O Presidente Fernando Henrique as reformulou e novamente as remeteu, e poucas foram aqui aprovadas, a não ser aquelas referentes à privatização, algo da privatização na área das comunicações, do petróleo. O que já representa algum avanço, mas não o necessário. E por que razão ele editou 51 medidas? Porque as reformas que estão tramitando por aqui têm muito mais do que 51 artigos. As medidas do Governo representam um esparadrapo que se coloca na ferida enquanto o Congresso não aprova as reformas que estão tramitando aqui. É verdade, também, que, ao longo dos meses em que as reformas por aqui tramitaram, pessoas de fora do Brasil e economistas brasileiros disseram que haveria um momento em que as bolsas sofreriam algum tipo de desvalorização. O Sr. Alan Greenspan previu que os ativos reais e os de bolsa estavam com uma defasagem de 70%, e que em algum momento haveria um desabamento. E aconteceu! Economistas brasileiros também diziam isto. Houve uma valorização, nos primeiros sete meses do ano, em torno de 67%. O que é uma maneira incomum de se ganhar dinheiro no mundo. Suponho que até os traficantes de cocaína devem ter ficado com inveja dos que aplicavam na Bolsa, que estavam ganhando bem mais do que eles. Essa situação não podia continuar. Tinha que haver algum tipo de queda. E ela acabou acontecendo. O que devemos fazer agora - e talvez V. Exª marchasse nesse caminho? Verificar as medidas que vieram para cá, as que dependem de medida provisória; evitar, ao máximo, aquilo que represente sacrifício para a classe média brasileira e para os menos favorecidos, tomando mais dos que tenham mais e que possam nos ajudar a sair da crise, aliás, tomando mais de quem ganhou mais nos meses que antecederam a crise, e apressarmo-nos, fazermos correr as reformas que estão tramitando há 10 anos e para as quais o Congresso brasileiro não deu a atenção necessária. E se o Congresso não aumentar o seu poder de resolver os problemas, se não aumentar o poder de dizer “sim” ou “não”, a rapidez de fazer isso, V. Exª sabe, também vai entrar na crise e cair na cotação da bolsa de valores da opinião pública brasileira.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA) - Concordamos num ponto e divergimos em vários outros, nobre Senador Gerson Camata.

Concordo com V. Exª que os governos são normalmente teimosos...

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo. Fazendo soar a campainha.) - Senador Josaphat Marinho, quero somente, de ofício, prorrogar a Hora do Expediente para que V. Exª possa concluir o seu pronunciamento, informando-o de que o seu tempo está esgotado.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA) - Pois não. O que ocorre, eu dizia, é que uns são mais e outros menos teimosos. Essa diferença V. Exª tem que fazer. E há sobretudo aquelas situações em que os que tanto invocam a globalização, para justificar o nosso procedimento, esquecem das boas lições.

Veja-se o que ocorre normalmente nos Estados Unidos - digo normalmente no sentido de continuamente: toda vez que se esboça uma crise de razoável proporção nos Estados Unidos, a primeira atitude que o Presidente adota é convocar a palácio os líderes dos dois partidos para lhes transmitir os fatos e pedir, como é natural, a solidariedade possível.

Não sei por que no Brasil essa prática não se adota regularmente, como ainda agora não se adotou. Nem os Líderes do Governo foram ouvidos previamente. Quanto aos da Oposição, nada é preciso falar.

O Governo adotou as providências, e já referi aqui a palavra de um de seus membros, no curso de um domingo. Apressadamente as medidas foram articuladas. O que mostra que não estavam sendo devidamente planejadas. V. Exª lembra circunstâncias que devem ser postas em relevo. Ninguém pleitearia do Governo, neste instante, que criasse novos cargos, que multiplicasse empregos. Mas também não era razoável, como não é, que o Governo adotasse medidas gravosas para toda a população sem distinguir entre os que são mais e os que são menos economicamente favorecidos.

Cabia ao Governo fazer a seleção, criar as distinções necessárias para dar o tratamento adequado a pessoas social e economicamente desiguais. Não fez. Aumentou o Imposto de Renda indistintamente. E ainda o Presidente da República teve oportunidade de declarar em discurso que só protestavam contra isso os poderosos.

Ora, Sua Excelência deve estar atento a que o Imposto de Renda não é pago apenas pelos poderosos. Ao que se sabe, aliás, no País os poderosos é que não pagam devidamente o Imposto de Renda. Os assalariados sofrem muito mais os efeitos dele. E esta era a hora do Presidente da República pôr em prática a sua idéia anunciada num projeto que ainda tramita nestas Casas do Congresso Nacional.

Por que não fez vir ao debate o seu projeto do imposto sobre as grandes fortunas? Ao invés de aumentar indistintamente o Imposto de Renda, deveria fazer com que o gravame recaísse sobre os que podem mais, a fim de reduzir o sofrimento dos que podem menos. Não o fez!

É por isso que se há de apoiar as medidas necessárias; condenar as que não o sejam. Ninguém há de opor-se dogmaticamente às providências anunciadas, mesmo que não sejam consideradas as mais próprias. Mas se o interesse da Nação está em jogo, cumpre aceitar as que sejam menos prejudiciais ao interesse da maioria da população; não é possível aceitá-las todas, em bloco. Não é isso próprio do regime democrático.

O Governo deveria ter atentado nessas circunstâncias todas, deveria ter ouvido as forças políticas, inclusive as forças políticas de Oposição, pois também elas integram o Governo como elementos de crítica e de correção, e a crítica e o pedido de correção são formas de colaborar.

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Permite-me V. EXª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA) - Concedo um aparte a V. Exª.

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Vivemos um momento muito importante. Pela sua tradição, pela sua história, pela sua competência, V. Exª, na minha opinião, é o grande nome deste Senado. É, na verdade, o Senador de nós todos, o paradigma da nossa orientação, sejamos de Oposição, sejamos de Governo. Quero felicitar V. Exª pela seriedade, pela profundidade e pela firmeza do seu pronunciamento. Pode-se concordar, pode-se divergir, mas não há dúvida alguma de que V. Exª está fazendo uma análise profunda do momento que estamos vivendo. Neste momento, V. Exª chama a atenção para o fato de que lamentavelmente o Governo não ouviu nem os seus Líderes. Pasmem, até agora não o ouvi da boca do Senador Antonio Carlos Magalhães, mas diz a imprensa que nem o Senador Antonio Carlos, Presidente do Congresso Nacional, foi ouvido! Na minha opinião, V. Exª agora está dizendo o correto. O Governo deveria, poderia - e ainda está em tempo - não só ouvir os seus Líderes, mas, como disse muito bem V. Exª, ouvir inclusive a Oposição, que também governa, integrando, às vezes, os quadros da sociedade brasileira. O Presidente Fernando Henrique poderia ter um pouco mais de singeleza, de modéstia; deveria convocar os líderes da Oposição para debater, analisar e esclarecer a matéria. Meus cumprimentos a V. Exª. Basicamente, nesse ponto, penso que V. Exª é perfeito; mas, lamentavelmente, o Governo, se não ouviu o Senador Antonio Carlos, não vai querer ouvir Lula, Brizola, os Líderes da Oposição.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA) - Agradeço-lhe o aparte, nobre Senador Pedro Simon, mas me permita, não obstante todo o meu agradecimento, ponderar-lhe que sou aqui um Senador igual a todos os meus Colegas.

Acolho as sugestões constantes de seu aparte para salientar, Sr. Presidente Antonio Carlos Magalhães, e precisamente no momento em que ia dizer que as ponderações que faço concordam com o pensamento de V. Exª, que é um homem que não esconde o seu apoio ao Governo, mas que quando achou excessiva a providência sobre o Imposto de Renda, proclamou-o publicamente.

É isso que me parece que o Congresso Nacional tem que fazer neste momento: apoiar ponderando, apoiar divergindo, apoiar selecionando. Não é possível dar o apoio pleno, isso não é da ordem democrática, nem serve ao Governo. Toda vez que o Governo é unanimemente aplaudido, erra mais. O nosso dever é apoiar as medidas acertadas, ponderar sobre as equívocas e negar as errôneas. Esse é o caminho do Parlamento na vida democrática.

O Sr. José Roberto Arruda (PSDB-DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA) - V. Exª tem o aparte, se ainda me sobrar tempo.

O Sr. José Roberto Arruda (PSDB-DF) - Agradeço a compreensão do Presidente da Mesa. Senador Josaphat Marinho, quero apenas dizer que, no seu conteúdo básico, o pronunciamento de V. Exª reflete uma realidade; realidade, inclusive, que parte da experiência que V. Exª tem no Parlamento. Entendemos também que o Congresso Nacional não vai faltar com a sua contribuição ao País, num momento grave como este; com a sua contribuição inteligente, construtiva e que; eventualmente, modifica; mas a sua contribuição sempre, porque pensando o País e não o Governo. Agora, quanto ao fato de o Presidente não ter ouvido as lideranças políticas, o acontecimento da economia internacional nos afetou mais fortemente numa sexta-feira, e a abertura dos mercados livres, na segunda-feira, teria que encontrar, naquela semana, um ajuste fiscal capaz de frear uma saída de divisas que nos tornasse ainda mais vulneráveis. Esse mesmo episódio do Brasil repetiu-se no último fim de semana no Japão, uma economia inclusive com números maiores, embora com o sistema financeiro mais frágil. E o governo japonês teve que tomar medidas fiscais muito duras nesse último fim de semana, capaz inclusive de recuperar a Bolsa, ao que assistimos na última madrugada. Mas feita a parte do Executivo, remetendo aquilo que é devido ao Congresso Nacional, está o Governo na seguinte posição: primeiro, receber o apoio político da sua base como fundamental para a credibilidade que deve ter junto ao mercado internacional. Segundo, receberá também as contribuições, as sugestões, as críticas construtivas, como é do seu dever no regime democrático. Muito obrigado.

O SR. JOSAPHAT MARINHO (PFL-BA) - Agradeço a V. Exª a bondade da sua intervenção e compreendo as justificativas que oferece às providências do Governo.

Permita-me ponderar, já quase ao fim deste discurso, que o que se pretende é que o Governo, já que não se preparou para, na hora própria, adotar as providências adequadas, que pelo menos no curso das medidas que anunciou faça a devida seleção, promova a correção necessária, afastando as que, evidentemente, ou são impróprias, inconvenientes, ou são até improdutivas. Não é possível que, para enfrentar uma crise como essa, repito, o Governo precisasse anunciar 51 medidas. Isso é falta de programação, de planejamento.

Mas sobretudo, nobre Senador, queria assinalar que, apoiando o que for devido, negando apoio ao que for impróprio, temos que ver a sorte da população, sobretudo a sorte da população mais pobre.

Aqui está a palavra de um Economista, Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, o Professor José Márcio Camargo. Note-se a observação que faz sobre as medidas que foram anunciadas:

Os pobres ficarão ainda mais pobres, e o setor de serviços, que vinha garantindo a sobrevivência da mão-de-obra de desempregados do setor formal da economia, irá passar por encolhimento.

O Governo, portanto, tem que atentar nos efeitos da natureza de suas providências e para que de outras áreas não venham reclamos como esse que já li, vindo dos funcionários da Ceplac, na Bahia, que estão temendo, por efeito das medidas anunciadas, a demissão de 704 funcionários.

Não é razoável que, em um quadro de restrição da economia, o Governo ainda possa imaginar que resolve os graves problemas econômicos e financeiros do País com a demissão de servidores, que, não podendo encontrar aproveitamento na área privada, irão irrecusavelmente para a miséria.

O que se pede, portanto, é que, passado pelo menos o momento de pânico que o Governo viveu, busque encontrar o equilíbrio para restringir as medidas anunciadas ou os efeitos delas. É isso que se pede.

Disse, de princípio, que, de minha parte, estarei inclinado a dar o apoio às medidas necessárias, a ponderar sobre as impróprias e a recusar as inadequadas, sobretudo as mais injustas.

Nobres Senadores, logo ao fim da Segunda Grande Guerra saiu um livro, que continua hoje, do meu modesto ponto de vista, um livro fundamental. É o livro de Harold Laski, "Reflexões Sobre a Revolução de nosso Tempo". Era um socialista que representava o pensador do partido trabalhista inglês. Entre tantos ensinamentos que nos deixou nesta obra, ele faz uma ponderação: não é o anúncio de medidas o que se deve tomar na devida consideração, mas, sobretudo, o alcance delas, porque é através do obtido, do alcançado que os governos comprovam a sua eficiência. Atente o Governo do Presidente Fernando Henrique para essa lição, que vale para qualquer governo, e na execução das providências anunciadas saiba afastar as que são impróprias, algumas das quais já foram denunciadas, e dê preferência às medidas próprias, porque somente assim servirá devidamente ao País.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/11/1997 - Página 25110