Discurso no Senado Federal

NECESSIDADE DA UNIÃO ATUAR DE MANEIRA MAIS AGRESSIVA NO SETOR DE TRANSPORTES NO AMAZONAS, QUE DETEM UM INCIPIENTE SISTEMA HIDROVIARIO E RODOVIARIO. EXPECTATIVAS DE S.EXA. COM A CONCLUSÃO DA HIDROVIA DO MADEIRA, EMPREENDIMENTO QUE CONTA COM A PARCERIA ENTRE O GOVERNO DO ESTADO DO AMAZONAS E A INICIATIVA PRIVADA.

Autor
Gilberto Miranda (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • NECESSIDADE DA UNIÃO ATUAR DE MANEIRA MAIS AGRESSIVA NO SETOR DE TRANSPORTES NO AMAZONAS, QUE DETEM UM INCIPIENTE SISTEMA HIDROVIARIO E RODOVIARIO. EXPECTATIVAS DE S.EXA. COM A CONCLUSÃO DA HIDROVIA DO MADEIRA, EMPREENDIMENTO QUE CONTA COM A PARCERIA ENTRE O GOVERNO DO ESTADO DO AMAZONAS E A INICIATIVA PRIVADA.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/1997 - Página 25270
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • EXPECTATIVA, CONCLUSÃO, HIDROVIA, RIO MADEIRA, LIGAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE RONDONIA (RO), RIO AMAZONAS, PARCERIA, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO FEDERAL, ESTADO DO AMAZONAS (AM), GRUPO, EMPRESA, OBJETIVO, REDUÇÃO, CUSTO, TRANSPORTE, GRÃO.
  • ANALISE, IMPORTANCIA, HIDROVIA, INTEGRAÇÃO, BRASIL, AMERICA LATINA.
  • DEFESA, AUMENTO, TRANSPORTE AQUATICO, BRASIL, MELHORIA, INFRAESTRUTURA, PORTO, ANALISE, SITUAÇÃO, RODOVIA, HIDROVIA, AEROPORTO, ESTADO DO AMAZONAS (AM).

           O SR. GILBERTO MIRANDA (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs Senadores, o Estado do Amazonas é marcado pela grandeza de suas dimensões geográficas, com seus mais de um milhão e meio de quilômetros quadrados; é conhecido pela magnitude do volume de águas, pois, além do rio Amazonas, abriga os dois maiores arquipélagos fluviais do mundo; é cobiçado pela exuberância de recursos naturais, pois lá estão localizados 33% das reservas florestais da Terra e a maior biodiversidade do planeta. Proporcionalmente, apesar da depressão do relevo, há uma montanha de desafios a serem transpostos, para melhor aproveitar suas riquezas de modo sustentável.

           O transporte de mercadorias e de passageiros é um desses grandes desafios. Vejam bem: é desafio se houver disposição para resolver o problema; mas constitui grave ameaça, se não houver uma ação concertada para resolver os problemas peculiares da região.

           Uma simples olhadela nos últimos 150 anos da história da navegação na região nos dá uma mostra disso: 1850 é marcante para a navegação fluvial da região, com a chegada dos primeiros barcos a vapor. Atento ao potencial local, o Imperador D. Pedro II cria a Companhia de Navegação da Amazônia, em 1852. Sob o comando do Barão de Mauá, concessionário da companhia, a navegação local alcança seu esplendor com a exploração da borracha, em 1866. Mas a queda no comércio do látex faz com que, na década de 1910, se afundem os desejos de se ter uma portentosa estrutura de navegação. Desse período até hoje, mesmo que o governo tenha investido num momento ou noutro na compra de embarcações, como o fez em 1950, a falta de uma política de navegação fluvial deixa à deriva a própria possibilidade de se explorar racionalmente as riquezas do Amazonas.

           Dentro da grandeza do Amazonas, dois episódios são ilustrativos da ação humana para enfrentar as dificuldades impostas por uma natureza tão poderosa. Um deles é do terreno das lendas, o outro do da realidade palpável.

           O primeiro desses episódios é contado no filme Fitzcarraldo, do cineasta alemão Werner Herzog: sob as mais difíceis condições, um imigrante, apaixonado por óperas, faz transpor um barco, por terra, por muitos quilômetros, até ter acesso a um rio que o levasse até Manaus. Em Manaus, assistiria a uma ópera encenada por uma companhia européia.

           O outro episódio, no terreno da realidade, é a Hidrovia do Madeira, um empreendimento feito em associação do Governo do Estado do Amazonas com um grupo empresarial do ramo de grãos. Essa é a história que promete ter sucesso, se sua trilha for seguida.

           A primeira história - guardadas as devidas proporções - ilustra o desafio dos moradores, industriais, comerciantes e prestadores de serviço do Amazonas: fazer com que aquela profusão de águas seja um canal natural para movimentar bens e pessoas. Uma vez que a lógica dos rios não é a mesma de quem pretende habitar, explorar e trabalhar no Estado, é necessário construir rodovias ou canais que liguem os rios entre si. Sem ligações, qualquer esforço de modernização no setor de transportes será um tiro n´água.

           Já o outro episódio, o da Hidrovia do Madeira, promete muito. O rio Madeira é navegável desde a foz, no rio Amazonas até Porto Velho, numa extensão de 1.100 km. Nas cheias, tem profundidade de 8,20 m, baixando para 2,80 m na estiagem. Embora seja grande a possibilidade de navegação, trata-se de um rio que depende de manutenção para navegação, pois há constante mudança de canais. Felizmente, as medidas para tornar esse trecho navegável o ano inteiro estão sendo tomadas. Essa hidrovia, por sinal, é significativa para o modelo que deveria ser implantado.

           Com a conclusão prevista para dezembro de 98, ela servirá para escoar os grãos produzidos em Mato Grosso, Acre, Rondônia e Amazonas, a preços 30% mais baratos que os do transporte rodoviário. Atualmente, com capacidade para 2 milhões de toneladas ao ano; quando concluída, poderá escoar até 8 milhões de toneladas. É um exemplo de parceria notável: Governo Federal, Governo Estadual e o Grupo Maggi juntaram-se para levar avante essa empreitada. Uma das obras resultantes dessa associação é o Terminal de Itacoatiara.

           As obras de infra-estrutura permitirão navegação dia e noite, reduzindo-se o tempo e o custo do transporte. Inicialmente, o empreendimento deve gerar 4 mil e 700 empregos, sem falar no incentivo à agricultura local, pois há cerca de 20 milhões de hectares de terras propícias para a agricultura, sem destruição de florestas. Essa área tem capacidade para a produção de 60 milhões de toneladas de soja, mais de duas vezes o total da produção nacional. A hidrovia do Madeira será um importante meio para se chegar à meta de produzir 50 milhões de toneladas de soja ao ano.

           Como se pode observar, Senhoras e Senhores Senadores, a melhoria da navegabilidade não beneficia apenas o Estado do Amazonas ou seus vizinhos, pois, a Amazônia tem importância estratégica para o País. Basta ver que o Amazonas, Acre, Pará, Rondônia, Amapá e Roraima, que compõem o corredor amazônico, são de importância fundamental para a integração do Brasil com outros países da América, pois, a partir desse corredor, chegamos à Guiana, à Venezuela, à Colômbia e ao Peru.

           Do ponto de vista comercial, é notória a importância de boas hidrovias para escoar a produção industrial de Manaus, pois, enquanto não for possível abrir novas fontes de desenvolvimento, a Zona Franca, além da principal fonte de receitas e de empregos do Estado, continuará sendo a maior demandadora de transportes. Suas indústrias não poluentes, de alto valor agregado, geraram, em 1996, 48 mil empregos diretos, somente no Distrito Industrial; e 150 mil empregos indiretos, em Manaus e em outras regiões do País. São 400 indústrias, das quais 349 controladas pela Superintendência da ZFM - SUFRAMA que tiveram, em 1996, um faturamento de 13,2 bilhões de dólares.

           Já sob o ponto de vista diplomático e de integração da América Latina, a importância do Estado fica patente no Tratado de Cooperação Amazônica - TCA, que congrega Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Venezuela, Guiana e Suriname e engloba os 7 milhões de quilômetros quadrados amazônicos. No âmbito do Tratado, há projetos e programas na área de Transportes, sob o encargo da Secretaria Pro Tempore e da Secretaria Executiva da CETICAM - Comissão Especial de Infra-Estrutura, Transporte e Comunicações da Amazônia. Tais programas e projetos visam obter o apoio e a colaboração dos países-membros para a realização dos estudos necessários ao desenvolvimento dos transportes na região. E o Estado do Amazonas, pela sua situação geográfica, participa do TCA e deverá compartilhar com os países limítrofes os diversos projetos a serem desenvolvidos.

           Voltando à questão da magnitude, verificamos que as distâncias são realmente significativas. Para os Senhores terem uma idéia, de Belém, no Pará, até Tabatinga, no Amazonas, são 3 mil 250 milhas náuticas; enquanto que, de Belém a Nova Iorque, são apenas 2 mil 950 milhas náuticas.

           A Bacia Hidrográfica da Amazônia - da qual o Estado do Amazonas ocupa um estimável espaço - detém um quinto das águas do mundo, o que torna as hidrovias a vocação natural para os transportes na região. No entanto, não tem sido natural a adoção desse caminho, e as causas são de diversas naturezas.

           Nesse particular, é preciso reconhecer que não é apenas o Amazonas ou a Amazônia que padecem da falta de uma política equilibrada de hidrovias. Vejam, Senhoras e Senhores, que, apesar de o Brasil ter 40 mil quilômetros de vias navegáveis; do total de cargas transportadas em todo o mundo por esse meio, em 1996, nossa participação foi de apenas 0,42%. No mesmo período, os Estados Unidos da América contribuíram com 57,7% das cargas transportadas por hidrovias.

           Torna-se mais lamentável essa constatação quando vemos que o Amazonas tem tudo para ter hidrovias bem organizadas, fazendo escoar riquezas; no entanto, o desenvolvimento desses caminhos de água sofre vários obstáculos. Alguns deles são de natureza cultural, revelando a falta de uma mentalidade hidroviária, pois aqui, quando se pensa em transporte, a primeira coisa que se sugere é a construção de rodovias. É até aceitável que isso ocorra, pois as estradas trazem benefícios num prazo mais curto. Entretanto, essa opção, além de desperdiçar um enorme potencial, revela uma falta de visão a longo prazo e, até mesmo, uma falta de perspectiva histórica, pois os rios foram os primeiros caminhos para levar o desenvolvimento ao interior do País. Mas, além dos problemas culturais, falta uma política aquaviária interior; carecemos de infra-estrutura portuária; e, para completar, as entidades gestoras de recursos para o setor são excessivamente burocratizadas. Todos esses problemas se refletem na “rede hidroviária possível”, pois, embora vasta, não permite navegação franca o ano inteiro.

           Contudo, com todos os obstáculos, é significativa a extensão coberta por aqueles rios que permitem embarcações de qualquer natureza, como é o caso dos rios Juruá, Amazonas, Solimões, Negro, Madeira, Purus, Acre, Branco, Japurá, Aripuanã e Uatumã.

           O Amazonas é o principal curso da bacia a que dá nome. São 2 mil e 100 quilômetros navegáveis, em dois trechos distintos. O primeiro, de 500 km, vai da divisa com o Pará até Manaus e aceita embarcações com calado 10 e 11 metros em águas altas, ou seja, de janeiro a agosto; esse volume baixa para 8 metros de setembro a dezembro. O trecho é amplamente coberto por cartas náuticas, conta com balizamento fixo e está, portanto, preparado para navegação marítima de longo curso, cabotagem e fluvial. Já o segundo trecho é o que vai da capital do Amazonas até Tabatinga e tem uma extensão de 1.600 km. Esse percurso permite navegação de barcos de até 8 metros, em águas altas, e de até 4 metros, na estiagem.

           Nos rios Negro, Branco, Purus e Acre, há linhas regulares para o transporte de passageiros e abastecimento das cidades ribeirinhas. Entretanto, as embarcações que navegam naquelas águas nem sempre são adequadas, e há poucos portos e embarcadouros.

           São várias as ligações internacionais pelas hidrovias: através do Rio Branco, por exemplo, é possível chegar à Venezuela; pelos rios Içá (Brasil) e Potumayo (Colômbia), é possível aportar na Colômbia, em trechos navegáveis o ano todo para barcos de até 3,70m, apesar de existirem bancos de areia no trecho brasileiro.

           Por via fluvial, também é possível chegar ao Peru, pelo Solimões (Brasil) e pelo Marañon (Peru), sendo boa de Manaus até Tabatinga e navegabilidade.

           Por enquanto, no Amazonas, apenas dois portos respondem por toda a demanda de carga: o de Manaus e o de Itacoatiara. O de Manaus conta com 9 armazéns para carga geral, ocupando um total de 16 mil 232 m². Tem acesso rodoviário a Itacoatiara e está ligado ao Oceano Atlântico, pelo Rio Amazonas. Em 1995, movimentou 3 milhões 250 mil toneladas, principalmente no desembarque de granéis líquidos. Trata-se do único grande porto da Amazônia Ocidental, apoio fundamental para a navegação entre Iquitos, no Peru, e o Oceano Atlântico. Constitui suporte indispensável ao comércio e à indústria da Zona Franca de Manaus, e sua importância estratégica é inquestionável.

           O outro porto é o de Itacoatiara, inaugurado no início de 1997, por iniciativa do Grupo Maggi, em parceria com o Governo do Amazonas, que criaram a Hermasa Navegação da Amazônia S.A. O empreendimento teve um investimento de 60 milhões de dólares, 28 dos quais empregados na construção do terminal flutuante, que recebe navios de até 60 mil toneladas. Conta com armazém graneleiro para 90 mil toneladas.

           Ao lado do sistema hidroviário, o Estado do Amazonas conta com um incipiente sistema rodoviário, que alimenta o primeiro e que é fundamental para a criação de novos pólos de desenvolvimento, principalmente para acesso a terras agricultáveis.

           Contando com cerca de 14 mil quilômetros de rodovias, pouco mais de mil deles são pavimentados. Dos pavimentados, menos de 200 km são de rodovias federais e, segundo o DNER, 47% encontram-se em péssima situação. As principais rodovias são a Manaus-Porto Velho, a Transamazônica e a BR-174, de Manaus ao Estado de Rondônia. Uma simples vista d´olhos a um mapa rodoviário constatará não só que são poucas as rodovias no Estado, como não são pavimentadas, ou seja, não oferecem condições de transporte de carga pesada.

           Mas há sempre possibilidade de melhoras, caso se cumpram os objetivos contidos no Programa Brasil em Ação, que elegeu a BR-174 como prioritária, destinando a ela 168 milhões de reais. Uma vez pronta, ligará o Brasil à Venezuela, abrindo-nos uma saída para o Caribe. Essa rodovia está sendo construída em parceria do Governo Federal, Estados do Acre, Amazonas e Roraima e conta com financiamento da Corporación Andina de Fomento - CAF, no valor de 86 milhões. A previsão de término da obra é para dezembro de 1998.

           Além das rodovias já citadas, temos a BR-317, implantada, que vai da Boca do Acre ao Estado do Acre. Há também outro projeto de importância estratégica que é a Rodovia Perimetral Norte, composta pela BR-210 e pela BR-307, com 4 mil 200 quilômetros, indo de Macapá, no Amapá, a Taumaturgo, no Acre. No Amazonas, essas rodovias se estenderão da divisa com Rondônia à divisa com o Acre. Mas, no momento, temos apenas pequenos trechos implantados, num total de 395 km.

           Sem rodovias, fica patente a impossibilidade de explorar racionalmente os recursos do Estado, razão pela qual julgamos necessário que o Governo Federal mantenha as metas para o setor.

           Provavelmente, o mais conhecido terminal de transportes dos não amazonenses é o Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, principal ponto do transporte aeroviário no Estado. Sua área total é superior a 13 milhões de metros quadrados e conta com terminal de passageiros com 30 mil m² e terminal de cargas com 12 mil 263 m². Principal ponto de chegada dos turistas, conta com uma ampla infra-estrutura de apoio e acesso ao mundo inteiro por intermédio de dezenas de companhias de aviação. Outros aeroportos do Estado são o de Tefé e o de Tabatinga, o primeiro com características regionais e o segundo na categoria de internacional.

           Entre janeiro de 96 e junho de 97 foram embarcados 645 mil passageiros no Aeroporto de Manaus, em 36 companhias aéreas diferentes, das quais 12 são nacionais.

           Como Manaus produz bens eletrônicos de alto valor, é grande a utilização do aeroporto para escoar seus produtos, tornando-os naturalmente mais caros do que seriam se transportados por via fluvial e marítima.

           Pois bem, Senhoras e Senhores Senadores, seja transformando os leitos naturais dos rios em hidrovias, seja cortando a floresta com rodovias ou ampliando o transporte aéreo, fica patente a necessidade de a União atuar de maneira mais agressiva no setor de transportes no Amazonas. Sem essas medidas, creiam, Senhoras e Senhores Senadores, não poderá haver o tão propalado desenvolvimento sustentado.

           Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/1997 - Página 25270