Discurso no Senado Federal

PANORAMA GERAL DO QUE ACONTECE COM A MUDANÇA NOS INCENTIVOS FISCAIS RELATIVOS AO ESTADO DO AMAZONAS, DECORRENTE DA MEDIDA PROVISORIA 1.602, DE 1997. DECLARAÇÃO DO PRESIDENTE DA SAMSUNG, HOJE, EM ENTREVISTA A IMPRENSA, QUE REFLETE A INSEGURANÇA DOS QUE SE ENCONTRAM NA AREA DA ZONA FRANCA DE MANAUS. LEITURA DE EXPEDIENTE DO GOVERNADOR AMAZONINO MENDES ENCAMINHADO A S.EXA., ESCLARECENDO QUE A PARTICIPAÇÃO DA ZONA FRANCA NAS IMPORTAÇÕES NACIONAIS ENCONTRAM-SE ESTABILIZADAS AO LONGO DE VARIOS ANOS, MANTENDO-SE NO PATAMAR DE 7%.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • PANORAMA GERAL DO QUE ACONTECE COM A MUDANÇA NOS INCENTIVOS FISCAIS RELATIVOS AO ESTADO DO AMAZONAS, DECORRENTE DA MEDIDA PROVISORIA 1.602, DE 1997. DECLARAÇÃO DO PRESIDENTE DA SAMSUNG, HOJE, EM ENTREVISTA A IMPRENSA, QUE REFLETE A INSEGURANÇA DOS QUE SE ENCONTRAM NA AREA DA ZONA FRANCA DE MANAUS. LEITURA DE EXPEDIENTE DO GOVERNADOR AMAZONINO MENDES ENCAMINHADO A S.EXA., ESCLARECENDO QUE A PARTICIPAÇÃO DA ZONA FRANCA NAS IMPORTAÇÕES NACIONAIS ENCONTRAM-SE ESTABILIZADAS AO LONGO DE VARIOS ANOS, MANTENDO-SE NO PATAMAR DE 7%.
Aparteantes
Elcio Alvares, Gerson Camata, José Ignácio Ferreira.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/1997 - Página 25534
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • ANALISE, EFEITO, ECONOMIA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), MEDIDA PROVISORIA (MPV), CORTE, INCENTIVO FISCAL, INSTALAÇÃO, EMPRESA ESTRANGEIRA, PAIS, PREJUIZO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, ZONA FRANCA, MUNICIPIO, MANAUS (AM), AGRAVAÇÃO, DESEMPREGO, REDUÇÃO, CRESCIMENTO ECONOMICO.
  • CRITICA, GOVERNO, EDIÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CORTE, INCENTIVO FISCAL, ESPECIFICAÇÃO, ZONA FRANCA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), MOTIVO, VIOLAÇÃO, DIREITO CONSTITUCIONAL, CARACTERIZAÇÃO, INCONSTITUCIONALIDADE, AJUSTE FISCAL, GOVERNO FEDERAL.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em alguns instantes, talvez o ideal fosse não ocupar a tribuna à vista de assuntos que, além de preocupantes, trazem à análise daqueles que se preocupam com a segurança dos seus Estados uma circunstância altamente desconfortável.

Por enquanto, Sr. Presidente, vou-me limitar, nesta manhã, a traçar um panorama geral do que acontece com a mudança nos incentivos fiscais relativos ao meu Estado. Vou-me reservar para o pronunciamento dos Ministros da Fazenda e do Planejamento amanhã, neste plenário; em seguida, o resultado das conversações que vêm sendo mantidas pelo governador Amazonino Mendes e pelo Secretário de Fazenda no meu Estado, Dr. Samuel Hanan, com a equipe econômica, para então debulhar, não só no plano político, como no plano constitucional, o meu entendimento em derredor do assunto.

O panorama que essa medida provisória, que tomou o número 1602, levou ao meu Estado é de simples pânico. As autoridades deveriam ter tido a cautela, para não dizer uma palavra mais forte, de convocar os governadores daquela área para discutir o assunto, trazendo uma palavra que implicasse não só a justificativa das medidas que foram editadas, mas também uma compreensão delas que não está a existir, porque é impossível ter essa existência.

Uma só palavra, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, definiria bem o que acontece, e esta palavra é do Presidente da multinacional coreana Samsung. Sabe V. Exª, porque foi dito nesta Casa, em um passado muito recente, que a Samsung estava construindo quatro fábricas no Estado do Amazonas e que seriam criados 5 mil empregos até o ano 2000. E para lá foi. Hoje, a declaração do Presidente da Samsung, em entrevista à imprensa, reflete a insegurança dos que se encontram na área da Zona Franca de Manaus.

“A multinacional coreana Samsung anunciou ontem a suspensão de dois projetos, previstos para os próximos três anos, estimados em R$250 milhões.”

Eis as palavras textuais do presidente:

“...não dá para confiar no Brasil”.

E continua a matéria da seguinte forma:

“A fuga de investimentos por conta das medidas que cortaram pela metade os incentivos da Zona Franca de Manaus já começou”.

E diz:

“A direção da multinacional não escondeu a perplexidade diante das novas medidas.

.......................................................................................

A fábrica de monitores de computador e cinescópio de 29 polegadas tinha instalação programada para o ano 2000”.

E continua a notícia:

“Diante das alterações nas regras de concessão de incentivos, reduzidos em 50% desde segunda-feira, a empresa optou por manter apenas a fábrica de cinescópios, que começa a operar no próximo ano”.

Observem as palavras, sob aspas, da direção da Samsung:

“Quando viemos para o Amazonas o governador mostrou a Constituição e disse que a ZFM estava garantida até 2013 e agora mudam-se as regras”.

E continua o presidente da empresa, em entrevista, ao jornal, a dizer que:

“...enquanto for mantida a redução dos incentivos fiscais, os investimentos da empresa ficarão suspensos.

A matriz da Samsung aguarda uma definição em relação ao assunto, disse o executivo”.

Além disso, a CCE, Sr. Presidente, que é uma das pioneiras, falando por intermédio do seu superintendente, o Dr. Marcilio Junqueira, sobre o clima de incerteza que contribui para a paralisação dos negócios no distrito industrial, declara:

“Não sabemos se ao transferir o projeto perdemos os incentivos.

Casos os incentivos sejam cortados pela metade, a empresa não processará a operação comum nas grandes empresas do DI”.

Este é um momento de pânico.

O Sr. Gerson Camata (PMDB-ES) - Senador Bernardo Cabral, V. Exª me concede um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Antes de ir adiante, Sr. Presidente, ouço o eminente Senador Gerson Camata, que foi Governador do seu Estado e deve, melhor do que ninguém, saber que um corte de incentivos provoca uma queda brutal nos trabalhos de qualquer Estado.

Ouço V. Exª.

O Sr. Gerson Camata (PMDB-ES) - Senador Bernardo Cabral, quero solidarizar-me com seu Estado, que V. Exª defende nesta hora. Não sei se V. Exª chegará a esse ponto, mas começo a perceber que, por atrás dessas medidas todas, existe um dedo invisível do Estado de São Paulo. E percebo isso pelos motivos que vou expor. Os paulistas que estão no Governo lutam desesperadamente, há anos, para acabar com a Zona Franca de Manaus e com o sistema portuário do Espírito Santo. Quando o Projeto Kandir veio para o Senado Federal - assim como todo projeto de lei que vem para cá -, que era aquela lei de incentivo às exportações, havia um artigo que proibia importação pelo Porto de Vitória. Tivemos que negociar e brigar para tirar esse artigo. Em toda lei lançada em situação de emergência ou quando há um problema sério, colocam um artigo que mexe com o Espírito Santo e com a Zona Franca de Manaus. Precisamos advertir o Presidente da República do que estão tentando fazer, porque pode ocorrer um seccionamento da unidade parlamentar do Presidente quando começar a ocorrer aqui uma disputa dos paulistas contra o resto do Brasil. Veja V. Exª que, no art. 31 dessa mesma lei, eles inseriram um artigo que acaba com as tradings. Não pode haver mais tradings no Brasil. Esse artigo faz cair a arrecadação, e é parte de um projeto de lei cujo objetivo é aumentar a arrecadação. Mas a sanha deles para acabar com o sistema de incentivos portuários do Espírito Santo é tão grande que numa lei destinada a aumentar a arrecadação da União eles incluíram um artigo que diminui essa mesma arrecadação. Ora, não havendo tradings, como as pequenas empresas poderão exportar, se elas não têm meios, nem aparato, nem conhecimento tecnológico ou finanças para promover exportações? Depois eles vão no art. 73 - o Senador José Ignácio Ferreira pode confirmar isso - e anulam, acabam com o decreto que criou o regulamento das tradings . Tudo isso para acabar com o porto do Espírito Santo. Cortaram também 50% da Zona Franca de Manaus, para acabar com ela. Ora, a legislação contida nas 51 medidas precisa da unidade e da compreensão do País, do povo brasileiro, pois nesta hora todos temos que nos unir em defesa da moeda nacional e lutar contra a inflação, contra a especulação. Mas instilar o veneno do separatismo, da secção entre as Unidades da Federação, impor disputas mesquinhas... O Presidente precisa ser advertido da ação dessa gente que, estando no seu ministério ou exercendo cargo no seu Governo, não o está ajudando nessa hora. Pelo contrário, está prejudicando o Amazonas, o Espírito Santo e podem, com isso, prejudicar o Brasil. Cumprimento V. Exª por ter sido o primeiro a vir a esta tribuna e denunciar esses movimentos que ocorrem numa hora em que deveria haver união nacional, e não essas defecções provocadas por ambições regionais.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador Gerson Camata, não preciso dizer a V. Exª que subscrevo por inteiro as suas palavras.

Quem convive com o Poder Legislativo, conhece a técnica legislativa e é associado ao mundo do Direito, ao ler de ponta a ponta a medida a que V. Exª acaba de fazer referência, sente nitidamente que a linearidade foi quebrada em algum instante para ser embutido um dispositivo, geralmente dispositivo que é ali colocado todas as vezes em que há uma crise que se aproxima de crise institucional, de crise financeira ou de crise governamental. Sempre é nesta hora. Não se discute um assunto dessa natureza num projeto devidamente alinhado, numa mensagem que traz começo, meio e fim. Ao contrário, veja o que é declarado no jornal O Estado de S. Paulo:

“O Governo entende que o corte de parte dos subsídios da Zona Franca de Manaus não fere a Constituição, porque o art. 40 das Disposições Transitórias determina apenas a manutenção da Zona Franca de Manaus até 2013, e não especifica o valor da renúncia fiscal da União”.

Isso, Sr. Gerson Camata, como V. Exª sabe, violenta, isso é um estupro ao Direito Constitucional, porque há um brocardo jurídico que existe no mundo inteiro, vindo desde o Direito Romano, segundo o qual “onde a lei não distingue, a ninguém é lícito distinguir”. E a equipe, ou alguém que embutiu esse dispositivo, está distinguindo aquilo que a Constituição fez questão de não distinguir. E o que é mais grave: o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias traz regras de Direito Especial. A parte inicial, a chamada parte formal da Constituição é que traz a regra geral. Uma regra de Direito Especial só termina quando atinge o seu objetivo. Por isso que é incluída no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Esse objetivo da regra adicional, que levou à Constituição o artigo dizendo que ela seria mantida até o ano 2.013 com seus incentivos fiscais, é imutável! Não há como se pensar em mudar uma regra de Direito Especial, a não ser que o Governo queira fazer isso que V. Exª está fazendo por alguém que está escondido - não sabemos qual é o biombo que está a fazer esse chamado esconderijo para a chamada secessão entre alguns Estados.

Quero dizer a V. Exª que, desde o começo, anunciei que não queria fazer, por enquanto, uma análise, senão panorâmica, sem descer no campo político e no campo jurídico, porque me reservo para ouvir o que vai dizer, amanhã, o Ministro da Fazenda. Mas sei, por informação absolutamente insuspeita, que V. Exª tem razão quando alega quais são os interessados nessa matéria. E veja por que: o próprio Secretário de Fazenda declara que todos os Estados, inclusive o do Amazonas, sabe que a estabilidade da moeda é um coisa indispensável ao País. Porém, o que acontece? Essa estabilidade passa pela redução e possível eliminação do déficit público. Já sabemos que, hoje, o déficit público é superior a 4,5% do PIB, Sr. Presidente. Só que esse produto do déficit da União, dos Estados e Municípios tem ingerido seus orçamentos anuais. O déficit público do Estado do Amazonas, por exemplo - e é aí que chamo a atenção dos eminentes Senadores José Ignácio e Gerson Camata, porque estamos os três a discutir -, em 1996, foi zero no Amazonas, e, em 1997, zero. Portanto, não temos déficit público. Por isso que o Secretário de Fazenda, Dr. Samuel Hana, diz o seguinte:

“Já impusemos cota de sacrifício para a sociedade (amazonense) porque poderíamos ter feito mais investimentos na área social, mas preferimos ajustar nossas contas e zerar nosso déficit. Temos condições morais para pedir a revogação dessa medida”.

Eu gostaria de trazer o seguinte raciocínio ao conhecimento do Senado: o Estado do Amazonas se sente com legitimidade para sugerir que deveriam ter sido chamados os Governadores interessados nessa área para discutir o assunto, pelo menos com o Presidente da República e com os Ministros da área econômica.

O meu Estado não tem dívida mobiliária; não tem operações para a Antecipação de Receitas Orçamentárias - ARO -, cumpre a Lei Complementar nº 82/95, está adimplente quanto à sua dívida para com a União, e, mais do que isso, tem o déficit igual a zero. Logo, nunca pedimos socorro financeiro à União. Desde 1995, nem para recuperar financeiramente o Banco do Estado do Amazonas o Estado do Amazonas pediu socorro. No entanto, o que se faz com essa medida é exatamente enfraquecer e desestimular a produção industrial naquele Estado.

Ora, Sr. Presidente, quero fazer a seguinte conclusão: o Governador do Estado, o nosso Colega, o advogado Amazonino Mendes, e o Secretário de Fazenda já mantiveram reuniões com o Presidente da República, com a área financeira e com a área da Receita Federal para chegar a uma solução. Mas é induvidoso o fato de que a inclusão da Zona Franca de Manaus nesse pacote é exatamente aquele dedo invisível que apontou o Senador Gerson Camata. Por trás dessa inclusão, há uma maldade que ou foi colocada para futura negociação política, visando a algum apoio para depois ser retirado, ou - e aí não quero avançar - permanecemos, o Senador Gerson Camata e eu, com a pergunta: quem está lucrando com isso?

O Sr. José Ignácio Ferreira (PSDB-ES) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Ouço V. Exª, Senador José Ignácio.

           O Sr. José Ignácio Ferreira (PSDB-ES) - Agradeço a V. Exª, eminente Senador Bernardo Cabral, e o felicito por estar abordando esse tema, que nos toca também. O eminente Senador Gerson Camata mencionou isso com muita clareza. Na verdade, veja V. Exª, Senador Bernardo Cabral, todas as vezes, durante esses últimos quase três anos em que estivemos buscando soluções para o Espírito Santo, como rolagem de dívida ou um determinado empréstimo, inevitavelmente aparecia um burocrata do segundo escalão para tentar alterar os incentivos financeiros - não os incentivos fiscais - do nosso Fundap. Era inevitável aparecer alguém oferecendo uma espécie de barganha: "nós damos isso, e os Senhores cedem nisso". Evidentemente, há outras pessoas - ressalto que tenho certeza de que falo em nome não só do eminente Senador Gerson Camata como do eminente Senador Elcio Alvares -, como o Ministro Pedro Parente, que sempre foi muito compreensivo conosco em relação aos nossos problemas. Na verdade, esse pacote identifica, revela a impressão digital das pessoas que se estão querendo aproveitar da oportunidade para escrever esses textos contra os nossos Estados. Veja V. Exª: hoje, pela manhã, um empresário do meu Estado telefonou-me, enfurecido, e disse - aliás, fico até estupefato como esse fato já chegou na base tão fortemente: "Senador, enfrente o Estado de São Paulo, enfrente essas figuras que estão contra o Espírito Santo". Disse-me ainda uma frase que me tocou, uma vez que tenho as responsabilidades de um integrante da Casa que pretende exatamente a harmonia da Federação: "Enfrente São Paulo. São Paulo é um Estado que usa a nossa Língua, fala a nossa Língua, usa nossa moeda, mas pensa que o resto do Brasil são vagões da sua locomotiva". Na verdade, não são todos. Há um segmento sério, que atua com o objetivo de alcançar, nesses momentos graves que o País vive, os Estados, como o do Amazonas e do Espírito Santo. Por que o Espírito Santo tem que sofrer essa espécie de secessão branca? Por que querem separar o Espírito Santo - que, por sinal, se fosse um país soberano, seria poderoso? Tenho certeza de que, se o Amazonas fosse cuidar de si, seria um país forte. Enquanto lutamos no Congresso para harmonizar essa Federação, para reduzir os desníveis regionais, para impedir a “desidratação” de algumas regiões do País, vemos esses burocratas, intocados, em gabinetes refrigerados, transmitindo a clara impressão de quem objetiva alcançar Estados como o nosso, que querem apenas sobreviver em igualdade de condições com os demais. Não. É preciso falar muito claro. Ontem, aprovamos aqui, em homenagem ao Governador Mário Covas, que muito nos merece, autorização para que a União possa assumir a dívida do Estado de São Paulo. Nada temos contra o Estado de São Paulo, mas não podemos deixar de repelir essa obstinação, como diria um capiau do meu Estado, de galinha quando vê minhoca. Explico: a galinha, quando vê a minhoca, olha fixamente e dá a bicada. Por que isso está acontecendo em relação ao Espírito Santo? Nosso Estado não merece atitudes como essa, razão pela qual vamos continuar repelindo-as. Na próxima semana devo fazer um pronunciamento a respeito dessas questões. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador José Ignácio Ferreira, o que causa estupefação é que convivemos com aqueles que têm representatividade política das mais autênticas, os nossos Senadores paulistas, em um ambiente favorável, onde se desenvolvem relações de companheirismo entre colegas. Isso gera, da parte dos que, em não tendo representação, em não tendo mandato, estão voltados para suas ambições pessoas, esse tipo de desabafo de V. Exª, do Senador Gerson Camata e do meu próprio. Quando um capiau da sua terra, como V. Exª mencionou, fala e fustiga os paulistas, ele não tem idéia de que, em verdade, não se trata do Governador de São Paulo, o nosso colega Mário Covas, que merece, sempre mereceu - convivemos com S. Exª há mais de 20 anos - todo o nosso carinho, todo o nosso respeito. Não se trata de S. Exª, mas acaba respingando, como um todo, nos chamados naturais de São Paulo.

Sei que temos que denunciar essa mão invisível que ataca o Espírito Santo, de um lado, e o Estado do Amazonas, do outro. Por essa razão, estivemos portando um mandato, sobretudo um mandato legítimo, autêntico, que me deu o povo da minha terra para representar o Estado - já que os Senadores representam os Estados - virei para cá.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, sei que estou contrariando oligopólios, sei que se trata de algo muito mais grave. Se tivessem ouvido meu conselho há algum tempo, as classes representativas industriais e comerciais do meu Estado já teriam ido ao Supremo. Este é o risco que o Governo corre: uma atitude mal elaborada juridicamente é levada ao Presidente que, a essa altura, conforme declarou o Governador, não tem absolutamente nenhuma culpa, mas que - faço questão de registrar - acaba desmoralizado, porque essa atitude vai atingir quem está no topo.

Por essa razão, como eu disse, vou voltar a esta tribuna para discutir o assunto, o lado político e o lado jurídico.

O Sr. Elcio Alvares (PFL-ES) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Com prazer, ouço V. Exª.

O Sr. Elcio Alvares (PFL-ES) - Como representante do Espírito Santo, sinto-me obrigado a ingressar no discurso de V. Exª e secundar as palavras dos meus nobres colegas e amigos, Senadores Gerson Camata e José Ignácio Ferreira. Sou o Líder do Governo nesta Casa. Há cerca de três anos dedico-me ao Governo, defendo-o ardorosamente. No entanto, nesse instante em que, no meu Estado, se faz um vozerio imenso contra as medidas que foram adotadas, vou manifestar-me. Inclusive foi atingido o Fundap, sistema fundamental para a economia do nosso Estado, fundamental para que tenhamos o complexo portuário de Vitória como um dos mais ativos do País. É paradoxal o fato de a medida atingir o Fundap. Em conversa com o Senhor Presidente da República, em companhia dos Senadores José Ignácio Ferreira e Gerson Camata, mostramos números segundo os quais o Porto de Vitória presta notória contribuição à economia brasileira. Na ocasião, argumentamos que a reciprocidade da devolução das verbas por intermédio de obras para o nosso Estado estava muito longe daquilo que é verdadeiramente o impacto da nossa contribuição para o Tesouro Nacional. O Espírito Santo vive da sua economia portuária. Eu diria que o Espírito Santo hoje, apesar de ter diversificado bastante, mantém a tradição da economia portuária. Nesse instante em que está sendo analisada parte da medida provisória que dispõe sobre tributos, imposto de renda de pessoa física e outras matérias pertinentes, a Bancada do Espírito Santo, que sempre esteve unida, toma o mesmo posicionamento. Ninguém desconhece nesta Casa que os três Senadores do Espírito Santo votam sistematicamente de comum acordo. Durante esses três anos, eminente Senador, a Bancada do Espírito Santo tem dado voto ao Governo, mesmo nos momentos difíceis. E gostaríamos de ter - como vamos ter - Senador Bernardo Cabral, um diálogo amplo com o Governo, para ressalvar o direito do nosso Estado. O Senador José Ignácio Ferreira é porta-voz da nossa Bancada. Incluo-me neste instante, sob a Liderança do Senador José Ignácio Ferreira, à nossa Bancada, para que não permitamos que o Espírito Santo sofra qualquer restrição. Parece-me que se trata de algo mais grave, porque, na restrição em relação ao Estado do Espírito Santo, quem perde mais é a própria União. Estamos fazendo um estudo - o Senador José Ignácio Ferreira já vai recebê-lo - com a participação de tributaristas do mais alto conceito neste País, para dizer, de maneira iniludível, Senador Bernardo Cabral, que a Bancada do Espírito Santo está coesa, unida, na defesa daquilo que é basicamente o sustentáculo da nossa economia.

O Sr. Esperidião Amin (PPB-SC) - Senador Elcio Alvares, não se esqueça de incluir o Senador Gerson Camata.

O Sr. Elcio Alvares (PFL-ES) - Já falei com o Senador Gerson Camata. Quando falei que a Bancada estava unida, talvez seja o Senador Gerson Camata o nosso maior Líder em termos de instrução e orientação. Mas, neste instante, é preciso registrar isto, Senador Bernardo Cabral: os Senadores José Ignácio Ferreira, Gerson Camata e Elcio Alvares estão identificados num mesmo movimento, num mesmo posicionamento.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Senador Elcio Alvares, não sei por que uma santa quer interferir no Espírito Santo, atrapalhando o aparte de V. Exª, quando V. Exª apenas quis dizer que o Estado do Amazonas não é o único enteado da Nação. O Espírito Santo é um outro Estado que também está sendo levado não mais para o lado da filiação, mas como enteado. E essa companhia, Senador Elcio Alvares, é muito boa, porque, como V. Exª ainda há pouco falava, há o problema do porto e das importações.

O Presidente me adverte que o meu tempo está esgotado, mas peço permissão à Presidência para que me conceda um minuto a mais - e sei que S. Exª me fará essa concessão - para tocar no problema das importações.

O SR. PRESIDENTE (Ronaldo Cunha Lima) - Para a Casa, é uma honra ouvir V. Exª.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - V. Exª me honra com esse registro.

Todas as vezes que se quer atacar a Zona Franca de Manaus, fala-se nas importações da Zona Franca de Manaus.

Sr. Presidente, aqui está um expediente, de autoria do Governador do Estado, que me foi trazido ao conhecimento, que diz o seguinte:

     “Cabe destacar que as importações da Zona Franca de Manaus, por serem basicamente importações de insumos com vista à industrialização de produtos para atender ao mercado brasileiro, já sofreram automaticamente restrições no momento em que o Governo Federal elevou a taxa de juros no mercado nacional, elevou tributos e aumentou o preço dos combustíveis, reduzindo a capacidade de consumo da população brasileira [e aqui vem o ponto claríssimo]. Quaisquer outras restrições, como as que estão sendo adotadas pela referida Medida Provisória, é fazer o Estado do Amazonas e seu povo pagar duas vezes a conta do desequilíbrio estrutural da economia brasileira decorrente do déficit público.

     Importa observar que, da análise das importações brasileiras, verifica-se que apenas e tão-somente pouco mais da metade, 53,87%, são tributadas de forma integral, ou seja, 46,13% são incentivadas ou desoneradas.”

           Veja agora, Sr. Presidente, Senador Ronaldo Cunha Lima, V. Exª que é um homem do Nordeste:

     “No particular, a Zona Franca de Manaus responde por apenas 7% das importações nacionais - aquele fantasma que o Senador Gerson Camata anunciou responde por muito mais -, sendo que, desse montante, a quase totalidade diz respeito a insumos. Ressalte-se que a participação da Zona Franca nas importações brasileiras encontram-se estabilizadas ao longo de vários anos, mantendo-se no patamar do citado percentual 7%. Não sendo, portanto, uma situação recente, como querem demonstrar ao País os órgãos técnicos do Governo Federal, a fim de justificar medidas de redução dos incentivos fiscais aqui vigentes.

Isso põe por terra a argumentação dos técnicos-burocratas em relação à Zona Franca de Manaus.

           Sr. Presidente, quero mandar um recado a um determinado órgão de imprensa que diz que, por atuação minha na Assembléia Nacional Constituinte, a Zona Franca de Manaus foi elevada à Constituição como um contrabando fiscal. Isso é não só uma forma de jogar uma injúria profunda nos membros da Assembléia Nacional Constituinte, porque todos os integrantes dessa Assembléia, dos partidos radicais, dos partidos de esquerda, dos partidos de centro, dos partidos mais centro-esquerda ou centro-direita, enfim, todos, sem exceção, se compuseram num acordo para que a Zona Franca de Manaus fosse prorrogada com a manutenção de seus incentivos fiscais. Essa é a resposta. Quem não conhece a história gosta de jogar pedras. Parecem aqueles abissínios do passado que jogavam pedras no sol que se punha, porque entendiam que ele não voltava.

           O Poder Legislativo está voltando. O Poder Legislativo está mostrando sua força. Tanto assim, Sr. Presidente, que 41 Srs. Senadores estão, numa sexta-feira, pela manhã, aqui presentes, dizendo o seguinte: não confundam um Poder Legislativo funcionando abertamente, apesar de suas dificuldades, com um Poder Legislativo fechado. Fechada é a ditadura instalada; aberto é exatamente o que estamos fazendo: a defesa da democracia.

           Sr. Presidente, se V. Exª me permitir, gostaria de conceder um aparte ao Senador Levy Dias, que está querendo dar um brilho ao meu discurso.

 

    O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - A despeito de o tempo estar esgotado, acho que a Casa, pela importância do debate e pelo orador que ocupa a tribuna, tem o interesse em ouvi-los.

O Sr. Levy Dias (PPB-MS) - Sr. Presidente, por se tratar de uma sexta-feira, temos bastante tempo, como disse o Senador Bernardo Cabral, já que trabalharemos no sábado e no domingo. Nobre Senador Bernardo Cabral, devido à profundidade do discurso de V. Exª, ele tem que ser bem acolhido pela Casa e pelo Governo. Ontem, ao fazer, mais uma vez, um discurso quase solitário no Plenário do Senado sobre o volume do dinheiro que o Brasil tem usado para socorrer bancos, um amigo perguntou-me se eu era contra o Governo. Absolutamente, eu lhe disse. Amigo é esse que faz o que V. Exª está fazendo. Amigo é o que fala, sem nenhum tipo de medo ou de pressão, as coisas que diria o povo do Amazonas se aqui estivesse. Também procuro falar o que o povo do meu Estado e o do meu Brasil desejaria fazer que chegasse aos ouvidos do Governo. O que significa, em montante de dinheiro, o corte dos incentivos da Zona Franca de Manaus, ou do Nordeste, ou do Centro-Oeste? O que significa isso para o contexto do volume de dinheiro que o Senado tem ajudado a remanejar em todo o nosso País? Se usarmos como exemplo o Banespa e o Banerj, isso daria um total de R$20 bilhões. É o pacote. Esse pacote visa levar para os cofres do Governo R$20 bilhões, penalizando, com isso, não só a sua região, o Amazonas, mas praticamente uma grande parcela do povo brasileiro. Esse pacote representa o dinheiro com o qual foram socorridos o Banespa e o Banerj. Como eu disse ontem, a rolagem da dívida de São Paulo, o diferencial de custo, o Governo, vendendo seus papéis a 40% e emprestando para São Paulo a 6% ao ano, só esse diferencial engole o pacote em um ano. Então, Senador Bernardo Cabral, solidarizo-me com as palavras de V. Exª, solidariedade do fundo do coração, porque não é cortando ou prejudicando uma região como o Norte do País, ou Nordeste ou Centro-Oeste, que resolveremos o problema do Brasil. Pelo contrário, tem que se aplicar mais recursos nessas regiões. Imagine V. Exª o que significará para a Região Norte do País, o corte dos incentivos para a Região Amazônica. Portanto, ao apartear V. Exª, mais uma vez quero dizer que continuarei falando deste Plenário, Senador Bernardo Cabral, sobre a facilidade com que distribuímos bilhões. A fonte é uma só. São bilhões do Tesouro, do Governo Federal, para socorrer bancos quebrados. Lamento, profundamente, porque no meu Estado não há um banco quebrado. Se isso lá ocorresse, certamente teríamos uma solução e um apoio maior para os nossos problemas. Ao deixar a minha solidariedade a V. Exª, peço ao Governo que faça um esforço para corrigir esses equívocos profundamente danosos ao nosso País. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL-AM) - Vou concluir, Senador Levy Dias, retomando o início do aparte de V. Exª quando diz: amigo é esse que chama a atenção do outro amigo de forma construtiva. E faço a imagem: se V. Exª, Senador Levy Dias, for abraçar um amigo seu que está de joelhos, V. Exª não vai abraçá-lo de forma tão forte, porque ele está muito abaixo. Ele está subservientemente de joelhos para dizer que está de acordo, na frente; para, por trás, tecer críticas desairosas. Amigo é o que está de pé - o que não é arrogante, mas não pode deixar de ser altivo; amigo é aquele que diz, olhando nos olhos, expondo a sua opinião, sem ter receio de sair de dentro para pôr para fora. Esse é o amigo. Amigo é o que ocupa a tribuna para dizer que nós apoiamos o Governo, mas não somos subserviente aos erros que ele possa praticar.

Com isso, concluo, agradecendo aos eminentes Srs. Senadores que me deram a honra do seu aparte e me ouvir

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/1997 - Página 25534