Discurso no Senado Federal

REFLEXÕES CRITICAS SOBRE O PACOTE FISCAL, LEVANDO EM CONSIDERAÇÃO AS CONTRIBUIÇÕES RECEBIDAS DOS MAIS VARIADOS SETORES SOCIAIS E ECONOMICOS.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • REFLEXÕES CRITICAS SOBRE O PACOTE FISCAL, LEVANDO EM CONSIDERAÇÃO AS CONTRIBUIÇÕES RECEBIDAS DOS MAIS VARIADOS SETORES SOCIAIS E ECONOMICOS.
Aparteantes
José Eduardo Dutra, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/1997 - Página 25565
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, IMPUTAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ESPECIFICAÇÃO, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO, RESPONSABILIDADE, CRISE, NATUREZA ECONOMICA, RESULTADO, NECESSIDADE, AJUSTE FISCAL.
  • CRITICA, POLITICA, ADOÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AUMENTO, TAXAS, JUROS, MOTIVO, PROVOCAÇÃO, RECESSÃO, DESEMPREGO, AGRAVAÇÃO, FOME, MISERIA, MAIORIA, POPULAÇÃO, SUSPENSÃO, INVESTIMENTO, EMPRESA, EMPRESA ESTRANGEIRA, EFEITO, CORTE, INCENTIVO FISCAL, REDUÇÃO, INVESTIMENTO PUBLICO.
  • CRITICA, PRETENSÃO, GOVERNO, DEMISSÃO, FUNCIONARIO PUBLICO, SUSPENSÃO, REAJUSTAMENTO, SERVIDOR PUBLICO CIVIL, AUMENTO, IMPOSTO DE RENDA, PESSOA FISICA, CORTE, BOLSA DE ESTUDO, PESQUISA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.

A SRª EMILIA FERNANDES (PDT-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago hoje à tribuna do Senado Federal as minhas considerações sobre o “pacote” lançado pelo Governo Federal, considerações essas realizadas a partir da análise que fizemos das medidas, levando em consideração as contribuições que temos recebido dos mais variados setores sociais e econômicos.

Em primeiro lugar, eu gostaria de destacar, na minha avaliação, o caráter antidemocrático do “pacote”, formulado pela equipe econômica. Assim como outras medidas anteriores, essa também, de certa forma, excluiu a participação do Congresso Nacional na sua elaboração, que nem sequer foi consultado. Agora está sendo chamado para votar às pressas. Aliás, segundo informações da imprensa, até mesmo setores importantes do próprio Governo não foram ouvidos.

Nesse sentido, são inteiramente descabidas as tentativas de se responsabilizar o Congresso Nacional e, particularmente, as Oposições pelo que ocorreu. O Executivo Federal sempre teve aprovadas as suas propostas. Como exemplos, temos a reeleição, as privatizações, o projeto Sivam, o FEF, a Lei Kandir e o Proer. E as Oposições, por seu turno, nunca deixaram de apontar a ausência de medidas mais eficazes para sustentar o desenvolvimento nacional em bases sólidas.

O que precisa ficar claro é que o Governo Federal inverteu as prioridades do País privilegiando determinadas teses em detrimento de outras. Ao invés de uma reforma tributária e fiscal séria e profunda, preferiu investir em medidas como o Fundo de Estabilização Fiscal e a Lei Kandir.

Antes de apostar na formulação de políticas industriais e agrícolas para mudar e para fortalecer a produção nacional, optou por apostar no “importacionismo”, até certo ponto profundamente irresponsável e predatório.

Além disso, escolheu o caminho de fragilizar o poder de intervenção e regulação do Estado Nacional em favor de uma política de liberdade absoluta para os monopólios e especuladores.

Aliada a essa postura, o Governo também comete, a meu ver, um erro ainda mais grave, que é, no mínimo, a excessiva confiança no capital estrangeiro. É inegável que se deve buscar a participação do capital produtivo externo para contribuir com os processos de desenvolvimento do País. Mas o que se vê atualmente é a absoluta dependência do capital especulativo internacional, interessado apenas nas altas taxas de juros pagas pelo Governo brasileiro - aliás, as maiores do mundo.

Antes de analisar algumas das principais medidas do Governo, é preciso destacar que a edição do “pacote” ocorreu depois da duplicação das taxas de juros no País, ocorrida alguns dias antes.

As medidas adotadas, portanto, mais do que resposta à chamada crise das Bolsas, significam um repasse ao País e ao povo da conta imposta pelos especuladores internacionais. Na ponta final, estão os servidores, os idosos, os aposentados, a classe média, os setores produtivos e os trabalhadores em geral atingidos pelo desemprego. E, aqui, é importante inclusive que se lembre uma matéria assinada pelo Ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, ex-Senador desta Casa, brilhante representante do Rio Grande do Sul, Dr. Paulo Brossard. Em matéria recente, publicada na imprensa gaúcha, S. Exª pergunta: “se o fenômeno é geral, como se explica que outros países maiores ou menores do que o Brasil - os Estados Unidos, o Canadá, a Alemanha, a França, a Holanda, a Áustria, o Chile e o Uruguai, por exemplo, tenham continuado a viver normalmente, sem lançar nenhum “pacote” e, muito menos, um “pacote” monumental, com várias overdoses, cada qual mais nociva?”

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é bem verdade que a conta que a sociedade está sendo chamada a pagar é dupla. Uma, diretamente, por meio das medidas; e outra, através da recessão, do desemprego e da fome, que atingem milhões de brasileiros. Se antes já era difícil produzir com as taxas de juros vigentes, agora se tornou muito mais arriscado e ficará totalmente impraticável a médio prazo, se não mudar o atual quadro.

           O desemprego, por seu turno, de preocupante, com a previsão de um PIB entre 1 e 2%, caminha para transformar-se, a curtíssimo prazo, em uma catástrofe nacional de proporções desumanas.

           As visíveis conseqüências começam a surgir com a drástica queda das vendas de veículos e do comércio, em geral. Além disso, diversos setores e empresas, diante das atuais taxas de juros, também anunciaram a suspensão de investimentos. Tal situação é ainda mais grave, se considerarmos que a economia já vinha em processo de desaceleração.

           O aumento e a manutenção das taxas de juros trazem ainda mais problemas para a vida dos municípios brasileiros. Já sem recursos e diante de um processo recessivo, a queda da arrecadação tornará inviável a sobrevivência de inúmeras administrações. Com isso, aprofunda-se o ataque ao espírito federativo e aos municípios brasileiros, base fundamental para a democracia e o desenvolvimento nacional.

           Ainda em relação ao “pacote”, não corresponde à realidade a afirmação de que “todos pagam a conta”, como têm repetido as autoridades governamentais. Não, Srs. Senadores, porque alguns não vão pagar a conta. As medidas, em sua totalidade, destinam-se a confiscar rendimentos, recursos e direitos dos setores populares e produtivos. Os especuladores, os grandes bancos, as grandes fortunas - e até mesmo os gastos de Governo, como os previstos para a publicidade oficial - não foram atingidos. Sabe-se que esses gastos são da ordem de R$500 milhões para 1998.

           Hoje as manchetes dos jornais publicam que o Banco Central precisou socorrer os bancos com uma soma próxima a R$13 milhões.

           Srs. Senadores, esse conjunto de medidas contidas no “pacote”, sem dúvida, na nossa avaliação, contribui para aprofundar o processo recessivo imposto pela duplicação das taxas de juros. Nessa direção, entre outras medidas, encontram-se a redução de 6% nos investimentos públicos, o aumento do IPI sobre automóveis e bebidas e o aumento dos preços da gasolina, do diesel, do álcool, do gás de cozinha. Outra medida extremamente prejudicial é o corte linear de 50% nos incentivos de setores regionais, como o Fundo de Investimento do Nordeste, o Fundo de Investimento da Amazônia, o Fundo de Recuperação Econômica do Espírito Santo. Essas propostas, que não foram debatidas com as lideranças, nem com a base governista representada neste Congresso Nacional, apontam para alternativas que, em nome de uma defesa, trazem prejuízos.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, chamo a atenção para algo que li hoje no Correio Braziliense. Precisamos de esclarecimentos, precisamos saber se a notícia é real ou se houve equívoco por parte do jornal. Trata-se de algo muito sério. Segundo o que está publicado, na medida provisória editada pelo Governo para elevação de 3% da tarifa externa comum - o imposto de importação do Mercosul - os técnicos do Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo fizeram 287 mudanças além daquelas que haviam sido combinadas com o Ministério da Fazenda. Como conseqüência, em lugar de aumento - estou reproduzindo o que está escrito -, alguns produtos ficaram com um imposto menor. É o caso do uísque importado em tonéis: a alíquota de 16% deveria subir para 19%, mas foi reduzida para 15%. O argumento dos técnicos é de que havia acordo com os países do Mercosul para que a alíquota caísse para 12%. Logo, ela não poderia subir, mas deveria descer. Fizeram, então, o que os técnicos da Fazenda chamaram de avanço para trás: somaram o aumento de 3% aos 12%, e a alíquota do uísque ficou em 15%, quando deveria ficar em 19%.

           Há notícia ainda mais grave, Srs. Senadores: segundo o jornal, a lista dos produtos que ficaram com a menor alíquota possível, 2%, traz dois códigos - se olhássemos somente para os números, talvez não tivéssemos percebido -: um refere-se à heroína e aos seus sais; o outro, à cocaína e aos seus sais. Portanto, confusão só aumenta quando se procura entender a lista. Os técnicos do Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo asseguram que não foram autores das mudanças no caso do uísque. Argumentam eles que alguns técnicos de quatro Ministérios participaram da redação do texto.

           Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, prova-se que, no mínimo, houve algum desencontro, pressa ou rapidez excessiva na apresentação das 51 medidas jogadas através de um “pacote”.

           O Brasil precisa de respostas. O Brasil não pode entender por que uma medida provisória foi aprovada ontem em 15 minutos. Bastaram 15 minutos para que o Governo conseguisse aprovar uma medida que, mesmo dispondo sobre a alocação de recursos importantes, não obedeceu normas e prazos regimentais. Essa medida teve a sua aprovação no Congresso Nacional, de forma precipitada, em uma Operação Trator, conforme denominaram os meios de comunicação.

           É assim que são construídas as alternativas neste País.

           O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - V. Exª me concede um aparte?

           A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Ouço V. Exª com prazer.

           O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT-SE) - Senadora Emilia Fernandes, estou ouvindo atentamente o pronunciamento de V. Exª e tento oferecer minha contribuição. Além do aspecto autoritário inerente ao “pacote”, já tão bem analisado por V. Exª, há outro a destacar. No momento em que o Brasil vai bem, em que a economia vai bem, alguns ganham muito dinheiro. No entanto, quando vem a crise, o Governo quer que o conjunto da sociedade, particularmente os trabalhadores, a classe média paguem pela crise. Não há medida nesse “pacote” mediante a qual se pretenda aumentar a taxação do capital; no entanto, os trabalhadores vão pagar juros mais altos, por exemplo. Várias indústrias de São Paulo já estão anunciando férias coletivas, e sabemos que férias coletivas são a ante-sala da demissão. Aumentou-se o imposto de renda para a classe média, mas - repito - aqueles que historicamente têm acumulado riqueza neste País não são convocados para pagar esse “pacote”. O segundo aspecto que eu gostaria de registrar é o caráter meramente aritmético da equipe econômica: ela decide aumentar impostos, faz as contas: a arrecadação hoje é tanto, aumenta-se tanto para obter-se aumento de tanto na arrecadação. Esquecem-se de exemplos históricos que demonstraram que aumento de imposto não reflete necessariamente aumento da arrecadação. Na época do Governo Collor houve aumento brutal do imposto sobre a cerveja, o que implicou redução do consumo. No final, a arrecadação foi menor do aquela obtida quando o imposto era menor. Há um exemplo da situação oposta, ocorrido no Governo Itamar: houve redução de impostos do carro popular. No entanto, no final do ano, aumentou-se a demanda; portanto, a arrecadação total foi maior do que a de quando o imposto era maior. O caráter autoritário do Governo Fernando Henrique Cardoso sepultou uma iniciativa pioneira no Brasil, que vinha dando certo: eram as câmaras setoriais, onde se sentavam representantes dos trabalhadores, representantes do Governo, representantes dos empresários que discutiam desde questão tarifária, reivindicação dos trabalhadores, do Governo, chegando-se a uma experiência importante no Governo Itamar que deu resultados positivos. No entanto, o Governo Fernando Henrique Cardoso e a sua equipe econômica, com todo o caráter autoritário e toda a postura arrogante que tem, acabou abortando essa experiência, que havia dado certo em outros países, na qual o Brasil estava engatinhando, podendo chegar a uma prática bastante amadurecida. Parabenizo V. Exª pelo seu pronunciamento.

           A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço o aparte de V. Exª e o incorporo ao meu pronunciamento, porque são avaliações conscientes, concretas e objetivas que a Oposição tem feito neste País. Muito ao contrário do que o Governo joga constantemente para a camada da sociedade, talvez um tanto desinformada, a respeito das contribuições, das avaliações e da busca de alternativas que as Oposições têm feito ao País. Caso houvesse o debate democrático e o diálogo construtivo, e não apenas a maneira precipitada e autoritária de impor medidas ao País, sem que se construam alicerces firmes e sólidos em cima de um plano que, se baixou a inflação, não trouxe todo aquele embasamento do ponto de vista econômico e social de que necessitamos, certamente não estaríamos nessa situação.

           Reporto-me a um trecho de uma matéria assinada pelo ex-Senador, o ilustre conterrâneo Paulo Brossard, que escreveu no Zero Hora o seguinte:

           “O fato é que, contrariando muitas e autorizadas advertências de estudiosos nacionais e estrangeiros, o Governo pretendeu segurar o real em amparos de duvidosa eficiência, os dólares voadores, com a sua imanente política de juros insuportáveis e o desmedido endividamento interno e externo.

           Os dólares voadores ou migratórios lembram uma nuvem de gafanhotos, hoje aqui, amanhã ali, sempre em busca de regalo mais farto, esgotada a comida, mudam até de continente, de um momento para o outro; saem como entraram, sem aviso e sem saudade. Aqui encontraram hospedagem cômoda e mesa farta. A rapinagem é estimulada com juros generosos, mas que sangram a economia nacional. Tudo isso tem sido feito para “salvar” o Real. Mas ele será salvo com esse remédio, ou o remédio pode matar o doente?”

           O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

           A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Concedo o aparte ao Senador Pedro Simon.

           O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Felicito V. Exª pela importância do tema, que suscita debates na Casa. Mas quero fazer coro ao que disse o Líder do PT às chamadas câmaras setoriais que existiram no Governo Itamar, algo que podia ser mantido e aprimorado neste Governo. Ali havia exatamente a presença das lideranças sindicais, dos empresários e do Governo que, juntos, fizeram grandes acordos e entendimentos altamente positivos, como, por exemplo, o do setor automobilístico, onde se sentaram a CUT, os trabalhadores, os proprietários das empresas de automóveis e o Governo e fizeram uma série de entendimentos recíprocos, numa hora em que o setor automobilístico atravessa talvez um dos seus piores momentos. O entendimento, o diálogo, a participação coletiva também poderia se dar no campo da agricultura, por exemplo. V. Exª, como eu, sabe da situação dos agricultores que, ontem, fizeram uma reunião belíssima aqui, em que estavam presentes representantes dos pequenos produtores, prefeitos, ocasião em que se reuniram, debateram, discutiram a questão da agricultura. Mas eles, nobre Senadora, são sempre pedintes. Eles vão falar com o Ministro da Agricultura que os recebe; vão falar com o terceiro escalão do Ministério da Fazenda, mas nunca tiveram condições de fazer uma câmara de debate em que pudessem sentar-se, eles e o Governo, para terem realmente esse diálogo e esse entendimento. No aparte de V. Exª, nobre Líder, e no discurso de V. Exª, nobre colega, Senadora brilhante do Rio Grande do Sul, acredito, com toda a franqueza, que aí está algo que o Governo Federal poderia acolher - inclusive o Senhor Fernando Henrique fez parte do Governo anterior e sabe como foi feito no Governo Itamar; aliás, em seu Ministério, Sua Excelência, à época Ministro da Fazenda, e sua equipe faziam essas reuniões, algumas das quais participava como Ministro. Penso que as câmaras setoriais seriam uma fórmula altamente positiva, onde esses pontos citados por V. Exª , essas interrogações, essas dúvidas, essas perplexidades que nos causam, pudessem ser resolvidos. Ninguém foi consultado; são os técnicos e mais ninguém. A classe política não foi consultada, o povo também não. Então, fica a exclusividade de uma classe, que é a dos técnicos, que pensa, fala e, no dia seguinte, é lei, publicada no Diário Oficial. Felicito V. Exª pela oportunidade, pelo significado do tema e, aproveitando a gentileza da aceitação de V. Exª, faço essa proposta, lembrada pelo Líder do PT de como era no passado. Lembro o que poderá ser, a partir dos próximos dias, se o Presidente acatasse e até melhorasse esse entendimento. Que Sua Excelência dê um novo formato à fórmula, mas o conteúdo é exatamente o de criar, no seu Governo, ângulos, fórmulas, setores, onde possa haver o diálogo entre os diversos grupos que compõem a sociedade. Meus cumprimentos a V. Exª.

           A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço o aparte de V. Exª, que é exatamente na linha das nossas ponderações, no sentido de se ampliar esses espaços de debate, hoje monopolizados numa meia dúzia de técnicos do Governo Federal, que exclui, muitas vezes, o Congresso Nacional, que é chamado numa última etapa para homologar o que o Governo apresentou, o que fica profundamente difícil para a sociedade brasileira, para a classe produtora, para os trabalhadores, para os sindicatos, para as confederações, enfim, para todos os setores organizados que conhecem profundamente as suas áreas de atuação, as suas dificuldades, que têm propostas e alternativas para ajudar no desenvolvimento equilibrado deste País. Esse desejo de que o Brasil, sua gente, seja respeitado é um dos pontos para o qual chamamos atenção.

           Incorporo os apartes dos ilustres Senadores ao meu pronunciamento que, sem dúvida, complementam essas minhas ponderações.

           Sr. Presidente, gostaria de chamar a atenção para alguns outros pontos que, nesse “pacote”, sem dúvida, considero medidas profundamente injustas e de eficácia no mínimo discutível. Refiro-me às medidas tomadas contra os servidores públicos, os idosos e os aposentados.

           A demissão de 33 mil funcionários não-estáveis, acrescidos de aposentados de diversas empresas, como os Correios, Radiobrás e Petrobrás - que agora o Governo já acena poder rever - é uma questão que também precisamos discutir e aprofundar. O próprio Ministro Bresser Pereira, numa colocação profundamente injusta e equivocada, disse ser uma bobagem essa questão de nos preocuparmos com o que está posto em relação aos funcionários públicos. Vejam, um Ministro considera uma bobagem o que está previsto e que, se for concluída, além de jogar milhares de pessoas no desespero, no desencanto, antecipa, de certa forma, o que a reforma administrativa já está trazendo.

           Além disso, junto com outros cortes, a suspensão do reajuste para os funcionários públicos para 1998. Vejam V. Exªs: quatro anos consecutivos que esse funcionalismo público tão difamado, tão colocado numa vala comum, tão generalizado num nível de desrespeito, de desvalorização, contra o qual se joga a sociedade brasileira, vai entrar no quarto ano consecutivo sem nenhum reajuste.

           Pergunto: será que isso não está a exigir providências junto à Organização Mundial do Trabalho? Sabemos que o País teve inflação, sim, os juros estão aí penalizando a todos. O Imposto de Renda incide diretamente na fonte, e quatro anos sem reajuste? O Imposto de Renda é descontado diretamente na folha de pagamento do funcionalismo público, e faz quatro anos que não é dado reajuste a essa categoria! Esta é a política do sacrifício para alguns e dos privilégios para outros tantos!

Quanto ao corte de direitos, ao mesmo tempo em que se dobram as taxas de juros, faz-se economia às custas de idosos e de aposentados, o que é incompreensível. O Presidente da República foi profundamente infeliz quando, neste momento de crise internacional - no Brasil, não há sustentabilidade, pois o Real está ancorado na areia movediça do capital estrangeiro -, Sua Excelência não concede o benefício previsto aos que já estão no limite de idade de 70 anos. Inclusive, estava previsto que, em 1998, seria reduzida essa idade. A pessoa, quando chegasse aos 67 anos, se não tivesse como comprovar a sua aposentadoria, receberia um salário mínimo. O mesmo ocorreria com os portadores de deficiência; sabe-se que é insignificante a contribuição recebida por suas famílias. Mas o Governo suspendeu essas medidas, levantando questões relativas à revisão e à possibilidade de fraudes.

Por outro, o Imposto de Renda das pessoas físicas sofreu um aumento de 10%. Sabemos - estamos a repetir isto aqui - que essa medida atinge, em cheio, o rendimento da classe média, cujos salários já estão arrochados. Inexplicável também é o corte de 12,5% nas bolsas de ensino e pesquisa.

           Srs. Senadores, há poucos dias, debatíamos sobre o Orçamento de 1998, na Comissão de Educação do Senado. Uma das propostas das emendas aprovadas pela Comissão de Educação do Senado Federal era exatamente o contrário do que o Governo fez: pedia o aumento dos recursos destinados às bolsas de ensino e pesquisa.

Mas o Governo traz um corte de 12,5% nesses recursos, caminhando contrariamente àquela política de investimento, competitividade, qualidade de mão-de-obra, e ainda repercutindo negativamente junto à educação e à saúde, setores em que o Governo afirma não mexer. Está aí também a eliminação da isenção para as entidades educacionais, instituições de saúde e entidades de prática esportiva.

No momento em que se mexe nisso que está sendo feito no País, estamos mexendo, sim, em setores essenciais profundamente desassistidos pelo Governo Federal.

Algumas medidas apontam, Srs. Senadores, embora timidamente, para atacar determinados problemas, e fazemos questão de colocar isso também no nosso debate, na nossa avaliação. Entre elas, ressaltaríamos a criação do que está sendo falado aí, de um fundo de aval para as pequenas e médias empresas, que já sinalizaram que terão acesso dificultado pelas condições cadastrais impostas pelos agentes financeiros. Além disso, não há previsão de taxas de juros. Quer dizer, vamos oferecer dinheiro às pequenas e médias empresas, com esses juros que estão aí? É a pergunta que o Governo tem de nos responder.

Outra medida que consideraríamos, até certo ponto positiva, seria o caráter aduaneiro, que é decisivo para combater a concorrência desleal que inunda o mercado brasileiro de arroz, trigo, leite e outros produtos primários e industrializados.

Frente a esse quadro, Srs. Senadores, o Congresso Nacional está sendo chamado para apressar as reformas. Resumem-se, até agora, às Reformas Administrativa e Previdenciária, como já assistimos nesses últimos dias. Ou seja, além de persistir no erro de não enfrentar os reais problemas do País, ainda se aposta novamente apenas em cortar mais direitos dos funcionários públicos, dos trabalhadores em geral e da sociedade brasileira. O Governo novamente, com o provável aval do Congresso Nacional, vai fazer de conta que está dando a solução à crise nacional.

É de se perguntar, neste momento, qual a eficácia de medidas como essas, quando, nesses últimos três anos de Plano Real, os funcionários não tiveram reajuste. Ou, depois, desde 1994, em nome do combate ao déficit público, o atual Fundo de Estabilização Fiscal vem concentrando, nos cofres do poder central, volumes cada vez maiores de recursos dos municípios. São questionamentos que deixamos.

           Também é de se questionar por que chegamos à situação atual após ter privatizado dezenas de empresas estatais, teoricamente fazendo economia e reduzindo o rombo do Tesouro Nacional. Ao mesmo tempo, enquanto se aumenta o confisco e a concentração de recursos no plano federal, assistimos ao crescimento vertiginoso do comprometimento orçamentário com os juros e serviços das dívidas interna e externa. Para 1998, estão previstos cerca de R$37 bilhões, enquanto que, em 1994, a proposta foi de aproximadamente R$15 bilhões para fazer frente a essas contas. É um rombo crescente que, depois da recente publicação das taxas de juros, tende naturalmente à explosão incontrolável.

A verdade, que precisa ser enfrentada de forma clara e transparente, é que além da queda da inflação - que todos defendemos - o Brasil não tem um plano de desenvolvimento nacional. Continua faltando ao País uma política de desenvolvimento, que aponte para o crescimento centrado na poupança interna, com definição de políticas industrial, agrícola, de exportação e, principalmente também, o fortalecimento do nosso mercado interno. Diante do crescimento vertiginoso das dívidas interna e externa, é de se perguntar: o que foi e o que está feito com esse dinheiro? Qual a obra desenvolvida pelo atual Governo - obra que se veja, que esteja aí, para o Brasil ver, além da queda da inflação. Também estamos diante de uma discutível melhoria das condições de vida dos mais pobres e da venda das estatais. Que mais foi feito nesse País?

Neste período de vigência do Plano Real, a sociedade tem apoiado a idéia de que a queda da inflação é fundamental para o País. Mas é certo também que cresce o questionamento sobre o custo que está sendo pago pela população e pelos setores produtivos e também sobre quem são os reais beneficiários da atual política econômica em vigor no País.

           A vulnerabilidade da propalada “muralha” em torno do Real, a queima de cerca de US$14 bilhões das reservas, a duplicação das já absurdas taxas de juros e a evidente e absoluta dependência ao capital especulativo internacional impõem a democratização do debate em torno da situação atual e de seus desdobramentos.

           Nesse sentido, o Congresso Nacional não pode reduzir-se ao papel de aprovar a toque de caixa as reformas apresentadas como salvadoras. É preciso que esta Casa - o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, a sociedade brasileira -, cada vez mais, seja chamada para cumprir o seu verdadeiro papel de legislar e fiscalizar o Poder Executivo Federal. Sem isso, com o aprofundamento da crise, a Nação deixará de contar definitivamente com o seu instrumento principal de garantia da democracia e do equilíbrio social.

           Srªs e Srs. Senarores, o Brasil não pode mais sustentar essa política que aniquila o setor produtivo nacional e transforma o País no paraíso dos especuladores internacionais. É inviável uma economia em que se comemora fechar as contas externas com um déficit de US$10 bilhões, apenas em 1997, enquanto de 1980 até 1994, o Brasil não possuía qualquer déficit, ao contrário, registravam-se superávits crescentes. Não existem reservas sólidas, não se pode falar em moeda forte ou em estabilidade diante de um quadro como esse, em que se trocou o investimento na produção pela esterilização dos recursos nacionais na ciranda financeira internacional.

           Frente a isso, a sociedade precisa conscientizar-se da gravidade da situação, e afirmar a sua contrariedade a essa política desumana de superlucros a qualquer custo, de sustentação de planos a qualquer preço, de desemprego e exclusão social.

Diante disso, é fundamental a união do povo brasileiro para buscarmos um novo caminho para o desenvolvimento nacional, com soberania, apoio à produção nacional, empregos, igualdade, educação de qualidade e respeito aos direitos sociais dos seus cidadãos.

Eram as nossas considerações Sr. Presidente.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/1997 - Página 25565