Discurso no Senado Federal

TECENDO EXPLANAÇÕES E COMENTARIOS SOBRE O ESTADO DO AMAZONAS E SUA EXUBERANTE REGIÃO, DESTACANDO SUA HISTORIA, ASPECTOS DE SUA ECONOMIA E EDUCAÇÃO.

Autor
Gilberto Miranda (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • TECENDO EXPLANAÇÕES E COMENTARIOS SOBRE O ESTADO DO AMAZONAS E SUA EXUBERANTE REGIÃO, DESTACANDO SUA HISTORIA, ASPECTOS DE SUA ECONOMIA E EDUCAÇÃO.
Publicação
Publicação no DSF de 27/11/1997 - Página 26060
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, INICIATIVA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), MELHORIA, NIVEL, EDUCAÇÃO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), CRIAÇÃO, PROGRAMA, DESCENTRALIZAÇÃO, TRANSFERENCIA, RECURSOS FINANCEIROS, PROCEDENCIA, SALARIO EDUCAÇÃO, DESTINAÇÃO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO.
  • ELOGIO, CRIAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, PLANO, VALORIZAÇÃO, MAGISTERIO, OBJETIVO, APERFEIÇOAMENTO, ENSINO, MELHORIA, CAPACIDADE PROFISSIONAL, PROFESSOR.
  • ELOGIO, CRIAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, FUNDOS, MANUTENÇÃO, DESENVOLVIMENTO, ENSINO FUNDAMENTAL, VALORIZAÇÃO, MAGISTERIO, GARANTIA, PAGAMENTO, SALARIO, PROFESSOR, PROMOÇÃO, PERMANENCIA, ALUNO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), REGIÃO NORTE.
  • IMPORTANCIA, IMPLANTAÇÃO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), PROGRAMA NACIONAL, EDUCAÇÃO, DISTANCIA, REDUÇÃO, AUSENCIA, IGUALDADE, ASSISTENCIA EDUCACIONAL, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORTE, REGIÃO AMAZONICA.

           O SR. GILBERTO MIRANDA (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dizia um dos versos cantados por Elis Regina que “o Brasil não conhece o Brasil”. Para nosso pesar, esse verso se mostra verdadeiro não apenas na boca de nossos adolescentes e jovens, mas também de muitos adultos, que revelam uma ignorância assustadora quando se indaga da realidade nacional que fica além das fronteiras do município em que nasceram. Quando muito, dominam algum conhecimento da vizinhança ou da região em que moram.

           Infelizmente, Senhor Presidente, o verso cantado por Elis Regina encontra eco na voz de muitos brasileiros, principalmente os habitantes do Sul e do Sudeste, ao se lhes indagar o que sabem sobre o Estado do Amazonas. É possível encontrarmos algumas respostas vagas e imprecisas, muitas recheadas de mitos e fantasias, outras ainda trazendo do fundo da memória fiapos de imagens vistas em reportagens na televisão. O Brasil não conhecer o Brasil é uma de nossas fragilidades. Como representante do Estado do Amazonas, não posso permanecer insensível e calado diante de tal limitação. É por isso que venho novamente à tribuna desta Casa, e a quantas onde me for facultada a palavra, para tecer explanações e comentários sobre o meu Amazonas e sua exuberante região.

           Se tivéssemos uma visão fatalista de nossa história pretérita, diríamos que ficou reservado a esse pedaço do Brasil a sina de ser tradicionalmente desconhecido ou mal conhecido por décadas e séculos a fio. No longo período em que a região amazônica pertenceu legalmente à Espanha, ficou ela entregue à própria sorte e ao usufruto de seus primitivos habitantes. Raros foram os missionários, aventureiros e expedicionários que trilharam seu território. Era tal a ignorância do reino espanhol diante da sequer suspeitada riqueza e da exuberância naturais, que não houve relutância em ceder toda a imensa área a Portugal, por ocasião das negociações do Tratado de Madri, em 1750.

           Não nos espantamos, por isso, quando as questões amazônicas são mais largamente debatidas no exterior do que por nós brasileiros, concedendo a imprensa estrangeira maior espaço ao noticiário sobre nossa Amazônia do que os meios de comunicação do nosso País. Mas nesse fato reside um outro problema, que não é motivado apenas pelo nosso desconhecimento da região. Está aí em jogo um outro fator, que merece ser mencionado. Trata-se da cobiça internacional tantas vezes demonstrada por uma região que figura no imaginário popular como “o pulmão do mundo” ou que figura nas agendas de empresas e de governos estrangeiros como um pródigo filão gerador de riquezas.

           É nesse cenário rapidamente desenhado que quero enfatizar a importância da educação como fator estratégico para o Amazonas e sua região. Se a educação é uma atividade estratégica para o desenvolvimento econômico e social do País, nossa porção amazônica também é estratégica, na medida em que a integridade do território e a soberania nacional estão intrinsecamente vinculadas a essa região tão cobiçada por outros povos. É por essa estreita vinculação que se justifica falarmos do Estado do Amazonas e do papel que a educação aí desempenha. Esses temas têm sua importância assegurada em qualquer agenda que projete o futuro de nossa Nação, que garanta a governabilidade, que se preocupe com o desenvolvimento sustentado, que busque preservar a biodiversidade de nossas florestas, que tenha em conta nossas limitações e os perigos que nos esperam à frente.

           A educação perpassa a questão amazônica sob diferentes aspectos, desde a oferta de ensino fundamental de boa qualidade dirigida à população em geral e à população indígena em particular, até a formação de pessoal com qualificação superior, que possa dar resposta adequada aos desafios e problemas da região e responda às necessidades nacionais no que diz respeito à proteção e à vigilância de uma das áreas que vem sendo objeto da cobiça internacional por mais de quatro séculos.

           A Região Norte vem apresentando, nos últimos 20 anos, um intenso crescimento do seu Produto Interno Bruto, que fez dobrar sua participação no PIB nacional até o início desta década. O Estado do Amazonas, que em 1970 respondia por 0,72% do PIB nacional, saltou para uma participação de 1,6% em 1990. O maior impulso ocorreu entre 1975 e 1980, com os bons resultados da política industrial coordenada pela Superintendência da Zona Franca de Manaus - SUFRAMA e pela Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia - SUDAM. Por força desses investimentos, Manaus transformou-se em um pólo produtor de equipamentos eletrônicos e de material de transporte para o mercado nacional, tornando-se uma das principais portas de entrada para novos grupos empresariais multinacionais em busca do mercado brasileiro. Incentivados por um forte programa de investimentos da indústria extrativa mineral e de transformação, os Estados do Amazonas e do Pará são responsáveis, em conjunto, por mais de três quartos do PIB regional.

           No entanto, apesar de a região como um todo indicar tendências de evolução positiva na qualidade de vida, convive com indicadores sociais que ainda nos preocupam. Entre tais indicadores, menciono os dados relativos à taxa de mortalidade infantil, que, embora tenha apresentado significativa redução nas duas últimas décadas, ainda permanece em patamar muito elevado diante do limite máximo aceitável pela Organização Mundial de Saúde - OMS, que é de 22 mortes para cada grupo de 1.000 crianças nascidas vivas. Na região Norte como um todo, os números revelam 40 mortes por 1.000 nascidos vivos. Quanto ao saneamento básico, apenas 35% da população urbana possui acesso a esgotos sanitários; 68% se beneficiam de abastecimento de água; e somente 59% dispõem de coleta de lixo. Na zona rural, apenas 9% dos moradores têm acesso ao abastecimento de água. Quanto à alfabetização, a taxa regional permanece alta, em torno de 80%. Como se vê, Senhor Presidente, os atuais níveis de bem-estar ainda estão muito aquém do patamar em que gostaríamos que estivessem, principalmente nas áreas rurais.

           Adotando-se a metodologia utilizada pela Organização das Nações Unidas - ONU para qualificar e classificar o nível de desenvolvimento das populações, expresso pelo Índice de Desenvolvimento Humano - IDH, verifica-se, que em toda a região, esse índice alcançou 0,706 em 1991, número não muito distante dos Estados mais pobres do País.

           Ocorre que a Região Norte, atingida por acentuado fluxo migratório, experimentou explosivo crescimento demográfico na década de 80, quando então sua população praticamente dobrou. Com essa expansão, aumentou a pressão sobre a oferta de serviços essenciais, fato que, de certa forma, desacelerou a melhoria dos níveis de qualidade de vida.

           O Estado do Amazonas conta hoje, de acordo com os números obtidos no Censo de 1997, com 539 mil 275 alunos matriculados na rede estadual e na municipal. Desses, metade se concentra na capital, Manaus. Há muito que fazer na área da educação, no entanto, Senhor Presidente. É por isso que louvo as atuais iniciativas do Ministério da Educação nessa área. O Governo Federal tem objetivado elevar os níveis de conhecimento da população mais carente, investindo na qualificação profissional para garantir a inserção dessa camada da população no mercado de trabalho. Destacarei, a seguir, alguns dos principais programas e projetos na área da educação que estão sendo priorizados para a Região Norte e que, com toda a certeza, beneficiarão a população de meu Estado.

           Visando a melhoria da gestão da escola pública, foi instituído o Programa de Recursos Descentralizados na Escola, que promove a transferência direta de recursos financeiros provenientes do Salário-Educação, na parte que corresponde à cota federal, recursos que são administrados pelas próprias escolas e pelas comunidades escolares, organizadas em associações de pais e professores. Já foram beneficiadas com esse Programa, no ano de 1996, duas mil e 200 escolas. Para o biênio 1997/98, estima-se a aplicação, em todas as escolas da região, de recursos de origem fiscal da ordem de mais de 300 milhões de reais. Esse Programa assume importância capital no Estado do Amazonas, dadas as especificidades que cercam cada comunidade escolar, que pode vir a ter suas necessidades emergenciais atendidas por meio da administração descentralizada dos recursos a ela repassados.

           O professor, que é o principal agente do processo educativo, não permaneceu esquecido pelo Governo Federal. Com o Plano de Valorização do Magistério, foi posto em ação um conjunto de medidas voltadas para o aperfeiçoamento do ensino, a valorização do magistério e a capacitação dos professores. Um dos graves problemas a marcar negativamente os Estados mais pobres da Federação e a atravancar o desempenho do setor educacional é a remuneração desigual que percebem os professores do ensino fundamental.

           Além disso, sabe-se que os recursos do orçamento fiscal destinados à educação são mal distribuídos no âmbito de cada Estado, o que gera graves disparidades no valor médio gasto por aluno. Para sanar essa deficiência, foi proposta a criação, no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de um fundo de natureza contábil, denominado Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, por meio do qual a União garantirá o valor mínimo de 300 reais para a manutenção anual de cada aluno. Do total de recursos que constituirá o Fundo, 60% terão de ser utilizados para pagamento dos salários dos professores em efetivo exercício. Será permitida, ainda, nos primeiros cinco anos, que parte desses 60% seja aplicada na capacitação de professores leigos.

           Pode-se antever, Senhor Presidente, o impacto positivo que o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério irá causar no Estado do Amazonas e em toda a Região Norte, no sentido de se atingir uma distribuição mais eqüitativa de recursos, que reverterá em benefício da manutenção do aluno na escola e contribuirá para a equalização dos salários dos professores e para a capacitação dos professores leigos. No tocante a esse último ponto, existem estatísticas que apontam cifras gigantescas de professores leigos em alguns Estados das regiões Norte e Nordeste. Para o Estado do Amazonas, o percentual de professores leigos estava próximo de 80%, no início desta década. Esse é um quadro que precisa ser revertido em todos os Estados do Brasil, mesmo que já tenhamos hoje alguma redução nos percentuais. Como se pode pensar em melhorar a qualidade do ensino, se não há progressos quanto à melhoria na capacitação e qualificação dos professores?

           Outro programa implantado pelo Ministério da Educação e do Desporto e direcionado também para a redução das desigualdades na área educacional do nosso País é o Programa Nacional de Educação a Distância. Ele é parte de uma estratégia de enfrentamento dos problemas de baixa produtividade no ensino e da falta de eqüidade na educação pública. Atualmente, a educação a distância está sendo ministrada pelo Programa TV Escola, que tem por objetivo a formação, aperfeiçoamento e valorização dos professores da rede pública do ensino fundamental, por meio de um canal de televisão dedicado exclusivamente à educação. As escolas públicas do ensino fundamental com mais de 100 alunos recebem recursos para a compra de um kit tecnológico básico, composto de antena parabólica, televisão, videocassete, 10 fitas e receptor de satélite. Com uma programação centrada em cinco eixos temáticos, a saber: língua e linguagem; natureza, ciência e tecnologia; matemática; ética, cidadania e sociedade brasileira; e identidade social e cultural; professores, diretores, funcionários e alunos das escolas atendidas pelo Programa TV Escola receberão informações específicas e de caráter geral para ampliar seus horizontes de conhecimento, sem terem de se deslocar da escola ou de seu município para receber atualização nos grandes centros.

           O Programa Nacional de Educação a Distância já cadastrou mais de 700 escolas no Estado do Amazonas. Foram comprados por volta de 720 kits, dos quais mais de 380 já foram instalados, beneficiando, até o momento, uma população de alunos superior a 465 mil.

           Esse Programa está causando uma verdadeira revolução nos métodos tradicionais de aperfeiçoamento de professores e alunos em todo o Brasil, Senhor Presidente, mas é nas regiões mais distantes das capitais e das grandes cidades que se pode encontrar seu melhor índice de aproveitamento. Penso particularmente nos efeitos benéficos de tal Programa no meu Estado, o Amazonas, área sabidamente de baixa densidade demográfica, com escolas polvilhadas num território imenso, estando grande parte delas muito distantes dos centros onde se produzem e se divulgam os novos conhecimentos.

           O direito à educação é universalmente reconhecido como um dos direitos fundamentais do homem. É dever do Estado provê-la, direta ou indiretamente, aos seus cidadãos, sem distinção de gênero, raça, idade ou classe social. O Estado do Amazonas, que abriga o maior número de índios do País, não pode ignorar esse segmento importante de sua população e mantê-lo privado dos benefícios da educação. É preciso dar aos nossos indígenas do Amazonas o mesmo acesso à educação que se dá a qualquer criança, jovem ou adulto não-índio, porque também na educação reside um fator indispensável à comunhão e à integração nacional.

           Não podemos permitir que aos caboclos do interior, aos povos ribeirinhos e às comunidades indígenas se ofereça uma educação de segunda categoria quando comparada com aquela que oferecem as escolas das capitais e dos grandes centros. As crianças e os jovens que vivem espalhados pela imensa área do meu Estado, habitando nas zonas ribeirinhas ou na floresta, não podem mais permanecer em estado de ignorância sobre a realidade que seu olhar não alcança. Num mundo em que o rádio, a televisão, o computador, o telefone, o satélite nos colocam em comunicação com todas as regiões do planeta e trazem ao nosso conhecimento todos os acontecimentos mundiais, não tem mais lugar para o isolamento e para a ignorância.

           Além disso, é sabido e ressabido que uma população educada desenvolve melhores condições para respeitar e conservar a riqueza animal e vegetal do seu país. Beneficiado por uma educação de qualidade, o povo do Amazonas certamente cuidará melhor da floresta, dos rios, dos animais, da natureza. As relações dos amazônides com o meio ambiente, dentro do ecossistema amazônico, serão melhores. Também com tais atitudes se forja a cidadania, Senhor Presidente!

           Tenho certeza de que o impacto positivo da educação nas crianças, nos jovens e nos adultos que habitam o Amazonas contribuirá para a formação de uma verdadeira brigada na defesa dos interesses da região, como forma de preservar suas riquezas, sua flora e sua fauna.

           Com uma educação de qualidade, voltada para a solução dos problemas locais, mas sem perder de vista os interesses nacionais e a soberania do País, os amazônides saberão identificar nas ações externas aquelas que visam a dominação, a conquista e a exploração. Saberão proteger a Amazônia da cobiça internacional. Saberão defender cada palmo do solo amazônico como uma parte do Brasil à qual não se admite sequer a mais leve ameaça.

           Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/11/1997 - Página 26060