Discurso no Senado Federal

TECENDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DAS MUDANÇAS CLIMATICAS, A PROPOSITO DO IMPORTANTE PAPEL DA CONFERENCIA DAS PARTES DA CONVENÇÃO DAS MUDANÇAS CLIMATICAS, REALIZADA ENTRE OS DIAS PRIMEIRO A 12 DE DEZEMBRO, NA CIDADE JAPONESA DE KYOTO, QUE VISA ALCANÇAR UM ACORDO PARA FIXAREM METAS QUE REDUZAM A EMISSÃO DE GASES TOXICOS QUE PROVOCAM O AQUECIMENTO DE NOSSO PLANETA.

Autor
Coutinho Jorge (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando Coutinho Jorge
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • TECENDO ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DAS MUDANÇAS CLIMATICAS, A PROPOSITO DO IMPORTANTE PAPEL DA CONFERENCIA DAS PARTES DA CONVENÇÃO DAS MUDANÇAS CLIMATICAS, REALIZADA ENTRE OS DIAS PRIMEIRO A 12 DE DEZEMBRO, NA CIDADE JAPONESA DE KYOTO, QUE VISA ALCANÇAR UM ACORDO PARA FIXAREM METAS QUE REDUZAM A EMISSÃO DE GASES TOXICOS QUE PROVOCAM O AQUECIMENTO DE NOSSO PLANETA.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/1997 - Página 26827
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ANALISE, IMPORTANCIA, REALIZAÇÃO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, PAIS ESTRANGEIRO, JAPÃO, DEBATE, ALTERAÇÃO, CLIMA, MUNDO, BUSCA, ACORDO, OBJETIVO, REDUÇÃO, EMISSÃO, GAS, POLUIÇÃO INDUSTRIAL, ATMOSFERA.

O SR. COUTINHO JORGE (PSDB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no período de 1º a 12 de dezembro, o mundo se reúne na bela e ex-capital imperial japonesa, Kyoto, para a Grande Conferência das Partes da Convenção das Mudanças Climáticas. Ali, todos os países do mundo, especialistas, tentarão alcançar um acordo para fixarem metas que reduzam a emissão de gases tóxicos que provocam o aquecimento de nosso planeta Terra.

Esta Conferência deve ter um impacto profundo nas perspectivas da Humanidade, particularmente no século próximo. No entanto, existe uma forte resistência das indústrias, dos países produtores de petróleo e de carvão em tomar medidas que possam reduzir a emissão de gases tóxicos. É um momento crucial em que parlamentares, empresários, homens que têm a consciência do futuro da terra devem se posicionar no sentido de pressionar os governos a tomarem decisões efetivas neste grande encontro que se realiza em Kyoto.

Como Senador da República, presidente de Comissão que acompanhou a implantação das teses brasileiras na Rio-92 e como ex-Ministro do Meio Ambiente, durante o período de 1992/93, sinto-me obrigado a discutir e a trazer as minhas inquietudes em relação a esse tema defendido por órgãos importantes, como o Globo International, que reúne os parlamentares da Europa, dos Estados Unidos, do Japão, da Rússia e de outras regiões; a EarthAction, publicação de 144 países que defende realmente uma postura física dos vários governos em relação ao chamado efeito estufa.

Por isso, aqui estou para tecer algumas considerações a respeito das mudanças climáticas e do papel importante deste encontro em Kyoto; e é muito importante lembrar alguns antecedentes.

Na verdade, desde que a vida surgiu no planeta, as emissões naturais de vapor d’água, dióxido de carbono e outros gases têm ajudado a manter a temperatura dentro de limites que permitem a existência de vida na terra. Eles têm atuado, na verdade, como uma estufa de vidro, controlando o calor do sol em relação à atmosfera terrena. A esses efeitos naturais são agregadas atividades humanas, a queima de combustíveis fósseis, como o carvão, petróleo e gás; a emissão de de carbono, metano e óxido nitroso. Todos são gases que provocam o chamado efeito estufa. A destruição das florestas - que retém o dióxido de carbono da atmosfera em sua vegetação - produz mais dióxido de carbono na atmosfera.

Durante o último século, o ser humanos têm alterado a composição química do ar; o nível de dióxido de carbono tem aumentado em 25%, o óxido nitroso 19% e o nível de metano quase a 100%, gerando como resultado um planeta que está aquecendo de forma rápida , trazendo conseqüências altamente negativas para a vida na Terra.

Na área científica, os vários estudos mostraram e mostram a inquietação com este aquecimento da Terra, mas a situação ficou configurada, com a Implantação do Painel Intergovernamental sobre o Campo Climático - IPCC -, criado em 1988, sob a inspiração das Nações Unidas, em que mais de 12,5 mil especialistas do mundo, indicados pelos governos, passaram a estudar esses impactos da emissão de gases tóxicos na atmosfera da Terra.

E o importante é que a publicação do Segundo Estudo, em 1996, diz: “pela primeira vez, prova-se que o aquecimento da Terra é um fato científico, e o balanço da evidência sugere que isso é causado pelas atividades humanas”. O Informe também indicou que o ritmo de aquecimento esperado para o próximo século poderá ser maior do que o que ocorreu nos últimos 10 mil anos na Terra.

Mas, por que é importante a nossa preocupação com as mudanças climáticas? Esse grupo de cientistas do IPCC mostrou, em seu Informe de 96, que o mundo poderia aquecer até 3.5°C. Muitos podem pensar que é pouco. Mas é preciso lembrar que, do período anterior até 15 mil anos atrás, a temperatura do Planeta era somente de 3° a 5°C, e a perspectiva era aumentar 3,5°.

Segundo esse Instituto que envolve os maiores cientistas do mundo, os oceanos podem subir até um metro ao final do próximo século, à medida em que as calotas polares e glaciais venham se derretendo. Isso significa o total desaparecimento dos Estados insulares, das ilhas e as inundações nas Zonas Costeiras. A própria Antártica está realmente degelando, e a montanha surgindo, o que nunca aconteceu na história. Algo sério está ocorrendo; não temos dúvida disso.

Existem também muitos perigos. O aquecimento global poderia afetar as correntes oceânicas que regulam as temperaturas das várias regiões, e temos o exemplo do El Niño.

De acordo com esse Instituto, as variações climáticas regionais poderiam ocasionar secas e enchentes em muitas partes do mundo. E as próprias Nações Unidas advertem que, durante o próximo século, se poderá produzir guerras entre países pela escassez de água e recursos hídricos.

Prevê-se que efeitos climáticos extremos - como os furacões - seriam mais freqüentes, e o aquecimento global poderia conduzir à destruição das florestas, à extinção das várias espécies, devido às mudanças do seu habitat.

Os desertos vão se estender, e há um projeto que realmente tenta diminuir a desertificação de certas regiões.

As queimadas aí estão. Em função das mudanças climáticas, elas se ampliam de forma incontrolável, para dizer simplesmente que a humanidade está levando a cabo um instrumento ou um método científico gigantesco, é verdade, com conseqüências porém desastrosas. Aqui não significa uma visão catastrófica, significa uma visão científica, provada, de que o mundo está mudando. E o que os nossos governos fizeram, até então, para impedir essa catástrofe?

Temos que lembrar que, em 1992, tivemos a Cúpula da Terra ou a Rio 92, o maior encontro mundial, que envolveu mais de 150 países, que firmaram cinco documentos, entre eles, o chamado "Mudanças Climáticas". Trata-se de uma convenção, um acordo assinado por todos os países, que visava exatamente evitar todo o caos previsto para o futuro da Terra.

As convenções sobre biodiversidade, obrigatoriamente, têm que ser aprovadas pelos Parlamentos dos diversos países.

Em 3 de fevereiro de 1994, praticamente dois anos depois, o Congresso Nacional aprovou a Convenção das Mudanças Climáticas, e essa aprovação mostrou compromisso.

Entre os aspectos importantes aprovados, essa Convenção dispõe claramente no seu artigo 2º que:

"O objetivo final desta Convenção e de quaisquer instrumentos jurídicos com ela relacionados que adote a Conferência das Partes é o de alcançar, em conformidade com as disposições pertinentes desta Convenção, a estabilização na concentração de gases de efeito estufa na atmosfera num nível que impeça uma interferência antrópica perigosa no sistema climático."

Outro ponto importante é definido no art. 3º, que diz:

"Em decorrência, as Partes países desenvolvidos devem tomar a iniciativa no combate à mudança do clima e a seus efeitos negativos.

Devem ser levadas em plena consideração as necessidades específicas das Partes países em desenvolvimento..."

A Convenção foi além e decidiu claramente que essas emissões antrópicas do dióxido de carbono e de outros gases de efeito estufa, não controladas pelo protocolo Montreal, deveriam retornar aos níveis de 1990. Portanto, há um compromisso assinado por todos os países do mundo para retornar, pelo menos, no ano 2000, a emissão de gases tóxicos geradores do efeito estufa para os níveis de 1990.

Quero lembrar que a globalização da economia traz seqüelas, conseqüências. Temos um exemplo claro do que está ocorrendo no mundo. Mas, geralmente, privilegiam-se países desenvolvidos em detrimento dos países atrasados ou emergentes.

No entanto, há soluções a médio e longo prazos para isso. Mas, em relação à globalização ou mundialização, podemos dizer, da irresponsabilidade da emissão de gases tóxicos. Temos conseqüências irreparáveis para a nossa morada cósmica, que é a própria Terra.

Na globalização da economia, perdem alguns países; na globalização da emissão dos gases tóxicos de forma irresponsável, todos perdem, ricos e pobres, desenvolvidos e subdesenvolvidos. A própria Terra está em xeque no terceiro milênio; não tenham dúvida sobre isso. Dizem até que a natureza não reclama as agressões que sofre, mas que sabe se vingar delas a médio e longo prazos, o que parece estar ocorrendo em relação às mudanças climáticas da Terra.

A Conferência de Kyoto, portanto, é fundamental. Nesses dias, ela vai tomar decisões importantes em favor do futuro da Terra e do mundo. E quero lembrar que os governos vão decidir metas e fixar reduções de gases de efeito estufa a partir do ano 2000. Existe, por exemplo, proposta dos países da Aliança dos Estados Insulares, que propõe redução de 20% dos níveis de 1990. Seria um primeiro passo, mas o próprio IPCC, que envolve todos os maiores cientistas do mundo, diz que a diminuição deve ser, pelo menos, entre 50 e 70% do total das emissões, de modo a estabilizar os níveis atuais de efeito tóxico ou efeito estufa na atmosfera.

Perguntaríamos: Como se pode reduzir a emissão de gases que têm esse efeito estufa? Segundo os cientistas, três são as chaves desse processo.

Primeiramente, devemos mudar os combustíveis fósseis por energias renováveis, tais como energia solar, a eólica, oriunda do vento, a biomassa e a hidráulica, em pequena escala, pelo impacto que as grandes hidrelétricas produzem para o meio ambiente.

Devemos utilizar, também, energia mais eficiente, na qual inclui mudar o automóvel privado, a médio prazo, por um transporte coletivo melhorado.

O terceiro grande aspecto apontado pelos cientistas é a redução da destruição das florestas. Todas as coisas são possíveis tecnicamente, mas precisam de uma decisão política de alcance mundial. Não temos dúvidas. Tudo isso melhoria as condições de vida das cidades, dos países e poderia resolver e evitar a catástrofe que os grandes cientistas prevêem para a terra. E nós perguntaríamos: que acordo se deve discutir em Kyoto para se evitar isso? Na verdade os governos reunidos em Kyoto devem fixar o limite global de emissão dos gases de efeito estufa; reduzi-los ano a ano, até que sejam suficientemente baixos para prevenir qualquer interferência na atmosfera de forma negativa. Mas existe uma primeira pergunta, que todos fazem: quem poderia emitir certo percentual do total global da terra? Podemos dizer que atualmente 20% dos países mais ricos emitem a maior parte dos gases de efeito estufa que envolvem a Humanidade.

Só para citar, com base em 1990, os países que emitem mais gases - sobretudo gás carbônico - na atmosfera são, em primeiro lugar, os Estados Unidos com 36%, Rússia com 17%, Japão com 8%, Alemanha com 7% e Grã-Bretanha com 4%. O próprio Ministério de Ciência e Tecnologia do Brasil mostra que os Estados Unidos despejam 4,9 mil toneladas por ano per capita de gás carbônico na atmosfera, enquanto que as emissões brasileiras não chegam a 0,3 toneladas por ano. A frota de veículos dos Estados Unidos, com mais de 160 milhões, realmente emite uma quantidade fantástica desses gases. O Brasil possui apenas 10% dessa frota. Portanto, a grande responsabilidade do efeito estufa, suas seqüelas e conseqüências graves são dos grandes países desenvolvidos e industrializados, não temos dúvida nenhuma. Por isso mesmo é que os países menos desenvolvidos também não vão estar de acordo em reduzir seus níveis de emissão por pessoa, já que são baixos. Com isso, eles iriam privilegiar os países desenvolvidos que têm o nível de emissão muito alto, gerando um conflito.

Portanto, as decisões a serem tomadas nessa Convenção que se realizará em Kyoto devem ser tomadas sob a base de eqüidade. Os países devem levar em consideração uma solução simples e equitativa, dividindo o limite global entre as nações, baseado em iguais direitos de emissão per capita. E, para os países atrasados ou em desenvolvimento, teríamos um período de transição a partir do qual nenhuma nação poderia emitir mais a sua quota justa anual.

Ora, é complicado, sim, muito complicado. Os interesses são divergentes entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Mas quem vai pagar isso? Quem vai pagar essa estratégia que se está propondo? E o problema gera recursos financeiros para promover o desenvolvimento das chamadas energias renováveis, melhorar o transporte público e proteger as florestas. Mas, para isso, os países do Terceiro Mundo têm que ter recursos. Durante a Rio-92 as nações industrializadas se comprometeram a usar 0,7% de seus produtos nacionais brutos em favor dos problemas ambientais dos países em desenvolvimento. Entretanto, isso não vem ocorrendo. As Nações Unidas, bem como o mundo inteiro percebe que isso não foi cumprido, portanto, ela propõe financiar o desenvolvimento ecologicamente sustentável por intermédio, entre outros, do estabelecimento de um imposto internacional sobre combustível - combustível de aviação, por exemplo. O próprio Brasil propõe algo interessante também: a criação de um fundo de desenvolvimento “limpo”, com base no princípio de que o poluidor tem de pagar. Os ricos contribuiriam para esse fundo na proporção em que deixassem de cumprir as metas quantitativas da emissão de gases tóxicos. É uma proposta de bom-senso, coerente essa que o Brasil propõe, ao lado da proposta das Nações Unidas em relação aos combustíveis dos aviões.

Esses dez dias em Kyoto serão de discussões importantes, em que conflitos e interesses divergentes estarão em confronto. Mas é importante mostrar, por exemplo, que vários países, como os Estados Unidos, não têm uma proposta ou uma meta fixa. Eles exigem que os outros países desenvolvidos também tenham uma meta de redução na emissão desses gases tóxicos. Na América Latina, o Brasil propõe, de forma clara, a emissão em torno de 30% abaixo dos níveis observados em 1990, a partir do ano 2020. Mas os países africanos, por exemplo, propõem que haja um período de transição para que possa ser fixada uma meta global. Os principais países exportadores de petróleo chegam ao absurdo de propor um sistema compensatório de perdas dos lucros que eles não terão com a redução da emissão de gases tóxicos. A União Européia, mais equilibrada, defende que sejam observados níveis de emissão 7,5% abaixo daqueles observados em 1990 no ano 2005 e 15% no ano de 2010.

Portanto, se analisarmos as várias regiões, os vários países, os vários interesses em jogo, vemos que há um grande conflito. Um conflito grave, sério do qual todos nós devemos ter consciência. A Terra está numa posição difícil, a temperatura se eleva. A opinião mundial, os parlamentos, as organizações não-governamentais podem ter um papel importante nessa mudança.

Por isso, Sr. Presidente, para concluir, quero relembrar aquilo que eu disse há pouco: a natureza não reclama das agressões sofridas, mas ela se vinga. E não precisamos de forças telúricas ou esotéricas que possam prenunciar um apocalipse na Terra. Não é preciso. O homem tece progressivamente esse apocalipse que virá, se não houver mudança grave na decisão dos países. Ainda há tempo de consertar essa situação se o bom-senso prevalecer, se a visão global da Terra for de interesse dos países, se houver uma responsabilidade compartilhada entre os países, de forma a estabelecer para os países desenvolvidos uma cota de responsabilidade nesse processo e apoiar os países em desenvolvimento, no que diz respeito à tecnologia mais avançada e à questão financeira, para que eles também possam incorporar-se nesse processo global.

Podemos evitar os efeitos desse apocalipse, que, conforme mostram os cientistas do IPCC, ocorrerá. Se isso não ocorrer, só Deus sabe o que poderá acontecer no mundo e em cada país da Terra.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é fundamental para o futuro da Terra o que está sendo decidido aqui hoje. É importante que acompanhemos as decisões que estão sendo tomadas. O Brasil tem uma posição clara, mas é importante que todos sejam responsáveis por aquilo que será decidido em favor do futuro da humanidade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/1997 - Página 26827