Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO ESCRITOR GOIANO BERNARDO ELIS.

Autor
Albino Boaventura (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Albino Gonçalves Boaventura
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO ESCRITOR GOIANO BERNARDO ELIS.
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/1997 - Página 26879
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, BERNARDO ELIS, ESCRITOR, ESTADO DE GOIAS (GO).

O SR. ALBINO BOAVENTURA (PMDB-GO. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Goiás está vivendo os dias tristes de uma grande perda. Bernardo Élis, o nome mais consagrado da literatura goiana, foi para a companhia do Senhor, e deixou entre nós, seus amigos e admiradores, um enorme sentimento de ausência e de saudade que vai perdurar para sempre, tanto quanto a sua obra imorredoura. Nos seus 82 anos de vida e nos mais de 50 anos de intensa produção literária, o nosso ilustre artista da palavra e da crítica social foi presença marcante entre as várias gerações que tiveram o privilégio de seu convívio, e fez desse dom divino do texto inteligente, fino e profundo, uma tribuna viva contra as desigualdades sociais.

A grandeza humana de Bernardo Élis foi sempre muito maior que a sua vida pessoal simples e despojada. Ele serviu aos seus contemporâneos com a força do ardor intelectual voltado para a justiça, mas os seus caminhos foram sempre os caminhos da renúncia, da simplicidade. As glórias do reconhecimento público não foram buscadas, mas vieram naturalmente. Foi assim que chegou ao círculo fechado da Academia Brasileira de Letras, uma consagração que não havia chegado para qualquer outro goiano dedicado à literatura. Nunca trabalhou pelo sucesso de seus romances, preferindo a vida pacata do homem comum recolhido à existência humilde e solitária. Viu grande parte de suas obras levadas para o cinema, como contribuições referenciais sobre as nossas realidades, mas não induziu as iniciativas, que vieram espontaneamente.

Nascido em Corumbá de Goiás, Bernardo Élis jamais abandonou os vínculos profundos de seus sentimentos com as raízes telúricas. Foi desse mirante que ele projetou a sua visão de mundo, em ensaios, contos e romances, no estilo cortante, denso e profundo contaminado pela expressão de caráter regionalista. Seu jeito de escrever era o jeito de falar de seu povo, sem concessões ao pedantismo literário, mas com a força do observador que sabia colocar sentido nas coisas dos homens, da terra e da vida. Sem imitar, fazendo ele mesmo uma escola de luz própria e independente, ele ajudou a enriquecer essa plêiade ilustre dos produtores de grandes clássicos, como Gilberto Freyre, Jorge Amado, Guimarães Rosa e José Lins do Rego.

O que me traz a esta tribuna, Srªs e Srs. Senadores, é o meu compromisso de reverenciar a memória da figura mais importante e mais marcante das letras do Estado de Goiás. Bernardo Élis produziu, em vida, a contribuição mais rica para colocar o meu Estado na história da literatura brasileira, ao lado de saudosos expoentes como Carmo Bernardes e Cora Coralina. O romance "O Tronco", sua obra maior, está na décima edição. Uma grande proeza para os limites acanhados do nosso mercado editorial. Infelizmente, ele morreu antes que se completasse a produção cinematográfica desta sua grande obra.

Em junho deste ano, o Senador Mauro Miranda ocupou esta tribuna para pedir ao Ministério da Cultura uma homenagem especial a Bernardo Élis, antes que a doença insidiosa o levasse de nossa companhia. O Ministro Francisco Weffort ouviu o apelo e comunicou ao Senador o seu interesse em atender à sugestão. Não sei se houve tempo para viabilizar as intenções do Governo. Ao justificar o seu pedido, o Senador Mauro Miranda afirmou, em seu discurso:

Apesar de todo o reconhecimento público de seu patrimônio literário, Bernardo Élis não deixa de ver-se como um intelectual de província. Vive de modesta aposentadoria de três salários mínimos, fala da vida espartana dividida com a mulher querida, e não esconde alguns queixumes sobre os limites impostos aos escritores que permaneceram longe dos grandes centros.

O ilustre companheiro que tenho a honra de substituir temporariamente nesta Casa reproduziu o trecho de uma entrevista dada pelo escritor ao jornal O Popular:

“- Eu me sinto excluído, porque todo o interior do Brasil, fora Rio de Janeiro e São Paulo, é excluído do mercado. Então a literatura brasileira só existe mesmo como mercado para quem mora em algum desses dois locais. Eu até consegui demais, porque cheguei à Academia Brasileira de Letras. Acho que eu tinha direito a uma projeção maior no país. Eu luto por isso. Estou fazendo parte, embora com 81 anos e adoentado, para divulgar a literatura de Goiás, que ainda é muito desconhecida.”

Concordo inteiramente com o Senador Mauro Miranda, quando disse que o desabafo de Bernardo Élis refletia sentimentos de frustração, sem a pequenez das amarguras. Faltava-lhe, para completar a rica biografia, o reconhecimento oficial pela obra que vai perdurar sem as limitações do tempo.

O nome de Bernardo Élis e a sua contribuição para perpetuar a presença de Goiás na literatura brasileira são superiores ao seu tempo neste mundo. Ele se foi, mas ficam os seus exemplos para as novas gerações. Mas jamais será tarde para reconhecer-lhe o valor da obra, na dimensão de sua grandeza. O patrimônio literário que ele produziu, desde o "Ermos e Gerais", publicado em 1944, fica para nós como algo que deve ser permanentemente analisado, compreendido e assimilado, para não ser esquecido. É a melhor homenagem que podemos dedicar a este grande brasileiro.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/1997 - Página 26879