Pronunciamento de Ademir Andrade em 05/12/1997
Discurso no Senado Federal
PARTICIPAÇÃO DE S.EXA., EM LISBOA, PORTUGAL, A CONVITE DA FEDERAÇÃO NACIONAL DOS TECNICOS INDUSTRIAIS, DO III CONSIG - CONGRESSO DE SINDICALISMO GLOBAL, QUE TRATOU DO TEMA 'ECONOMIA DO TRABALHO NO MERCADO GLOBAL'.
- Autor
- Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
- Nome completo: Ademir Galvão Andrade
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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MOVIMENTO TRABALHISTA.:
- PARTICIPAÇÃO DE S.EXA., EM LISBOA, PORTUGAL, A CONVITE DA FEDERAÇÃO NACIONAL DOS TECNICOS INDUSTRIAIS, DO III CONSIG - CONGRESSO DE SINDICALISMO GLOBAL, QUE TRATOU DO TEMA 'ECONOMIA DO TRABALHO NO MERCADO GLOBAL'.
- Publicação
- Publicação no DSF de 06/12/1997 - Página 27189
- Assunto
- Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA.
- Indexação
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- PARTICIPAÇÃO, ORADOR, CONGRESSO INTERNACIONAL, SINDICATO, REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL, DISCUSSÃO, CRITICA, PROCESSO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, TENTATIVA, SUBSTITUIÇÃO, PODER PUBLICO, FAVORECIMENTO, PODER ECONOMICO, IMPEDIMENTO, PRODUÇÃO INDUSTRIAL, PRODUÇÃO AGROPECUARIA, MUNDO, PREJUIZO, TRABALHADOR, BENEFICIO, CLASSE EMPRESARIAL.
O SR. ADEMIR ANDRADE (Bloco/PSB-PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Ramez Tebet, Senador Roberto Requião, a convite da Federação Nacional dos Técnicos Industriais, estive, durante a semana passada, em Lisboa, Portugal, para participar do III Consig, Congresso de Sindicalismo Global, que tratou do tema Economia do Trabalho no Mercado Global.
Participaram desse encontro sindicalistas de todos os países de língua portuguesa e de língua espanhola. O encontro foi basicamente organizado pela Fentec e pela Sinergia, que é o sindicato do setor de energia de Portugal. Lá estavam também representantes dos Estados Unidos, da Alemanha, além de representantes de trabalhadores de todos os países de língua espanhola e portuguesa. Participaram também outros brasileiros, entre os quais, José Aparecido de Oliveira, Ex-Embaixador do Brasil em Portugal, Alceu Collares, Ex-Governador do Rio Grande do Sul, Carlos Chiarelli, Ex-Senador pelo Rio Grande do Sul, entre outros convidados.
E o tema do Consig foi a Economia do Trabalho no Mercado Global. Fiquei feliz por perceber que os trabalhadores do mundo estão compreendendo esse processo, opondo-se a ele e questionando-o, porque, na verdade, Sr. Presidente, a globalização é confundida com integração. Somos diariamente bombardeados pela propaganda oficial do Governo, nas rádios, nas televisões, nos jornais, a mostrar que a conseqüência do processo de globalização, o processo de destruição do Estado, de aniquilamento do Estado, de entrega do Estado às mãos de empresas privadas é algo positivo; e também a compreendermos que essa globalização parece uma integração, parece algo em torno do qual o mundo está se unindo para resolver os seus próprios problemas.
Os trabalhadores e nós estamos buscando resistência a esse processo, porque isso, na verdade, é uma grande mentira, uma grande farsa. A globalização não resolve os problemas do mundo, não tem nada a ver com solidariedade, não tem nada a ver com a solução dos problemas dos povos mais pobres e da melhoria dos países menos desenvolvidos do nosso Planeta - aliás, a globalização interessa apenas aos países do G-7 e a alguns chamados periféricos e em processo de desenvolvimento. Os países mais pobres do mundo, da África, da Ásia nem sequer são lembrados nesse processo, até porque, economicamente, não têm influência no mesmo.
É preciso ficar claro que globalização é algo que interessa apenas às corporações internacionais. Se nós, trabalhadores do mundo, não tomarmos cuidado, em breve seremos governados por fantasmas, pelos donos das grandes corporações, pelos donos dos bancos, que são pessoas que não aparecem, não pedem voto e não dão satisfação a ninguém, mas que, nesse processo, passam a dar as ordens de como as coisas devem acontecer no mundo. Nesse processo de globalização, o poder político passa a ser um poder subserviente, um poder empregado, um poder que exerce aquilo que os banqueiros e os empresários das multinacionais determinam à classe política.
Portanto, estamos a construir um mundo onde o povo não existe, onde o povo é apenas máquina, onde o povo é utilizado como objeto. O político passa a ser instrumento do poder econômico, que, na realidade, torna-se o dono das verdadeiras decisões. Esquecem-se as conquistas que vêm sendo alcançadas ao longo de décadas, como a questão dos direitos humanos, dos direitos sociais e dos direitos dos trabalhadores.
Quero ressaltar que, nesse processo de globalização, não há uma preocupação com a fome, com as guerras, com os problemas de certos países pobres do mundo. Não há uma preocupação no sentido de se atender às necessidades desses países. A globalização é algo perverso, porque não diz respeito ao povo; ela chega a impedir o processo produtivo.
Vimos na semana passada produtores da França serem massacrados pela segurança, porque estavam produzindo leite além da quantidade que a Organização do Comércio Mundial lhes permitia. Eles não podem produzir, porque a questão econômica prevalece sobre o direito do povo do Planeta Terra.
Já vimos, no Brasil, em épocas passadas, queimar-se, destruir-se o café produzido para se manter o preço internacional; e os trabalhadores, nessas circunstâncias, são levados pela propaganda massiva de que isso é natural, normal, que temos de aceitar essa situação. Os trabalhadores se esquecem da questão política maior e passam a fazer aquilo que o poder econômico determina, ou seja, vão preparar-se, vão aperfeiçoar-se para competir no mercado de trabalho, que se torna restrito a cada dia. E a preocupação deixa de ser política, deixa de ter o comando político para ser instrumento e gerar a competição entre os próprios trabalhadores. Esse é um caminho errado que os trabalhadores estão tomando hoje.
Os trabalhadores têm de ter a compreensão de que a luta não pode ser simplesmente sindical, de organização de defesa da sua categoria, mas, acima de tudo, tem de ser política, da busca do poder, para que este poder seja integrado ao interesse da sociedade, e não submisso ao interesse do capital, como estamos a assistir nos grandes países do mundo e, essencialmente, no nosso, onde o Presidente Fernando Henrique Cardoso é nada mais do que um instrumento do poder econômico do Planeta Terra.
Vale ressaltar que, ao invés de ficar preocupado apenas com o emprego, é preciso olhar o mundo como um todo. A necessidade de consumo da população mundial não é atendida, é evidente que não é atendida! Portanto, há espaço para se aumentar a produção no nosso Planeta. Metade do mundo, de certa forma, passa fome, passa necessidade e não tem acesso aos bens mais comuns: um rádio, uma televisão, uma geladeira. Então, há espaço para a produção, há espaço para consumo. É preciso aumentar essa produção. Se o poder econômico olhasse isso, observando o aspecto solidariedade, preocupar-se-ia em atender esse segmento que necessita consumir, que representa mais da metade da população do nosso Planeta.
É preciso lembrar também que existe espaço para ser ocupado. Vamos fazer uma comparação: um País como o Brasil, com 150 milhões de brasileiros, tem espaço para abrigar 10 vezes mais a nossa população. Temos um potencial e uma capacidade produtiva 50 vezes maior do que a que efetivamos hoje. E a Inglaterra, por exemplo, é um país menor do que o Município de Altamira, no Estado do Pará. O Brasil deve ser 60 vezes maior. E a Inglaterra tem uma população que é apenas duas vezes e meia menor do que o Brasil. Como se pode admitir que o Produto Interno Bruto do Brasil chegue a US$800 bilhões e a Inglaterra tenha um Produto Interno Bruto que vai a US$1 bilhão e 300 milhões? Portanto, um país que é 60 vezes menor tem um Produto Interno Bruto maior do que o nosso. Isso é uma demonstração clara de que há espaço para se aumentar a produção. Se eles são capazes de fazer tanto com uma população duas vezes e meia menor do que a nossa, com uma área territorial quase 60 vezes menor, por que não podemos produzir mais?
Quero demonstrar que esse espaço existe no mundo para que haja mais produção, para que haja mais emprego, desde que a política se sobreponha ao interesse econômico, e não que o interesse econômico dê ordens ao segmento político.
Por isso, Sr. Presidente, fico feliz em ver a reação dos trabalhadores no mundo com relação à questão da globalização. A globalização leva países como o nosso a privatizar o seu patrimônio, a entregá-lo basicamente a esse segmento que está dominando e querendo comandar o Planeta Terra. Vemos um Governo como o nosso, que passa a imagem de governo competente, de governo sério - e, nesse ponto, questionei o Ministro Pedro Malan. O Governo Fernando Henrique Cardoso iniciou com R$60 bilhões de dívida interna, cerca de US$100 bilhões de dívida externa, já vendeu metade do patrimônio nacional e, no entanto, a dívida interna passou para US$200bilhões e a externa para US$120bilhões. Que competência pode ter um Governo como esse, que ao longo de quase três anos aumenta a dívida, vende e destrói metade do patrimônio do Estado? Que competência pode ter o Governo de Fernando Henrique Cardoso?
O pior é que ao privatizar empresas como a Vale do Rio Doce, o Governo de Fernando Henrique Cardoso deu de graça um patrimônio público, pois as contas do Governo estão a demonstrar, e é preciso repetir isso, que o aumento dos juros, em função da quebra da Bolsa de Hong Kong, foi para manter as reservas cambiais, basicamente construídas com o estímulo à aplicação no nosso sistema financeiro de recursos que vêm para cá e não rendem nada, apenas ganham. Quando se ameaça retirá-los, o Governo aumenta os juros para que eles aqui permaneçam.
Somente com a decisão de aumentar os juros para manter o dinheiro nesse sistema de especulação, em 15 dias o Governo jogou fora os US$3,3 bilhões que recebeu da venda da Companhia Vale do Rio Doce. E não foi só isso, porque ao vender a Vale e não receber absolutamente nada, já que o dinheiro foi perdido no aumento da dívida interna brasileira, o Governo perdeu a possibilidade de estabelecer uma política de industrialização desses minérios no nosso País.
Os Estados Unidos, a União Européia e o Japão transferem para seus países as nossas reservas e muitas vezes nem as usam, guardando nos seus territórios minérios que não possuem, como o manganês, o nióbio e a bauxita, que produz o alumínio. Eles dependem do nosso minério e vão, a partir de agora, sendo seus donos, determinar não apenas o seu preço de compra, mas também a sua política de industrialização.
Para o Brasil mudar a sua situação, precisava mudar a pauta de sua exportação. Hoje, 70% do que é exportado são produtos semi-elaborados, que não agregaram mão-de-obra, que não foram industrializados em nosso País. No entanto, é inversa a nossa importação: 90% do que importamos são produtos acabados, que geraram emprego lá fora, deram aos trabalhadores de outros países condições de dignidade e vêm apenas para o nosso consumo. São essas coisas que precisam mudar na política do Presidente Fernando Henrique Cardoso.
É preciso aumentar a industrialização no Brasil, não se permitindo a exportação desses produtos semi-elaborados, que gerariam mais empregos no nosso País, ao contrário do que está fazendo o Governo com sua proposta de contrato de redução de direitos trabalhistas.
Enquanto a Alemanha reduziu a sua jornada de trabalho para 35 horas - e já pensa em baixar para 30 horas - e a Holanda, para 32 horas semanais, em função da automação, da informatização e da modernização, aqui pensamos em trabalho aos domingos, em reduzir o direito do trabalhador, atendendo à pressão do capital internacional. É isso que estamos a fazer e é isso que precisa ser combatido.
Encerro, Sr. Presidente, falando da minha alegria de ter sido convidado por trabalhadores - de ter, inclusive, a minha passagem paga por eles - para falar sobre um tema de tamanha importância como esse. Volto de Portugal satisfeito por ter participado desse debate com mais de 400 sindicalistas de cerca de 20 países, e feliz por ver que eles estão compreendendo esse processo, que estão dispostos a combatê-lo e a conquistar o poder político, para que ele não continue a ser instrumento do poder econômico, como tem ocorrido no nosso Brasil.
Muito obrigado.