Pronunciamento de Casildo Maldaner em 08/12/1997
Discurso no Senado Federal
DEBATENDO O SUBSTITUTIVO DA CAMARA DOS DEPUTADOS AO PROJETO QUE REGULAMENTA OS PLANOS DE SAUDE PRIVADOS, EM TRAMITAÇÃO NESSA CASA. SUCATEAMENTO DA REDE HOSPITALAR PUBLICA NO PAIS.
- Autor
- Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
- Nome completo: Casildo João Maldaner
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SAUDE.:
- DEBATENDO O SUBSTITUTIVO DA CAMARA DOS DEPUTADOS AO PROJETO QUE REGULAMENTA OS PLANOS DE SAUDE PRIVADOS, EM TRAMITAÇÃO NESSA CASA. SUCATEAMENTO DA REDE HOSPITALAR PUBLICA NO PAIS.
- Publicação
- Publicação no DSF de 09/12/1997 - Página 27243
- Assunto
- Outros > SAUDE.
- Indexação
-
- ANALISE, LIMITAÇÃO, SENADOR, VOTAÇÃO, SUBSTITUTIVO, CAMARA DOS DEPUTADOS, REGULAMENTAÇÃO, PLANO, SAUDE, SEGURO-DOENÇA, PROVOCAÇÃO, IMPEDIMENTO, SENADO, FUNDAMENTAÇÃO, DECISÃO, REFERENCIA, ASSUNTO.
- DISCORDANCIA, POSIÇÃO, SEBASTIÃO ROCHA, SENADOR, QUALIDADE, RELATOR, SENADO, SUBSTITUTIVO, CAMARA DOS DEPUTADOS, REGULAMENTAÇÃO, SEGURO-DOENÇA, REFERENCIA, SUPRESSÃO, ARTIGO, AUTORIZAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, CAPITAL ESTRANGEIRO, EMPRESA PRIVADA, PLANO, SAUDE, MOTIVO, POSSIBILIDADE, MELHORIA, ATENDIMENTO, DIAGNOSTICO, TRATAMENTO, UTILIZAÇÃO, TECNOLOGIA, PAIS INDUSTRIALIZADO, PRIMEIRO MUNDO.
- DISCORDANCIA, SUPRESSÃO, ARTIGO, SUBSTITUTIVO, REGULAMENTAÇÃO, SEGURO-DOENÇA, REFERENCIA, CONCORRENCIA PUBLICA, CONTRATAÇÃO, SERVIÇO, ASSISTENCIA MEDICA, SERVIDOR, ORGÃOS, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
- IMPORTANCIA, URGENCIA, VOTAÇÃO, SENADO, SUBSTITUTIVO, REGULAMENTAÇÃO, SEGURO-DOENÇA, PAIS.
O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, considerando "simplesmente antiético, e até mesmo imoral, excluir cobertura de despesas com doenças contraídas independente da vontade do segurado", o nobre Senador Iram Saraiva apresentou projeto a esta Casa, em 1993, proibindo qualquer exclusão de cobertura de despesas com tratamento médico em contratos para atendimento médico-hospitalar com empresas privadas de seguro-saúde, com planos de assistência médica, de medicina de grupo e assemelhados, que vinham redundando, ainda, em elevado número de recursos à Justiça e entidades como o Procon.
Projeto simples, limitado a três curtos artigos, que o Senado aprovou e enviou ao exame da Câmara dos Deputados. Esta devolveu-nos, depois de quatro anos de debates e tramitação, extenso substitutivo, no qual a regulamentação, com grande abrangência, disciplina os serviços prestados pelas empresas de seguro-saúde, bem como das operadoras dos planos de saúde que, do nosso ponto de vista, devem ter legislação específica.
O trabalho na Câmara dos Deputados desenvolveu-se sob forte polêmica, dada a vasta importância da matéria, que diz respeito a cerca de 40 milhões de brasileiros, bem como a poderosos interesses financeiros envolvidos num mercado que cresce de modo espetacular, acompanhando a falência do sistema público de saúde.
De plano, a que se destacar que o seguro-saúde é uma modalidade de seguro pessoal, oferecido e operado por uma seguradora e regulamentado por normas legais próprias, diferentemente dos planos de saúde que constituem contratos de prestação de serviço de assistência médico-hospitalar, feitos entre, por um lado, pessoas ou empresas e, por outro lado, empresas ou cooperativas que vendem esses serviços.
O seguro-saúde é hoje a modalidade de seguro que mais cresce no setor e, na opinião dos especialistas da área, será o principal produto da década. Foi instituído entre nós em 1966, podendo ser visto como decorrente da crise em que, já naquela época, debatia-se a Previdência Social após a unificação dos antigos institutos e caixas de pensões e aposentadoria.
Mesmo apresentando crescimento positivo, após sua implantação em 1977, pouco eram os segurados que atraía, até que o setor sofresse, em 1994, a autêntica explosão. Só naquele ano, cresceu o mercado segurador em 64%, hoje abrangendo 40 milhões de brasileiros e movimentando mais de R$7,2 bilhões.
É evidente, Sr. Presidente, que essa súbita explosão, ocorrida em menos de três anos, conforme sugeri há pouco, é fruto da desesperança dos brasileiros quanto à assistência à saúde, direito que lhes é assegurado constitucionalmente. E tudo coincidindo com o sucateamento da rede hospitalar pública, hoje reduzida a hospitais paralisados ou em funcionamento precário e com imensos sacrifícios por parte do pessoal daqueles hospitais que ainda funcionam, como é notório.
A assistência médico-hospitalar tornou-se um dos mais promissores negócios do País, constituindo mercado de potencialidade capaz de atrair o capital internacional. Estamos, sem dúvida, diante da inequívoca falência do Estado no setor, tal como começa a se dar no tocante à segurança pública, que também vem propiciando outra formidável fonte de investimentos privados. É o Estado retirando-se precisamente de setores que, juntamente com a educação, mais preocupam e alarmam a Nação. Os dados constam de todas as pesquisas de opinião pública realizadas por iniciativas governamentais ou privadas.
Sr. Presidente, nobres Colegas, imensa foi a celeuma estabelecida na Câmara dos Deputados no decorrer da discussão e votação do projeto que ora nos cabe examinar. Discordâncias e protestos contra o texto, que nos é agora submetido, surgem de todos os setores, não deixando nenhum deles de reclamar alterações no projeto atual.
O projeto que aprovamos e remetemos ao exame da Câmara dos Deputados de lá nos retorna como vasto estatuto que objetiva regular, de forma minuciosa, o seguro-saúde, bem como todas as formas de planos de saúde existentes. Segundo entendimento do Relator, o nobre Senador Sebastião Rocha, a nós, no Senado, cabe apenas referendar ou rejeitar o que nos vem da Câmara, sendo-nos lícito apenas apresentar emendas supressivas, de difícil execução, pois, em pontos fundamentais, podem redundar em mal maior. Será atirar no que vemos, atingindo o que não vemos.
O Ministro da Saúde, Carlos Albuquerque, publicou artigo na imprensa saudando o fruto do trabalho da Câmara, contra o qual, não obstante, erguem-se gregos e troianos. Segundo S. Exª, há que congratular com “avanços de regulamentação”, o que nos alivia, por exemplo, do temor que nos vem da afirmativa de que a simples alegação de epidemia isentará planos de saúde de toda responsabilidade. O estatuto aprovado pela Câmara, abrangendo setores diversos, vai a minúcias em que a capciosidade é pródiga, ao mesmo tempo em que atende a ardentes reivindicações dos grupos privados envolvidos com planos de saúde, setor que vem abastecendo copiosamente nossos já supercongestionados tribunais. Excetuando o entusiasmo do Ministro Carlos Albuquerque, de toda parte nos vêm advertências, protestos e denúncias em torno da legislação, de abrangência e importância excepcionais.
Nobre Presidente e nobres Colegas, rápido estudo da proposição e de manifestações sobre ela já surgidas - a começar pelo artigo ardente, desesperado mesmo, do Deputado José Aristodemo Pinotti, inquestionavelmente autoridade no assunto - me dá plena convicção de que estamos diante de xeque-mate que nos impede toda decisão. Ou se aprova o texto que recebemos sem modificação, ouvidos fechados à celeuma que se ergue, de todos os lados, ou rejeitamos o projeto, retornando à estaca zero em assunto que, há muito, está a reclamar legislação específica. A não ser que passemos ao exame cuidadoso do substitutivo, por meio de comissão especial, visando modificá-lo no que for necessário, sem que disso decorra o risco de vermos tornada lei a íntegra da decisão dos Srs. Deputados.
Todos que votamos e aprovamos o projeto do nobre Senador Iram Saraiva tivemos como objetivo unicamente atender à específica reivindicação da numerosíssima clientela dos planos e seguros de saúde, pondo fim a uma situação que dava margem a abusos intoleráveis, como já proclamado pela Justiça. E vemo-nos, agora, diante de uma armadilha: ou aprovamos, in totum, o que nos é devolvido pela Câmara, ou o rejeitamos, lembrando que a matéria com que nos deparamos é de imensa importância para o povo brasileiro e apresenta complexidade que requer acurados estudos, sem os quais toda decisão será precipitada, inadequada ao senso de responsabilidade que sempre caracterizou esta Casa.
Sem a menor pretensão de esgotar o assunto, muito pelo contrário, até para corroborar essa minha percepção dos altos riscos de uma decisão precipitada, permito-me chamar a atenção dos ilustres Pares tão-somente para dois aspectos do eminente Senador Sebastião Rocha, os quais me parecem altamente problemáticos e eloqüentemente ilustrativos das muitas dificuldades que nos aguardam.
O nobre Relator propõe suprimir o §4º do art. 1º do Substitutivo da Câmara dos Deputados, que permite a participação de empresas e capitais estrangeiros na constituição, na participação e no aumento de capital de operadoras de planos de saúde, louvando-se em duas ordens de alegações: de um lado, uma petição de princípio, melhor dizendo, um juízo de valor não comprovado e nem testado, segundo o qual - e aqui cito textualmente seu relatório - “a entrada de capital estrangeiro nesse setor cria um risco sério para sua desnacionalização”. E, em apoio a esse ponto de vista, faz o nobre Relator menção ao que “já se está observando no setor de seguros privados”. De outro lado, o Relator expressa seu receio de que - torno a abrir aspas - “com o poder que lhes confere o vigor financeiro de suas matrizes no exterior, o mais provável é que se utilizem (esses capitais estrangeiros) da prática do dumping para apoderar-se das empresas do setor, vindo a substituí-las a médio prazo para, então, praticarem os preços que lhes convêm”. Para concluir, o representante do Amapá manifesta-se contrário - abre aspas - “à manutenção desse dispositivo por considerar que está correto o que reza a Constituição Federal quando veda a participação direta ou indireta de empresas e capitais estrangeiros na assistência à saúde no País (art. 199, §3º)” - fecha aspas.
Sr. Presidente, nada mais impróprio, inoportuno e sem sentido, aqui, que entrar em disputas de hermenêutica constitucional. Tampouco este é o momento e o lugar de encetar reflexão sistemática sobre os riscos, as oportunidades e os rumos da globalização. Por isso, vou tentar ir direto ao assunto.
Em primeiro lugar, está fora de dúvida que a Emenda Constitucional nº 13, de 1996, alterou substancialmente as regras do jogo no tocante à entrada dos investimentos produtivos externos, eliminando a distinção entre empresas brasileiras de capital nacional, de um lado, e estrangeiro, de outro. Os levantamentos demonstram que essa mudança fortaleceu a capacidade do Brasil para beneficiar-se dos aspectos positivos da globalização, traduzidos em aumento do estoque de capital nacional, sofisticação da base termológica e geração de novos empregos.
Em segundo lugar, o Brasil tem registrado avanços significativos no tocante aos mecanismos de proteção contra o dumping, como exemplifica, aliás, a recente manifestação do Conselho de Administração de Defesa Econômica, - CADE -, contrário à fusão de dois gigantes industriais de ramo cervejeiro.
Em terceiro, último, mas não menos importante lugar, estou convicto de que o afluxo de empresas e capitais estrangeiros, no caso específico da assistência à saúde, redundará em amplos benefícios para o consumidor, graças à fixação de novos e superiores patamares de atendimento e excelência tecnológica no diagnóstico e tratamento de doenças, baseados na experiência dos países mais desenvolvidos.
O outro questionamento refere-se à supressão do art. 35 do substitutivo da Câmara, dispondo sobre a objetividade de concorrência pública na contratação de serviços de assistência médica a servidores dos órgãos de Administração Pública e seus respectivos dependentes.
Não comungo com o raciocínio do ilustre Relator, para quem a existência da Lei nº 8.666, de 1993, é suficiente para garantir a lisura desses processos - abre aspas mais uma vez - “tornando totalmente desnecessária tal previsão em outro diploma legal.” O que se lhe afigura como pura redundância, parece-nos um óbvio imperativo: a manutenção do art. 35 da Câmara dos Deputados, particularmente no que tange à ordem ética e exigência de racionalidade administrativa, não deixando, assim, a menor oportunidade de dubiedade quanto à interpretação da Lei.
Sr. Presidente, não posso deixar de fazer alusão às semanas tempestuosas que temos vivido, assustada a Nação com as ameaças à estabilidade do real e, agora, surpreendida por violento pacote de medidas econômico-financeiras baixado pelo Governo, destinado a repercutir intensamente na vida do cidadão. Mais uma luz amarela a nos recomendar cautela!
Mas, Sr. Presidente e nobres Colegas, vim à tribuna nesta tarde para fazer alguns comentários sobre o tema em pauta, a saúde, que está sendo discutido para ser então votado e regulamentado. Recebemos o dispositivo da Câmara dos Deputados e para que ele não retorne, nos é permitido apenas suprimir alguns tópicos. Se nós o mudarmos substancialmente, ele terá que voltar à Casa de origem, acarretando com isso demora para a sua praticidade.
Sabemos que, em função dessa expectativa, os setores públicos ligados à saúde deixam a desejar. O Governo tem a expectativa de que se coloque em prática o quanto antes essas modalidades (seguro-saúde e planos de saúde), porque cerca de 40 milhões de brasileiros deixarão de ser atendidos pelos hospitais públicos, ou melhor, pelo SUS, trazendo com isso uma economia enorme para o Governo Federal, que deixaria à própria sorte a saúde no Brasil; com isso muitos brasileiros terão que buscar alternativas. Essa é a verdade. Estamos diante de um ditado: “Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.” Esse é o adágio que está posto, essa é a realidade por que o Brasil está passando. Por isso, a importância de analisarmos esse caso, porque é a realidade. Há também uma grande expectativa por parte das empresas.
Precisamos fazer pressão ao Governo também; isso é fundamental e já está ocorrendo. Precisamos nos apressar; estamos para entrar em recesso no próximo dia 15, e se esta Casa não votar e não ficar apenas nessa parte supressiva - como o Relator mostra em algumas questões - não atenderemos a cerca de 40 milhões de brasileiros que não encontram amparo no Sistema Único de Saúde, o SUS, porque a saúde está sucateada.
Entra em pauta, esta semana, a CPMF. É outro dispositivo que o Governo usa para, até 1999, dispor desses recursos que, muitas vezes, não são destinados à saúde. De qualquer sorte, mais uma vez, se analisarmos bem, é o povo brasileiro que arca com a bitributação, porque terão de buscar outras fontes, outros recursos para poder agüentar e ter melhor atendimento na área da saúde. Dessa forma o Governo se sentirá aliviado, mas vamos deixar 100 milhões de brasileiros buscando esses benefícios, esse atendimento nos hospitais públicos, no Sistema de Saúde do País, o SUS. Esse assunto já está em pauta para esta semana, e a Casa haverá de se pronunciar em relação a isso. Essa é a importância que nós temos. Segundo o Relator da matéria, empresa estrangeira e capital externo não devem entrar nas modalidades de saúde. Creio que não é por aí. Se alguns julgam ser perigoso que empresas internacionais entrem para atuar na área de saúde, de minha parte não vejo nenhum risco nisso. Argumenta-se que a entrada de empresas estrangeiras poderia nos levar a alguma desvantagem, mas não percebo isso nesta corrida internacional que vemos hoje, principalmente no setor de saúde privada. Penso que aquilo que pode nos ajudar deve vir. Essa é a abertura que está existindo hoje.
Eram algumas considerações que eu não poderia deixar de trazer na tarde de hoje, Sr. Presidente e nobres Colegas.
Muito obrigado.