Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM AS METAS DE SANEAMENTO BASICO E HABITAÇÃO POPULAR TRAÇADAS PELO GOVERNO.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA HABITACIONAL.:
  • PREOCUPAÇÃO COM AS METAS DE SANEAMENTO BASICO E HABITAÇÃO POPULAR TRAÇADAS PELO GOVERNO.
Publicação
Publicação no DSF de 09/01/1998 - Página 302
Assunto
Outros > POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • DEFESA, ADOÇÃO, GOVERNO FEDERAL, POLITICA, PRIORIDADE, APLICAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, MINISTERIO DO PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO (MPO), CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, INVESTIMENTO, SANEAMENTO BASICO, HABITAÇÃO POPULAR, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), IMPEDIMENTO, DOENÇA ENDEMICA, EXPANSÃO, FAVELA.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ocupo a tribuna desta Casa para manifestar a minha grande preocupação com relação ao cumprimento de metas urgentes para minorar as deficiências estruturais que o nosso País apresenta em matéria de saneamento básico.

A grave crise nos mercados asiáticos, que desabou fortemente sobre a nossa economia, aliada aos desequilíbrios preocupantes que já se acumulavam em nossas contas internas e externas, estão levando o Governo a adotar políticas austeras de controle de gastos públicos para evitar, de qualquer maneira, o colapso do Plano Real. Infelizmente, neste momento de grandes turbulências e incertezas, os programas sociais são os primeiros a receberem os cortes de recursos impostos pelas emergências que precisam ser adotadas pelas autoridades da área econômica. 

Lamentavelmente, devemos admitir que os programas de saneamento básico e de habitação popular já estão duramente prejudicados pela nova conjuntura.

As operações de crédito dos órgãos e entidades do setor público para investimentos em saneamento básico e habitação popular, desde o último dia 17 de novembro, estão limitadas por força de resolução adotada pelo Conselho Monetário Nacional. Assim, por exemplo, tanto os recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, que é a mais importante fonte de alimentação do setor, quanto os recursos oriundos do Orçamento Geral da União, que também nutrem os programas e são catalogados na rubrica “fundos perdidos”, com a nova realidade, tornaram-se insuficientes para cobrir as necessidades nacionais.

Portanto, a falta de recursos e as limitações de crédito agravarão ainda mais o quadro sanitário do País e privarão a população brasileira de uma melhor qualidade de vida. E V. Exª, Sr. Presidente Carlos Patrocínio, que é médico, sabe o quanto é deficiente o saneamento básico no interior brasileiro, principalmente nos nossos Estados da Região Centro-Oeste. Além do mais, o déficit em serviços de saneamento será ampliado e o desemprego crescerá em virtude dos cortes e das restrições estabelecidas recentemente pelo Conselho Monetário Internacional.

Sr. Presidente, Srª e Srs. Senadores, lamentavelmente, o Brasil apresenta ao mundo uma triste e vergonhosa realidade social. Os relatórios oficiais dos organismos internacionais atestam esses dados e revelam que estamos abaixo de mais de 60 países, quase todos bem menos desenvolvidos economicamente do que o nosso em matéria de qualidade de vida. Paradoxalmente, ao mesmo tempo em que ocupamos o lugar de oitava economia industrial do mundo, com um Produto Interno Bruto de quase 900 bilhões de dólares, mais de 10 milhões de famílias brasileiras - aproximadamente 40 milhões dos 160 milhões de habitantes do nosso País - ostentam uma condição de vida miserável. Habitam barracos, favelas, mocambos, palafitas, choças e convivem permanentemente com a promiscuidade, com a falta de higiene, com a desnutrição, com a violência e com o abandono.

Para tristeza minha, Sr. Presidente, no meu Estado, cuja população sempre teve um nível de vida de qualidade razoável para boa, também já se constata a presença dessa chaga social. Há muitas favelas nos arredores de Cuiabá e Várzea Grande - que compõe a Grande Cuiabá. Muitas pessoas moram em situação lamentável em Rondonopólis, Cáceres e Barra do Garça, que são as cidades de maior população do meu Estado. Também na zona rural a situação não é melhor. Em determinadas regiões, o quadro é chocante. O cidadão sai do Rio Grande do Sul, do Paraná, de Santa Catarina, de São Paulo e de Minas à procura de uma nova qualidade de vida, em busca do novo eldorado que pensa encontrar na Amazônia brasileira, na Amazônia mato-grossense. Chegando lá, ele é abandonado. Nos projetos de colonização do Incra, nos assentamentos feitos pelo Incra, a qualidade de vida das moradias é abaixo da linha de pobreza. São verdadeiros casebres. São aqueles barracões cobertos com plásticos pretos que são típicos das moradias improvisadas nas invasões comandadas pelo MST, mas que lá são residências permanentes. A situação de abandono em que vive o homem pobre do meu Estado de Mato Grosso nos choca bastante.

Neste Brasil de contrastes, que também registra anualmente uma das maiores produções mundiais de grãos, continuam a aumentar assustadoramente os casos de cólera, de tuberculose, de tifo, de sarampo, de dengue, de coqueluche e também de hepatite, que hoje é uma doença muito freqüente na Região Amazônica e no Estado de Mato Grosso. A presença da hepatite naquela região dos municípios de Aripuanã, Cotriguaçu - área colonizada pelo Incra -, Coniza, Juruena está muito elevada. É bastante presente a hepatite no nosso vizinho Estado do Acre e no Estado de Rondônia. Além da malária, a hepatite também acomete a população da Amazônia.

A mortalidade infantil tem taxas assustadoras, motivadas por causas banais como a diarréia. Vale ressaltar que tudo isso existe porque a estrutura sanitária do País é deficiente e porque os programas até agora empreendidos pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Social - BNDES, e pela Caixa Econômica Federal foram muito tímidos e paliativos.

Aliás, no BNDES, é muito fácil conseguir recursos para incentivar a privatização, a industrialização - o que é válido -, mas é muito difícil o acesso a recursos para os programas sociais.

Não podemos esquecer que já tivemos dias melhores em matéria de política de saneamento básico no Brasil, principalmente na gestão do então Ministro do Interior, que comandava o BNH, o saudoso Sr. Mário Andreazza, que deu prioridade à construção de casas populares e de estrutura de saneamento básico no Ministério do Interior.

Todavia, com as metas abandonadas e com a desestruturação do sistema financeiro do saneamento que estamos percebendo agora, o futuro fica realmente sombrio.

É um dever do Estado brasileiro convocar os profissionais do setor, que estão dispersos, para elaborar com urgência um Programa Nacional de Saneamento Básico e construir um novo sistema que seja eficiente. Para isso, o Ministério do Planejamento e a Caixa Econômica Federal estão aí como órgãos importantes para impulsionar soluções que envolvem também uma corajosa mudança nos padrões de financiamento por meio de concessão e terceirização das obras e serviços do setor a investidores privados, como bem recomenda o Banco Mundial. Mas isso deve ocorrer em cidades onde o nível de renda já é bastante elevado, não no interior brasileiro.

Do jeito que está, nós nos vemos diante de um verdadeiro crime quando analisamos o quadro de saneamento básico em nosso País. Nada menos que 70% da população brasileira não dispõe de serviço de esgoto e de água encanada e tratada. Como vimos anteriormente, o País tornou-se um verdadeiro viveiro de doenças endêmicas que já atingem até mesmo as classes sociais mais abastadas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, segundo dados do Catálogo Brasileiro de Engenharia Sanitária Ambiental - Cabes, os números alarmantes das doenças sociais prosperam exatamente nas áreas onde faltam coleta do lixo, tratamento da água, rede de esgotos, comida e habitação dignas. Infelizmente, é preciso acrescentar que a maioria dos nossos políticos não gosta muito de cuidar de água, dos esgotos, da educação e da saúde, por se tratar de obras que dão poucos votos ou nenhum.

No Orçamento de 1988, uma das emendas coletivas que a Bancada de Mato Grosso apresentou - emenda, aliás, por mim defendida e patrocinada - visava justamente ao serviço de abastecimento de água dos pequenos municípios daquele Estado. Graças à benevolência dos membros da Comissão do Orçamento e do Relator-Geral, conseguimos incluir no Orçamento da União de 1988 recursos de R$8,5 milhões para abastecimento de água nos municípios de Mato Grosso. Espero que o Ministro do Planejamento, Antonio Kandir, tenha sensibilidade e não corte essa verba destinada ao abastecimento de água das pequenas cidades do Mato Grosso.

Temos de dar apoio à população da longínqua Amazônia Mato-grossense. Muitos dos municípios daquela região têm Prefeitura e Câmara funcionando. Muitos têm agricultura e pecuária relativamente desenvolvidas. Mas não contam com abastecimento de água, como é o caso de Cana Brava do Norte, de Juruena, de Cotriguaçu, de Aripuanã e de tantas outras cidades do meu Estado. 

           Ainda segundo os estudos realizados pelo Cabes, para vencer o desafio do saneamento básico, o Brasil deveria investir cerca de 1% do PIB por ano, ou seja, aproximadamente US$9 bilhões, o que seria hoje motivo de risada para muitos. É praticamente impossível conseguirmos, no Orçamento-Geral da União de 1998, que estejam incluídos U$S9 bilhões para o saneamento básico do nosso País.

Apesar dos grandes obstáculos, já está mais do que na hora de deixar para trás as obras de fachada, que demandam bilhões de reais, e de eliminar, de vez por todas, o desperdício do dinheiro público, principalmente a corrupção que ainda germina em vários segmentos da Administração Pública brasileira, em todos os níveis de governo. Está na hora de empregar corretamente essa montanha de dinheiro perdido em outros setores da atividade pública deste País e investir no saneamento básico, em áreas cujas deficiências condenam, a cada ano, milhões de brasileiros à morte, à doença e à ignorância.

Tenho certeza absoluta de que o Presidente Fernando Henrique Cardoso, um homem sensível aos problemas nacionais e aos problemas do interior brasileiro, fará do seu Governo, do seu último ano de mandato, a priorização dos recursos do Ministério do Planejamento, da Caixa Econômica Federal, do BNDES e dos órgãos paralelos do Governo, para que sejam bem destinados a uma política de saneamento do nosso País.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/01/1998 - Página 302