Discurso no Senado Federal

REGISTRO DA CARTA DO SR. PRESIDENTE ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, ENCAMINHADA AO EMBAIXADOR DOS EUA NO BRASIL, SR. MELVYN LEVITISKY, ANEXADA A DOCUMENTO SUBSCRITO POR DIVERSOS SENADORES, QUE SOLICITA AO GOVERNO AMERICANO A CONCESSÃO DE VISTO DE ENTRADA AQUELE PAIS AO DEPUTADO FERNANDO GABEIRA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • REGISTRO DA CARTA DO SR. PRESIDENTE ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, ENCAMINHADA AO EMBAIXADOR DOS EUA NO BRASIL, SR. MELVYN LEVITISKY, ANEXADA A DOCUMENTO SUBSCRITO POR DIVERSOS SENADORES, QUE SOLICITA AO GOVERNO AMERICANO A CONCESSÃO DE VISTO DE ENTRADA AQUELE PAIS AO DEPUTADO FERNANDO GABEIRA.
Publicação
Publicação no DSF de 22/01/1998 - Página 1125
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • REGISTRO, CARTA, AUTORIA, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, PRESIDENTE, SENADO, ENDEREÇAMENTO, MELVYN LEVITSKY, EMBAIXADOR, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ENCAMINHAMENTO, DOCUMENTO, ASSINATURA, MAIORIA, SENADOR, SOLICITAÇÃO, VISTOS DE ENTRADA, FERNANDO GABEIRA, DEPUTADO FEDERAL.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP. Para breve comunicação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, praticamente todos os Srs. Senadores - informo que ainda não terminei a coleta de assinaturas - estão encaminhando um ofício ao Presidente Antonio Carlos Magalhães, do Senado Federal e do Congresso Nacional, no seguinte teor:

“Sr. Presidente, um congressista brasileiro, o Deputado Federal Fernando Gabeira, do Partido Verde, do Rio de Janeiro, está tentando há vários anos entrar nos Estados Unidos, sem obter visto da Embaixada daquele País. O Deputado Fernando Gabeira não obteve visto para visitar a ONU, em 1996, nem para participar, em 1997, de um debate no Congresso Norte-Americano sobre o futuro do Tibet.

As autoridades da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil têm justificado a negativa para o visto em virtude de o congressista, eleito em 1994, ter participado, em 1969, do seqüestro do então Embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick. Ocorre, entretanto, que o Deputado Fernando Gabeira, através de inúmeras manifestações, inclusive de seu mais importante livro, O que é isso, companheiro?, já fez a autocrítica de sua participação na luta armada. Foi anistiado, assim como todos os autores do seqüestro, por iniciativa do Governo brasileiro e pelo Congresso Nacional.

Na ocasião, o próprio Embaixador Charles Burke Elbrick manifestou-se a favor da anistia dos exilados e presos brasileiros. Sua filha Valery Elbrick mantém cordiais relações de amizade com o Deputado Fernando Gabeira. Como representante do Partido Verde, Fernando Gabeira tem se destacado em favor das causas humanitárias, em defesa do meio ambiente e pelo fortalecimento das instituições democráticas.

Tão importante foi o testemunho de Fernando Gabeira em O que é isso, companheiro? que seu livro tornou-se um dos mais vendidos no Brasil e tema de filme do mesmo nome, dirigido pelo Cineasta Bruno Barreto, concluído em 1997, sucesso de público e de crítica no Brasil, ainda que tendo causado grande polêmica, pois nem todos os que viveram o episódio tiveram a mesma percepção e avaliação dos fatos. O filme foi escolhido pelas autoridades brasileiras para representar o Brasil na premiação do Oscar, é um dos indicados pela Academia de Hollywood para ganhar o prêmio de melhor filme estrangeiro com o nome Four Days in September .

Como seria de esperar, o Deputado Fernando Gabeira foi convidado pela empresa Miramax, distribuidora do filme e do livro, para estar presente por ocasião do seu lançamento em inglês no próximo dia 30 de janeiro nos Estados Unidos. Tendo dado entrada no novo pedido de visto, ainda não conseguiu resposta da Embaixada dos Estados Unidos em Brasília.

Diante desses fatos, solicitamos ao Presidente do Congresso Nacional, Antonio Carlos Magalhães, que comunique ao Presidente do Congresso norte-americano seu desejo de que essa proibição inadmissível sobre um congressista brasileiro, perfeitamente integrado na vida democrática, seja suspensa, para que o Deputado Fernando Gabeira possa cumprir a sua tarefa nos Estados Unidos, que é a de divulgar a cultura brasileira.

Assinam essa manifestação, Sr. Presidente, praticamente todos os Senadores com os quais me encontrei, e ainda vou inclusive solicitar a assinatura dos Senadores Geraldo Melo e Nabor Júnior. Tenho a certeza de que S. Exªs subscreverão este documento, pois todos os Senadores com os quais tive oportunidade de encontrar assim o fizeram. Estou certo de que, uma vez respaldado pelo conjunto dos Srs. Senadores, o Senhor Presidente, Senador Antonio Carlos Magalhães, levará esta carta ao conhecimento do Congresso Nacional norte-americano, das autoridades norte-americanas, porque, afinal de contas, trata-se de uma expressão do conjunto dos representantes do Senado. Acredito que na Câmara dos Deputados haverá iniciativa semelhante, uma vez que aqui o próprio Senhor Presidente da República recebe e dialoga com o Deputado Fernando Gabeira. Todos nós, Senadores e Deputados, temos por ele o maior respeito.

O filme O que é isso, companheiro? tem extraordinária qualidade técnica e emociona as pessoas, ao retratar aquele episódio. Lembro que o Diretor Bruno Barreto, ao iniciar o filme, coloca que os personagens que ali estão, os seqüestradores, não são exatamente aqueles colocados na história ou no próprio livro. Trata-se de um filme de ficção baseado em fatos reais.

Houve, inclusive, pessoas que viveram o episódio que discordaram de alguma maneira da forma como foi retratado o evento. Lembro-me de que um dos mais importantes jornalistas brasileiros atualmente, Franklin Martins, que escreve no jornal O Globo e que foi um dos personagens da história, escreveu alguns artigos e, pelo que pude compreender das entrevistas e dos relatos, teria ele sido um dos autores do manifesto lido pelos meios de comunicação, relatando o que estava ocorrendo - o seqüestro -, dizendo o que expressavam naquela ocasião os que lutavam contra a ditadura militar. Ele achou que, a respeito de um dos personagens participantes do seqüestro, houve uma retratação, no filme, não completamente adequada. Pois bem, o filme pode ter retratado alguns episódios com uma perspectiva diferente, mas, mesmo assim, trata-se de um episódio sobre o qual os próprios autores do seqüestro muito aprenderam com o mesmo; fizeram uma avaliação crítica, se incorporaram à luta e à vida democrática no Brasil. O próprio Embaixador Charles Elbrick, quando ainda vivo, disse que era a favor da anistia. A filha do Embaixador, mais do que isso, tornou-se uma amiga do Deputado Fernando Gabeira. Então, acredito que o nobre Senador Antonio Carlos Magalhães, como Presidente do Congresso, terá todos os elementos para transmitir às autoridades do Congresso norte-americano, às autoridades norte-americana, à Embaixada dos Estados Unidos esta consideração que é dos membros do Senado Federal.

O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Pois não. Ouço, com muita honra, o aparte de V. Exª, nobre Senador Bello Parga.

O Sr. Bello Parga (PFL-MA) - Senador Eduardo Suplicy, fui um dos subscritores desse requerimento que V. Exª traz ao conhecimento da Casa. Fiz isso porque me considero uma pessoa de espírito liberal e, portanto, a minha atividade política tem que ser calcada na linha do liberalismo. A minha intervenção cinge-se apenas à forma com que este apelo ou esta mensagem está sendo feita. Eu indagaria de V. Exª se a proibição de ingresso do Deputado Fernando Gabeira nos Estados Unidos é produto de uma lei ou de uma atitude das autoridades competentes daquele país. Se for em decorrência de uma lei, a mensagem, efetivamente, deve ser endereçada ao Congresso dos Estados Unidos e não a qualquer outra autoridade; se não decorre de dispositivo legal, seria o caso de ser entregue, evidentemente através da Embaixada Americana, ao próprio Presidente da República. Era essa a observação que me ocorria fazer no momento.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - A reflexão que fiz ao elaborar o ofício foi a de que o Presidente do Congresso brasileiro poderia se reportar adequadamente ao Presidente do Congresso norte-americano e este, então, faria ver ao Executivo, ao Presidente Bill Clinton, à Embaixada dos Estados Unidos esse ponto de vista. Mas como o Presidente do Congresso Nacional, acredito que o diálogo se faz bem feito com o Presidente do Congresso Nacional norte-americano. Por isso está nesses termos. Se porventura houver uma legislação a respeito, fica adequado; se for uma questão de julgamento das autoridades - parece-me que é esse o caso - relativas ao serviço de migração, de concessão de vistos, também fica adequado, porque o Congresso norte-americano poderá transmitir ao serviço de migração, ao serviço da embaixada o apelo que é feito por todos os Srs. Congressistas e Membros do Senado.

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Ouço o Senador Pedro Simon, com muita honra.

O Sr. Pedro Simon (PMDB-RS) - É da maior importância o requerimento de V. Exª, o qual, assim como vários Srs. Senadores, tive a honra de assinar. É inconcebível o que está acontecendo. V. Exª disse, com todas as letras, que houve um movimento no Brasil, que, talvez de forma inédita no mundo, resolvemos com muita categoria, dando uma anistia recíproca, sem guerra, sem violência. Fizemos uma transição, sem precisar de nenhum país de fora, do arbítrio para a democracia que estamos vivendo hoje. O Deputado Gabeira é um brilhante Parlamentar, de atuação a mais respeitosa. Diz bem V. Exª, o Deputado inclusive é amigo da filha do embaixador. Vi o documento do embaixador, no qual entende e até respeita as figuras que o tiveram sob cativeiro naquela oportunidade. Dentro do contexto que V. Exª está dizendo, de os Estados Unidos impedirem um parlamentar, um deputado federal do nosso País de entrar naquele país, é um absurdo! Mas, dentro desse absurdo tem um outro que não entendo, que é o Deputado Gabeira ser integrante de uma delegação brasileira para ir à ONU e as autoridades americanas não o deixarem entrar em Nova Iorque. São os Estados Unidos que vão dizer quem vai ou não à assembléia das Nações Unidas? Estaria certo se fosse um cidadão agitador; mas é um parlamentar brasileiro, com uma credencial para participar de uma assembléia da Organização das Nações Unidas. Sim, fica em território americano, mas tem a sua vida, tem a sua autoridade, tem a sua credibilidade, é um órgão que representa o mundo inteiro. Lá estão representadas nações que não têm maiores simpatias pelos Estados Unidos; no entanto, se fazem presentes. Sinceramente, não entendo essa posição, essa apatia, essa imponência dos americanos. Eu diria até que eles têm quase que um desprezo pelo restante do mundo; não sabem valorizar caso a caso. Está certo que há brasileiros e gente do mundo inteiro querendo entrar nos Estados Unidos, de qualquer jeito. Está correto que eles têm que fazer um controle dessa entrada; acho até normal. Está certo que eles têm que fazer uma série de restrições, as mais variadas, afinal, aquilo é um paraíso, para eles pelo menos. Mas é inacreditável que um parlamentar não possa entrar nos Estados Unidos, não possa ir à ONU, porque ela fica em Nova York. Um cidadão sobre o qual qualquer Embaixador dos Estados Unidos no Brasil - o atual ou anterior - dá boas informações, um cidadão que tem credibilidade e o respeito de todos os brasileiros. V. Exª tem minha solidariedade ao seu requerimento. E digo, com toda a franqueza, que está na hora de o Senado brasileiro debater algumas questões internacionais. Na minha opinião, somos como o elefante, ou seja, não sabemos a força que temos. É claro que uma decisão do Senado brasileiro é zero vírgula alguma coisa perto de uma decisão do Senado americano, que abala o mundo. Mas uma decisão do Senado brasileiro tem o seu valor, pelo que representa o Brasil, pelo nosso passado, pelo nosso presente, pela credibilidade que nós temos. V. Exª foi muito oportuno ontem, apresentando o requerimento que será votado hoje, sobre a ida do Papa a Cuba, fazendo um apelo aos americanos no sentido de suspenderem o bloqueio. Hoje, mais uma vez, V. Exª está sendo muito feliz, porque, por sua solicitação, haveremos de intervir quanto a esse absurdo, esse acontecimento ridículo com relação ao Deputado Gabeira. E se alguém imagina que isso não nos diz respeito, que não nos atinge, que é somente problema do Deputado Gabeira, está completamente enganado. Isso é problema do Congresso Brasileiro, porque, no momento em que se está atingindo um Congressista, se está atingindo o Congresso Nacional. Todos nós, de certa forma, estamos sofrendo uma restrição com o que está acontecendo com o Deputado Gabeira. Minha solidariedade ao pronunciamento de V. Exª.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Agradeço, Senador Pedro Simon, a sua manifestação.

O Deputado Fernando Gabeira teve, em 1996, a intenção de visitar a ONU. Na ocasião, S. Exª não fazia parte da delegação oficial brasileira, mas queria visitar a ONU e não pôde.

Depois, foi convidado para participar de um debate, dentro do Congresso norte-americano, sobre o Tibete, que é uma questão que S. Exª defende. O Deputado Fernando Gabeira foi uma das pessoas que trouxeram ao Congresso Nacional o representante do Governo do Tibete, inclusive visitando - eu estava presente - o Presidente Antonio Carlos Magalhães, quando expressou a importância de o povo do Tibete ter a sua autodeterminação em relação à República Popular da China - aliás, uma causa muito cara para os norte-americanos, que são a favor do processo de democratização da República Popular da China. Assim, acredito que esse apelo assinado pela maioria dos Srs. Senadores - e acredito que será assinado por todos os Senadores, de todos os partidos e todos os líderes -, certamente fará com que o Senador Antonio Carlos Magalhães tome as providências que esperamos.

Logo mais, falaremos sobre a oportunidade de Fidel Castro estar batendo à porta dos Céus, no encontro que hoje ocorrerá com João Paulo II em Havana.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/01/1998 - Página 1125