Discurso no Senado Federal

INVIABILIZAÇÃO DA PRODUÇÃO LEITEIRA NACIONAL, EM ESPECIAL, NO ESTADO DE RONDONIA. PREMENCIA NA REVISÃO DOS FINANCIAMENTOS CONCEDIDOS ATRAVES DOS FUNDOS CONSTITUCIONAIS, PRINCIPALMENTE O DO NORTE, SOB O RISCO DE UM COLAPSO GENERALIZADO DA ATIVIDADE RURAL NAQUELA REGIÃO.

Autor
José Bianco (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: José de Abreu Bianco
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • INVIABILIZAÇÃO DA PRODUÇÃO LEITEIRA NACIONAL, EM ESPECIAL, NO ESTADO DE RONDONIA. PREMENCIA NA REVISÃO DOS FINANCIAMENTOS CONCEDIDOS ATRAVES DOS FUNDOS CONSTITUCIONAIS, PRINCIPALMENTE O DO NORTE, SOB O RISCO DE UM COLAPSO GENERALIZADO DA ATIVIDADE RURAL NAQUELA REGIÃO.
Aparteantes
Lúdio Coelho, Osmar Dias, Ramez Tebet, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 27/01/1998 - Página 1298
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • DEFESA, URGENCIA, GOVERNO FEDERAL, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, PROTEÇÃO, SETOR, PRODUÇÃO, LEITE, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DE RONDONIA (RO), MOTIVO, EXCESSO, REDUÇÃO, PREÇO, LATICINIO, RESULTADO, CONCORRENCIA, PRODUTO, PAIS ESTRANGEIRO, URUGUAI, ARGENTINA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, REDUÇÃO, DIVIDA, DEVEDOR, FUNDO CONSTITUCIONAL DE FINANCIAMENTO DO NORTE (FNO), FUNDO CONSTITUCIONAL DE FINANCIAMENTO DO CENTRO-OESTE (FCO), FUNDO CONSTITUCIONAL DE FINANCIAMENTO DO NORDESTE (FNE), VIABILIDADE, MANUTENÇÃO, ATIVIDADE AGRICOLA, PEQUENO AGRICULTOR, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, REGIÃO CENTRO OESTE.

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, ocupo esta tribuna para voltar a um assunto que tem sido motivo de extrema preocupação e de muita angústia, especialmente para milhares de pequenos agricultores no Estado de Rondônia, que, com muita honra, represento nesta Casa. Refiro-me, Srs. Senadores, à questão do preço do leite.

No meu Estado, chegamos de fato ao fundo do poço. O leite, que vinha sendo vendido pela ínfima importância de R$0,12, R$0,14 centavos o litro, a partir de agora, terá o preço máximo, nada mais nada menos, de R$0,08 o litro, segundo informações dos laticínios aos produtores na semana passada. Acredito que seja impossível produzir um litro de leite para entregar a R$0,08.

É absolutamente necessário e extremamente urgente que o Governo tome alguma medida. Há que se determinar algum mecanismo para resolver esta questão que angustia milhares de agricultores no Brasil inteiro; ou criando algum tipo de subsídio, ou taxando o queijo proveniente da Argentina e do Uruguai que entra, via Mercosul, no Brasil. De qualquer sorte, alguma coisa há que ser feita em prol desses produtores. Não é possível deixá-los desfazerem-se de suas matrizes, uma vez que não compensa produzir leite para vender a esse preço. É inacreditável: 12 litros de leite para comprar um refrigerante!

Relativamente a essas questões que angustiam os agricultores, principalmente na Amazônia e em especial em Rondônia, tenho um projeto em tramitação nesta Casa, que se encontra na Comissão de Assuntos Econômicos e cujo relator é o eminente Senador Jonas Pinheiro, em que proponho a redução da dívida dos devedores de fundos constitucionais, seja do FNO, do FCO ou do FNE.

No Norte, onde conhecemos a situação de perto, os devedores que assumiram dívidas do fundo constitucional, por meio do BASA, não têm a mínima condição de arcar com o compromisso assumido. É preciso, de fato, a sensibilidade das autoridades da área econômica e do Senhor Presidente da República para rever o valor desses financiamentos. Se persistirem os atuais valores, como já afirmei nesta Casa, o BASA se transformará, seguramente, na maior imobiliária do País e quiçá do mundo, porque será proprietário de nada menos que 11 mil pequenas propriedades agrícolas no Estado de Rondônia.

O Sr. Romero Jucá (PFL-RR) - Senador José Bianco, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO) - Ouço o Senador Romero Jucá.

O Sr. Romero Jucá (PFL-RR) - Senador José Bianco, gostaria de registrar, neste breve aparte, meu apoio às palavras de V. Exª. O Governo Federal, o BASA, o Banco do Brasil, a gestão do FNO e dos outros fundos constitucionais têm de buscar um caminho para tornar novamente adimplentes milhares de pequenos produtores que hoje estão em uma situação extremamente delicada. Quero citar um dado do Estado de Roraima: de 580 contratos do FNO em Roraima, apenas dois produtores estão adimplentes, o restante está inadimplente, portanto, proibido de operar um crédito que, bem ou mal, ainda permite exercer alguma atividade. É uma questão urgente, e V. Exª, ao levantá-la nesta tarde, está prestando um serviço ao País, especialmente à nossa região, a Amazônia. Meus parabéns.

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO) - Agradeço o aparte de V. Exª. Já afirmamos, aqui nesta Casa, que esta questão é crucial para nossos Estados.

Sr. Presidente, é preciso encontrar uma solução para o problema, que envolve pessoas simples que conhecemos, até porque somos originários de uma dessas famílias. Sabemos que são pessoas que, quando possível, gostam de pagar seus compromissos, inclusive antes mesmo de seu vencimento, e estão angustiadas porque, como disse o Senador Romero Jucá, estão inadimplentes. Isso tem causado muita intranqüilidade e levado aqueles mais preocupados a desfazerem-se dos seus lotes de forma até irresponsável, porque sempre aparece um vivaldino para adquirir o lote, mas a dívida com o Banco continua no nome do proprietário anterior.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO) - Ouço, com muita satisfação, o Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador José Bianco, desejo fazer coro com V. Exª, principalmente porque a questão da terra, da agricultura, da pecuária, dos fundos constitucionais tem sido, desde que assumimos nosso mandato nesta Casa - V. Exª, o Senador Lúdio Coelho e eu, bem como outros Senadores -, uma preocupação constante para nós. Quantas vezes temos procurado os diversos ministérios e o Presidente da República, alertando para a gravidade da situação daqueles homens que estão produzindo ou tentando produzir neste País. Hoje, V. Exª - apesar de a situação ser profundamente dramática, como falo em aparte, pretendo ser rápido -, resumiu muito bem: ou há uma rápida solução, ou os estabelecimentos de crédito, aqueles que administram esses fundos, tornar-se-ão efetivamente as maiores imobiliárias deste País, de vez que todos perderão as propriedades que foram dadas em garantia ou que estão hipotecadas junto aos mais diversos estabelecimentos de crédito. No caso do Fundo do Centro-Oeste, o Banco do Brasil; no caso do Norte e do Nordeste, o BASA, e assim por diante. Nós sempre pedimos um Proer para a agricultura; inclusive agora, ao que me parece - e vamos torcer para que rapidamente isso se faça -, foi anunciada, conforme entendimento entre vários Parlamentares, dentre os quais estamos incluídos, a promessa de o Senhor Presidente da República baixar normas a fim de minorar o drama dos agricultores do Brasil. Há possibilidade de que isso aconteça dentro de poucos dias. Estamos com essa esperança, e V. Exª, que está regressando do seu Estado, traz - como trago, pois também regresso do meu - a preocupação angustiante daqueles que trabalham no campo. Vamos torcer, Senador José Bianco, para que realmente haja essa ajuda para a agricultura no Brasil.

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO) - Agradeço o aparte de V. Exª. É oportuna a lembrança de V. Exª no sentido de que o Governo Federal anuncia um possível Proer, conforme disse, em favor das cooperativas de agricultores. Esperamos que esse procedimento socorra as cooperativas e também os agricultores.

Veja V. Exª, Senador Ramez Tebet, que os fundos constitucionais foram criados, pelos Constituintes de 88, com a intenção de permitir o progresso e o desenvolvimento dessas nossas regiões, as menos desenvolvidas, como é o caso do Norte, do Centro-Oeste e do Nordeste. Portanto, não haveria nenhum grande prejuízo, uma vez que esses fundos têm, por finalidade, o socorro, a ajuda, o apoio àquele pequeno agricultor, que, corajosamente, desenvolve uma atividade tão em descrédito.

O Sr. Osmar Dias (PSDB-PR) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO) - Ouço, com muita satisfação, o Senador Osmar Dias.

O Sr. Osmar Dias (PSDB-PR) - Senador José Bianco, nesta tarde, V. Exª traz à tribuna dois assuntos de extrema importância. Começo pelo segundo tema, o endividamento da agricultura, que tem de ser enfrentado com coragem pelo atual Governo. Se retardarmos uma solução para o problema do endividamento, que é geral na agricultura, poderemos torná-lo irreversível. Será muito difícil, depois, encontrarmos uma solução. Quero concentrar uma opinião a respeito do primeiro assunto tratado, com muita preocupação, por V. Exª, que é a comercialização do leite, um problema grave que ocorre em todos os Estados brasileiros. O leite é um produto nobre e não vem sendo tratado com o devido respeito pelos governos que se sucedem. Não há uma preocupação com o que ocorre no Brasil, no Mercosul e no mundo. No início da década de 90, a Europa foi forçada a reduzir o rebanho de produção do leite e inclusive comercializou vacas leiteiras para o Brasil a preços inferiores aos praticados de mercado, para que se reduzisse em 20% o rebanho produtor de leite, já que havia um superávit de produção, uma oferta muito acima da possibilidade de consumo daquela região do mundo. Nós brasileiros, ao invés de partirmos para o melhoramento genético do nosso rebanho, adquirindo essas matrizes, estamos ajudando o escoamento da superoferta de leite da Europa, comprando o produto. Para que V. Exª tenha uma idéia, até setembro deste ano, importaram-se US$300 milhões em leite. Há 5 anos o Brasil produzia 15,5 bilhões de litros de leite. Hoje, estamos produzindo 20,5 bilhões de litros, ou seja, a produção aumentou em 5 bilhões de litros. Pode-se, daí, concluir que está havendo uma superoferta do produto no Brasil e, por isso, o preço está baixo? Não, porque o consumo nos países vizinhos, como o Uruguai e a Argentina, chega a 190 litros per capita. No Brasil, se dividirmos os 20,5 bilhões de litros pelos 160 milhões de brasileiros, teremos 120 litros por pessoa, o que está muito aquém do recomendado pela OMS - Organização Mundial de Saúde e do nosso potencial de consumo. O Brasil não cuida de seus produtores, deixa as importações ocorrerem normalmente sem alíquotas de proteção ao mercado nacional. Se o Brasil não consegue sequer consumir aquilo que está produzindo - embora não estejamos, repito, produzindo demais -, por que importar? O Governo não tem que interferir diretamente na produção, pois essa vem funcionando bem; mas deve interferir no mercado, não permitindo que o leite importado da Europa pela Argentina entre no Brasil via Mercosul, como se produzido fora na Argentina. Disso o Governo não toma conhecimento. É preciso fiscalizar a comercialização desonesta que está ocorrendo por parte de alguns empresários que trazem leite da Europa, fazem com que esse leite seja carimbado na Argentina e entre em nosso território para competir com o nosso leite, porque vem sem nenhuma alíquota de proteção, sem nenhum tributo, sem nenhum imposto e, evidentemente, nossos produtores não vão poder concorrer. Senador José Bianco, V. Exª reclama e pede uma solução. Outras medidas deverão ser tomadas depois, mas a primeira medida seria uma fiscalização rigorosa dos produtos que entram no Brasil como se fossem produzidos no Mercosul; a segunda seria o Brasil parar de importar tudo que tem pela frente, como se precisássemos importar leite e algodão, como tem acontecido, acabando com essas culturas em nosso País. A produção de leite emprega muita gente em nosso País, creio que em torno de um milhão de pessoas. No momento em que o emprego é um bem que deve ser buscado, não podemos permitir que se acabe com a pecuária leiteira. Cumprimento V. Exª.

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO)- Agradeço a V. Exª pelo brilhante aparte. V. Exª é um profundo conhecedor do assunto e sempre tem trazido contribuições valiosíssimas nessa área. V. Exª menciona, de forma prática, a primeira medida - algum mecanismo tem que ser criado, tem que ser posto em prática -, que é a fiscalização na importação desses produtos, quer seja do leite em pó quer seja do queijo, oriundos, aparentemente, dos mercados dos países que, juntamente com o Brasil, formam o Mercosul.

Agradeço a V. Exª.

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO) - Ouço com muita satisfação meu nobre e eminente colega, Senador Lúdio Coelho.

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - Senador José Bianco, V. Exª está tratando de dois assuntos que atingem muito o meu Estado. Quanto ao preço do leite, há alguns equívocos. As pessoas não sabem que o agricultor, com 10 litros de leite, não paga o transporte de ônibus; da mesma forma, com 5 litros de leite, não paga um cafezinho no bar. A produção de leite merece um tratamento diferenciado do Governo Federal deveria cuidar do leite, já que esse produto é diferenciado dos demais na alimentação da população. É um produto diferenciado dos demais, assim como a profissão de militar e a de juiz são diferenciadas das demais. O que as pessoas nesses numerosos assentamentos da reforma agrária vão fazer com leite a R$0,08 o litro? Por isso não é possível dar independência para qualquer assentamento, pois o agricultor não tem condições de sobrevivência; só estamos cobrindo o sol com a peneira. O Fundo de Desenvolvimento do Centro-Oeste, que objetiva desenvolver essa região, trouxe muita infelicidade. Conheço inúmeros agricultores sérios e trabalhadores que estão completamente quebrados, pois não conseguem pagar os custos do FCO. Nobre Senador, tratei deste assunto muitas vezes. Da última, fomos 14 Senadores nos reunir com o Ministro Kandir, juntamente com 20 presidentes de federações do comércio ou da indústria. Isso faz, seguramente, uns quatro ou cinco meses, e não conseguimos nenhum resultado. Quero felicitá-lo por tratar de um assunto tão importante e de tanto interesse público para a Nação brasileira.

O SR. JOSÉ BIANCO (PFL-RO) - Muito obrigado. Fico muito satisfeito com o aparte de V. Exª.

Senador Lúdio Coelho, V. Exª relembra essa audiência com diversos Senadores e o Ministro do Planejamento. Isso deve ter ocorrido há cerca de quatro meseds, e até hoje não há qualquer solução.

De qualquer forma, não podemos permitir que este assunto caia no esquecimento e que as autoridades monetárias deste País fiquem nas suas salas, nos seus ambientes refrigerados, sem enxergarem a realidade, como V. Exª acabou de afirmar, de centenas de famílias infelicitadas por terem ido buscar um dinheiro que foram incentivadas a pagar, porque dissemos que era um dinheiro subsidiado. Na época, por exemplo, os técnicos que preparavam aquele projeto informavam que, com as crias, com os bezerros, aqueles que adquirissem o empréstimo para aquisição de vacas leiteiras pagariam o financiamento. Hoje, essas pessoas podem juntar o gado adquirido e as crias e ainda não conseguem pagar. Em alguns casos, se venderem também o lote, ainda não conseguem cumprir com os compromissos do financiamento.

Faço um apelo para que as nossas autoridades, em especial o Presidente da República, neste momento em que falam em Proer, em solução para os problemas da agricultura, realmente procurem resolver os problemas dos agricultores, dessas centenas de milhares de produtores, que, na Amazônia, no norte do Brasil, no Centro-Oeste, no Nordeste, são adquirentes de financiamentos de fundos constitucionais.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/01/1998 - Página 1298