Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS SOBRE AS INFORMAÇÕES E IMAGENS DE SATELITE APRESENTADAS PELO INPE, COMPROVANDO O AVANÇO DO DESMATAMENTO NA REGIÃO AMAZONICA.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • COMENTARIOS SOBRE AS INFORMAÇÕES E IMAGENS DE SATELITE APRESENTADAS PELO INPE, COMPROVANDO O AVANÇO DO DESMATAMENTO NA REGIÃO AMAZONICA.
Aparteantes
Ernandes Amorim.
Publicação
Publicação no DSF de 28/01/1998 - Página 1400
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, DADOS, INSTITUTO DE PESQUISAS ESPACIAIS (INPE), DESMATAMENTO, REGIÃO AMAZONICA, APREENSÃO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, EXCESSO, DESTRUIÇÃO, FLORESTA.
  • CRITICA, GOVERNO, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO, REGIÃO AMAZONICA, OMISSÃO, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE.
  • DEFESA, INCENTIVO, EXPERIENCIA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, REGIÃO AMAZONICA, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, CONTROLE, EXPLORAÇÃO, MADEIRA, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, DEFINIÇÃO, CRIME, MEIO AMBIENTE.
  • QUESTIONAMENTO, METODOLOGIA, GOVERNO, REFORMA AGRARIA, REGIÃO AMAZONICA.
  • APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), AUDIENCIA PUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), CIENTISTA, DEBATE, DADOS, INSTITUTO DE PESQUISAS ESPACIAIS (INPE).

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, primeiramente, parabenizo a Senadora Benedita da Silva pela solidariedade com que trata os problemas referentes ao desflorestamento da Amazônia, que é do interesse desta Casa, do Brasil e do mundo.

Ontem, o INPE apresentou à sociedade brasileira e ao mundo os dados referentes ao desflorestamento da Amazônia nos anos de 1995 e 1996. Esses dados foram obtidos por meio da análise de 229 imagens de satélites. Está de parabéns a equipe de competentes pesquisadores que realizou esse trabalho. Estou de pleno acordo com a avaliação do Ministro da Ciência e Tecnologia porque se existe algo a ser comemorado é o trabalho primoroso dos cientistas do INPE, que, repito, acabam de apresentar à sociedade e ao mundo, os dados referentes ao desflorestamento da Amazônia nesses anos. Houve dois meses de atraso, segundo o Ministério da Ciência e Tecnologia, em função de problemas financeiros da ordem de R$2,5 milhões, porque o Banco do Brasil, que era o agente financiador, teve problemas com este financiamento.

É bom que se registre, desde o início, que um trabalho dessa magnitude não poderia sofrer qualquer tipo de atraso em função de uma cifra que, para o desafio de preservar a Amazônia, é insignificante: R$2, 5 milhões.

            Sr. Presidente, o ano de 1995 foi recorde em devastação da Floresta Amazônica. Segundo os dados dos INPE, 29.059 km2 de floresta foram destruídos na região que tem 5.000.000 km2. No ano de 1996, 18.160km2 de floresta foram devastados.

Sr. Presidente, no Governo Collor houve um desmatamento de 12.062 km2; no Governo Itamar Franco, 14.896 km2 foram desmatados e no atual Governo, estamos apresentando para o mundo e para a sociedade a cifra de 23.600 km2 de florestas devastadas em nossa Região.

As fotografias dos satélites só alcançam o corte raso, pois a tecnologia de que dispomos não nos permite avaliar o corte seletivo de madeira. Se pudéssemos avaliar todos os cortes, constataríamos que a devastação na Amazônia é muito maior. Há um investimento no sentido de aumentar a capacidade de fotografia dos satélites para que possam, também, alcançar o corte de madeira.

Os dados disponibilizados fizeram com que alguns jornais do País publicassem algumas comparações. Um jornal publicou: “Neste Governo, houve uma devastação da Amazônia equivalente a 11% do total desmatado desde o descobrimento até agora”. Esse número não é insignificante. Segundo A Folha de S.Paulo,  nesses dois anos, 1995 e 1996, desmatou-se na Amazônia uma área equivalente ao Estado do Espírito Santo, ou seja, mais de 45.000 km2. Segundo O Globo, houve 60.257km2 de desmatamento nesses três anos. Nessa quantia está incluída também a projeção de 1997, porque, analisando quarenta fotografias, pode-se estimar o desflorestamento que ocorrerá em 1997.

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Nobre Senadora Marina Silva, V. Exª permite-me um aparte?

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Concederei o aparte a V. Exª assim que concluir meu raciocínio.

O jornal que publica os dados referentes a esses três anos - 60.257km2- -- diz que essa área equivale a uma Suíça e meia - para onde foi o Presidente Fernando Henrique Cardoso - ou então, à Bélgica.

Neste século já perdemos 469.000km2 de florestas tropicais nativas. Os dados mostram que cerca de 50% das áreas desmatadas concentram uma espécie florestal de alto interesse econômico. Isso pode ser comprovado por meio do perfil de ocupação da região, com um papel destacado para as empresas madeireiras no processo de destruição florestal. O próprio Presidente do Ibama, Dr. Eduardo Martins, reconheceu esse novo perfil no processo de devastação da Floresta Amazônica.

Concedo o aparte ao Senador Ernandes Amorim.

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Nobre Senadora Marina Silva, também eu, dia a dia, que sou de Rondônia, tenho acompanhado esse problema do desmatamento. Fico alegre ao ver que essas estatísticas dizem que de 30 caiu para 20, de 20 para 12 e de 12 para 10. Na verdade, devemos nos lembrar de que há um interesse muito grande, por parte das organizações internacionais e das pessoas que querem interferir na Amazônia, em fazer publicidade negativa, até porque, quando falam nesses desmatamentos e nessas queimadas, não subtraem da derrubada da mata aquelas que são feitas pelas queimadas de pastagens. E sempre, todos os anos, contabilizam os mesmos números e falam, com grande alarde, desse desmatamento que não existe. O próprio Plano Real não permitiu que houvesse derrubadas de árvores nas fazendas, porque os fazendeiros e a população estão empobrecidos com a falta de apoio governamental. Na maioria das vezes, é bom que se faça a ressalva, porque esses interesses escusos existem. A denúncia que fazemos das madeireiras asiáticas ainda não repercutiram no Governo Federal. No entanto, as queimadas na Amazônia têm diminuído constantemente, haja vista o novo modelo econômico, que se encarrega disso. Esse encolhimento da agricultura não é bom para o povo brasileiro. Contudo, é o que ocorre naquela região.

            A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT-AC) - Agradeço o aparte de V. Exª. Gostaria de esclarecer que essa avaliação foi feita não por ONGs, não por entidades internacionais, mas pelo INPE, que é ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Esse documento, assinado pelo Ministro Gustavo Krause, pelo Ministro da Ciência e Tecnologia, pelo Presidente do Ibama e pelo Presidente do INPE, não trata do problema de queimadas, mas do desflorestamento na Amazônia. As queimadas constituem outro problema. Não podemos avaliar para fazer a diferenciação entre o que está sendo queimado em termo de florestas nativas e o que está sendo queimado de pastagens. Está-se tentando fazer isso, inclusive o IPAN fez esse levantamento. O que se está sendo disponibilizado é a taxa de desflorestamento na Amazônia. Portanto, o que V. Exª está colocando é uma preocupação, mas não é disso que trata o processo de discussão em curso.

Sr. Presidente, o Ministro Gustavo Krause disse que os resultados apresentados são bons e mostram que o Governo está agindo, mas a primeira evidência que os números trazem é a de que o Governo não tem assumido uma política de desenvolvimento na Amazônia compatível com a conservação. Essa é apenas uma observação preliminar.

Estou apontando os dados ainda de maneira fria, sem fazer juízo de valor, porque, assim como a sociedade brasileira, deles tomei conhecimento ontem. Não queremos agir precipitadamente, vamos previamente analisá-los. Essa é a primeira vez que estão sendo colhidos dados de 100% do território da Amazônia, ou seja, dos 5 milhões de quilômetros quadrados. Antes, era feita apenas uma amostragem. Agora, em função disso, precisamos digerir esses dados antes de atirar qualquer pedra, até porque alguma parte da pedra também se voltaria contra todos nós, porque somos responsáveis pela Amazônia como um todo. Mas é claro que cabe ao Governo a maior responsabilidade.

Sr. Presidente, medidas meramente punitivas e de contenção, com leis ou o que quer que seja, sem levar em conta o processo de desenvolvimento incorporando novas práticas econômicas e sociais na Amazônia, não são capazes de fazer frente a esse problema da devastação. As experiências positivas que estão dando certo na Amazônia precisariam ser potencializadas pelo Governo como um mecanismo de barrar o processo de desmatamento, que é algo muito grave.

O crescimento da atividade madeireira nos preocupa e, com certeza, contribui muito para esse processo que estamos analisando.

O problema do direcionamento da reforma agrária para a Região Amazônica também é preocupante. O Governo tem que fazer o assentamento onde há pressão por terra e não deslocá-lo para a Amazônia. O Senador Ademir Andrade sabe muito bem que já temos uma demanda reprimida por terra na própria região. Não podemos aceitar esse processo de se retirar sem-terra de determinadas regiões do País, onde há uma grande concentração de terras na mão de poucos, numa tentativa de resolver o problema na Amazônia. Os projetos de assentamentos são práticas do Governo; portanto, não se pode atribuir qualquer atividade que está sendo feita pelos projetos de colonização aos próprios colonizadores, que seriam os colonos e, sim, no caso, a quem orientou essa nova fronteira agrícola, que é, em última instância, o Governo.

O Governo Federal anunciou treze medidas - inclusive, um número bastante sugestivo, que é o número do meu Partido - mas de imediato só será possível encaminhar apenas duas medidas. Uma diz respeito à implantação de programas de florestas nacionais e a outra, à proteção de 100% de áreas na Amazônia; as demais precisam de regulamentação e de criação de leis.

Eu diria que o Governo esqueceu de acentuar alguns pontos - pelo menos no pacote de medidas que ainda não tive tempo de analisar. Numa leitura rápida, assinalo alguns programas que considero fundamentais, fulcrais para esse processo, como o Programa Amazônia Solidária, que, muito embora tenha sido aprovado pelo Governo, não consta do Orçamento da União para 1997, com os recursos necessários para a sua implementação. Esse programa teria enorme repercussão porque vai direto ao problema dos pequenos extrativistas.

Ontem, o próprio Ministério do Meio Ambiente, na pessoa do Dr. Eduardo Martins, avaliou que há um crescimento exagerado das cidades na Amazônia. Sessenta por cento da sua população está vivendo em cidades, segundo dados oficiais, onde há uma crescimento de 4% ao ano da população, em contraposição ao resto do País, cujo crescimento anual é de 2,7%.

É grave imaginarmos programas como esse, que foram discutidos com os próprios extrativistas, frutos da experiência local de quem sabe que uma das saídas para a Amazônia é fazer com que a sua vocação agroflorestal seja levada a cabo. Essa vocação acontece por intermédio da implementação dos sistemas agroflorestais, de uma parceria entre os cientistas, pesquisadores, que podem dar assistência técnica para esse novo processo produtivo em vez de incentivo a qualquer outra atividade que causa devastação. É claro que as áreas que já foram devastadas precisam ser potencializadas, tanto para a agricultura como para a agropecuária, mas não podemos abrir novas frentes porque, do contrário, estaremos incentivando esse processo de devastação.

A análise que estou fazendo é muito rápida, Sr. Presidente. Um dos primeiros testes que o Governo está enfrentando, a partir de agora - não sei se a matéria já foi votada na Câmara - é a lei do crime ambiental, sobre a qual foi feito um trabalho muito sério no Senado, com a participação da comunidade científica, juristas renomados, o próprio Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal, o Ministério da Justiça. O Senador Lúcio Alcântara e eu debruçamo-nos durante meses para chegarmos a um substitutivo, que foi votado e aprovado por unanimidade nesta Casa. Lamentavelmente, na Câmara dos Deputados ele está sofrendo uma alteração em 36 dos seus artigos, o que considero um prejuízo para a Lei Ambiental. O próprio Presidente do Ibama diz que, das multas que aplicou, num total de R$2 milhões, só pôde arrecadar R$800 mil, em função da ausência desse instrumento legal.

Sr. Presidente, quero retornar a esta tribuna para fazer uma avaliação e algumas sugestões, mas, de pronto, estou apresentando um requerimento à Comissão de Assuntos Sociais, presidida pelo Senador Ademir Andrade, convocando para uma audiência pública o Ministro da Ciência e Tecnologia, o Ministro do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal alguns representantes de ONGs e da comunidade científica. O objetivo dessa audiência é que o Congresso Nacional possa digerir, num debate de alto nível, o que está sendo posto para a sociedade, que é a taxa de desflorestamento da Amazônia, e para que se construa com responsabilidade as sugestões a serem apresentadas ao Governo pelo Congresso Nacional e pela sociedade, pois a responsabilidade de preservar a Amazônia é de todos os brasileiros, mas, acima de tudo, de quem está no Governo e pode, com medidas concretas, evitar que a nossa floresta continue a ser devastada.

Sr. Presidente, quero anexar ao meu pronunciamento a nota expedida pelas entidades não-governamentais, apontando uma avaliação preliminar e alguns dados que não poderiam ser analisados agora, pela exigüidade do tempo.

Sr. Presidente, o meu Estado contribuiu com uma taxa de 433 km2 e o vizinho, o Estado do Senador Ernandes Amorim, contribuiu com 2.432 km2 no total dessa devastação.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/01/1998 - Página 1400