Pronunciamento de Júlio Campos em 04/02/1998
Discurso no Senado Federal
CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROJETO DE LEI DO SENADO 218, DE 1996, DE SUA AUTORIA, QUE PREVE A OBRIGATORIEDADE DE RECOMPRA DE EMBALAGENS NÃO BIODEGRADAVEIS POR PARTE DAS EMPRESAS PRODUTORAS E IMPORTADORAS DE BEBIDAS E ALIMENTOS.
- Autor
- Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
- Nome completo: Júlio José de Campos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
- CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROJETO DE LEI DO SENADO 218, DE 1996, DE SUA AUTORIA, QUE PREVE A OBRIGATORIEDADE DE RECOMPRA DE EMBALAGENS NÃO BIODEGRADAVEIS POR PARTE DAS EMPRESAS PRODUTORAS E IMPORTADORAS DE BEBIDAS E ALIMENTOS.
- Publicação
- Publicação no DSF de 05/02/1998 - Página 2365
- Assunto
- Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
- Indexação
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- ANALISE, AUSENCIA, VANTAGENS, EMBALAGEM, AUMENTO, LIXO, POLUIÇÃO, MEIO AMBIENTE.
- JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBRIGATORIEDADE, INDUSTRIA, AQUISIÇÃO, EMBALAGEM, POSTERIORIDADE, UTILIZAÇÃO.
O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, anos atrás, no início da década de 1970, um humorista da revista norte-americana Time desenhou, numa caricatura que ficou célebre, a estátua da Liberdade coberta até a cintura de lixo. Na legenda, podia-se ler estas palavras, à guisa de protesto do próprio monumento: “Arre! Embalagens sem retorno”.
De fato, a cultura americana, por seu gosto pela praticidade, pela higiene pessoal e pela comodidade, havia progressivamente instituído no pós-Guerra a universalidade da embalagem dita one-way, que permitia aos usuários dos mais diversos produtos, sobretudo refrigerantes e produtos alimentícios, a despreocupação total com a questão, considerada incômoda, da devolução dos frascos e embalagens aos fornecedores. Estes, por sua vez, aproveitavam-se do corte dos custos com o transporte dos frascos de volta às unidades de produção para aumentar seus lucros, impondo também aos produtos sobrepreços que ultrapassavam o custo das próprias embalagens sem retorno.
Esse é o tipo do lucro mesquinho, da higiene idiota, da instituição socialmente suicida em que o interesse da preguiça se choca com o interesse maior da continuidade da vida e da economia. Trata-se de questão de tal evidência, que é surpreendente que só tenha vindo a ser considerada quando o problema do lixo tomou as proporções ironizadas por aquele humorista.
A higiene individual proporcionada por se lidar com uma embalagem de uso único, por exemplo, contradiz a higiene coletiva pelo acúmulo de lixo causado pelo descarte de milhares de frascos de refrigerante e potes de creme, geralmente feitos de vidro ou plástico, materiais não degradáveis pela natureza que se vão acumulando nos “lixões” e provocando perda de qualidade de vida das populações urbanas.
A economia trazida pela ausência de custos de transporte de retorno das embalagens, por seu lado, contradiz a economia planetária, tanto no que diz respeito ao envenenamento dos ambientes naturais, causado pela deposição de lixo por toda parte, quanto do ponto de vista do desperdício que representa o não-reaproveitamento das embalagens.
O problema, naquele país, já está colocado em outros termos hoje em dia, tanto pela volta das embalagens retornáveis quanto pelo surgimento de uma forte mentalidade a favor da reciclagem das embalagens não retornáveis. Assim é, por exemplo, que o turista brasileiro, em terras de Tio Sam, talvez estranhe ver gravado, nas tampas das latinhas de cerveja e Coca-Cola, um valor em centavos, às vezes diferente em cada Estado por questões de tributação, que o usuário receberá ao devolver a lata ao supermercado. O mesmo se dá com as embalagens plásticas de um litro ou mais: os supermercados costumam ter uma área em que estão enfileiradas várias máquinas de retorno de embalagens, uma máquina para cada tipo -- plásticos, alumínio, vidro, etc. --, que as reciclam e fornecem moedinhas a quem nelas as coloca.
É verdade que já temos, no Brasil, uma consciência embrionária dos problemas ambientais causados pelo lixo. A capital dos paranaenses, Curitiba, por exemplo, é uma cidade famosa por sua qualidade de vida e por ter um sistema altamente desenvolvido de classificação e reciclagem de lixo, de que participa toda a população de suas áreas mais centrais. Outras cidades vêm empreendendo formas menos avançadas de reaproveitamento dos rejeitos industriais e domésticos.
No entanto, sem que um bom estímulo, maior que a mera conscientização ecológica, seja dado para que a população recicle as embalagens, muito material reaproveitável continuará a ser direcionado aos aterros sanitários, perenizando o desperdício. E qual maior estímulo conhecem V. Exªs. que a remuneração pecuniária?
Por isso, apresentei o Projeto de Lei nº 218, de 1996, que prevê a obrigatoriedade da recompra de embalagens não biodegradáveis por parte das empresas produtoras e importadoras de bebidas e alimentos. O valor de recompra, como ocorre com as mencionadas latas de cerveja nos Estados Unidos, deverá ser gravado de forma permanente nos vasilhames, para que seja público e reconhecido. O projeto prevê ainda que os estabelecimentos atacadistas e varejistas que comercializam os produtos poderão servir de intermediários dessa recompra, de modo a torná-la mais cômoda à população em geral.
Uma medida como essa se faz necessária quando se sabe que as grandes redes de supermercados tendem a preferir os produtos acondicionados em embalagens não retornáveis, como denunciou reportagem do jornal Estado de S. Paulo de 11 de novembro do ano passado. No caso dos refrigerantes, por exemplo, a proporção de garrafas de vidro retornável nos supermercados caiu de 82% em 1992 para 34% em 1995, enquanto as embalagens de polietileno descartável subiam em sua participação de 7,3% para 53%. Outro tipo de embalagem que experimentou grande crescimento foi o das latas, que não passavam de 1,7% em 1992 e atingiram 5,3% das vendas em supermercados em 1995.
Os comerciantes alegam, como seria de se esperar, que as embalagens não retornáveis têm duas vantagens fundamentais: primeiro, cortam os custos com a manutenção do setor de retorno de embalagens vazias e com a quebra de vasilhames; segundo, estimulam as compras por impulso, só possíveis se o freguês não precisar trazer frascos para troca. Por essas razões, apontava a reportagem, os setores de marketing dos supermercados se esforçam em convencer os consumidores a trocar as embalagens retornáveis -- de cerveja, por exemplo -- pelos novos vasilhames sem retorno.
Mais uma vez, podemos constatar que nosso País, sob o pretexto equívoco de modernidade, caminha na contra-corrente das tendências dos países mais avançados. Pesquisas realizadas nos países da OCDE mostram que a devolução de embalagens, naquelas nações, já atinge valores entre 80 e 90%, chegando mesmo, em alguns países, à totalidade. Aqui, pelo andar da carruagem, corremos o risco de ver algum chargista, à exemplo do americano, soterrar a estátua carioca do Cristo Redentor em uma pilha de latas de guaraná.
Embora o tratamento legal do assunto enseje alguma polêmica, estou seguro de que a iniciativa é da maior relevância para a melhoria dos problemas do lixo das grandes cidades e para a economia de materiais para o fabrico de embalagens. Uma lei nesse sentido tem ainda a vantagem de estimular a pesquisa e o desenvolvimento de embalagens biodegradáveis, além de representar a criação de postos de emprego com a infra-estrutura logística necessária para o retorno dessas embalagens. Por isso, solicito a atenção dos meus eminentes Pares para a apreciação, o aprimoramento e a aprovação desse projeto.
Muito obrigado.