Discurso no Senado Federal

CRISE NA PECUARIA LEITEIRA, OCASIONADA PELO DESCASO DO GOVERNO FEDERAL FRENTE A IMPORTAÇÃO DE PRODUTOS CONGENERES SUBSIDIADOS NOS PAISES DE ORIGEM. DEFESA DE POLITICA DE ALIQUOTAS ALFANDEGARIAS QUE PRESERVE OS SETORES PRODUTIVOS NACIONAIS.

Autor
Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PECUARIA.:
  • CRISE NA PECUARIA LEITEIRA, OCASIONADA PELO DESCASO DO GOVERNO FEDERAL FRENTE A IMPORTAÇÃO DE PRODUTOS CONGENERES SUBSIDIADOS NOS PAISES DE ORIGEM. DEFESA DE POLITICA DE ALIQUOTAS ALFANDEGARIAS QUE PRESERVE OS SETORES PRODUTIVOS NACIONAIS.
Aparteantes
Ernandes Amorim, José Bianco, José Eduardo, Mauro Miranda, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 11/02/1998 - Página 2610
Assunto
Outros > PECUARIA.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, SETOR, PECUARIA, LEITE, RESULTADO, ABERTURA, GOVERNO FEDERAL, IMPORTAÇÃO.
  • DEFESA, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, GOVERNO FEDERAL, POLITICA, PROTEÇÃO, PRODUTOR, LEITE, AMBITO NACIONAL, CRIAÇÃO, ALIQUOTA, ALFANDEGA.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o Governo atual, do Presidente Fernando Henrique Cardoso, tem feito um esforço enorme para corrigir os erros do passado. Aliás, a participação nesse esforço tem sido pedida a toda a sociedade brasileira: aos trabalhadores, aos empresários do campo e aos da cidade. Enfim, a sociedade brasileira tem contribuído para essa correção, combatendo as causas de problemas que ocorreram durante sucessivos governos, que não se preocuparam com o futuro do País.

Assim aconteceu com a criação do Proer. Aliás, não sabemos ao certo qual o valor envolvido nesse Programa de Apoio ao Sistema Financeiro. Alguns falam em R$40 bilhões, outros em R$50 bilhões. A verdade é que a soma é astronômica.

Sr. Presidente, em relação à rolagem das dívidas dos Estados, que o Senado tem que apreciar - e quase todas as rolagens têm sido aprovadas -, só para citar um exemplo, a de São Paulo ultrapassou a casa dos R$60 bilhões; a securitização das dívidas dos agricultores com débito de até R$200 mil atingiu R$7 bilhões; o lançamento do refinanciamento das cooperativas, para tentar arrancá-las da crise que se abate sobre um setor fundamental para a economia brasileira, deve atingir R$2,5 bilhões; o novo programa de atendimento aos produtores rurais com dívidas superiores a R$200 mil pode chegar a R$13 bilhões. Enfim, todas essas medidas adotadas pelo Governo têm uma relação direta com os sucessivos erros do passado, quando eram adotadas políticas imediatistas, que não pensavam no futuro e, sim, quase sempre, na próxima semana ou no próximo mês.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, falarei de um problema, que, a princípio, pode parecer não ter relação com o início do meu discurso. Mas a relação existe, porque evitaremos que o futuro governo, seja o do Senhor Fernando Henrique Cardoso ou o de outro presidente, tenha que lançar mão de uma outra medida para corrigir a falta de atitude do atual Governo. Refiro-me a um setor que muitas vezes é esquecido, mas que está presente na vida das pessoas todos os dias. Falo da pecuária leiteira, que atravessa uma das suas mais graves crises em toda a nossa história.

Para que os Srs. Senadores que não têm uma relação direta com a agricultura e, portanto, com o setor leiteiro, possam entender: qualquer cidadão, hoje, que entra em um bar e pede um copo de água mineral pagará R$0,60. Hoje, há produtores em várias regiões do Brasil, do Rio Grande do Sul ao Rio Grande do Norte, passando pelo Paraná, por Mato Grosso do Sul, do Senador Lúdio Coelho, pelo Amazonas, do Senador Bernardo Cabral, que já vendem um litro de leite a R$0,09 . Em alguns casos, chegam a vender a R$0,08, quando o leite é extracota. Ou seja, o produtor vende a R$0,20 o litro, quando estabelecido pela cota, e, quando extrapola a cota, entrega esse leite a R$0,09 o litro. Trocando em valores, chegaremos à conclusão de que um produtor precisa vender de sete a oito litros de leite para comprar um copo de água mineral em um bar.

Sr. Presidente, não sei qual é o custo de produção de um copo de água, mas o Senador Mauro Miranda, de Goiás, que é hoje o Estado que mais cresce em produção de leite no País, pelos investimentos feitos pelo Governo do Estado, incentivando a produção leiteira, e pelos seus produtores, sabe que esse crescimento que Goiás está tendo e que alcança vários Estados brasileiros, resultando também num crescimento extraordinário na média da produção leiteira brasileira, não tem a contrapartida de políticas de apoio, em especial na política externa do Brasil, o que está matando a produção leiteira.

Outro dia, em aparte ao Senador José Bianco, eu disse que não adianta implementarmos diretamente ao produtor medidas de apoio, se não resolvermos o problema, a causa principal da crise que se abate sobre o setor. Vejam que, há cinco anos, estávamos produzindo 15,5 bilhões de litros por ano. Passamos a 20,5 bilhões de litros. Isso significa que os produtores fizeram sua parte: investiram em tecnologia, em melhoramento genético, em equipamentos; modernizaram a atividade. Alcançaram um nível de produção que poderia ser considerado razoável não fosse o nosso consumo ainda baixo, em torno de 128, 130 litros leite/ano, por pessoa, quando a Organização Mundial da Saúde recomenda 90 litros/ano. Os nossos países vizinhos, Uruguai e Argentina, já atendem a esse índice estabelecido pela Organização Mundial da Saúde. Pois bem, mesmo não atendendo à demanda recomendada pela OMS, os produtores já estão oferecendo leite suficiente para atender ao mercado nacional.

O grande problema é que, mesmo estando a oferta ajustada à demanda, o País insiste numa política de importação sem precedentes, sem critérios. Não há proteção ao produtor nacional, não há alíquotas que sejam pelo menos razoáveis para equiparar o preço do produto no mercado nacional com o do produto que está sendo importado. Isso é fácil verificar. Para se produzir uma tonelada de leite na União Européia gasta-se US$3 mil. E o leite importado da mesma União Européia chega ao Brasil custando US$1, 7. E não há milagre algum nisso. Há, sim, um forte subsídio por parte dos governos da União Européia, que há cinco anos iniciaram um programa de redução do número de matrizes em produção com o objetivo de atingir a meta de reduzir em 20% o número de matrizes, uma vez que lá existe uma grande oferta em relação ao consumo. Eles precisam encontrar países ingênuos como o Brasil para colocar esse excedente de produção, mesmo que o governo tenha que subsidiar fortemente, como tem feito em relação ao leite que importamos. Segundo dados do IBGE, até outubro do ano passado, os subsídios chegaram a US$400 bilhões. Sem nenhuma dúvida, essa importação é a causa da derrubada de preços em plena entressafra - persiste na safra, porque já estamos em período de alta produção.

Concluindo o raciocínio, não há mais no Brasil aqueles períodos de grandes quedas de produção na entressafra que ensejariam o apoio do Governo à importação para cobrir um eventual déficit. Não; os produtores hoje já suplementam o seu rebanho nas épocas de baixo poder nutritivo das pastagens. Evidentemente, isso faz com que a curva seja muito mais próxima da reta. Ou seja, não temos mais aquele período em que a produção cai a ponto de se precisar de importação. A produção de leite é quase constante durante todo o ano. Portanto, nada justifica o ingresso de produtos importados no nosso País, ainda mais porque o Governo não tem feito uma fiscalização condizente com os fatos que têm sido denunciados em relação ao Mercosul. É sabido que parte do leite que entra no nosso País vem com o carimbo argentino, mas tem origem na União Européia. Enviam o produto via Argentina, pagando uma taxa de 16% ao invés de 27%, se o produto viesse direto ao Brasil. E, da Argentina para o Brasil, em função das tarifas privilegiadas do Mercosul, não pagam nada. Reduzem, portanto, um custo de importação de 27% para 16%. Ora, Sr. Presidente, 11% em um mercado de margens comprometidas significam muito. Somando-se ao subsídio de US$1,3 mil por tonelada, o produtor de leite brasileiro fica sem nenhuma possibilidade de competir, mesmo que fosse o mais eficiente do mundo.

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Pois não. Ouço o aparte do nobre Senador Ernandes Amorim.

O Sr. Ernandes Amorim (PPB-RO) - Nobre Senador Osmar Dias, V. Exª aborda um assunto de sumo interesse, principalmente para nós, ligados à agricultura, à pecuária e ao homem do campo. Se observarmos a política do Governo em relação às importações, veremos que há problemas não só na área do leite, mas também em outras, como a borracha, a seringa. O Governo tanto fala - e há lei aprovada nesta Casa mediante a qual se faliu o projeto de borracha no País -, mas importa a borracha de outros países com um custo muito mais baixo. Não se toma providência alguma para impedir que essa borracha seja importada com subsídio, o que leva os produtores à falência. No caso do leite, o meu Estado de Rondônia está sofrendo essas conseqüências: antes do Plano Real, o Governo financiou matrizes no valor de US$500, mas hoje elas não valem US$200. Lá um litro de leite custa R$0,10 ou R$0,08. Isso desestimula o produtor rural, que acaba migrando para as cidades, deixando de produzir, de exportar o leite. O pior, nobre Senador, é que no nosso Estado a maioria dos produtores tomou esse financiamento, prevendo a melhoria do preço do leite. Mas, diante dos juros altíssimos do mercado, estão sendo levados à falência, perdendo suas propriedades, transformando-se em sem-terra. Isso está ocorrendo, portanto, por falta de uma política nessa área, principalmente pela importação de leite subsidiado. Ouvi comentários segundo os quais o Presidente da República estaria tomando providências nesse sentido. Até agora, no entanto, o problema não foi resolvido. Oxalá, com o discurso de V. Exª, as autoridades tomem conhecimento do problema e inibam essa importação que traz prejuízos para os nossos produtores. Parabéns pelo seu discurso.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Obrigado, Senador Ernandes Amorim.

Se a política cambial deve ser mantida para o bem do Real, entendo que, também para o bem da nossa moeda, é preciso que o Governo tome providências em relação à destruição dos setores produtivos que vem sendo feita sistematicamente por importações desnecessárias que atendem apenas ao desejo de empresas importadoras, de fazerem capital de giro com o crédito privilegiado. Esse crédito é concedido com um prazo de mais de um ano de prazo e 8% de juros ao ano. Não se faz, portanto, a importação propriamente dita, necessária, mas usa-se a importação para formar capital de giro de empresas importadoras.

O Sr. Mauro Miranda (PMDB-GO) - Permite-me um aparte, Senador Osmar Dias?

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Concedo o aparte a V. Exª, Senador Mauro Miranda.

           O Sr. Mauro Miranda (PMDB-GO) - Senador Osmar Dias, V. Exª aborda um assunto importantíssimo para o meu Estado e para o Brasil. O Estado de Goiás é o segundo maior produtor de leite do País - e V. Exª fez referência a isso. Ficamos orgulhosos do trabalho dos agricultores e pecuaristas do nosso Estado. V. Exª disse que se paga em torno de R$0,08 por litro de leite. Digo mais, porque também sou pequeno produtor de leite: no nosso curral estão pagando em torno de R$0,05 por litro. Cada latão de 50 litros corresponde a R$2,50. Este é o meu testemunho: recebi essa proposta e estou fornecendo grande parcela do leite produzido por esse preço, porque não se pode jogar o leite fora num momento como esse. Nós, de Goiás, agradecemos a V. Exª, por analisar essa questão com profundidade. Faço este alerta ao Presidente da República: pelo menos nesses programas sociais, teríamos condições de disputar, em condições de igualdade, com esses importadores que, por meio de subsídios do mercado europeu, prejudicam tanto os nossos agricultores. Queremos fixar o homem na terra e somos favoráveis à reforma agrária. Precisamos dar alento principalmente aos pequenos agricultores. A produção leiteira é um forte elemento de fixação do homem no campo. Agradeço as palavras de V. Exª. Eu as endosso com a certeza de que, nesse momento, todo o Estado de Goiás também o faz. Estamos prontos para, juntamente com os demais Senadores interessados, conversar pessoalmente com o Ministro da Agricultura, para mostrar a S.Exª o posicionamento desta Casa em relação a esse problema gravíssimo, que hoje atinge os pequenos produtores nacionais, especialmente os produtores de leite. Muito obrigado.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Senador Mauro Miranda, V. Exª conhece o sacrifício feito por um produtor para atingir um grau de produtividade que o coloque no mercado. Levam-se anos para se conseguir o melhoramento genético de um rebanho; isso não é feito de um momento para outro. A seleção deve ser rigorosa. Há descarte de animais e prejuízos que, muitas vezes, são imprevisíveis. Enfim, há um enorme investimento para se alcançar uma boa qualidade do rebanho. Investe-se muito em equipamentos, em infra-estrutura e em treinamento de pessoal. Tudo isso poderá ser jogado no lixo se o Governo não adotar uma medida rigorosa neste momento, com o intuito de evitar as importações desnecessárias e a competição desigual entre os nossos produtores.

Na verdade, estamos pagando subsídios que são dados aos produtores europeus e, sobretudo, abrindo mão de um setor que ainda é responsável por mais de 500 mil empregos em todos os Municípios deste País. Esse setor existe em todos os Municípios de norte a sul do País e também é responsável pela viabilização de outros setores da agricultura, como o da produção de milho e de forrageiras, onde produtores fazem verdadeiros consórcios e participam de projetos integrados, viabilizando pequenas propriedades em todo País.

Para evitar que seja necessário eliminar as conseqüências, o Governo precisa combater a causa, estabelecendo uma política de apoio ao produtor nacional e não ao produtor do Mercado Comum Europeu.

O Sr. José Bianco (PFL-RO) - Permita-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Concedo o aparte a V. Exª. Posteriormente, concederei um aparte ao Senador José Eduardo.

O Sr. José Bianco (PFL-RO) - Senador Osmar Dias, eu não poderia deixar de cumprimentar V. Exª, que, mais uma vez, assume a tribuna de forma já conhecida e reconhecida por todos nós, ou seja, com competência. V. Exª é um expert na área da agricultura. Quero abordar - recentemente falei sobre isso da tribuna e, inclusive, tive a honra de ser aparteado por V. Exª - essa questão a que V. Exª faz referência na tarde de hoje. Desejo falar desse preço irrisório - poderíamos dizer que, na verdade, é ridículo - que se oferece ao produtor do leite. No meu Estado, o litro de leite está sendo vendido a oito centavos. Realmente, não há mais como levar isso adiante. Hoje, quando estamos em nossos gabinetes, somos pressionados, pelo telefone, pelas cooperativas e pelas pequenas associações rurais. Quando estamos nos nossos Estados, constantemente somos procurados por esses agricultores e por seus representantes, que estão aflitos com essa situação. Quero reafirmar isso, na busca de sensibilizar as autoridades desse setor. Evidentemente, conforme acabou de dizer o nobre Senador Mauro Miranda, todos somos favoráveis à reforma agrária, mas, se não apresentarmos uma solução para essa questão, haverá um contra-senso. Será dada a terra e condições mínimas ao agricultor; será concedido um financiamento, com recursos do FNO, do FCO ou do FNE, a esse novo assentado, que, daqui a quatro ou cinco anos, estará vivendo a mesma situação dramática daquele agricultor que hoje já está assentado. Cumprimento V. Exª pela importância do seu discurso.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Senador José Bianco, sou eu quem agradeço a V. Exª, que iniciou o debate desse assunto nesta Casa. Tive a honra de aparteá-lo. Esse é um dos assuntos mais importantes concernentes ao setor rural.

Olho para o Senador Levy Dias e sei que S. Exª está pensando o seguinte: se o Senador Mauro Miranda está produzindo leite a RS$0,05 e os produtores brasileiros, a RS$0,09, é melhor então dar esse leite aos suínos. Mas, na hora de vender os suínos, isso não vai adiantar nada, porque também os suínos estão sendo vendidos a preços que inviabilizam a produção de qualquer produtor, seja ele pequeno, médio ou grande, já que não cobrem o custo de produção.

Em média, a produção diária dos produtores de leite do País é de 50 a 60 litros. O Senador José Eduardo, que falará em seguida, sabe disso. Não sei se estou enganado, mas, se multiplicarmos 50 litros por oito, obtém-se um total de quatro reais por dia. Essa é a receita de um produtor brasileiro de leite. Enquanto isso, na União Européia, um criador recebe, por uma vaca, um subsídio de US$2,4 mil do Governo. Pode-se pensar: é melhor ser vaca na Europa do que produtor de leite aqui. Não é bem assim, mas, na Europa, um criador tem recebido por uma vaca bem mais do que o produtor de leite deste País.

O Sr. José Eduardo (PTB-PR) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães. Fazendo soar a campainha) - Senador Osmar Dias, lembro que o tempo de V. Exª está se esgotando.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Sr. Presidente, se for possível, eu gostaria de ouvir o aparte credenciado do Senador José Eduardo Vieira, que foi Ministro da Agricultura.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - É claro. O tempo pertence a V. Exª e ao Senador José Eduardo Vieira.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Obrigado, Sr. Presidente.

Concedo o aparte ao nobre Senador José Eduardo.

O Sr. José Eduardo (PTB-PR) - Senador Osmar Dias, V. Exª aborda dois aspectos importantíssimos da economia nacional. O primeiro diz respeito à produção agrícola, não só a do leite ou a do frango. O preço do milho, da laranja, do alho, da cebola, do algodão e de tantos outros produtos está muito alto, pois, periodicamente, tem havido uma concorrência desleal por parte dos produtos importados. Mas, aproveitando a minha experiência no Ministério da Agricultura, devo confessar que sempre tive muita dificuldade em sensibilizar alguns setores do Banco Central e do Ministério da Fazenda, no sentido de que é necessário preservar a produção de certos produtos nacionais. Há uma corrente de economistas que pensam que, importando um produto barato, o cidadão brasileiro poderá consumir sem a preocupação de saber de onde vai tirar a renda para se tornar consumidor. Essa mesma corrente acredita que não precisamos produzir para pagar essas contas, que basta “rolar a maquininha”, ou seja, emitir papel. Dessa forma, descobriram um jeito fácil de rolar essas dívidas: a emissão da nota promissória corrigida em dólar. Há anos, quando não havia uma lei que permitia a emissão de papel-moeda corrigido em dólar, o Brasil quase chegou à bancarrota. Chegamos àquela fase chamada de default, em que o Brasil não tinha condições de pagar, porque não havia nenhuma entrada de recursos, nenhum investimento em moeda estrangeira no País, o que nos levou a uma situação de extrema dificuldade. Rolava-se o déficit interno por meio do pagamento de juros elevados. Assim, um iluminado descobriu que poderiam ser emitidas notas do Banco Central corrigidas em dólar e que, com isso, poder-se-ia atrair essa moeda tão necessária para a sobrevivência da nossa economia e do nosso País. A partir daí, entramos na fase em que se pagam juros caros para rolar o déficit interno, para atrair dólares e também para rolar o déficit da balança de pagamentos. Todos nós sabemos que isso não perdura por muito tempo. Sem dúvida alguma, trata-se de uma corrida para o precipício, para o desastre. Enquanto nossas autoridades não se conscientizam de que a única maneira correta de se pagar as nossas contas é aumentando a nossa produção e de que oferecer condições de igualdade ao nosso produtor não é concessão de subsídio - eu também sou contra todo e qualquer subsídio, na acepção da palavra, mas sou favorável a que se ofereça aos produtores brasileiros, sejam eles da agricultura, sejam eles da indústria, condições de igualdade com nossos competidores da Europa, da Ásia ou da América do Norte - enquanto nossas autoridades não atentarem para esses aspectos, que acho que são tão simples, de tão fácil entendimento, o Brasil vai continuar nessa corda bamba, nessa suspeição permanente, ou seja, se a nossa economia atingiu um estágio de auto-sustentação ou não. Mas o fato é que o patrimônio nacional hoje não vale nada, em função das altas taxas de juros. Por que produzir, por que investir, se aplicando no mercado financeiro pode-se ganhar tanto e tão facilmente sem risco nenhum? Muito obrigado pelo aparte.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Sr. Presidente, para concluir meu pronunciamento, gostaria de deixar aqui propostas rápidas que podem ser levadas ao Governo - pretendo fazê-lo, já o fiz, mas vou repetir -, que podem resolver esse problema. Três delas são casadas. Primeiro, o Brasil não pode mais continuar oferecendo essa oportunidade de se contratar importações com créditos de um ano de prazo de pagamento com 8% de juros, porque isso significa que empresas importam, colocam o produto no mercado nacional e ficam com o capital de giro. É preciso estabelecer, para o caso do leite e de outros produtos que estão sendo importados desnecessariamente um prazo máximo de 30 dias, porque aí, sim, as empresas só vão importar se necessário. Junto com essa providência, elevar a tarifa externa comum para 23%, a fim de dar paridade dos preços nacionais em relação aos internacionais e exigir que o preço praticado no mercado nacional seja o mesmo praticado no mercado interno da União Européia, para,. desta forma, fugirmos do subfaturamento, que tem levado as empresas às importações. E o Governo poderia dar aqui uma grande mão não usando leite importado nos programas sociais, porque esse é o maior absurdo: pegar o leite importado e colocar nos programas sociais do Governo, ao invés de dar preferência absoluta - não prioridade -, dando, isso sim, exclusividade para o leite nacional nos programas sociais de forma a aumentar o consumo do leite produzido aqui. E outra, que o Ministério da Agricultura cadastre novamente as empresas importadoras, porque é sabido também que estamos importando produto de segunda categoria, que não tem aceitação no mercado onde é produzido, e estamos aqui aceitando tudo, porque o consumidor nacional, menos exigente, talvez por não conhecer a origem desses produtos, aceita tudo. Mas quem tem a responsabilidade de fiscalizar é o Governo, que não tem primado pela qualidade dos produtos importados, e o Brasil aceita qualquer tranqueira, principalmente de derivados de leite. Quando vem um queijo, por exemplo, com um rótulo da Suíça ou da França, só o rótulo vale mais do que o queijo produzido nacionalmente, quando sabemos que, na maior parte, o queijo produzido em nosso País, não só o de Minas Gerais, como o de outros Estados, tem qualidade superior, porque a matéria-prima utilizada é superior.

Esse conjunto de medidas, somado a um projeto de minha autoria, aprovado no Senado, mas derrubado na Câmara, que estabelecia o fornecimento de um litro de leite para cada trabalhador que tivesse em sua casa uma mulher em gestação ou um filho de até dois anos de idade - foi aqui aprovado, se não me engano, com um relatório feito pela Senadora Emilia Fernandes, mas foi rejeitado na Câmara -, poderia aumentar o consumo de leite, somente esse programa, segundo projeção da Associação dos Produtores de Leite do Brasil, em um bilhão de litros. Muito mais do que aumentar o consumo, faria com que essas famílias carentes tivessem uma alimentação digna, porque hoje o maior motivo de repetência no primário é a subnutrição, e com o leite nós a estaríamos combatendo também.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Concedo o aparte ao Senador Ramez Tebet.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senador Osmar Dias, mais uma vez V. Exª retoma esse assunto tão importante para os nossos respectivos Estados, e para o Brasil. Em Mato Grosso do Sul, uma comissão de produtores de leite procurou-me para fazer uma simples reivindicação na direção que V. Exª está abordando, no sentido de que, pelo menos nos programas sociais, só se utilizasse o leite produzido pelos nossos produtores. E V. Exª agora acaba de ir mais longe, adiantando-se. É uma sugestão, acredito, que V. Exª faz ao Ministério competente, ao Ministério da Agricultura e a outras autoridades do sistema econômico, no sentido de que as famílias carentes sejam ajudadas com esse alimento, que é um dos mais preciosos. Permita-me dizer que - a frase, embora científica, é também poética - o leite é o divino alimento, e ele poderia muito bem ajudar no combate à subnutrição no Brasil, desde que o Governo adote uma política decisiva nesse sentido, que é o que reclamam os nossos produtores, que têm em suas vozes as mais representativas deste campo.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Obrigado, Senador Ramez Tebet. V. Exª é de um Estado importante na produção agrícola nacional e oferece um importante subsídio ao meu pronunciamento.

Sr. Presidente, V. Exª que é um homem que assume grandes lutas, esta é uma luta que merece ser assumida por todos os brasileiros, e custa muito menos que todos os programas que foram lançados para combater as causas, até a securitização da dívida - nem vou falar de Proer - o Governo gastou sete bilhões para securitizar as dívidas dos agricultores e pode gastar treze bilhões agora. Este programa que estamos sugerindo tem custo zero para o Governo e tem, sobretudo, a simpatia de toda a sociedade. A Reforma Administrativa, não tenho dúvida, é importante, e eu estou aqui para votá-la, juntamente com aqueles que a propõem, no sentido de diminuir os gastos do Estado e tornar a máquina administrativa mais eficiente.

A Reforma da Previdência, não tenho dúvida, é importante, mas, Sr. Presidente, peço o apoio de V. Exª para que não deixemos a vaca ir para o brejo. A produção de leite é importante; se querem manter o câmbio como está, tudo bem, mas há outras medidas para evitar a importação e salvar, dessa forma, o leite das crianças.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - V. Exª tem inteira razão e sabe que contará não só com o apoio da Mesa mas com o apoio da Casa, nessa luta que é em favor de uma grande parte da população brasileira, que tem, nesse produto, talvez, a base maior da sua alimentação.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/02/1998 - Página 2610