Discurso no Senado Federal

ALERTA SOBRE A IRRESPONSABILIDADE NO PROGRAMA DE PRIVATIZAÇÕES DO GOVERNO FEDERAL FACE A PRECARIEDADE DOS SERVIÇOS OFERECIDOS PELAS EMPRESAS DO SETOR ELETRICO, APOS SUA TRANSFERENCIA PARA A INICIATIVA PRIVADA.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • ALERTA SOBRE A IRRESPONSABILIDADE NO PROGRAMA DE PRIVATIZAÇÕES DO GOVERNO FEDERAL FACE A PRECARIEDADE DOS SERVIÇOS OFERECIDOS PELAS EMPRESAS DO SETOR ELETRICO, APOS SUA TRANSFERENCIA PARA A INICIATIVA PRIVADA.
Publicação
Publicação no DSF de 13/02/1998 - Página 2924
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, FORMA, GOVERNO FEDERAL, PROMOÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, SETOR, FORNECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MOTIVO, PRECARIEDADE, SERVIÇO, OFERECIMENTO, EMPRESA DE ENERGIA ELETRICA, POSTERIORIDADE, DESESTATIZAÇÃO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/ PT-SP. Para uma comunicação inadiável.) - Sr. Presidente, Senador Geraldo Melo, Srªs. e Srs. Senadores, o Brasil inteiro acompanha, estupefacto e com grande preocupação, os mais recentes acontecimentos no Estado do Rio de Janeiro. O serviço de energia elétrica foi privatizado, depois de ter os preços de suas tarifas reajustados três vezes acima do índice da inflação, sob o argumento de que era necessário corrigir a defasagem acumulada. Desde então, o serviço vem sofrendo uma degradação assustadora na sua qualidade.

As quedas de tensão e interrupções de fornecimento passaram a ser freqüentes, deixando as pessoas e empresas totalmente inseguras e à mercê de toda sorte de acontecimentos, como violência urbana, danos a equipamentos eletrodomésticos e industriais, perda de documentos e trabalhos urgentes, problemas de abastecimento de água, perdas de alimentos e, inclusive, adiamentos de operações cirúrgicas importantes - cerca de 50, pelo menos, numa única unidade hospitalar, conforme ressalta hoje Jânio de Freitas.

Esses problemas devem-se, principalmente, ao açodamento do Governo que inverteu a ordem natural dos acontecimentos. As empresas geradoras e distribuidoras de energia elétrica foram incluídas no PND - Programa Nacional de Desestatização, e foi iniciada sua privatização, para, só depois, ser estudado que modelo deveria ser adotado pelo setor. Até hoje tal modelo não está definido, e as vendas das empresas continuam em ritmo acelerado.

A legislação existente, que servia ao modelo majoritariamente hidroelétrico estatal, não está respondendo às demandas do modelo híbrido (empresas estatais e privadas). Criou-se um vazio jurídico-institucional que vem sendo preenchido na medida em que os problemas vão surgindo. Tal procedimento está transformando o arcabouço legal que rege os serviços de energia elétrica numa verdadeira “colcha de retalhos”, e já começam a aparecer incoerências e contradições.

Apesar de várias empresas já terem sido privatizadas, até hoje o órgão regulador e fiscalizador do setor (Agência Nacional de Energia Elétrica - Aneel) ainda não está totalmente estruturado. Prova é que só agora, em janeiro de 1998, o Diário Oficial publicou o primeiro edital de concurso público para a contratação de 103 técnicos de nível superior e médio, que deverão compor seu quadro de funcionários.

O diretor-geral da Aneel, ontem, informou que atualmente aquela agência conta com apenas 50 pessoas para fiscalizar e acompanhar o que ocorre com 40 milhões de consumidores.

O açodamento na privatização do serviço de energia elétrica, juntamente com os pesados reajustes que recaíram sobre o preço desse serviço imprescindível, sem que benefícios concretos fossem trazidos para a sociedade, representam um verdadeiro atentado à economia popular.

Não podemos esquecer que o Programa Nacional de Desestatização tinha, e ainda tem, como principal argumento a incapacidade do Estado brasileiro em atender às crescentes demandas na área de infra-estrutura. Como o Tesouro Nacional não disporia de recursos que pudessem ser usados na melhoria dos serviços públicos, visando proporcionar um atendimento de maior qualidade para a população, a venda das empresas teria sido a única solução encontrada. Entretanto, o que percebemos hoje, após uma série de privatizações na área de energia elétrica, por exemplo, é que as empresas privatizadas estão auferindo lucros cada vez maiores e, ao mesmo tempo em que promovem demissões em massa, deixam degradar sensivelmente a qualidade dos serviços prestados à população.

Aliás, com a Lei nº 9.249, ao contrário de seu discurso, o Governo incentiva as empresas a distribuírem os lucros ao invés de reinvesti-los. A referida norma legal taxa o lucro que é reinvestido com uma alíquota de Imposto de Renda de 20%, e aquele que é distribuído entre seus acionistas, sob o nome de juros, é taxado em 15%. Como diz Osiris Lopes Filho: “É uma inovação heterodoxa no funcionamento das empresas remunerar seus sócios com juros e não com lucros. Trata-se de incentivo tributário à usura. A remuneração dos sócios das empresas decorre da sua capacidade de gerar lucros. E não juros artificiais, induzidos e bancados pelo governo”. No ano de 1996, o lucro da Light foi de R$ 173 milhões; em 1997, R$132 milhões, totalmente distribuído entre seus acionistas, ao invés de ser aplicado na urgente melhoria dos serviços. O outro lado da medalha desses lucros foi a dispensa de aproximadamente 5.000 empregados da Light e a deterioração dos serviços à população. O que fez a Aneel diante de tal evolução? Decidiu, segundo revelou o Diretor-Geral, José Mário Miranda Abdo, em depoimento perante a CAE, no Senado, na manhã de ontem - até para dar uma resposta aos Srs. Senadores -, multar a empresa em R$2 milhões. Uma multa que está fazendo os acionistas da Light sorrirem.

Não satisfeito com essa forma de encorajamento à compra de empresas estatais, o Governo agora está engendrando mais uma inovação. Ele estuda a possibilidade de garantir a recompra das ações das empresas de energia elétrica e de outros setores que deverão ser vendidas nos próximos meses. O compromisso seria de recomprá-las ao preço de venda. Essa medida teria a finalidade de diminuir os riscos dos investidores no caso de queda nas Bolsas, como, por exemplo, a que aconteceu recentemente em decorrência da crise asiática. Ou seja, se os preços das ações despencarem num determinado período, o Governo recompraria as ações, transferindo para o Tesouro o prejuízo do investidor. Como já dissemos noutras ocasiões, seria mais um exemplo do famoso capitalismo sem risco. Uma situação em que o Governo, com a desculpa de alavancar o preço das ações das empresas estatais, incentiva a gestão temerária, pois os administradores não precisariam se preocupar. Afinal, um eventual prejuízo seria bancado pelo Governo. É o famoso princípio do lucro privado e do prejuízo socializado. Princípio que, segundo Celso Furtado, em sua obra magistral, Formação Econômica do Brasil, é um dos aspectos centrais da história do capitalismo brasileiro.

Contrariando a premissa governamental de que as empresas não dispunham de capacidade para investir, o Presidente da Eletrobrás, Firmino Sampaio, em dezembro de 1997, perante a Subcomissão de Reestruturação do Setor Elétrico da Câmara dos Deputados, afirmou: “Em relação ao papel da Eletrobrás como agente financiador, hoje temos uma empresa em condição muito especial. A Eletrobrás é a segunda empresa mais lucrativa do País, a primeira é a Telebrás”. Observou ainda Firmino Sampaio que a Eletrobrás “é uma empresa lucrativa, que tem todas as suas obrigações com os seus fornecedores e com os seus financiamentos externos rigorosamente em dia. Não há dívida vencida, nem dívida tributária. Não há absolutamente nada a reparar. (...) A condição da Eletrobrás de financiadora é tranqüila”.

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo. Faz soar a campainha.)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Sr. Presidente, peço a gentileza de me inscrever novamente para, após a Ordem do Dia, em cinco minutos complementares, completar este pronunciamento, dada a relevância do tema.

Como teremos um tempo sem sessão, peço o direito de me inscrever novamente para completar o meu pronunciamento, sem prejuízo dos demais oradores, ainda na sessão de hoje.

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Se houver a possibilidade regimental de fazê-lo, a Mesa o fará com o maior prazer, consciente da importância do pronunciamento de V. Exª.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Agradeço a V. Exª.

De qualquer forma, se não houver essa possibilidade, peço que seja transcrito na íntegra. Mas, Sr. Presidente, eu gostaria de pronunciá-lo na íntegra.

O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - V. Exª terminará o seu pronunciamento após a Ordem do Dia.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Obrigado pela atenção.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/02/1998 - Página 2924