Discurso no Senado Federal

DESATIVAÇÃO DA PRODUÇÃO ALGODOEIRA NO BRASIL. DEFESA DO AUMENTO DE INVESTIMENTOS PARA A COTONICULTURA. RESULTADO DO ENCONTRO REALIZADO, NA CIDADE DE SERRA TALHADA, EM PERNAMBUCO, ONDE FORAM DISCUTIDOS OS PROBLEMAS E AS PERSPECTIVAS DA CULTURA DO ALGODÃO NO NORDESTE.

Autor
Joel de Hollanda (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Joel de Hollanda Cordeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • DESATIVAÇÃO DA PRODUÇÃO ALGODOEIRA NO BRASIL. DEFESA DO AUMENTO DE INVESTIMENTOS PARA A COTONICULTURA. RESULTADO DO ENCONTRO REALIZADO, NA CIDADE DE SERRA TALHADA, EM PERNAMBUCO, ONDE FORAM DISCUTIDOS OS PROBLEMAS E AS PERSPECTIVAS DA CULTURA DO ALGODÃO NO NORDESTE.
Publicação
Publicação no DSF de 04/03/1998 - Página 3255
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • GRAVIDADE, DESTRUIÇÃO, PRODUÇÃO, ALGODÃO, BRASIL, CRITICA, POLITICA, ABERTURA, IMPORTAÇÃO, FALTA, PROTEÇÃO, CULTIVO, PRODUTO IMPORTADO, SUBSIDIOS, PAIS ESTRANGEIRO.
  • DEFESA, INCENTIVO, AGRICULTURA, ALGODÃO, REDUÇÃO, CUSTO, SEGURANÇA, FORNECIMENTO, MATERIA-PRIMA, INDUSTRIA TEXTIL, BRASIL, AUMENTO, OFERTA, EMPREGO, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.
  • ANALISE, DOCUMENTO, RESULTADO, ENCONTRO, MUNICIPIO, SERRA TALHADA (PE), ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), DISCUSSÃO, VIABILIDADE, RECUPERAÇÃO, CULTIVO, ALGODÃO, REGIÃO NORDESTE, NECESSIDADE, TECNOLOGIA, CREDITOS, REFORMA AGRARIA.

O SR. JOEL DE HOLLANDA (PFL-PE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, ao que tudo indica, o Brasil está alcançando, no corrente ano, o posto de maior importador de algodão do mundo. Esse fato é ainda menos aceitável quando lembramos que, há pouco tempo, nosso País era um dos grandes exportadores do produto.

O que se passou entre este e aquele momento foi, antes de tudo, a abertura comercial brasileira, que resultou na inserção do País em um mercado globalizado. Sabemos que essa tendência da economia mundial é praticamente inexorável e que pode trazer grandes benefícios para nossos setores produtivos - desde que o processo seja conduzido da maneira adequada para o desenvolvimento da economia nacional.

No caso da cultura do algodão, a abertura comercial não apenas foi realizada de forma abrupta, como também não se fez acompanhar por uma política agrícola compensatória que estimulasse a produção interna em conjuntura adversa. Os malefícios que daí estão advindo ao nosso País são inúmeros e extremamente preocupantes.

Alguns fatores vêm afetando sobremaneira a igualdade de condições que, teoricamente, deveria haver entre os produtores de diferentes países. Estados Unidos, Espanha e Grécia concedem elevados subsídios aos cotonicultores. A China e a Índia, principais produtores mundiais ao lado dos Estados Unidos, pagam à mão-de-obra rural uma remuneração das mais minguadas. Constatamos ainda que, em quase todos os países onde a cultura do algodão tem relevante importância econômica ou social, há programas consistentes de apoio ao seu desenvolvimento - o que é de se louvar.

Não bastasse o fato de nossos cotonicultores contarem com estímulos reduzidos, observamos que, no Brasil, as importações recebem todas as facilidades, em detrimento do consumo da produção interna. Assim é que os juros internacionais aplicados às operações de importação ficam na faixa de 6% a 8% ao ano, muitíssimo inferiores aos praticados em nosso mercado financeiro. Contam, ainda, os importadores com prazos elásticos de 180 a 360 dias, para efetuarem seus pagamentos, além de se beneficiarem da defasagem cambial.

A queda da alíquota do imposto na importação do algodão em pluma, que demorou demais para se iniciar, acabou ocorrendo de maneira brusca: durante o Governo do Presidente José Sarney foi reduzida de 55% para 10%; em 1991, já no Governo do Presidente Collor, foi reduzida a zero. Hoje em dia, encontra-se situada em 3%, alíquota insuficiente para fazer face às condições mais favoráveis dos produtores externos.

Não é de se estranhar, portanto, que a área plantada de algodão, no Brasil, venha caindo em plano íngreme: de 3,1 milhões de hectares em 1984, ela decresceu em quase dois terços, para 1,2 milhão de hectares em 1994. Ganhos de produtividade fazem com que a produção não mostre queda tão acentuada: de qualquer modo, a produção interna de 864 milhões de toneladas de algodão em pluma, em 1988, já caiu para menos da metade - menos de 415 milhões de toneladas em 1996, conforme dados da Companhia Nacional de Abastecimento - Conab.

Sem os estímulos necessários, inúmeros cotonicultores brasileiros têm aderido a outras culturas mais rentáveis. Não obstante, a cotação do algodão no mercado internacional vem se tornando novamente atrativa, com perspectiva de crescer ainda mais, tendo em vista a tendência de aumento do consumo mundial.

Há ainda outros fortes motivos para que incentivemos a cultura do algodão em nosso País. A indústria têxtil e de vestuário no Brasil é responsável por 11% do Produto Interno Bruto das indústrias de transformação. Esse importante setor industrial está dependendo cada vez mais da matéria-prima fornecida por produtores externos. As importações brasileiras de algodão, segundo estimativa da Conab, totalizarão cerca de 500 mil toneladas em l997, crescendo 39% em relação ao ano passado. Países como Argentina e Paraguai multiplicaram sua produção de algodão justamente para atender, no contexto favorável do Mercosul, à demanda brasileira crescente.

A dependência excessiva em relação ao suprimento de algodão pelo mercado externo, que já é bem superior à participação dos produtores nacionais, pode representar uma séria vulnerabilidade de nossa indústria têxtil de fibras naturais. Prevê-se que a proximidade do local de produção da matéria-prima será fator cada vez mais decisivo para a redução de custos e o aumento da competitividade em termos internacionais. Não se deve, tampouco, desprezar os efeitos negativos da importação crescente do algodão na desequilibrada balança comercial brasileira.

Uma das conseqüências mais sérias da desativação da produção algodoeira no Brasil é o desemprego da mão-de-obra rural, com sua conseqüente migração para as cidades. É sobretudo por essa razão que a Espanha e a Grécia oferecem expressivos subsídios aos plantadores de algodão. O Governo do Paraná está se empenhando em implementar um programa dessa natureza, tendo em vista o expressivo crescimento populacional da periferia das maiores cidades paranaenses.

Na Região Nordeste, o problema assume proporções mais sérias e até mesmo dramáticas, devido às dificuldades socioeconômicas que se acumulam na região. O algodão é cultura tradicional e de forte expressão econômica nos Estados nordestinos desde, pelo menos, o século XVIII. Nas áreas do agreste e do sertão, a cotonicultura apresenta ainda maior importância, considerando-se que há poucas opções de culturas alternativas.

O consumo industrial do algodão no Nordeste, com destaque para o pólo têxtil do Ceará, é bastante expressivo: fica em torno de 300 mil toneladas de algodão em pluma por ano, enquanto a produção regional, em 1996, foi estimada em 80 mil toneladas. No que se refere ao Estado de Pernambuco, segundo maior consumidor do produto, a produção interna de oito mil toneladas contrapõe-se a um consumo seis vezes maior. A saída para a indústria têxtil do Nordeste tem sido a importação da maior parte da matéria-prima que utiliza, o que cria uma perspectiva de futura instabilidade, a depender do comportamento do mercado internacional do algodão. Esse fato deve ser considerado tanto mais absurdo quando lembramos da necessidade imperiosa de desenvolvermos a agricultura nordestina, especialmente na zona semi-árida.

Para discutir os problemas e as perspectivas da cultura do algodão no Nordeste, estiveram reunidas, na cidade pernambucana de Serra Talhada, autoridades do Governo Federal e Estadual, de empresas estatais relacionadas à agricultura, de bancos oficiais e de entidades de classe dos produtores. O resultado do encontro traduziu-se na “Carta-Manifesto de Serra Talhada sobre a reativação da cotonicultura no Nordeste”, datada de 11 de julho de 1997.

É possível, de fato, reerguer a cultura do algodão no Nordeste de modo consistente, se forem conjugados os esforços de diferentes esferas do setor público aos dos produtores. Que medidas podem ser tomadas desde já?

Antes de tudo, é necessário incrementar o padrão tecnológico da cotonicultura nordestina. Amplas campanhas de difusão de tecnologias, voltadas para viabilizar a produção de algodão em bases rentáveis no semi-árido, devem ser realizadas pela participação conjunta da indústria têxtil, bancos oficiais, empresas estatais e secretaria estaduais e municipais de agricultura. Uma preocupação correlata deve ser a de possibilitar, conforme a Carta-Manifesto, “o fornecimento dos insumos e equipamentos mínimos necessários à produção de algodão no Nordeste, incluindo sementes, inseticidas, pulverizadores manuais, plantadeira e cultivador de tração animal, ao custo médio de R$200,00 por hectare ao ano”.

Os produtores, organizando-se em comunidades, associações ou cooperativas, podem facilitar o acesso às tecnologias, bem como às máquinas de descaroçamento, agregando, assim, valor ao seu produto. Fornecer sementes fiscalizadas e selecionadas; melhorar a qualidade extrínseca do algodão, difundindo métodos adequados de colheita e embalagem; fazer cumprir a legislação para destruir os restos culturais do algodão, como medida vital para vencer a luta contra as pragas, são exemplos de práticas que já não podem ser adiadas, se pretendemos que a cotonicultura nordestina sobreviva no mercado globalizado.

Outro ponto fundamental refere-se à viabilização de crédito com taxas de juros compatíveis com o mercado internacional, especialmente para os pequenos e médios produtores. É necessário ainda tornar efetivo o crédito de R$2,7 milhões destinado ao incremento das pesquisas e fomento do algodão no Nordeste, conforme aprovado em emenda orçamentária.

O soerguimento da cotonicultura deve associar-se também à reforma agrária, possibilitando o acesso à propriedade rural dos produtores sem terra, que receberiam financiamento e condições para produzir em uma unidade de 25 hectares.

Os resultados de todos esses esforços seriam, portanto, a viabilização agrícola do semi-árido nordestino, a fixação do homem no campo, promovendo-se a distribuição de renda, além da criação de um ambiente favorável à expansão da indústria têxtil no Nordeste. Estima-se que, no prazo de cinco anos, possam ser criados 300 mil empregos no semi-árido, por meio da duplicação da área plantada com algodão, agregando-se renda na razão de R$700 por hectare.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, não é possível dispensarmos uma tal oportunidade de avanço econômico e social no Nordeste brasileiro.

É por isso que, nesta tarde, saliento a importância desse esforço conjunto - Governo, empresários, instituições oficiais de crédito - para promover o soerguimento da cultura do algodão no Nordeste.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/03/1998 - Página 3255