Pronunciamento de Artur da Tavola em 06/03/1998
Discurso no Senado Federal
ANALISE DA CRISE DE VALORES CIVILIZATORIOS PORQUE PASSA A SOCIEDADE BRASILEIRA.
- Autor
- Artur da Tavola (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RJ)
- Nome completo: Paulo Alberto Artur da Tavola Moretzsonh Monteiro de Barros
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SEGURANÇA PUBLICA.:
- ANALISE DA CRISE DE VALORES CIVILIZATORIOS PORQUE PASSA A SOCIEDADE BRASILEIRA.
- Aparteantes
- Leonel Paiva, Marina Silva.
- Publicação
- Publicação no DSF de 07/03/1998 - Página 3528
- Assunto
- Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
- Indexação
-
- ANALISE, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), AUMENTO, VIOLENCIA.
- COMENTARIO, SIMILARIDADE, SITUAÇÃO, BRASIL, SUPERIORIDADE, INDICE, HOMICIDIO, MORTE, ACIDENTE DE TRANSITO.
- ANALISE, PROBLEMA, VIOLENCIA, AMBITO, CULTURA, CIVILIZAÇÃO, EDUCAÇÃO, POLITICA, IDEOLOGIA, CAPITALISMO, SOCIALISMO.
- OPOSIÇÃO, PRONUNCIAMENTO, LEONEL PAIVA, SENADOR, INJUSTIÇA, ACUSAÇÃO, CRISTOVAM BUARQUE, GOVERNADOR, DISTRITO FEDERAL (DF), RESPONSABILIDADE, VIOLENCIA, CAPITAL FEDERAL.
O SR. ARTUR DA TÁVOLA (PSDB-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o jornal Correio Braziliense de hoje traz uma primeira página inusitada, a aludida pelo Senador Leonel Paiva. Em seguida, lista os nomes de cerca de 170 e poucas pessoas mortas, neste ano - estamos em março -, em Brasília, por assassinato.
É uma primeira página vigorosa, muito bem-feita do ponto de vista jornalístico, porque coloca em corpo grande as letras com os nomes das pessoas, embaixo um “BASTA”, e dá as estatísticas dos assassinatos em Brasília, no ano de 1998 - uma média de dois homicídios por dia.
Essa manchete poderia estar em qualquer jornal do Rio de Janeiro que tivesse a idéia, em qualquer jornal de São Paulo e de outras grandes capitais. Essa manchete poderia estar no campo brasileiro; essa manchete poderia estar em todos os Estados onde houve a perda das casas, as enchentes, as mortes. Essa manchete poderia estar - como esteve - no Carnaval, ao se darem as estatísticas de acidentes automobilísticos com uma certa euforia de que eles haviam diminuído, quando, em acidentes automobilísticos, naqueles dias, mesmo com a euforia da diminuição, graças ao novo Código de Trânsito, morreram cerca de 170 pessoas. Essas manchetes poderiam estar, ao fim de cada ano, em todos os jornais brasileiros, em todas as televisões do País, pois a média anual de homicídios, no Brasil, é de 47 mil - maior que a de muitas e muitas guerras, como a do Vietnã, por exemplo, em um ano. Essa manchete poderia estar, igualmente ao fim de cada ano, ou no primeiro dia do ano, a focalizar o número de mortos em acidentes de trânsito, quase igual ao número de mortos por homicídios, na ordem, no Brasil, de 40 a 50 mil pessoas.
Enfim, os dados, nessa matéria da violência, não honram o momento brasileiro e nem os valores civilizatórios, educativos e culturais em torno dos quais a nossa sociedade está embasada.
A tendência imediata da política é a de ficar atribuindo culpas, ou seja, a Oposição culpa o Governo, o Governo culpa as estruturas. Evidentemente, isso é uma outra maneira de deformar o problema, o seu entendimento e o seu amadurecimento. A classe política erra muito quando toma essas matérias para bandeira de Oposição ou bandeira de Governo. Essa é uma forma superficial de abordar o problema, que não envolve o fundo da questão, até por que ele não é de fácil percepção. Ele integra tantos elementos, que não dá para erigir um, e justamente as campanhas e a política precisam sempre do réu, precisam sempre da figura visualizável, daquele ou daquilo em que se possa colocar a “culpa”, numa certa ânsia de busca de culpados, que é uma defesa natural da sociedade, num primeiro momento.
Falo profundamente tocado por tudo isso, em que pese não poder vir a esta tribuna, como seria glorioso e altissonante, com soluções. Tenho a impressão mais aguda de que estamos a viver, no Brasil e no mundo, uma grave crise de valores civilizatórios.
Quais são os valores em torno dos quais as sociedades se organizam? Fui, durante muitos anos, um adepto das idéias socialistas e das formas de socialismo propostas no mundo. Continuo adepto delas, apenas mudei o meu enfoque, porque compreendi, com muito sofrimento, que as formas do socialismo preservadas e mantidas pelo Estado, como sonhei, uma entidade independente, capaz de repartir a justiça com maior equilíbrio, desde que democrático, evidentemente, nunca fui a favor de Estados totalitários, elas engendraram Estados totalitários. E a lista da violência dos Estados totalitários é enorme. Mao Tsé-tung, um dos heróis da minha juventude, hoje se sabe, matou milhões de chineses. As tolices que Mao Tsé-tung fez no Governo geraram fomes cíclicas, que provocaram milhões de mortes.
Por outro lado, toda a visão que possuía dos sistemas capitalistas, enquanto a Guerra Fria predominava, também não era igualmente alvissareira. O capitalismo mata e matou muita gente. O capitalismo fez uma guerra estúpida no Vietnã. O capitalismo gerou a violência que ainda hoje medra no mundo.
Essa luta dos dois sistemas nos levou, por entusiasmo, generosidade de pensamento, cada um a integrar-se num: o socialismo, porque nos acenava com o ideal de justiça; o liberalismo, porque nos acenava com o ideal de liberdade. Ambas as alternativas se mostraram violentas, perversas, cruéis e não resolveram o problema das sociedades no tocante à sua escala de valores.
As sociedades mercantis que o capitalismo gerou são eficazes, são sociedades de trabalho, construtivas, criativas, porém são sociedades perversas. São implacáveis com quem não admite ou aceita o sistema; são implacáveis com os adversários e, sobretudo, são implacáveis com os fracos, aqueles que, por razões de natureza interna, psicológica, ficam à margem da sociedade e não se constituem com as energias e as voracidades necessárias a uma existência competitiva.
A Srª Marina Silva (Bloco/PT-AC) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Artur da Távola?
O SR. ARTUR DA TÁVOLA (PSDB-RJ) - Permito, Senadora, com muito prazer.
A Srª Marina Silva (Bloco/PT-AC) - Agradeço a V. Exª pela oportunidade do aparte e pela forma isenta como abordou a problemática da violência em Brasília e no Brasil. Enquanto o Senador falava sobre a manchete do jornal, imaginei fazer um aparte. Inclusive, o meu colega, Senador Lobão, desafiou-me, num acenar de cabeça: “E aí, Marina, qual é a resposta?” E eu disse: “Depois me pronuncio”. Com certeza, eu não teria a capacidade, que V. Exª teve, de agir sem ser movida pela paixão. Ouvindo agora V. Exª, acredito ter sufocado um pouco a paixão do respeito pelo Governador Cristovam Buarque, um professor competente, responsável e bastante comprometido com a defesa dos direitos humanos e com uma proposta política diferente de tudo o que existiu na política de esquerda tradicional e na busca da construção de uma alternativa adequada para o País, no espaço em que está governando. Com certeza, quando transferimos para a política a lógica perversa de fazer política, a primeira coisa que nos ocorre é levantarmos o bastão para julgarmos. Foi um pouco isto que tentei expressar quando abordei o episódio Sérgio Naya. Não adianta levantarmos o bastão para o Deputado, porque existem entranhas que precisam ser avaliadas, e não é na figura do Deputado em si que se resolverá o problema. Era isto que eu queria dizer. Com certeza, sobre o problema da violência não se pode simplesmente dizer que a culpa é do Governador ou que tem de haver mais - ou menos - polícia. Não estou aqui querendo isentá-lo de responsabilidades que porventura existam, porque o debate correto, responsável, que quer respostas, é o que busca atacar as causas e não simplesmente o que quer levantar o tema para obter qualquer tipo de crescimento político. Lembro-me que o Presidente Fernando Henrique Cardoso disse, certa feita, que: A democracia era muito boa, porque o bastão da ditadura era perverso. Não sei se V. Exª se lembra desse episódio. E alguém tentou deturpar as palavras dele dizendo que Sua Excelência estava com saudade do tempo da ditadura, que ele estava nos ameaçando com a ditadura. Naquela oportunidade, eu disse aos meus colegas: “Por favor, não vamos fazer desta forma, porque no contexto em que a frase foi dita eu não teria a coragem de dizer, conhecendo a sua trajetória política, que o Presidente está a favor da ditadura.” Penso que isto é fazer política com “p” maiúsculo: não pegar os fatos e os acontecimentos em si, e, a partir daí, criar alguns mecanismos, até como sofisma, que nos levam a determinadas verdades que não são reais. O problema da violência é grave e deve ser encarado pelo Governo que estiver no Palácio do Buriti, assim como é grave o problema da violência no Rio de Janeiro, em São Paulo e no meu pequenino Estado do Acre. Segundo dados do IBGE - e o meu Estado não é governado pelo PT -, o Acre tem o maior índice de violência contra as mulheres. Mesmo sendo uma opositora ferrenha do Governador Orleir Cameli - e tenho certeza de que o currículo do Governador Cameli jamais chegará a um centil do currículo do Governador Cristovam -, eu não teria coragem de vir a esta tribuna dizer que o problema da violência no Acre é exclusivamente culpa do Governador Orleir Cameli, porque fazer isso seria sofismar.
O SR. ARTUR DA TÁVOLA (PSDB-RJ) - Muito obrigado, Senadora. Agradeço a V. Exª o aparte.
Realmente, o tema é atraente e eu não gostaria de desviar o meu pronunciamento, porque, em seguida, o Senador Leonel Paiva vai pedir-me um aparte e o meu discurso irá por água abaixo, violentado por apartes de uma questão que não está no meu discurso.
O Sr. Leonel Paiva (PFL-DF) - Faço-lhe agora o pedido.
O SR. ARTUR DA TÁVOLA (PSDB-RJ) - O meu discurso, evidentemente, perderá a sua substância exatamente naquilo em que não desejava: transformá-lo numa discussão tópica.
O Sr. Leonel Paiva (PFL-DF) - Mas não posso deixar a verdade perder a substância, perdoe-me V. Exª. Gostaria de sugerir a todos quantos têm dúvida sobre a culpa que começassem por essa relação de nomes que está no jornal; que procurassem essas pessoas onde for possível encontrá-las - Rafael da Silva Ximenes, Nilva Peixoto dos Santos -, para dialogar com elas sobre o que está acontecendo com a segurança pública do Distrito Federal, sobre quem são os culpados. Penso que a culpa é de um dos que estão aqui nominados - destes cidadãos e cidadãs. Não cogito, em momento algum, duvidar da capacidade intelectual do Governador Cristovam; mau Governador do PT e excelente professor; cidadão honrado, honesto. Conheço-o pessoalmente. Há muito privo de sua vida pública, sempre o admirando e aplaudindo. Não está em questão o Governador Cristovam, mas sim o Governo do PT, que usa o dinheiro da União para fazer a segurança pública do Distrito Federal e não a faz; e quando a faz, com parte do dinheiro recebido, é de forma absolutamente incompetente. As pessoas que têm dúvida de quem é a culpa pela insegurança pública do Distrito Federal devem procurar nesta lista de nomes publicados, devem ir ao Campo da Esperança perguntar de quem é a culpa. Transcenda-se, extrapole a vida, vá à morte perguntar quem é o culpado. Quero agradecer a V. Exª, Senador Artur da Távola, mas não eu poderia deixar de reafirmar que a insegurança pública do Distrito Federal é fruto da incompetência do PT.
O SR. ARTUR DA TÁVOLA (PSDB-RJ) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, quero apenas dizer que considero muito injustas as observações do Senador Leonel ao culpar um governador por um problema de violência, sobretudo um governador do nível humanista do Governador Cristovam Buarque, que é de um outro Partido, de oposição ao meu, mas um homem de grande valor.
Tendo em vista que sou aqui, neste instante, vítima de uma violência não desejada, não natural, que é a discussão de assuntos tópicos sobre um tema que tentei abordar em profundidade, concluo que, realmente, é muito difícil falar sobre a matéria. Agradeço e deixo a tribuna neste momento, porque não há mais tempo e nem tenho mais o que dizer.
Muito obrigado.