Discurso no Senado Federal

HOMENAGEM AO DIA INTERNACIONAL DA MULHER.

Autor
Emília Fernandes (PDT - Partido Democrático Trabalhista/RS)
Nome completo: Emília Therezinha Xavier Fernandes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. FEMINISMO.:
  • HOMENAGEM AO DIA INTERNACIONAL DA MULHER.
Aparteantes
Lúdio Coelho, Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 11/03/1998 - Página 3673
Assunto
Outros > HOMENAGEM. FEMINISMO.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, MULHER.
  • COMENTARIO, ANALISE, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, MULHER, MERCADO DE TRABALHO, BRASIL, MUNDO.
  • COMENTARIO, DEFINIÇÃO, FUNÇÃO, MULHER, SOCIEDADE, BRASIL, CODIGO CIVIL, APROVAÇÃO, SENADO, GARANTIA, IGUALDADE, DIREITOS, COMPARAÇÃO, HOMEM.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, autoridades que nos escutam neste momento, mulheres brasileiras, o Dia Internacional da Mulher - 8 de março -, que lembramos hoje, reveste-se de particular importância em decorrência das novas conquistas da luta feminina e, principalmente, dos desafios que ainda estão colocados para as mulheres brasileiras.

Em primeiro lugar, é importante registrar os avanços das mulheres na sociedade, que, com determinação e competência, estão rompendo tabus, derrubando barreiras e indo além dos espaços tradicional e historicamente a nós reservados.

A presença destacada das mulheres na sociedade evidencia-se em setores de ponta da produção e serviços, na Medicina, na Administração de Empresas, na Polícia Militar, no campo da pesquisa e da ciência, da Comunicação, da Engenharia, da Informática e no Poder Judiciário, para citar alguns exemplos.

Esses espaços são fundamentais se vistos além do aspecto da conquista individual e tratados como exemplos ou referências e, acima de tudo, como estímulo para a mobilização coletiva das mulheres brasileiras, tanto na busca de sua valorização profissional, quanto na luta geral por cidadania, justiça social e democracia.

A personificação dessa situação poderia se chamar - até como uma forma de homenagem - Fernanda Montenegro, que, premiada como melhor atriz no Festival de Berlim, não deixou de lutar pelo conjunto dos artistas brasileiros e da cultura nacional, quando da recente votação da Lei dos Direitos Autorais nesta Casa.

Srª. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, ainda no campo dos avanços que obtivemos desde “8 de março” do último ano , destaca-se a aprovação do novo Código Civil Brasileiro, no Senado Federal, que passou a reconhecer e a afirmar formalmente, no texto da lei, o papel da mulher na sociedade moderna.

Ao substituir as expressões “todo homem” por “todo ser humano” e “pátrio poder“ por “poder familiar”, o novo Código Civil Brasileiro dá ordem legal à condição de igualdade entre homens e mulheres, de forma especial na direção da sociedade conjugal e da família.

Além disso, a eliminação da expressão “filhos ilegítimos”, que passam a ser tratados corretamente como “filhos”, avança na direção do fortalecimento do respeito, da consideração e da garantia de direitos iguais das crianças e do assumir responsável de deveres de homens e mulheres, como responsáveis pelo seu comportamento sexual e reprodutivo e pela sua função social e familiar.

Essas conquistas, aliadas a outras, como a do Planejamento Familiar - agora “de livre decisão do casal” -, tratado como questão de saúde pública, por meio de assessoramento, informação e educação, e a criminilazação do assédio sexual no Código Penal significam o cumprimento, ainda que parcial, de uma das metas apontadas pela IV Conferência Mundial Sobre os Direitos da Mulher, promovida pela ONU, em 1995.

Também não podemos deixar de resgatar, nesta reflexão sobre o Dia Internacional da Mulher, a vitória que obtivemos nas últimas eleições municipais de 1996, com o aumento da participação das mulheres nos Executivos e nas Câmaras Municipais, segundo dados do Instituto Brasileiro de Administração Municipal - IBAM.

O número de vereadoras em todo o País passou de três mil e oitenta e cinco (3.085) para seis mil e quinhentos e trinta e seis (6.536), registrando um crescimento de 111,86%, enquanto o número de prefeitas passou de 171 para 301, significando um aumento de 76,61%.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Concedo o aparte a V. Exª.

O Sr. Ramez Tebet (PMDB-MS) - Senadora Emilia Fernandes, peço-lhe, pela grande estima que lhe tenho, que me permita entrar nesse ponto do judicioso pronunciamento que V. Exª faz dessa tribuna, para acrescentar que este Senado mesmo é exemplo de crescimento da participação da mulher nessa nobilitante atividade que é a política. Basta salientar que, enquanto V. Exª discursa, a Mesa do Senado está ornamentada pela Senadora Júnia Marise, na Presidência, ladeada pela Senadora Marluce Pinto, que bem representa o Estado de Roraima. Acrescento a essa estatística a que V. Exª se refere, do crescimento da participação das mulheres na vida pública brasileira, que no meu Estado ostentamos um orgulho todo nosso, todo pessoal, todo de Mato Grosso do Sul: em cinco dos 77 Municípios do meu Estado as prefeituras são ocupadas por mulheres, e são Prefeituras importantes, como as dos Municípios de Angélica, Brasilândia, Mundo Novo, Porto Murtinho e Rochedo. E mais: na cidade onde nasci, de onde tenho meu título eleitoral, a minha querida Três Lagoas, no Estado do Mato Grosso do Sul, detemos um recorde no Brasil, que mais uma vez saliento: temos a única Assembléia Legislativa onde o sexo feminino predomina; isto é, das quinze cadeiras de Vereadores, oito são ocupadas por mulheres. Isso bem demonstra que tenho uma natural razão para me sentir orgulhoso e para interferir no discurso de V. Exª no exato momento em que lembra a estatística que está colocando as mulheres no patamar que vêm alcançando a cada dia. Permito-me ainda deixar registrado no pronunciamento de V. Exª uma alegria minha, toda pessoal. Quando fui Relator da Lei Eleitoral, vi com que bravura V. Exªs., Senadoras desta Casa, interferiram para que houvesse uma emenda de plenário - naquela oportunidade só poderia ser proposta pelo Relator. Foi a emenda que permitiu e garantiu a obrigatoriedade de que 20% das vagas para as Câmaras Municipais fossem reservadas às mulheres. Portanto, é com essa satisfação que homenageio as mulheres do Brasil, e agradeço muito a V Exª.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço o seu aparte, Senador Ramez Tebet. V. Exª tem sido nesta Casa, sem dúvida, um parceiro na luta pela igualdade.

Esses números que nós apresentamos, em relação às eleições em 96, e os que V. Exª apresenta, sem dúvida, embora ainda pequenos diante da potencialidade da mulher e da necessidade da participação feminina no poder, tornam expressivo o resultado da conquista da aplicação da “Cota de 20%” nas listas dos partidos, e da campanha “Mulheres Sem Medo do Poder”, coordenada pela Bancada Feminina do Congresso Nacional.

A partir de agora, com a ampliação da cota para 25%, já neste ano, e de 30% para as futuras eleições, a nossa responsabilidade está redobrada, não apenas quanto à participação nas eleições, mas, desde já, na luta para assegurar junto aos partidos o direito legal adquirido com a nova legislação eleitoral.

É importante que se diga e se registre a presença significativa, qualitativamente, das mulheres no Senado Federal, embora em termos numéricos ainda precisemos avançar. É importante que se registre que o Senado possui, atualmente, três mulheres na Mesa administrativa, enquanto que a Câmara, nesta Legislatura, não possui nenhuma. Portanto, é o exemplo de que nós ainda precisamos trabalhar, e com determinação e muito afinco.

A vida das mulheres brasileiras, no entanto, Srª. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, apesar desses incontestáveis avanços, não tem sido somente de vitórias e de conquistas, ainda temos grandes desafios pela frente, presentes no dia-a-dia da educação, da moradia, da saúde, do trabalho ou dentro, inclusive, dos próprios lares.

Em muitos casos, ainda, as mulheres continuam sendo violentadas, desrespeitadas em seus direitos humanos mais elementares, como demonstra pesquisa recente dando conta de que mais de 70% das agressões sofridas ocorrem dentro dos próprios lares, e, na maioria dos casos, na presença dos filhos.

Mulheres são exploradas no trabalho, têm menor oportunidade de emprego, ganham menos que os homens, são assediadas pelos chefes, cuidam da casa sozinhas, são contaminadas pelos parceiros, humilhadas em hospitais e continuam, ainda, solitárias persistentes nas filas que visitam presos e no cuidado aos familiares doentes.

Atualmente, o País convive com cerca de sete milhões de mulheres chefes de família, responsáveis pelo sustento e pela educação dos filhos, e vivendo com grandes dificuldades, de forma especial em relação à moradia, praticamente inacessível para a grande maioria.

Nesse sentido, buscando apoiar as mulheres chefes de famílias, apresentamos um projeto de lei, em março de 1997, destinando 20% dos recursos do Sistema Financeiro da Habitação àquelas mulheres que se encontrem nessa situação de responsabilidade maior, ou única, pela sustentação da família.

Na mesma direção, nesta última sexta-feira, dia 6 de março, a Portaria nº11, do Ministério do Planejamento, reconhecendo a gravidade da situação, estabeleceu que o atendimento às mulheres chefes de famílias seja incluído entre as prioridades de seleção para os empreendimentos e financiamentos habitacionais - o que esperamos seja, de forma urgente, concretizado na prática, por medidas efetivas.

No campo da saúde, as mulheres são atingidas com o aumento brutal da incidência da AIDS; com a ausência de acompanhamento pré-natal e, no caso das adolescentes, de orientação à prevenção da gravidez; ou, pior ainda, com a perda de seus filhos em clínicas e maternidades despreparadas, inescrupulosas ou criminosas até.

Mulheres ainda ganham filhos no saguão de hospitais, ou ainda, trabalhadoras rurais precisam deixar o campo pela cidade para clamar por saúde, educação e crédito, como aconteceu nesse final de semana, em Porto Alegre, no Estado que represento nesta Casa, o Rio Grande do Sul.

A tragédia do desemprego crescente, que se abate diretamente sobre a própria mulher, seu marido, ou filhos, é uma situação que dificulta, impede ou inviabiliza completamente o pleno desenvolvimento feminino no campo pessoal, profissional ou social. Diante disso, é fundamental que as mulheres brasileiras, a partir das conquistas obtidas, das experiências históricas acumuladas e das suas características peculiares, assumam o desafio histórico que a todas está colocado, a exemplo do que vem ocorrendo no mundo.

As eleições de 1998 se aproximam e é preciso que as mulheres brasileiras, candidatas em vários níveis e eleitoras, assumam a responsabilidade de dar a sua contribuição para o necessário e urgente processo de renovação da vida política nacional, em todas as instâncias do poder público.

Vamos, juntas, lutar para ocupar o espaço de poder que nos é devido, para, a partir dele, implementar um nova visão de administração pública, e de ação parlamentar, não apenas em benefício das mulheres, ou contra os homens, mas, acima de tudo, em favor da maioria excluída da população.

O Brasil e o mundo atual precisam de novas relações de poder, que tenham o desenvolvimento do ser humano como objetivo central, e não o lucro a qualquer custo, a competição desleal, a especulação predatória, o privilégio para os ricos, o desemprego crescente, a inadimplência e a exclusão social.

A sociedade brasileira clama, de forma especial neste momento, por uma nova forma de fazer política, que se paute pela solidariedade, pela moralidade pública, pela coerência pessoal e histórica, pelo espírito coletivo e, acima de tudo, pela transparência, pela democracia e pela ética.

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - Permite-me V. Exª um aparte?

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Concedo o aparte ao nobre Senador Lúdio Coelho.

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - Senadora Emilia Fernandes, são muito oportunas as declarações de V. Exª sobre a importância da mulher na vida pública. Participo inteiramente desse pensamento e tenho convocado as mulheres em meu Estado para que assumam as responsabilidades que têm na vida do País. A mulher sofre mais as conseqüências dos desajustes sociais; é sobretudo no lar que elas se refletem. Segundo dados de pesquisa internacional divulgados há pouco tempo, a mulher brasileira está entre as mais honestas do mundo. As mulheres, não sei se por falta de oportunidade ou se pelo fato de serem realmente mais corretas, não estão contaminadas por procedimento ilícitos, tão comuns na vida pública brasileira. Tenho a impressão de que uma participação maior da mulher na vida pública do nosso País, em todos os níveis, prestaria contribuição enorme para um novo rumo na administração do nosso País. Felicito e apóio V. Exª pelo que disse em seu pronunciamento. Muito obrigado.

A SRª EMILIA FERNANDES (Bloco/PDT-RS) - Agradeço a V. Exª pelo aparte.

O povo brasileiro está farto, e já está demonstrando isso, da política, da vaidade, do abuso do poder e de autoridade, do tráfico de influências, da conivência criminosa, do atropelo aos poderes constituídos, da impunidade, do desrespeito aos que produzem e trabalham ou, ainda mais grave, do desprezo à vida dos seus semelhantes. Daí a importância de se buscar ocupar espaços no poder a fim de que sejam resgatados os princípios, os valores éticos, morais e até humanitários que correspondam às expectativas, ao anseio do povo e, principalmente, do espírito coletivo, que o poder deve pleitear.

É nesse sentido que, na condição de mulher, mãe, avó, professora e Senadora da República, conclamo todas as mulheres brasileiras, de todas as profissões, de todos os segmentos sociais, raças, idades, cores partidárias e credos religiosos para construirmos uma grande corrente de sensibilidade, compromisso, ação e fé no presente e no futuro.

É um chamamento a todas que geram a vida, que, em grande parte, administram os seus lares praticamente sozinhas, educam os filhos, vivem a dupla jornada, sofrem com o marido desempregado ou um filho sem poder estudar, mas que, acima de tudo, nunca esmorecem.

Nós, que somos a metade dos eleitores deste País, vamos nos mobilizar, de norte a sul do Brasil, nas próximas eleições e fazer valer a nossa capacidade de participação, de fortalecimento da cidadania e, principalmente, de tomada de decisão na direção da autonomia da mulher e, em parceria com os homens, na melhoria da condição política, social e econômica de todos.

Vamos fazer do nosso voto um instrumento democrático e poderoso de combate à atual política econômica e social neoliberal, às relações de poder que impedem que todos tenham um emprego, uma vida saudável e plena, e que destrói sonhos, frustra perspectivas de vida e espezinha cinicamente a condição humana.

Além dos interesses específicos das mulheres, a nossa luta e o nosso compromisso é com o Brasil, com o conjunto da população, com os excluídos, com os trabalhadores, com os professores, com os aposentados, com aqueles que produzem, com os portadores de deficiência, com os jovens, com os idosos e com as crianças.

Os nossos direitos e espaços avançarão tanto quanto mais nos identificarmos com a luta de todos os brasileiros e participarmos efetivamente do poder político nacional, para transformá-lo, democratizá-lo e coletivizá-lo.

Essa é a nossa mensagem e a nossa reflexão neste dia dedicado às mulheres deste País e do mundo todo.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/03/1998 - Página 3673