Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS A REPERCUSSÃO, NO BRASIL E NO EXTERIOR DA EDIÇÃO ESPECIAL DA REVISTA VEJA SOBRE A AMAZONIA, QUE CIRCULOU A PARTIR DO DIA 24 DE DEZEMBRO PASSADO.

Autor
Gilberto Miranda (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: Gilberto Miranda Batista
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • COMENTARIOS A REPERCUSSÃO, NO BRASIL E NO EXTERIOR DA EDIÇÃO ESPECIAL DA REVISTA VEJA SOBRE A AMAZONIA, QUE CIRCULOU A PARTIR DO DIA 24 DE DEZEMBRO PASSADO.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/1998 - Página 3990
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DIVULGAÇÃO, SITUAÇÃO, SETOR, REGIÃO AMAZONICA, ESPECIFICAÇÃO, RECURSOS HIDRICOS, FAUNA, FLORA, RISCOS, DESTRUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, EXPLORAÇÃO, MADEIRA, PECUARIA, PESCA.
  • COMENTARIO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, NECESSIDADE, DEFESA, MEIO AMBIENTE.

O SR. GILBERTO MIRANDA (PFL-AM. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a edição de VEJA ESPECIAL AMAZÔNIA, que circulou a partir do dia 24 de dezembro do ano transato, teve extraordinária repercussão no Brasil e no Exterior. Contendo ilustrações primorosas, que ressaltam especialmente as múltiplas tonalidades do verde característico da floresta, em contraste com o azul do firmamento aqui e ali matizado pelo branco das nuvens, a revista reúne textos de qualidade também admirável, a merecerem atentas e percucientes leitura e meditação.

Sugerem, igualmente, algumas breves apreciações. Tales Alvarenga, discorrendo sobre a Sinfonia das Águas, revela-nos, em palavras didáticas e sobretudo singelas, que “os grandes rios da Amazônia corriam para o Oceano Pacífico ou para o Caribe”, antes que se erguesse, “há milhões de anos”, a Cordilheira dos Andes, bloqueando o livre curso das águas.

Represados, os rios uniram-se para fazer desabrochar “na Amazônia o maior lago da terra”, até que “as condições geológicas” gerassem a “saída para o lado oposto”, o caminho do Atlântico. Daí se concluir que lá havia uma quantidade de água muitas vezes superior a que hoje encontramos na vastidão de suas matas.

“Esse volume diluviano, cuja cauda ainda se precipita nos Andes de escarpas a 5000 metros de altura, logo deita numa planície com uma monotonia de relevo que é outra das excentricidades amazônicas”, esclarece o articulista. Pois, não há, em todo o mundo, outro território de iguais dimensões “como o da Bacia Amazônica”, com tão pouca variedade de altitude.

Subisse o Atlântico “apenas 55 metros, suas águas chegariam a banhar Tabatinga, na margem nacional do Amazonas, separando as fronteiras com a Colômbia e o Peru, distantes 4000 quilômetros do Oceano. O rio Amazonas, a cada mil metros do seu curso, em território brasileiro, tem um declive pouco acima de 2 centímetros, dando-se o movimento menos pela inclinação do terreno e mais pela pressão hidráulica, proveniente da força das águas impelindo as que estão à frente, tal como sucede ‘nos encanamentos domésticos”’.

Descida a Cordilheira, o volume de suas águas “recebe o reforço de 1100 afluentes”, transformando-se numa inavaliável massa líquida. Nas partes mais abertas do rio Negro, pode-se visualizar de forma nítida “a curvatura da terra na água”, assim como se vê “o horizonte no mar”. 

Perto da capital amazonense, o rio mede 100 metros de profundidade, um abismo coberto de água que, “embora gigantesco, é apenas um dos afluentes do Amazonas”. Existem, aproximadamente, mais vinte com semelhantes dimensões, “e centenas de outros que na Europa seriam considerados rios enormes”.

O rio Amazonas, à semelhança do eixo “de um sistema hídrico que corre junto ao Equador”, é depositário das águas de dois hemisférios, cada qual com sua própria e diferenciada estação de chuvas. Assim, na maior parte do ano ora acolhe as enchentes vindas do norte, ora as que chegam do sul. Quando transborda, suas águas “invadem campos e matas”, correspondendo a área inundada da Bacia Amazônica a um espaço territorial duas vezes superior ao da Áustria.

Tales Alvarenga registra que o regime de cheias tem uma duração aproximada de seis meses, constituindo “uma bênção da natureza”, em face de criar nas planícies alagáveis a concentração do mais rico viveiro da Amazônia. Trata-se, no entanto, “de um sistema ecológico em risco de vida”, segundo as avaliações de Michael Goulding, Nigel Smith e Dennis Mahar, autores do livro Enchentes da Fortuna.

A obra adverte que “grande parte da floresta das planícies de inundação já não existe mais ou foi grandemente alterada, sobretudo no médio e baixo Amazonas”. O sistema, recebendo menor atenção do que a devida, tende a sofrer danos irreparáveis, “a não ser que providências sejam tomadas urgentemente”.

Hoje, ainda é possível que, debaixo da superfície do rio, os “seus habitantes estejam sempre se movimentando para algum lugar. Tambaquis, pirapitingas, matrinxãs, piramutabas e dourados estão entre as multidões de peixes que desfilam rio acima em grandes cardumes para desovar”.

Certas espécies, como a piramutaba, deixam a cada ano o estuário do rio Amazonas e, percorrendo 3 mil quilômetros na direção oeste, desovam e empreendem a volta ao lugar de origem, numa distância equiparada à que separa Paris de Nova Iorque. O tambaqui, por sua vez, tem a peculiaridade de migrar para as áreas inundadas, onde alimenta-se fartamente com os frutos caídos das árvores. Na vazante, “vai para o canal dos rios”, jejua e emagrece, até a próxima época de enchentes.

Tales Alvarenga segue esclarecendo que, “nas planícies de inundação, vive ou passa parte do dia um terço das aves amazônicas”, como patos e marrecos, papagaios e araras. Também capivaras e múltiplas famílias de tartarugas usufruem “desse pomar amazônico”, assim como lontras e o peixe-boi - “o maior mamífero da região. Nas planícies alagadas, ele encontra um pasto verdejante, de onde consome 50 quilos de capim, ou 10% do seu peso, diariamente”.

No Amazonas, as várzeas inundadas se estendem por 40 quilômetros de cada margem, nesse espaço depositando toneladas de mato e terra que fertilizam o solo todos os anos. Aí “os caboclos plantam suas roças, aproveitando todo o adubo que o rio deixou”, enquanto o capim que logo cresce alimenta suas poucas cabeças de gado. “As florestas alagáveis, pelo abrigo e pela nutrição que fornecem a centenas de espécies, formam um dos ambientes ecológicos mais preciosos da Amazônia”, completa o articulista.

Porém, essas áreas, entre outras da floresta, “têm sofrido ataque constante, nas últimas décadas, principalmente entre Manaus e a região do estuário”, pelos que procuram obter dividendos econômicos à custa do patrimônio natural. São exemplos disso a exploração inconseqüente de madeira; a criação de bois e búfalos em terrenos impropriamente conquistados à floresta; a pesca comercial de exemplares ainda jovens ou em fase de desova.

Não fosse a proteção do meio ambiente um dever constitucional, aprovamos aqui, após longa tramitação, a Lei dos Crimes Ambientais, sancionada, com vetos, em 12 de fevereiro de 1998, pelo Presidente da República. É mais um instrumento que, pretendendo reverter a impunidade dos agressores da natureza, objetiva a manutenção da qualidade de vida e do meio ambiente, à força de rigorosa coerção legal.

Produto, em grande parte, do esforço da Frente Parlamentar Ambientalista, a nova lei consolida a legislação protecionista, sancionando o causador de danos ao meio ambiente com multas de 50 a 50 milhões de reais, e com o apenamento de detenção, de 6 meses a 1 ano, acrescido de multa, de quem cometer os crimes de matar, perseguir ou caçar animais silvestres, nativos ou em rota migratória. Em correspondente sanção incide quem destruir ou danificar as florestas.

Estamos concluindo, Srs. Senadores, estas breves considerações, registrando que a memorável edição de VEJA sobre a Amazônia expõe, em textos esclarecedores e ilustrações deslumbrantes, toda a realidade de uma região ameaçada, deixando subjacente, na lembrança do leitor atento, a necessidade de protegê-la contra todo tipo de agressão e em todas as circunstâncias.

De fato, a riqueza que nela se concentra há de ser defendida a qualquer preço, como patrimônio que é de todos os brasileiros, contra a cobiça de nacionais e estrangeiros que, em ações de desprezo às leis de resguardo do meio ambiente, intentam dela extrair, junto a bens materiais ainda abundantes, toda a inigualável beleza de suas matas e rios.

      Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/1998 - Página 3990