Discurso no Senado Federal

COMENTARIOS ACERCA DOS TEMAS A SEREM ABORDADOS NO SEGUNDO ENCONTRO 'CUPULA DAS AMERICAS', A REALIZAR-SE NO MES DE ABRIL PROXIMO, EM SANTIAGO NO CHILE.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • COMENTARIOS ACERCA DOS TEMAS A SEREM ABORDADOS NO SEGUNDO ENCONTRO 'CUPULA DAS AMERICAS', A REALIZAR-SE NO MES DE ABRIL PROXIMO, EM SANTIAGO NO CHILE.
Aparteantes
Jefferson Peres.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/1998 - Página 4926
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • COMENTARIO, REUNIÃO, REPRESENTANTE, AMERICA, REALIZAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, CHILE, DISCUSSÃO, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, POBREZA, MELHORIA, NIVEL, EDUCAÇÃO, REFORMULAÇÃO, INCENTIVO, PROMOÇÃO, BEM ESTAR SOCIAL.

         O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, como todos sabem, vai-se realizar a II Cúpula das Américas, no mês de abril, no Chile, dando seqüência àquela primeira reunião que aconteceu em Miami, a que o então Presidente Itamar Franco compareceu, juntamente com o Presidente eleito Fernando Henrique Cardoso, que ainda não havia sido empossado.

         Naquela ocasião, o Presidente Bill Clinton e os presidentes dos demais países do continente americano tiveram oportunidade de firmar o compromisso de promover uma integração cada vez maior entre os países das três Américas.

         E essa segunda reunião, que foi marcada para a cidade de Santiago, no mês de abril próximo, tem como principal ponto da agenda a integração da economia dos países americanos na chamada Alca - Área de Livre Comércio das Américas. Razões de política interna dos Estados Unidos fizeram que o Congresso americano não aprovasse o chamado fast track, quer dizer, que ele não delegasse ao Presidente dos Estados Unidos poderes para que S. Exª pudesse negociar com esses países os termos dessa integração, tanto sua abrangência, sua amplitude como um cronograma para que essa integração se dê. O que, de certa maneira, é uma grande aspiração dos povos americanos, que remonta ainda aos ideais de Bolívar, que se referia sempre à “Pátria Grande”, um país cujo território contivesse praticamente todos os países da América do Sul e que não pôde se concretizar, mas tem um embrião agora no Mercosul - no acordo entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai e, em fase de integração, o Chile e a Bolívia -, assim como no NAFTA - no acordo Canadá, Estados Unidos e México.

         Como esse aspecto da criação da Alca está prejudicado, porque o Presidente Bill Clinton não recebeu essa delegação do Congresso americano, não pode, evidentemente, haver negociação alguma - os demais países americanos não irão negociar se não souberem que o Presidente dos Estados Unidos está autorizado a fazer os entendimentos naqueles termos. Uma vez que isto não aconteceu, amanhã o Congresso americano poderia deixar de ratificar esses entendimentos e eliminar dessa agenda pontos que tinham sido acordados e que o Congresso americano não referendasse.

         Por esta razão, essa reunião se dará, agora, tendo como tema o combate ao narcotráfico, e, também, o combate à pobreza e a melhoria dos níveis de educação, como, aliás, já havia sido lembrado por ocasião daquela reunião de Miami. A questão do narcotráfico, então, prevê, inclusive, um centro de estudos na cidade do Panamá, e o Serviço de Inteligência norte-americano, segundo notícia do jornal Folha de S. Paulo de domingo, dará apoio à iniciativa, que, aliás, é uma proposta dos Estados Unidos.

         Essa discussão tem grande importância no momento em que nós nos lembramos que há grandes sinais de violência, de uma violência crescente nas maiores cidades brasileiras, em que drogas que, até então, não eram reconhecidamente consumidas e traficadas no Brasil - como é o caso da heroína -, estão integrando esse elenco.

         Hoje ou amanhã, haverá uma reunião do Conselho Nacional de Entorpecentes, em que, pela primeira vez, será apresentado o crescimento da apreensão de heroína no Brasil, que, de certa maneira, é um fato novo e extremamente preocupante em relação a essa questão do tráfico de drogas.

         Outro item importante que será tratado nessa reunião é o combate à pobreza, que afeta 150 milhões de pessoas na América. Portanto, há um contingente apreciável de pessoas vulneráveis a políticas econômicas que, de alguma maneira, reduzam a expansão das economias ou diminuam o nível de emprego, ainda que gerem a estabilidade econômica e provoquem o fim da inflação.

         É importante salientar o fato de que o combate à pobreza consta dessa agenda em discussão. Essas reformas que visam reduzir o tamanho do Estado, combater o déficit público e a inflação e, portanto, manter a estabilidade da economia, por si só, não produzem redistribuição da riqueza, não contribuem para reduzir a disparidade de renda entre as pessoas e entre as regiões desses países.

         Tanto isso é verdade que muitas dessas medidas levam ao aumento do desemprego, à perda de postos de trabalho e ao fechamento de indústrias e de estabelecimentos comerciais. Tudo isso é conseqüência não só dessas políticas recessivas, indispensáveis ao alcance da estabilidade econômica, mas também da integração das economias e, portanto, da necessidade de essas empresas competirem no mercado internacional com produtos de boa qualidade e com preços mais baixos. Uma conseqüência disso é a liberação de mão-de-obra.

         Nesse particular, também é interessante chamar a atenção para o que está sendo chamado de reformas de segunda geração, que, sucedendo-se a essas a que ainda estamos assistindo - venda de empresas estatais, privatização, redução do tamanho do Estado, combate ao déficit público e política de estabilização -, serão canalizadas para a solução dos problemas sociais nas áreas da saúde, da habitação, da educação, do emprego, da formação de mão-de-obra e assim por diante.

         Essas reformas poderão, de fato, ser assimiladas pelas populações e percebidas pelo povo, principalmente pelos mais humildes, pelos mais pobres, como algo que surge em seu benefício, como algo que tem um conteúdo social, que, inclusive, servirá para legitimar as chamadas reformas de primeira geração, a que já me referi.

         Se não forem feitas essas reformas que têm por objetivo promover o bem-estar social, certamente todo o nosso esforço para empreendermos esse grande programa de reestruturação dos Estados nacionais terá sido em vão, porque a parcela mais pobre da população, que, no Brasil e nos demais países, é também a mais numerosa, não terá se apropriado de nenhum benefício desse esforço e, certamente, mais uma vez, terá pago um alto custo pela sua implementação.

         Aliás, em 1994, a própria Cúpula de Miami havia incluído, entre as metas de integração hemisférica, a matrícula no curso primário de todas as crianças da região até o ano 2010 e a elevação para 75% da porcentagem de alunos que ingressam no curso secundário. Ainda estamos muito longe de alcançar esse objetivo no Brasil. Há um compromisso claro de que a questão da educação seja um instrumento de promoção da igualdade social, da igualdade de oportunidades para todos.

         Na reunião de Santiago, que será realizada no mês de abril, poder-se-á reafirmar o compromisso desses países na questão da educação, na questão do combate à pobreza e nessas chamadas reformas de segunda geração.

         Em Brasília, está sendo realizado um encontro do chamado Círculo de Montevidéu, integrado por Presidentes da República de vários países, por acadêmicos das universidades desses países e por líderes políticos de expressão. Nesse encontro, discute-se como lidar com essas questões sociais e como procurar solucioná-las no contexto dessas reformas econômicas, que são essenciais, importantes e fundamentais, mas que não podem esgotar-se em si mesmas.

         O Presidente Julio Maria Sanguinetti, do Uruguai, está presidindo essa reunião do Círculo de Montevidéu, organização esta que nasceu da sua inspiração e que, como eu disse, congrega políticos, acadêmicos, professores universitários e cientistas políticos. Na reunião de abertura, mais uma vez, ficou bem clara a necessidade de se ampliarem ações que tenham por objetivo solucionar esses problemas sociais, buscando, inclusive, o apoio nas chamadas instituições multilaterais, como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o próprio Fundo Monetário Internacional. O seu dirigente, Michel Camdessus, não pôde comparecer ao encontro, mas enviou uma carta, onde clama para que se promovam muitas dessas reformas - inclusive, as do Poder Judiciário -, no sentido de colaborar para que os princípios da justiça social possam ser implementados nesses países.

         Portanto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, com o meu pronunciamento, desejo chamar a atenção para o conteúdo desses debates, que, no mês de abril, deverão ser travados na segunda reunião da Cúpula das Américas, que sucede à primeira realizada em Miami em 1994, quando, talvez, por esse vazio que se deu, perdeu o sentido a discussão em torno da Associação de Livre Comércio das Américas - Alca, já que o Presidente dos Estados Unidos não está autorizado para tal pelo Congresso. Talvez por isso, esses assuntos relacionados ao combate ao tráfico e à pobreza e ao esforço pela educação terminaram ganhando um relevo que não teriam se a Alca fosse um tema predominante naquele encontro de Presidentes americanos.

         O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Permite-me V. Exª um aparte?

         O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Concedo o aparte a V. Exª.

         O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Senador Lúcio Alcântara, acompanho, com atenção, o seu discurso a respeito desse tema de tão grande relevância, importantíssimo para o nosso futuro e para o de todo o hemisfério, que é a formação e a concretização da Alca. Vale registrar, Senador Lúcio Alcântara, que a Diplomacia brasileira - faça-se justiça - conseguiu duas vitórias nessa fase preliminar, que terminou agora, quando da reunião de San José. A primeira dessas vitórias implicou dois recuos do Governo americano. A proposta americana era de que o Mercosul se dissolvesse na Alca, que o Brasil abrisse mão...

         O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - De negociar em bloco.

         O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - De negociar em bloco com o Mercosul. O Brasil, com o apoio dos seus parceiros, conseguiu fazer com que o Governo americano aceitasse a negociação em bloco. O segundo recuo também foi importante. O Governo americano não admitia incluir a agricultura na negociação, o que é importantíssimo para nós; eles não queriam abrir mão de reduzir os consideráveis subsídios que são dados à agricultura americana, tornando impossível a penetração de muitos de nossos produtos naquele mercado. Esses dois recuos americanos são uma vitória de toda a América Latina, e o Brasil teve um papel preponderante nisso. Penso que está havendo um processo de amadurecimento que fará com que a Alca surja não como uma imposição americana, mas como resultado de um consenso de todos os países do hemisfério. Parabéns pelo seu pronunciamento.

         O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE) - Muito obrigado, Senador Jefferson Péres. V. Exª fez uma referência correta. Na reunião de San José tivemos realmente os dois avanços a que V. Exª se referiu.

         É importante salientar que o Congresso americano, ao não conceder o fast track ao Presidente Clinton, melhorou a nossa posição de negociação. Por quê? Porque nenhum país vai negociar a Alca se o Presidente não estiver com esses poderes. Ele poderá negociar e, amanhã, o Congresso americano poderá modificar os termos dos ajustes que ele realizou em nome do seu governo. Portanto, seria debalde o entendimento que se tivesse firmado.

         Daí por que só pode haver conversa definitiva - claro que esses entendimentos vão ajudando, como V. Exª disse muito bem, a amadurecer a idéia -, só pode haver acerto final com o fast track. Aí, sim, o Presidente estará autorizado a fazer uma negociação definitiva com os países americanos, que são evidentemente muito mais frágeis do ponto de vista político e econômico e precisam ter muito mais segurança na hora de fazer essas negociações.

         Agradecendo o aparte do Senador Jefferson Péres, que contribuiu muito com mais informações sobre esse tema, cada dia mais importante para nós nesses tempos de integração e globalização econômica, encerro Sr. Presidente.

         Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/1998 - Página 4926