Discurso no Senado Federal

CRITICAS A CAMARA DOS DEPUTADOS REFERENTE AO ENVOLVIMENTO DOS DEPUTADOS, CONHECIDOS COMO PIANISTAS, NA FALTA DE DECORO PARLAMENTAR DURANTE AS VOTAÇÕES ACARRETANDO-LHES PROCESSO DE CASSAÇÃO DE MANDATO PARLAMENTAR.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • CRITICAS A CAMARA DOS DEPUTADOS REFERENTE AO ENVOLVIMENTO DOS DEPUTADOS, CONHECIDOS COMO PIANISTAS, NA FALTA DE DECORO PARLAMENTAR DURANTE AS VOTAÇÕES ACARRETANDO-LHES PROCESSO DE CASSAÇÃO DE MANDATO PARLAMENTAR.
Publicação
Publicação no DSF de 26/03/1998 - Página 5182
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • LEITURA, TEXTO, AUTORIA, ORADOR, DEMONSTRAÇÃO, INCOERENCIA, PRESIDENCIA, CAMARA DOS DEPUTADOS, PRETENSÃO, PUNIÇÃO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, DEPUTADO FEDERAL, RESULTADO, IRREGULARIDADE, VOTAÇÃO, SIMULTANEIDADE, IMPOSIÇÃO, BANCADA, PARTIDO POLITICO, CONDICIONAMENTO, LIBERAÇÃO, VERBA, INTERESSE, ESTADOS, VOTO FAVORAVEL, PROPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AMBITO, CONGRESSO NACIONAL.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, impressionado com o escândalo dos pianistas, dediquei-me, hoje, a refletir sobre o caso e redigi um texto que denominei “O Piano e a Flauta”, que quero reproduzir neste Plenário e publicar em algum jornal de grande circulação do País.

Vamos ao texto, Sr. Presidente:

O Piano e a Flauta

Em uma dessas recaídas de ocasião, para “lavar a imagem” de um Congresso acrítico e submisso, indigitam agora os Deputados José Borba e Valdomiro Meger, expondo-os ao apedrejamento ritual. E, igualmente acríticas, a mídia e a Oposição dançam no embalo do “tema da moralidade”, querendo desconhecer (ou tentando induzir ao esquecimento) que, ao fundo, tange a flauta encantada do Alvorada.

Basta parar a orquestra um minuto, para se dar conta de que o solo de José Borba, embora assincrônico, acompanhava a sedução do Hamelin palaciano.

Coordenador da Bancada governista paranaense, José Borba votou por Meger porque sabia que todo dissentimento, ainda que involuntário (no caso, ausência ao plenário), poderia significar punição a Meger e à Bancada, na forma de retenção de emendas orçamentárias, nomeações e represálias da espécie, pois é com esta batuta que o flautista-maestro comanda a Câmara.

Mesmo sabendo disso, o Presidente da Câmara, como se não fosse ele um dos principais instrumentalistas dessa orquestra, arma o flagrante e, mesmo tendo outras alternativas para evitar o crime, prefere a consumação do delito, para, depois, pousar às fotografias como campeão da moralidade.

Será que, com isso, ele pretendeu “lavar” também a sua imagem do terrível e inquietante episódio da invasão da convenção do PMDB pelos “camisas amarelas”, cuja entrada no plenário da Câmara foi atribuída à sua conivência?

“Camisas amarelas” (sucedâneos a caráter dos ”camisas verdes”, dos “camisas pardas”, dos “camisas pretas”), “pianismo”, tudo tem a ver, tudo faz parte do mesmo processo. É o rolo compressor esmagando discordâncias, violentando consciências, forçando ilícitos, constrangendo, comprando votos, estimulando a barganha barata (uma ponte, um posto de saúde...) pela cassação dos direitos da cidadania - vide a votação da Previdência e tantas outras.

Qual a diferença do toque dissonante de José Borba da atrapalhada “Macareña”, dançada por Ronivon e pares acreanos? Não regia a orquestra o mesmo maestro, não se tocava a mesma e medíocre melodia composta pelo flautista do Alvorada?

O que ouvimos no Congresso, à véspera de cada votação considerada “fundamental” pelo flautista e seus fiéis “primeiros-violinos”? A toada monótona de sempre: liberação de recursos da Caixa Econômica, do Banco do Brasil, liberação de emendas orçamentárias, nomeações para estatais. É com essa música que o nosso Hamelin enfeitiça a orquestra.

E agora querem punir um pianista, e louve-se: um fiel, fidelíssimo membro da orquestra, sempre atento à batuta do maestro, porque, na defesa das promessas feitas, quis que toda a sua Bancada participasse da récita, mesmo com um deles ausente.

Deixemos de hipocrisia, chega de tanta empulhação, basta de elogios e condescendências à roupa do rei nu. Não sejamos impassíveis e coniventes com essa - mais uma - descarada, impudica tentativa de “lavagem da imagem” de parte do Parlamento.

Por que punir o pianista e não a orquestra toda? Por que indigitar o pianista e isentar o maestro e sua flauta sedutora?

Embora acidamente criticado, o Senador José Eduardo Andrade Vieira não deixa de ter razão, quando diz que essa prática é comum, porque o “pianismo” não se expressa tão-somente no toque do botão, fraudando o voto. É “pianismo”, é fraude, assoprar a flauta do encantamento fisiológico para vender estatais a preço vil, para passar a emenda da reeleição, a reforma da Previdência, para rolar dívidas e aprovar empréstimos a Estados e municípios falidos.

José Borba e Valdomiro Meger poderão até ser punidos. No entanto, a orquestra continuará tocando a mesma e péssima partitura, sob a batuta do nosso inefável Hamelin.

Para terminar, ocorrem-me duas imagens: a do Titanic afundando e a orquestra, impassível, tocando; e a do flautista de Hamelin, encantando os ratos, mergulhando-os à morte no mar.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/03/1998 - Página 5182