Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DOS 100 ANOS DE NASCIMENTO DO EX-SENADOR LUIS CARLOS PRESTES, IMPORTANTE LIDER POLITICO BRASILEIRO.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DOS 100 ANOS DE NASCIMENTO DO EX-SENADOR LUIS CARLOS PRESTES, IMPORTANTE LIDER POLITICO BRASILEIRO.
Publicação
Publicação no DSF de 26/03/1998 - Página 5099
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CENTENARIO, NASCIMENTO, LUIS CARLOS PRESTES, VULTO HISTORICO, EX SENADOR, LIDER, PARTIDO POLITICO, PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO (PCB), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS).

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, os familiares de Luiz Carlos Prestes e o Senador Roberto Freire, pela iniciativa, recebem neste momento a minha manifestação.

Pouca coisa tenho a dizer depois de tão brilhante homenagem prestada pelo Senador Roberto Freire, enriquecida pelos apartes dos Srs. Senadores. No entanto, não poderia deixar de manifestar-me nesta justíssima homenagem aos 100 anos de nascimento de Luiz Carlos Prestes.

Poucos, mas pouquíssimos mesmo, foram os brasileiros que tiveram a honra de representar para o povo de nossa Pátria a figura da esperança. Um desses brasileiros, sem dúvida, foi Prestes, a quem o povo respeitosamente chamava de “Cavaleiro da Esperança”.

Não me identifico integralmente com a ideologia marxista que Prestes tão obstinadamente defendia, mas comungo com a maioria da Nação brasileira no respeito e na admiração pela coragem, coerência e integridade com que esse homem lutava pela liberdade e pela sua fidelidade ao nosso povo. Nesse sentido, podemos dizer que Prestes tornou-se um consenso nacional, apesar das considerações aqui feitas de que esse homem, que tinha tudo para odiar, amou.

Neste dia em que todos os patriotas reverenciam sua memória, gostaria de prestar-lhe homenagem em meu nome e em nome do povo fluminense, ao qual, em seu tempo, ele esteve tão ligado.

O nome de Prestes está indissoluvelmente vinculado à luta pela democracia, que tem marcado com sangue, lágrimas, mas também com muita alegria e orgulho, a História do Brasil deste século que se finda.

Levantando-se, ainda jovem, com o Movimento Tenentista para combater a corrupção, a degeneração e o elitismo do regime da República Velha, Prestes nunca mais deixou de estar no olho do furacão das lutas populares.

O Presidente Arthur Bernardes, ao derrotar o levante do Forte de Copacabana, em 1922, não estava derrotando o Movimento Tenentista, que, na realidade, nascia com aquela rebelião. Em 1924, no Rio Grande do Sul, o levante armado dirigido pelo então capitão Prestes dava continuidade ao movimento. A Coluna rebelde, que se tornou conhecida como Coluna Prestes, conquistou a simpatia popular e percorreu o País de norte a sul, marchando cerca de 24 mil quilômetros, sem sofrer nenhuma derrota militar. Os feitos da Coluna na imaginação popular fizeram de Prestes o “Cavaleiro da Esperança”.

O Movimento Tenentista foi um dos protagonistas mais decisivos da Revolução de 30, que conduziu Getúlio Vargas ao poder e construiu as bases do Brasil industrial e moderno. Numa decisão polêmica mas coerente com seu compromisso com a democracia mais radical, aquela que incluía a participação autônoma dos trabalhadores, Prestes se recusou a participar desse movimento.

Anos mais tarde, já como dirigente do Partido Comunista, Prestes fundou, em 1935, a Aliança Nacional Libertadora - ANL, uma frente de forças populares que lutava contra a ascensão do fascismo em nossa terra e pela conquista de um regime democrático e popular.

Getúlio fechou a ANL, conquista de regime democrático e popular. Getúlio fechou o que ganhava força, e Prestes organizou então uma insurreição armada, que foi sufocada pelo Governo. Em meio à feroz repressão e tortura de seus companheiros, Prestes foi finalmente preso e lançado em solitária, onde ficou por alguns anos.

Enquanto esteve preso, obteve a solidariedade de um movimento internacional que exigia a sua libertação, mas foi somente em 1945, após o avanço da democratização do País por força da pressão popular associada à adesão tardia do Brasil aos Aliados na luta conta o nazi-fascismo, que a anistia foi conquistada e Prestes, com inúmeros outros democratas e revolucionários, foi colocado em liberdade.

Sofrendo a pressão de hegemonia americana contra o Brasil, Vargas busca o apoio popular e defende a política nacionalista. Mesmo nunca perdoando Getúlio por ter entregue a sua mulher, Olga Benário, aos nazistas, Prestes o apóia nesse momento, coerente com a sua posição patriótica e anti-imperialista. Mas apesar do crescente apoio popular, Vargas é deposto pelas forças reacionárias e entreguistas.

Na eleições da Assembléia Nacional Constituinte, Prestes é eleito Senador por dois Estados, e o Partido Comunista e outras forças democráticas conquistam expressiva representação política e parlamentar.

Prestes se torna uma liderança de massas e o Partido Comunista, o maior da América Latina.

Mas a “guerra fria” já estava em curso e os Estados Unidos não podiam permitir a ascensão do movimento popular e democrático no Brasil, que ele considerava fazer de sua área de influência. Depois de muitas manobras antidemocráticas, em 1974 o registro do Partido Comunista foi cassado, bem como os mandatos de Prestes e dos deputados comunistas; e a repressão campeou contra todos os democratas e patriotas. Mesmo na clandestinidade, Prestes continuou sua luta, sem se intimidar com os riscos pessoais e políticos.

O golpe militar de 64 atingiu Prestes na condição de um dos mais prestigiados líderes do movimento democrático do País. Obrigado, pela ferocidade militar, a sair do País, Prestes continuou do exílio o seu bom combate. Anos mais tarde, a vitória da anistia, em 1979, trouxe para o País Prestes e todos os democratas. De volta ao Brasil, Prestes, mesmo com a idade avançada, continuou atuando ativamente, mantendo a sua coerência ideológica e política e não se deixando seduzir pelos cantos de sereia da política conformista.

Admiro em Prestes a coerência política que sustentou durante toda a sua vida. Num momento em que, lamentavelmente, virou moda se abandonar os ideais anteriores, a atitude digna de Prestes parece um anacronismo.

Ressalto também a coragem com que perseguia seus objetivos e assumia sua posição, não se intimidando diante de nenhuma dificuldade, mesmo tendo que passar dez anos em solitária, na clandestinidade ou no exílio; a integridade que manteve em todos os momentos de sua luta, nunca abrindo mão dos princípios éticos; o seu compromisso inabalável com o socialismo, com os interesses de nosso povo e de nossa Pátria.

Acredito que sua passagem na História de nosso País não foi em vão. Os exemplos que a vida continua inspirando vão reforçar ainda mais em todos nós, que lutamos para transformar o Brasil em uma Nação soberana, livre e justa, a coerência, a coragem e a integridade de nossas ações.

Luiz Carlos Prestes, que nós deixou aos 92 anos, sempre teve o sonho de alcançar a aliança de todas forças populares e democráticas. Esse sonho também é nosso.

Esse homem, que partiu com honradez, não comeu as criancinhas mas as defendeu. Defendeu também a liberdade de expressão. Derrubou todos os muros e foi indiferente às incompreensões.

Quis, propositadamente, como representante política do Estado onde ele teve uma brilhante atuação,. prestar-lhe essa homenagem. Não só pela sua atuação naquele Estado, mas também pela minha concepção religiosa, pois pude acompanhar a perseguição que se fazia a esse homem por sua opção filosófica. Em nenhum momento Prestes, sendo um homem que não professava a fé cristã, deixou de defender os nossos interesses com democracia. Isso me sensibilizava demais, porque eu estava dos dois lados: o dos meus queridos irmãos cristãos, que o perseguiam por ser um homem marxista, e ao lado de Prestes, porque defendia, com coerência, todo o interesse social para os menos favorecidos e para nós, os cristãos.

Por esse motivo, vim a esta tribuna prestar a minha humilde, porém sincera, homenagem a este grande homem, ao comunista Cavaleiro da Esperança.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/03/1998 - Página 5099