Discurso no Senado Federal

REGISTRO DA COMEMORAÇÃO, HOJE, DO DIA MUNDIAL DA SAUDE. REFLEXÃO SOBRE A SAUDE PUBLICA NO PAIS. DEFESA DE MAIOR ABRANGENCIA DO PROGRAMA DE ATENÇÃO INTEGRAL DA SAUDE DA MULHER - PAISM. HOMENAGENS PELO TRANSCURSO DO DIA DO JORNALISTA.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. SAUDE.:
  • REGISTRO DA COMEMORAÇÃO, HOJE, DO DIA MUNDIAL DA SAUDE. REFLEXÃO SOBRE A SAUDE PUBLICA NO PAIS. DEFESA DE MAIOR ABRANGENCIA DO PROGRAMA DE ATENÇÃO INTEGRAL DA SAUDE DA MULHER - PAISM. HOMENAGENS PELO TRANSCURSO DO DIA DO JORNALISTA.
Publicação
Publicação no DSF de 08/04/1998 - Página 6132
Assunto
Outros > HOMENAGEM. SAUDE.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, SAUDE.
  • ANALISE, SITUAÇÃO, SAUDE PUBLICA, BRASIL, OMISSÃO, GOVERNO, COMBATE, PREVENÇÃO, DOENÇA ENDEMICA, EPIDEMIA, RESULTADO, CRESCIMENTO, NUMERO, DOENÇA, TUBERCULOSE, MORTE, MULHER, PARTO, AUMENTO, DOENÇA TRANSMISSIVEL, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS).
  • DEFESA, ADOÇÃO, GOVERNO, POLITICA, SAUDE, GARANTIA, SANEAMENTO BASICO, JUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, IMPLANTAÇÃO, PLANEJAMENTO FAMILIAR, AMPLIAÇÃO, ATUAÇÃO, PROGRAMA, ATENÇÃO, MULHER.
  • HOMENAGEM, DIA NACIONAL, JORNALISTA.
  • HOMENAGEM, ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA (ABI), ATUAÇÃO, COMUNICAÇÕES, BRASIL.

A SRª BENEDITA DA SILVA (Bloco/PT-RJ. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, comemoramos hoje, 7 de abril, o Dia Mundial da Saúde. Esta data serve como marco para abordarmos, detidamente, a situação dramática da saúde do povo brasileiro.

           Num primeiro momento, entendo ser necessário identificar a origem, as raízes de um processo de adoecimento crônico em que atualmente está mergulhada a maioria da população brasileira.

           Sabemos que uma melhor qualidade de vida é o resultado de decisões políticas e não de formas de governos. O Governo que atenta para a educação e a saúde de seu povo obtém resultados expressivos em termos de qualidade de vida da população e progresso social. Pobre ou rico, o país que prioriza esses setores eleva sensivelmente a expectativa de vida e a capacidade de aprendizagem a partir do nível intelectual que a população logrou atingir.

A desnutrição desempenha um trágico e determinante papel no destino do povo brasileiro. A cada 30 minutos morrem 20 crianças, tendo como causa básica, ou associada, a desnutrição profunda. Estudos do Unicef revelam que mil crianças brasileiras morrem a cada 24 horas antes de completar um ano de vida, vítimas da desnutrição. Este é o verdadeiro termômetro que mede a doença social a que ainda hoje, tragicamente, está fadada a nação brasileira.

As mudanças políticas, econômicas, demográficas e socioculturais ocorridas no Brasil nas últimas três décadas levaram a maioria da população a uma situação em que os problemas de saúde não podem mais ser encarados apenas pela perspectiva tradicional de cuidados médicos.

A explosão de epidemias de doenças como a dengue, que hoje atinge duramente a nossa população, é o resultado da omissão, descaso e ausência de políticas preventivas para seu combate. Para se ter uma idéia, no ano passado registraram-se cerca de 226.912 casos da doença, mas, só neste ano, em apenas três meses, já são quase 100 mil casos. O mais grave é que o Governo já sabia de todos os riscos, alertado que foi pelo então Ministro da Saúde Adib Jatene, que, em novembro de 1996, antes de sair do cargo, afirmou: “Se não cuidarmos urgentemente desse problema, a epidemia da dengue pode chegar a uma situação jamais imaginável. Temos o melhor programa para combater essa epidemia. É só dar continuidade”.

Outro exemplo é o caso da hepatite B, que cansei de denunciar aqui desta tribuna, doença virótica que mata mais pessoas em um dia do que a AIDS em um ano, sendo mais contagiosa. Segundo a Fundação Nacional de Saúde, pelo menos 8% da população brasileira já contraiu o vírus da hepatite B. Mesmo assim, o Brasil ainda não produz a vacina contra esse vírus extremamente perigoso, contagioso e mortal.

A Fundação Nacional de Saúde confirma que a cada ano surgem entre 30 a 36 mil novos casos de lepra, e a tendência é de crescimento do número de casos, porque o período de incubação da doença é semelhante ao da AIDS - em média dura de 3 a 6 anos, mas pode chegar até 10 anos. Mesmo com um plano de controle da doença, a partir de 1986, o número de casos aumentou. O Brasil ocupa lugar de destaque no mundo em casos de hanseníase, ficando logo depois da Índia.

A tuberculose é outro problema em nosso País, e é também motivo de preocupação da Organização Mundial da Saúde, pois é a doença que mais mata ou debilita pessoas com idade entre 15 e 59 anos em todo o mundo. Morrem mais mulheres em idade gestacional por tuberculose do que por causas relacionadas à gestação ou parto. No Brasil, os serviços de saúde notificam anualmente 90 mil casos novos e 5 mil mortes em decorrência da tuberculose. Isso significa que a doença mata diariamente 14 pessoas, colocando o Brasil em sexto lugar em número de casos no mundo. A detecção e cura dos transmissores é a forma mais efetiva de prevenir e controlar a disseminação da tuberculose. Para isso, os tratamentos e medicamentos, que são muito baratos - um tratamento custa em média US$11,00 por pessoa -, deveriam estar disponíveis na rede pública de saúde. No entanto, o programa de combate à tuberculose foi desmontado ainda no Governo Fernando Collor de Melo.

Sr. Presidente, estamos assistindo a taxas constrangedoras referentes à saúde da mulher. As doenças e a mortalidade maternas são uma tragédia contemporânea que não tem recebido a devida atenção, e o mais triste é que a maior parte dessas mortes poderiam ser evitadas. Mulheres estão morrendo, porque não existem programas de saúde pública eficientes.

De que morrem as mulheres? Já citei várias vezes desta tribuna as causas dessa mortalidade: parto ainda mata muitas brasileiras, e a falta de assistência é a maior responsável. Sessenta por cento das mortes relacionadas à gravidez e ao parto são causadas por hipertensão (eclâmpsia e pré-eclâmpsia), hemorragias, abortos clandestinos feitos em condições precárias - houve queda da mortalidade por aborto atribuída ao uso do Cytotec, que também provoca efeitos colaterais, como a hemorragia -, septicemias provocadas por falta de higiene durante o parto, infecções decorrentes de cesáreas, problemas renais e danos cerebrais fatais. Outras causas freqüentes são: falta de equipe médica para realizar cesáreas em casos de necessidade; falta de tratamento adequado da anemia.

No Brasil, estima-se que 5.000 mulheres morram, a cada ano, em decorrência de complicações na gravidez, parto ou pós-parto. Segundo dados do Unicef, todos os dias mulheres morrem na sala de parto, mortes que resultam da má qualidade do atendimento e da falta de assistência. Para cada mulher que morre, outras sobrevivem com seqüelas, infecções, incapacitações. Morrem sofrendo, envergonhadas, assustadas, humilhadas, sangrando, com o útero perfurado, com feridas infeccionadas, com septicemia progressiva, anemia profunda: um verdadeiro desrespeito à pessoa humana.

A esterilização ocorre, cada vez mais cedo, em parcelas crescentes das mulheres brasileiras. Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) constatou que, atualmente, as mulheres são esterilizadas, em média, aos 29 anos. Há dez anos, a idade era 34 anos.

O número de cesáreas no Brasil também está acima das recomendações da Organização Mundial de Saúde, que recomenda que elas devem corresponder a 10% do número de partos realizados. A média brasileira de cesáreas nos últimos cinco anos foi de 36%.

Outro problema que as mulheres brasileiras vêm enfrentando é o da AIDS. A participação feminina na epidemia assume proporções maiores dia a dia. Se, em 1985, havia uma mulher infectada para 35 homens, hoje essa relação passou de um para três. A transmissão heterossexual cresce na população feminina, pois a metade das mulheres atingidas tem parceiros fixos e únicos.

O câncer de colo do útero apresenta elevada incidência e mortalidade no Brasil. Essa neoplasia, se detectada por meio de uma simples citologia, pode ser curável em 100% dos casos diagnosticados em fase inicial, o que reduziria substancialmente a mortalidade. A mesma situação é visível no câncer de mama, de fácil diagnóstico e tratamento simples, se detectado prematuramente.

O Brasil foi pioneiro no lançamento do Programa de Atenção Integral da Saúde da Mulher - PAISM; também já falei sobre isso, desta tribuna, várias vezes. Esse programa foi elogiado em todo o mundo e discutido na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento realizada no Cairo; serviu de modelo para diversos países. Deveria abarcar todas as demandas onde o gênero fosse determinante para a saúde da mulher; entretanto, hoje o Programa cuida apenas da saúde reprodutiva, abandonando a saúde mental, a prevenção e o controle das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST), inclusive a AIDS, e os aspectos decorrentes das relações de trabalho. A falta de decisão política e a parca alocação de recursos constituem as principais causas do fracasso do PAISM.

Para diminuir a morbidade e a mortalidade maternas, seriam necessários serviços de planejamento familiar de boa qualidade ao alcance de toda a população feminina, aplicado de forma consciente e profunda. Infelizmente, pratica-se o controle da natalidade para impedir o crescimento demográfico, quando se deveria fazer um planejamento consciente. As mulheres brasileiras não têm acesso a informações que lhes permitam planejar sua família por meio de contraceptivos de sua escolha ou de melhor adaptação à sua saúde.

No País como um todo, é urgente uma ação política abrangente em setores como saneamento básico e saúde, com recursos orçamentários compatíveis com as necessidades. É urgente uma política de distribuição de renda, pois o mundo inteiro sabe que o Brasil é um dos países mais injustos nesse sentido. É urgente realizarmos uma reforma agrária que tenha continuidade numa política agrícola que assente o homem no campo, dando sustentação e viabilizando o trabalho e a vida de pequenos produtores rurais, para que produzam mais alimentos, diminuindo, assim, o abandono do campo e os bolsões de miséria nas grandes cidades. Minha convicção é a de que essas seriam algumas das medidas com as quais poderíamos resgatar verdadeiramente a qualidade de vida e a saúde do nosso povo.

Quanto ao quadro da saúde, afirmo que o Brasil tem de esforçar-se muito para resgatar a qualidade, o conceito e a confiabilidade de seu sistema de saúde.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, neste meu breve pronunciamento, não me aprofundei na questão, porque já havia feito comentários anteriormente. Creio que a presença de um novo Ministro nos dará a oportunidade de resgatar esses programas que estão perdidos e que consideramos importantes para a saúde não só da mulher como do povo brasileiro.

Sr. Presidente, um segundo assunto me traz à tribuna: desejo prestar minha homenagem pela passagem do Dia do Jornalista. Eu não poderia deixar de homenagear os profissionais brasileiros nas pessoas dos jornalistas que integram as equipes da TV Senado e do Jornal do Senado e, mais recentemente, da TV Câmara. Eles prestam um relevante serviço, e o trabalho que têm feito com total isenção merece destaque. Quisera que a TV Senado estivesse a serviço de todo o Brasil, para que todos pudessem ver - inclusive os jornalistas de outras empresas, também homenageados por mim neste momento - que esta Casa, com sua equipe de jornalistas, tem dado um exemplo de isenção e de qualidade.

Quero, ainda, prestar a minha homenagem à Associação Brasileira de Imprensa, entidade que sempre esteve à frente dos grandes acontecimentos nacionais. Podemos dizer que a mulher e o homem de comunicação são elos de ligação entre os fatos do cotidiano e a sociedade.

Nesse contexto, quero ressaltar o importante trabalho desempenhado por homens de comunicação em períodos de exceção no Brasil, como a ditadura de 64, em que tivemos várias vítimas do desrespeito aos direitos humanos, entre elas o jornalista Wladimir Herzog. Da mesma forma, na era Fernando Collor, a imprensa mostrou a sua importância, denunciando tudo aquilo que estava acontecendo.

Preocupa-me muito, hoje, a atividade intensa dos profissionais de comunicação, principalmente em países como o Brasil, onde os problemas sociais e políticos são intensos, o que, muitas vezes, causa ao jornalista, além de um baixo salário, redução do tempo de vida por infarto, cardiopatia, úlcera e, com a modernização das redações por computadores, a perda da visão. Levanto esses argumentos, porque, coincidentemente, hoje é o “Dia Mundial da Saúde” e também o “Dia do Jornalista”. Não poderia deixar de ressaltar aqui os riscos dessa profissão, para os quais deveríamos estar mais atentos. Os contratos de trabalho com as empresas de comunicação, no entanto, nem sempre recompensam tais prejuízos à vida desses profissionais. Uma melhor legislação nesse sentido certamente faria jus à intensa atividade dos jornalistas profissionais. Sem citar nomes, para não ser injusta para com tantos profissionais de imprensa, inclusive do meu relacionamento e desta Casa, quero deixar consignadas as minhas homenagens a todos os jornalistas do Brasil e do mundo.

Peço, Sr. Presidente, que esta homenagem ao Dia do Jornalista seja dada como lida, na íntegra.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/04/1998 - Página 6132