Discurso no Senado Federal

TRANSCRIÇÃO DE ARTIGO PUBLICADO NO CORREIO BRAZILIENSE, EDIÇÃO DE 22 DE MARÇO ULTIMO, REFERENTE AO CRESCIMENTO ALARMANTE E GENERALIZADO DA VIOLENCIA NAS CIDADES BRASILEIRAS E O RESPECTIVO CUSTO ECONOMICO PARA A SOCIEDADE.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • TRANSCRIÇÃO DE ARTIGO PUBLICADO NO CORREIO BRAZILIENSE, EDIÇÃO DE 22 DE MARÇO ULTIMO, REFERENTE AO CRESCIMENTO ALARMANTE E GENERALIZADO DA VIOLENCIA NAS CIDADES BRASILEIRAS E O RESPECTIVO CUSTO ECONOMICO PARA A SOCIEDADE.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/1998 - Página 6551
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • APREENSÃO, CRESCIMENTO, VIOLENCIA, ZONA URBANA.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, DAD SQUARISI, JORNALISTA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), REFERENCIA, DADOS, BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO (BID), INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), CUSTO, VIOLENCIA.
  • SUGESTÃO, PROGRAMA, GARANTIA, RENDA MINIMA, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, ENSINO PROFISSIONALIZANTE, INTEGRAÇÃO, POPULAÇÃO CARENTE.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, volto à tribuna para comentar um assunto que tem preocupado bastante o povo brasileiro: a violência.

Temos assistido todos os dias - e praticamente em todas as cidades brasileiras, sobretudo nos centros urbanos - a cenas de violência que são extremamente constrangedoras e que trazem grande insegurança aos habitantes dessas grandes cidades.

Há pouco tempo, em São Paulo, uma professora foi assassinada por um aluno. Diariamente, naquela cidade - hoje cedo um programa de televisão mostrou -, pessoas têm sido chacinadas quando param os seus automóveis em respeito ao sinal de trânsito. Quer dizer, de um lado, há a necessidade de se respeitar as leis que nós próprios aprovamos nesta Casa - o Código Nacional de Trânsito - e, de outro, quem assim procede se torna vulnerável a essas agressões, a essas violências.

Ainda hoje, pela televisão, vi um cidadão perplexo, pai de um jovem que foi assassinado. Ele disse que se não pára no sinal, desrespeita a lei e é multado; se pára, pode ser assaltado, como aconteceu. Cidadãos são chacinados, indivíduos em motocicletas praticamente fuzilam as pessoas que surpreendem nos sinais de trânsito. Há toda uma sorte de violência que está criando um clima extremamente perigoso e preocupante.

Paço a ler um artigo, Sr. Presidente, publicado no Correio Braziliense, em 22 de março último. Trata-se da abordagem econômica do problema da violência. Se ela já nos intranqüiliza, assusta, horroriza, se nos deixa inseguros, constatamos que os números dos prejuízos decorrentes da violência - para aqueles que são mais sensíveis aos argumentos financeiros - são assustadores.

No Correio Braziliense de domingo, 22 de março de 1998, Dad Squarisi, editora de opinião, escreveu o seguinte artigo, que passo a ler:

“Um dia a casa cai.

Os números são do BID. O Banco Interamericano de Desenvolvimento traduziu em cifrões o custo da violência. O preço é pra lá de salgado. Todos os anos, o Brasil joga pelo ralo 10,5% de toda a riqueza aqui produzida. São US$84 bilhões que deixam de ser aplicados em escolas, hospitais, transporte e segurança.

Convenhamos. É grana sem fim. Os US$84 bilhões significam mais de 140 vezes os recursos previstos para investimentos em educação (US$525,8 milhões), 84 vezes em saúde (US$1 bilhão), 25 vezes em transporte (US$3,3bilhões). Dariam para pagar as pensões e aposentadorias do INSS e ainda sobrariam quase US$9 bilhões.

Segundo o Ipea, aqui vivem 16 milhões de brasileiros abaixo da linha de pobreza. É a população de um Chile e meio. Ou de meia Argentina que não mora, não come, não estuda, não trabalha.

Violência rima com carência. Pesquisa do Instituto de Estudos da Religião revela que o risco de violência multiplica-se por 7 em lugares pobres e com escassos recursos públicos - é a violência da periferia, das cidades do interior, das regiões mais pobres do País. As áreas mais violentas sofrem de duplo déficit. O primeiro é o da cidadania. Os moradores não conhecem seus direitos nem cumprem as normas da convivência social civilizada.”

Ora, todos sabem que a cidade é historicamente ligada à idéia de urbanidade, de convivência civilizada entre as pessoas. Essa é a própria essência da idéia de cidade. Pois é justamente aí que ocorre muitas vezes uma convivência absolutamente bárbara, selvagem, onde a lei é a do mais forte, do crime organizado; é a violência que impera e que oprime os cidadãos.

E continua Dad Squarisi.

“O outro, da presença do Estado. Falta escola, falta hospital, falta polícia, falta saneamento. Sobra lixo.”

Mais uma vez, verificamos que, quando falamos em reduzir o tamanho do Estado, não estamos nos lembrando de que, em certos lugares, ele é praticamente inexistente. Em certas regiões do Brasil, às vezes há um cobrador de imposto e um cabo da polícia. Mas evidentemente isso não representa a presença do Estado no sentido de assegurar ao cidadão a sua tranqüilidade, muito menos de lhe oferecer os serviços básicos essenciais.

“E sobra para nós. Desde Pindorama, aprendemos a afastar o pobre do nosso convívio. Empurramo-lo para a periferia. (Antes era para a senzala. Hoje, para a favela.) Mas esquecemos de excluir da Constituição o direito de ir e vir. Resultado: os mal-educados, malvestidos, malcheirosos, malnutridos e maltudo estão povoando nossas ruas e nossos pesadelos.”

É ilusão pensar que se pode criar guetos e segregar dentro de uma cidade. Não se pode isolar aqueles que têm uma renda alta, boas condições de vida e habitação de alto nível do grande contingente de excluídos, de abandonados à própria sorte, que terminam por vir em busca de algo que permita a sua sustentação ou até mesmo que pratiquem algum ato ilícito ou violento, do qual possam tirar algum recurso para a sua sustentação.

“Quanto mais o tempo passa, mais eles aumentam. O espectro - cada vez mais inquietante e ameaçador - há muito deixou de ser exclusividade da Ceilândia ou Samambaia. Hoje bate às portas do Plano Piloto e Lago Sul.

Além dos custos materiais, quantificados em perda de vida, saúde, bem-estar, a violência traz prejuízos emocionais. Vivemos em clima de medo. Calçar um tênis Nike, portar uma mochila Company, andar de bicicleta de marcha, dirigir um carro ou usar uma jóia? Nem pensar. É aventura pra lá de arriscada.”

É trivial hoje nos grandes centros, onde a insegurança é grande, a mãe, ao preparar a criança para ir à escola, colocar em seu bolso algum dinheiro a fim de garantir-lhe segurança, a fim de que seu filho não seja assassinado por um possível assaltante.

”Os muros altos deixaram de garantir a segurança. Cajes e papudas não resolvem. E custam caro.

O jeito é agir. Buscar soluções criativas. Abrir espaços econômicos para os carentes. Dar aos deserdados de Deus e dos homens as possibilidades de trabalho e crescimento pessoal. O programa de renda mínima pode ser uma resposta.

Inclusive, Sr. Presidente, estive, na segunda-feira, com o Presidente da República e pedi para que Sua Excelência instasse junto ao Ministro Paulo Renato para deflagrar o Programa de Renda Mínima vinculado à educação, que foi aprovado por esta Casa, destinado àquelas famílias mais pobres, inclusive das pequenas cidades do interior dos Estados, aquelas famílias mais pobres dos municípios mais pobres do Brasil.

“O salário é diferente da esmola. Esta humilha. Aquele confere dignidade.

Se se der um salário mínimo por mês para 8 milhões de famílias, vão ser amparados 32 milhões de pessoas (cada família tem, em média, 4 membros). O programa custaria em torno de US$11,5 bilhões. Ou 15% dos US$84 bilhões que se pagam anualmente pela violência. É menos de um Proer. (O SOS dos bancos abocanhou mais de US$ 25 bilhões.) E bem menos que os juros da dívida pública, que ultrapassam os US$40 bilhões.

O programa de renda mínima é importante. Mas não suficiente. As massas carentes necessitam de reais oportunidades de trabalho - não paternalistas nem assistencialistas. Impõe-se, pois, investimento maciço em educação e treinamento profissional adequado às exigências do mercado. É hora de ensinar a pescar.

Vale um exemplo. Pouco adianta formar uma costureira em máquina doméstica. Costureira do varejo está em extinção. O importante é prepará-la para operar máquina industrial, exigida pelas confecções.

Amparar a massa de deserdados é receita para diminuir o tamanho do povão. Com um pouco de sorte, o trabalhador se torna classe média, o miserável se transformará em povo e parte do povo vira emergente.”

Pensei ser oportuno trazer ao conhecimento da Casa este artigo, publicado no Correio Braziliense, porque ele procura relacionar a violência com o custo econômico, com o dispêndio, e traz algumas comparações que mostram o quanto seria útil e mais racional se se pudesse reduzir esse desperdício, decorrente da violência, para aplicá-lo em uma série de ações que pudessem diminuir a pobreza desse grande contingente de brasileiros. Isso torna o País ainda muito distante da justiça social e de um processo democrático que guarde uma certa eqüidade social, capaz de fazer com que o Brasil possa progredir e tomar o seu assento no concerto dos países desenvolvidos, prósperos e com um futuro pela frente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/1998 - Página 6551