Discurso no Senado Federal

APOIO IRRESTRITO AO SENADOR RENAN CALHEIROS ANTE O RECRUDESCIMENTO DE CRITICAS E ACUSAÇÕES RELACIONADAS A SUA POSSE NO MINISTERIO DA JUSTIÇA. EXALTAÇÃO DA IMAGEM E BOM CONCEITO DO POVO ALAGOANO, ALVO DE AGRESSÕES INSOLITAS PATROCINADAS POR ORGÃOS DE IMPRENSA.

Autor
Djalma Falcão (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AL)
Nome completo: Djalma Marinho Muniz Falcão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA NACIONAL.:
  • APOIO IRRESTRITO AO SENADOR RENAN CALHEIROS ANTE O RECRUDESCIMENTO DE CRITICAS E ACUSAÇÕES RELACIONADAS A SUA POSSE NO MINISTERIO DA JUSTIÇA. EXALTAÇÃO DA IMAGEM E BOM CONCEITO DO POVO ALAGOANO, ALVO DE AGRESSÕES INSOLITAS PATROCINADAS POR ORGÃOS DE IMPRENSA.
Publicação
Publicação no DSF de 16/04/1998 - Página 6553
Assunto
Outros > POLITICA NACIONAL.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, ORADOR, OPORTUNIDADE, EXERCICIO, SUPLENCIA, RENAN CALHEIROS, SENADOR, REGISTRO, ATUAÇÃO, POLITICA, PAIS.
  • DEFESA, POLITICA, ESTADO DE ALAGOAS (AL), REPUDIO, CRITICA, INDICAÇÃO, RENAN CALHEIROS, SENADOR, FUNÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ).

O SR. DJALMA FALCÃO (PMDB-AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, permitam-me V. Exªs e tolerem, inicialmente, uma auto-apresentação.

A minha investidura no mandato de Senador é apenas mais uma conseqüência da união de laços indissolúveis e absoluta fidelidade que celebrei desde a minha infância com uma entidade mulher, às vezes de hímen rompido, tantas vezes tendo o seu altar deserdado e desonrado: a política.

A política, Sr. Presidente, conduz os meus passos na vida desde a mais tenra idade. Recordo-me de que, ainda criança, na minha cidade perdida lá no mais alto e adusto sertão do Nordeste, muitas vezes eu me privava de brincadeiras próprias da infância, de jogar pião, de empinar pipas no sol sempre imaculado do Nordeste, para participar, embora não tendo sido convidado, de reuniões políticas que se realizavam nas casas dos meus pais e dos meus familiares.

A política me conduziu, Sr. Presidente, aos colégios e à universidade, onde fiz política estudantil. Fui batizado... E não creio que os políticos autênticos deste País não tenham recebido, em algum instante, o batismo do cassetete da polícia. Tantas vezes pratiquei a coreografia das massas nas ruas para fugir à perseguição dos cães, da cavalariça e das próprias balas das armas da polícia.

            Da política universitária, fui levado à redação de um jornal, já extinto, mas que cumpriu um papel de grande relevância na vida alagoana: o Diário de Alagoas, onde, por três anos, servi como Redator. Recordo-me de que, debruçado sobre uma escrivaninha a mim destinada, o Aurélio à mão, confrontava o que vinha ainda quente das velhas linotipos com o texto original da lavra dos melhores intelectuais alagoanos. Foi uma escola de excepcional valor para minha formação intelectual e para minha formação política também.

            Da Revisão, fui guindado à posição de Repórter Político; depois, de Chefe de Redação e Editorialista do Diário de Alagoas.

            Em nome desse amor, dessa paixão que tenho pela política, que hei de conservar até o último dia da minha vida, fui convocado, Sr. Presidente, para a política partidária.

Em 1967, elegi-me, pelo MDB, Deputado Federal por Alagoas. Integrei, na Câmara dos Deputados, um grupo dos seus mais jovens Parlamentares; um grupo que, pela sua ação aguerrida, destemida no enfrentamento da ditadura, recebeu o epíteto ou o apelido de “o imaturos” - um rótulo que nos foi dado pela saudosa Deputada Ivete Vargas, do Estado de São Paulo. E recebemos esse rótulo, Sr. Presidente, exatamente porque esse grupo, que tinha a integrá-lo homens como Bernardo Cabral, que volto a encontrar no Senado da República, David Lerer, de São Paulo, Caruzo da Rocha, do Rio Grande do Sul, Hermano Alves e Márcio Moreira Alves, do extinto Estado da Guanabara, combateu o bom combate, enfrentando os ditadores e a ditadura de 64 e defendendo os direitos democráticos do povo brasileiro.

Em 1969, com a cassação do então Deputado e hoje Governador de São Paulo, Mário Covas, por indicação de Ulysses Guimarães e de Nelson Carneiro, com a aprovação unânime da Bancada, tornei-me Líder do MDB na Câmara dos Deputados, posto que transferi, em março de 1970, ao então Deputado, e até recentemente Senador pela Paraíba, Humberto Lucena. E aproveito a oportunidade, Sr. Presidente, para render o meu melhor preito de saudade e de homenagem ao Senador Humberto Lucena, pelas lições de patriotismo, de firmeza de convicções e, sobretudo, de probidade pessoal que ele nos ofereceu no exercício da vida pública.

Pois bem, Sr. Presidente, novamente, em 1982, fui trazido à Câmara dos Deputados, representando o PMDB do Estado de Alagoas. No último ano do mandato, renunciei para exercer o cargo de Prefeito da cidade de Maceió.

Sou, Sr. Presidente, um dos fundadores do MDB e do PMDB. Dirijo o seu Diretório Regional, em Alagoas, pela décima vez. Sou membro do seu Diretório Nacional e do seu Conselho Político Nacional.

Essa é a minha modesta história, Sr. Presidente, como militante da política neste País. É essa história que me traz ao Senado. Lamento profundamente que o meu propósito inicial de me inaugurar na tribuna desta Casa com discurso que versaria sobre a personalidade e a obra de um dos maiores Parlamentares deste País em todos os tempos, o alagoano Aureliano Cândido Tavares Bastos, que esse propósito não possa consumar-se neste instante, porque me sinto na obrigação moral e cívica de enfocar um tema que, tenho certeza, será constante na minha atuação no Senado Federal. Embora tenha consciência da interinidade que estou exercendo, pois apenas estou substituindo o Senador Renan Calheiros, quero aproveitar esta passagem, que não sei se será breve ou longa, pelo Senado Federal, para, sempre que for possível, assumir a defesa do Nordeste e dos nordestinos, especialmente do meu Estado, as Alagoas, e dos alagoanos, tantas vezes vilipendiados por uma campanha que se tem constituído contumaz, resistente, insistente e que procura descaracterizar a nossa formação cultural, a nossa formação histórica e os valores dos nossos homens públicos e da nossa tradição republicana.

Venho aqui hoje, Sr. Presidente, fugindo àquele propósito inicial, referir-me à indicação do nome do Senador Renan Calheiros para o Ministério da Justiça. Bastou ter sido o nome de Renan Calheiros indicado para ocupar a Pasta da Justiça, para que recrudescesse, de maneira eu diria até irracional, essa indisposição que há de certos setores da vida nacional, de alguns setores identificados na geografia do Brasil, setores regionais, contra o meu Estado e contra o meu povo, como se fôssemos constituídos de bandoleiros ou de saltimbancos. Não sabem esses setores, Sr. Presidente, que compomos uma comunidade igual em defeitos e virtudes às comunidades de todos os Estados da Federação brasileira.

Pois bem, Sr. Presidente, bastou o anúncio do nome do Senador Renan Calheiros para ocupar o cargo de Ministro da Justiça para que houvesse esse recrudescimento contra a imagem, contra o conceito de Alagoas e dos alagoanos perante a opinião pública nacional. Tão logo foi anunciado o nome de Renan, a cidade de Murici, a pequenina urbe onde nasceu Renan Calheiros, foi, de um momento para outro, transformada na Meca do jornalismo brasileiro. Representantes de todos os jornais, televisões, revistas e rádios deste País para lá correram, a fim de vasculharem a vida de Renan Calheiros. Depois de lá permanecerem por três ou quatro dias, anunciaram à Nação que Renan não poderia ser Ministro da Justiça, porque havia sido Líder no Governo de Collor e lhe faltava o notável saber jurídico.

Renan foi Líder do Governo Collor, ao seu lado esteve durante oito meses. Depois, como tantos e tantos brasileiros que votaram em Collor, decepcionou-se com o seu governo e teve a hombridade, a coragem cívica, a honestidade de, ainda investido no mandato de Deputado Federal, se insurgir contra Collor. Foi exatamente das suas denúncias, rompendo com Collor, que surgiram os primeiros indícios de imoralidade na administração do ex-Presidente Fernando Collor de Mello, que desaguaram no processo que conduziu ao impeachment do então Presidente da República.

Pede-se a cabeça de Renan, porque foi Líder do Governo Collor!

Sr. Presidente, a se aplicar esse princípio, na própria Nação brasileira há de se construir um mega cadafalso para decepar a cabeça de muita gente. Renan irá para o cadafalso, mas na companhia de 35 milhões de brasileiros que votaram em Collor e de outros milhões de brasileiros que acreditaram em Collor. Certamente para esse cadafalso iria o atual Vice-Presidente da República, que foi Líder de Collor nesta Casa, iria o ex-Ministro da Previdência Social, Deputado Reinhold Stephanes, e iria o ex-Ministro Antonio Kandir. Também a esses iria fazer companhia o ex-Governador Leonel Brizola, que, na condição de Governador do Estado do Rio de Janeiro, ficou solidário a Collor até o último instante; iria para o cadafalso, para essa guilhotina, uma das musas da esquerda neste País, a Srª Luiza Erundina, ex-Prefeita de São Paulo, que foi indicada e aceitou o convite, sem que me conste houvesse um protesto do seu Partido à época, o PT, para exercer o cargo de Ministra da Administração. De quem, Sr. Presidente? Do Vice de Collor, o Presidente Itamar Franco.

O pecado de Renan, que justifica essa campanha contra seu nome, é ter sido Líder no Governo de Fernando Collor.

Sr. Presidente, o voto é secreto em tese. Os dirigentes e proprietários dessas grandes e respeitáveis organizações do jornalismo brasileiro votaram em qual candidato? Será que os dirigentes e proprietários dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, da Rede Globo de Televisão, da rede de televisão do Sr. Sílvio Santos, da rede de televisão do Bispo Edir Macedo e do Jornal do Brasil escolheram, no segundo turno das eleições presidenciais de 1989, Luiz Inácio Lula da Silva como seu candidato à Presidência da República? Sr. Presidente, o voto é secreto apenas em tese.

Não tenho dúvida, assim como a Nação, de que esses dirigentes que hoje atiram pedra em Renan Calheiros também preferiram Collor a Lula. Essa é uma verdade que não está explícita, mas que é tão verdadeira quanto a melhor das verdades! Se procedentes as acusações que fazem a Renan, eles também deveriam marchar para o cadafalso e para a guilhotina.

Diz-se também, Sr. Presidente, que Renan não tem notável saber jurídico para exercer o cargo de Ministro de Estado da Justiça. Ao que me consta, a Constituição exige a aferição de notável saber jurídico para a escolha dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. O Ministro da Justiça exerce um cargo político e não tem que ser necessariamente recrutado entre técnicos. Pela primeira vez na história deste País, ao que me consta, o cargo de Ministro da Saúde não é exercido por um médico, mas sim por um economista, o Senador José Serra, que, na sua visão global de político, está dando respostas afirmativas aos desafios da política de saúde no Brasil.

Há que se distinguir, Sr. Presidente, entre notável saber jurídico e notável consciência social. Renan Calheiros é bacharel em Direito. Fez um curso jurídico regular na Universidade Federal de Alagoas e é advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil. Não quero dizer que Renan Calheiros seja um jurista consumado, mas ele é um homem público da maior qualificação no cenário da República. Não é por acaso que Renan Calheiros mereceu a indicação do PMDB, o maior Partido político organizado no Brasil, para representá-lo no Ministério da Justiça do Governo Fernando Henrique Cardoso. A notável consciência jurídica de Renan Calheiros há de consagrá-lo como um dos melhores Ministros deste País!

Sr. Presidente, não conheço nenhuma obra jurídica escrita por Tancredo Neves. No entanto, ele era um líder político, um homem público de excelsas qualidades, tanto que, ao final da vida, foi eleito Presidente da República. Tancredo Neves é considerado, ainda hoje, um dos melhores titulares que a Pasta da Justiça teve na sua história.

Mais vale a notável consciência social e jurídica do que o notável saber jurídico, porque, em nome desse princípio de notável saber jurídico, já se praticaram muitos crimes contra o Brasil e contra os brasileiros. Quem conhece a história deste País sabe que Getúlio Vargas, quando quis rasgar a Constituição e implantar o Estado Novo, em 1937, convidou um dos luminares das letras jurídicas deste País, Francisco Campos, para redigir a Constituição de 1937, a chamada “Polaca”.

Sr. Presidente, todos sabem que, quando eclodiu o Movimento Militar de 64, Costa e Silva, Castelo Branco e outros líderes do Golpe buscaram o notável saber jurídico do Jurista Carlos Medeiros e Silva para iniciar o processo de edição de atos institucionais que mergulhou esta Nação na mais negra ditadura da sua história. Todos sabem que, no Governo Costa e Silva, quando se quis editar o Ato Institucional nº 5, foi-se buscar o notável saber jurídico do Professor Gama e Silva, da Universidade de São Paulo. Quando se quis institucionalizar a tortura neste País, foi-se buscar o notável saber jurídico do Professor da Universidade de São Paulo Alfredo Buzaid.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, tenho certeza de que Renan Calheiros, com a sua notável consciência social, não permitirá retrocessos na história democrática do Brasil!

Sr. Presidente, para concluir, quero dizer a V. Exª que tenho ouvido na planície tantas vezes - e tantas vezes isso tem me revoltado - o tom pejorativo que se dá à expressão “República de Alagoas”. Quero dizer aos eminentes Senadores e Senadoras, a V. Exª e à Nação que a República das Alagoas, que conheço e que o Brasil conhece, é a República dos Palmares, a cidadela negra que se implantou na Serra da Barriga e que, há 300 anos, soltou o mais alto brado de liberdade que já ecoou nas terras das Américas!

A República das Alagoas, que eu e a Nação conhecemos, é a República dos Marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto; um proclamou e o outro consolidou a própria República brasileira. É a República de Tavares Bastos e de Pontes de Miranda, o maior jurisconsulto do século, o autor da grande obra Tratado do Direito Civil, em 50 volumes, e até hoje o melhor comentarista, em 14 volumes, da Constituição de 1946. É a República de Graciliano Ramos, o escritor social deste País! É a República de Jorge de Lima, o príncipe dos poetas brasileiros! É a República do menestrel das Alagoas, Teotônio Vilela, que pontificou neste plenário e na vida pública brasileira! É a República, Sr. Presidente, sobretudo, de homens e de mulheres que lutam, que sofrem e que procuram, desesperadamente, fugir desse estigma de que, involuntariamente, foram vítimas. É a República de um povo ordeiro, trabalhador, hospitaleiro, patriota e de raras virtudes cívicas: o povo alagoano.

Tenho a honra de, neste instante, representar o Estado de Alagoas no Senado Federal, ao lado de Teotônio Vilela Filho e de Guilherme Palmeira.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, finalmente, peço que me relevem, que desculpem o tom, de certa forma emocionado, que dei a este meu primeiro pronunciamento da tribuna do Senado Federal. Espero que entendam os meus sentimentos feridos, o meu sentimento de “alagoanidade”, o meu sentimento de representante de um Estado e de um povo que têm sido vilipendiados nos últimos tempos por certos setores da vida brasileira.

Ao terminar o meu pronunciamento, quero dizer que não sei quanto tempo durará a minha permanência nesta Casa. Mas, seja quanto for, quero ser digno da história, das tradições do povo e do Estado de Alagoas. Enquanto aqui estiver, Alagoas e os alagoanos, o Nordeste e os nordestinos terão sempre uma voz altiva e uma presença vigilante para repelir, tantas vezes quantas sejam necessárias, essas agressões insólitas contra o nosso povo, contra a nossa história, contra as nossas tradições.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/04/1998 - Página 6553