Discurso no Senado Federal

COMEMORAÇÃO DOS 50 ANOS DE FUNDAÇÃO DO ESTADO DE ISRAEL.

Autor
Lúcio Alcântara (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/CE)
Nome completo: Lúcio Gonçalo de Alcântara
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • COMEMORAÇÃO DOS 50 ANOS DE FUNDAÇÃO DO ESTADO DE ISRAEL.
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/1998 - Página 7298
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, CINQUENTENARIO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, ESTADO, PAIS ESTRANGEIRO, ISRAEL.
  • LEITURA, REGISTRO, ANAIS DO SENADO, CARTA, AUTORIA, CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA, COMUNIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, ISRAEL, AGRADECIMENTO, HOMENAGEM.

O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB-CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmº Sr. Senador Eduardo Suplicy, que preside esta sessão solene, Exmªs Autoridades, aqui já mencionadas pelos oradores que me antecederam, Srs. Membros da Comunidade Judaica, Srs. Deputados Federais, Srs. Convidados, Srs. Membros do Corpo Diplomático, minhas Senhoras e meus Senhores, a minha presença nesta tribuna obedece a uma condição singular.

Eu deveria me desincumbir de uma missão que me foi confiada para sanar uma lacuna de nosso Regimento: dar conhecimento ao Plenário, de modo especial aos Srs. Senadores, de uma carta que recebi da Confederação Nacional Israelita do Brasil, onde os seus dirigentes, os signatários da carta - deixarei para lê-la ao fim de meu pronunciamento -, agradecem a iniciativa do Senado Federal em promover esta justíssima comemoração para assinalar os 50 anos de fundação do Estado de Israel.

Adicionalmente, tocou-me outra incumbência: apresentar as escusas do Senador Ney Suassuna, que, inscrito para falar nesta sessão, não o fez por razões superiores, que levaram S. Exª a ausentar-se de Brasília no dia de hoje. Confiou-me o discurso que havia escrito a fim de que o passasse à Mesa, para que, cumpridas as exigências regimentais, fosse publicado para que a comunidade judaica tomasse conhecimento de seu pronunciamento e de seu alto apreço ao Estado e ao povo de Israel.

Sr. Presidente, ouvindo esses discursos, essa evocação da saga do povo judeu, praticamente nada tenho a acrescentar, porque os discursos dos Senadores Bernardo Cabral e José Ignácio Ferreira esgotaram o assunto - foram minuciosos, profundos e, sobretudo, justos. Poderia resumir a minha palavra neste momento, porque não quero me limitar a ler a carta, mas também deixar aqui registrado o meu tributo e a minha admiração a esse bravo povo. Não teria nada a acrescentar do ponto de vista histórico, nem do ponto de vista dos conceitos que foram aqui trazidos, os quais subscrevo integralmente, além dos apartes - dois do Senador Hugo Napoleão e um do Senador Edison Lobão - que complementam os pronunciamentos feitos aqui pelos Senadores Bernardo Cabral e José Ignácio Ferreira.

Mas me restaria, talvez, dar um depoimento das minhas impressões, ainda que resumidas, que estão vinculadas a uma viagem que fiz entre dezembro de 1989 e janeiro de 1990, então Deputado Federal, integrando uma comitiva composta do Deputado Paes de Andrade, que, na época, era Presidente da Câmara dos Deputados, e do ex-Deputado Alencar Furtado. Fomos convidados pelo Governo de Israel e lá ficamos uma semana. Fizemos uma visita demorada e extensa, deslocando-nos pelo país e tendo a oportunidade de travar conhecimento com diversos organismos do governo de Israel e, em algumas regiões do país, a oportunidade de aquilatar o seu alto nível de democracia, de desenvolvimento científico e tecnológico, a sua história, a sua evolução. Fomos à Universidade de Beer Sheva, visitamos o campus no deserto, tendo encontrado um laboratório funcionando que se dedicava, entre outros estudos, à pesquisa sobre a avestruz, sua reprodução, suas potencialidades econômicas e sua exploração racional.

Depois de tudo aquilo fomos almoçar em um restaurante com os cientistas que trabalhavam no laboratório. Durante a conversa, uma jovem cientista identificou que éramos brasileiros e perguntou de onde. Por coincidência, o Deputado Paes de Andrade e eu somos cearenses, um povo que também conhece esse fantasma da diáspora, que no nosso caso acontece por outras razões: pobreza, subdesenvolvimento e falta de oportunidade na terra, que terminam por espalhar cearenses pelo mundo todo. O nosso acompanhante durante a visita era um ex-Embaixador de Israel no Brasil, Moshe Erel, que é muito amigo do Ceará, porque o Governo de Israel mantinha, com o nosso Departamento Nacional de Obras contra Secas, um amplo convênio de colaboração técnico-científica, vinculado principalmente à área da irrigação e da piscicultura. Mas informamos, então, à jovem cientista que éramos cearenses, de Fortaleza. Até o Deputado Alencar Furtado, apesar de ter sido Deputado pelo Paraná, é também cearense. Para surpresa nossa, ela disse que conhecia Fortaleza, onde estivera a passeio. Disse-nos, inclusive, que havia adotado uma criança de lá. Achei uma situação curiosa, já que tivemos uma diáspora cearense por razões de afinidade, e, seguramente, deve estar tendo uma criação muito adequada e um destino muito feliz.

Fomos a alguns kibutz, estivemos em Bror Chail como bem lembrou o Senador Hugo Napoleão - e fomos recebidos pelo Benjamim, um carioca, que com um tradicional humor judaico disse que esse era um dos kibutz mais endividados de Israel, para fazer jus à nossa origem, quando queria dizer do nosso tradicional problema de endividamento, que tem perseguido o Brasil durante tantos anos.

Estive com o Presidente de Israel, visitei a moderna Tel-Aviv, caminhei por todas as ruas de Jerusalém. Como católico, evidentemente fiquei extremamente emocionado de visitar todos aqueles lugares santos. Fomos a Belém, protegidos por um dispositivo militar muito forte, entramos na Igreja da Natividade quase que sorrateiramente, porque as condições eram muito difíceis e só a nossa insistência na visita fez com que o Governo de Israel autorizasse e protegesse a nossa ida.

Mas, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, Srs. Convidados, de toda essa visita que fiz, de tudo que me foi dado ver, inclusive o Instituto Weissmann, dois lugares marcaram-me definitivamente - evidentemente, colocando à parte os lugares santos que me tocam por uma questão de fé e da minha crença na Igreja Católica. Que lugares são esses? Um deles é um museu que fica em Jerusalém, um museu dedicado às crianças que pereceram vítimas do Nazismo.

Não creio que alguém que visite aquele museu saia de lá sem um profundo toque de sensibilidade e revigorado em seu sentimento humano, para, com toda sua força, com toda sua energia, combater um tipo de movimento como aquele que trouxe a perda de tantas vidas e, particularmente, daquelas crianças inocentes. O museu é tocante em si; as fotos daquelas crianças; o ambiente de penumbra em que estão; aquela música e ainda o nome daquelas crianças, que são repetidos incessantemente; o jogo de luzes; as velas, tudo aquilo nos enche de profunda indignação e, ao mesmo tempo, mune-nos de uma condição de resistência contra qualquer tipo de movimento que possa atentar contra a paz, contra o ser humano e, de modo especial, contra aquelas crianças. Visitei vários museus, mas esse, particularmente, marcou-me de forma muito forte. E o outro, lá no deserto, não sei exatamente precisar qual o local, há um monte e ali, em um ambiente com algumas árvores se projetando sobre o deserto estão duas lápides simples: a de Ben-Gurion e de sua esposa. Então, esses dois lugares definitivamente me marcaram durante essa visita que tive a oportunidade e a satisfação de fazer, quando da minha visita ao Estado de Israel. Na simplicidade daquelas lápides certamente há uma grandeza maior do que qualquer monumento que se pudesse construir, porque falam, por si mesmas, desse homem que foi o grande líder e fundador do Estado de Israel.

Voltasse a Israel e, certamente, aumentaria esses dois lugares que me marcaram para três, incluindo aquele outro onde tombou vítima da insensatez, do radicalismo este grande homem que foi Yitzhak Rabin. É preciso ter muito mais grandeza para construir a paz do que para combater na guerra. É preciso ser muito mais bravo para enfrentar o desafio de fazer a paz, de combater a cizânia, o radicalismo, o que separa, o que desune, do que para enfrentar a guerra, para enfrentar a luta.

E por isso, Sr. Presidente, Srs. Senadores e Srs. Convidados, é que, rendendo essa homenagem pelos 50 anos da fundação do Estado de Israel, considerei importante trazer aqui este depoimento, que é muito mais fruto da minha vivência, do que pude ver e sentir durante aquela visita e pelos desdobramentos dos fatos que culminaram com a morte de Yitzhak Rabin, como uma lição - como falou o nobre Senador José Ignácio Ferreira - e, como S. Exª disse, não é apenas uma lição mas muitas lições, mas todas elas só podem servir para abastecer a nossa disposição de procurarmos construir um mundo justo, um mundo muito mais fraterno, um mundo onde todos possam, livremente, professar as suas crenças, as suas preferências políticas e suas tendências e ser fiel às suas origens e às suas etnias. Essa é a grande lição que nós devemos retirar deste momento.

Sr. Presidente, como o Regimento não permite que pessoas ou instituições homenageadas possam usar da palavra para agradecer iniciativas como esta de hoje, vou ler, para que conste dos Anais da Casa, a correspondência que recebi do Sr. Jack Leon Terpins e Berel Aizenstein, em nome da Confederação Nacional Israelita do Brasil, que vem vazada nos seguintes termos:

       “A Conib - Confederação Israelita do Brasil - entidade que representa a comunidade judaica do Brasil, vem a público, através desta tribuna, apresentar os agradecimentos à Mesa do Senado Federal e a todos os Senadores que compõem esta ilustre Casa de leis, em particular, o Senador Bernardo Cabral, autor do requerimento pedindo que o tempo destinado aos oradores da Hora do Expediente fosse dedicado a homenagear a passagem dos 50 anos de fundação do Estado de Israel.

       O Brasil sempre recebeu as comunidades estrangeiras com o maior carinho e os imigrantes, que aqui chegaram em busca de uma vida nova, se integraram, definitivamente, na vida brasileira, cujo caldão de raças é um exemplo para o resto das nações do nosso planeta.

       Aqui não há racismo - que, por sinal, é considerado crime passível de punição por lei - há liberdade total de cultos e de religião e todos os cidadãos deste País, quaisquer que sejam suas origens étnicas, raciais ou religiosas se irmanam num único propósito, o amor à Pátria brasileira.

       Há uma simbiose de carinho e respeito entre Israel e o Brasil. Quis o feliz destino que um brasileiro, o saudoso chanceler Oswaldo Aranha, presidisse a sessão histórica da Assembléia Geral das Nações Unidas que criou o Estado de Israel, marcando, perenemente, seu nome e o do Brasil à história da jovem nação que surgia.

       A proclamação do Estado de Israel se deu há 50 anos, quando um punhado de idealistas judeus se reuniu numa assembléia memorável e David Ben-Gurion, seu primeiro dirigente, leu a Declaração da Independência, um documento vibrante, corajoso e destemido, que, hoje, 50 anos depois, ainda continua atual como se tivesse sido recém escrito.”

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/1998 - Página 7298