Discurso no Senado Federal

ABORDAGEM SOBRE A SECA QUE ATINGE O NORTE DE MINAS GERAIS, O VALE DO JEQUITINHONHA, E O VALE DO MUCURI. COMENTARIOS AO RELATORIO DOS PREFEITOS DO NORTE DE MINAS GERAIS, ENTREGUE AO GOVERNADOR DO ESTADO, EDUARDO AZEREDO E AO GOVERNO FEDERAL.

Autor
Junia Marise (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MG)
Nome completo: Júnia Marise Azeredo Coutinho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA.:
  • ABORDAGEM SOBRE A SECA QUE ATINGE O NORTE DE MINAS GERAIS, O VALE DO JEQUITINHONHA, E O VALE DO MUCURI. COMENTARIOS AO RELATORIO DOS PREFEITOS DO NORTE DE MINAS GERAIS, ENTREGUE AO GOVERNADOR DO ESTADO, EDUARDO AZEREDO E AO GOVERNO FEDERAL.
Aparteantes
Arlindo Porto.
Publicação
Publicação no DSF de 08/05/1998 - Página 7726
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA.
Indexação
  • GRAVIDADE, SITUAÇÃO, SECA, FOME, VALE DO JEQUITINHONHA, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).
  • REGISTRO, RELATORIO, PREFEITO, REGIÃO NORTE, ESTADO DE MINAS GERAIS (MG), APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, PREVENÇÃO, CALAMIDADE PUBLICA, SECA, DEFESA, REFORÇO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE).

A SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, certamente, o tempo não me é favorável para fazer a abordagem de uma questão extremamente séria e que está ligada à seca que hoje assola o norte de Minas, o Vale do Jequitinhonha e o Vale do Mucuri no nosso Estado de Minas Gerais.

Nesta semana, os órgãos de imprensa se ocuparam exatamente em mostrar manchetes da situação por que está passando a nossa população do Vale do Jequitinhonha. No jornal, estão publicadas as seguintes manchetes: “A Seca Humilha Homens e Dizima Animais no Vale”; “Água a Preço de Ouro“; “Sede, Fome e Revolta no Vale do Jequitinhonha“; “Seca Prolongada Faz Vale Virar um Deserto e Fome Pode Gerar Confusão“; “Alarme da Seca é Ignorado“; “A Seca Prolongada Faz Vale Virar um Deserto“. Uma outra manchete de outro jornal da imprensa de nosso Estado diz: “Cesta Básica Alimenta a Indústria da Seca”.

Neste momento, queremos registrar um relatório apresentado pelos Prefeitos Municipais do Norte de Minas, que hoje estão reunidos na cidade de Mato Verde, em audiência pública promovida pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais. Este relatório, que é um dossiê referente à seca do norte de Minas e que foi encaminhado ao Governador do Estado e ao Governo Federal, mostra os dados coletados em 58 municípios até o último dia 25 de abril. Os prefeitos relatam, de forma absolutamente clara, a dramática realidade que assola aquela região atingida pela seca nesses últimos meses.

Entre as propostas sugeridas pelos prefeitos municipais às autoridades governamentais, consta a construção de mini barragens e de poços artesianos e a formação de frentes de trabalho, a fim de que se possa enfrentar, precariamente, neste momento, uma situação que se revela tão dramática como a realidade do Nordeste brasileiro.

No Vale do Jequitinhonha, por exemplo, os municípios estão em estado de calamidade pública e de emergência, como no norte de Minas. Há pouco, recebi um telefonema proveniente do norte de Minas. Fui informada que, nesta semana, crianças morreram por desnutrição, por falta de alimentação. Essa situação está se agravando cada vez mais. Neste momento, isso está transformando a população atingida pela seca, que está praticamente desolada pela grave omissão por parte das nossas autoridades, que estão fechando os olhos diante da situação avassaladora que está atingindo a população do norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha.

Hoje, segundo estatísticas apontadas pelos prefeitos, há 180 mil flagelados da seca só no norte de Minas. A população procura por um balde de água para beber. Hoje a água é uma mercadoria que está sendo vendida a peso de ouro. A própria imprensa noticia: “Água Vendida a Peso de Ouro”. Isso ocorre, porque, praticamente, não existe água potável para ser consumida por aquela população. Os rios secaram, e toda a produção agrícola foi perdida. O gado está sendo dizimado. Mais do que isso, a população disputa a água e o gado também está disputando um pouco de água para poder sobreviver. Essa é a situação desoladora que estamos enfrentando em Minas Gerais. Os nossos conterrâneos estão passando fome.

O jornal Hoje em Dia mostra que, durante quatro horas, crianças ficaram à procura de água, mas não beberam sequer um gole no seu trajeto, porque não encontraram água para beber.

Neste momento, eu me pergunto: quando o Governo colocou três Ministros de Estado de plantão para atender os Parlamentares, para liberar as verbas para os Parlamentares, para aprovar o projeto da reforma da Previdência - o Governo ficou de plantão, o que a imprensa divulgou claramente; houve até transparência por parte do Governo.

Por que, Presidente Fernando Henrique Cardoso, não deixar, neste momento, o Governo de plantão, os seus Ministros, os órgãos governamentais, para que possam ir a essas regiões estender as mãos a essa população e socorrê-la nesta hora grave e desoladora de seca?

Mais do que isso, Sr. Presidente. Os próprios órgãos do Governo receberam o aviso há alguns meses - o Ministro Arlindo Porto está concordando comigo - de que, devido ao fenômeno El Niño, a seca deste ano seria muito mais extensa e avassaladora. O Governo foi avisado. Portanto, não foi pego de surpresa.

Há quantas décadas estamos enfrentando a seca, tanto no Nordeste brasileiro quanto nas nossas regiões de Minas Gerais? O Governo sabe disso. E por que não elaborar programas e medidas eficazes para conter os resultados tão negativos da seca que vem atingindo a nossa população?

Por isso, neste momento, gostaria de enfatizar aqui uma declaração do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que disse que só Deus pode nos ajudar. Mas Deus disse uma outra coisa: “Faz a tua parte que eu te ajudarei”. E é preciso que o Governo faça a sua parte. O que o Governo está fazendo? Será, Sr. Presidente, que apenas a distribuição de cestas básicas, feita agora em razão dos saques que estão ocorrendo no Nordeste brasileiro, onde populações famintas, de estômago vazio, estão procurando alguma coisa para se alimentar e tentar sobreviver? Será que é isso? Só por isso o Governo começou a tomar providências e encaminhar cestas básicas?

O Sr. Arlindo Porto (PTB-MG) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - Nobre Senadora Júnia Marise, permita-me interromper V. Exª, antes que conceda o aparte ao Senador Arlindo Porto, para prorrogar por mais cinco minutos a sessão, a fim de que V. Exª possa concluir o seu brilhante pronunciamento.

A SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG) - Muito obrigada, Sr. Presidente.

Ouço com muito prazer o eminente Senador Arlindo Porto.

O Sr. Arlindo Porto (PTB-MG) - Agradeço a deferência da Presidência, de conceder o alongamento da sessão, mas não poderia deixar de enfatizar aqui os meus cumprimentos à Senadora Júnia Marise. Vereadora de Belo Horizonte, Deputada Estadual, Deputada Federal, Vice-Governadora do nosso Estado e hoje Senadora da República, S. Exª conhece bem de perto Minas Gerais. Conhece as suas defasagens e a sua importância. Conhece as várias Minas, como escreveu Guimarães Rosa. Por isso, Senadora, é muito oportuno o seu pronunciamento, que vem ao encontro do projeto apresentado por V. Exª, em fase final de aprovação nesta Casa. Tenho certeza de que ele estará agregando mais uma área, também com limitações climáticas, à influência da Sudene. Estou convicto de que V. Exª não pensava, naquele momento, apenas em questões emergenciais, mas em projetos e programas que pudessem, de maneira definitiva, melhorar o nível de vida daquela população. Fico orgulhoso de estar ao lado de V. Exª, representando o Estado de Minas Gerais, neste momento em que V. Exª chama a atenção para uma questão grave, que se prolonga por anos e anos e que, seguramente, precisa de medidas enérgicas. O pronunciamento de V. Exª, mais do que uma denúncia, é um chamamento para que todos que tenham responsabilidade e consciência participem dessa solução. E a solução é fazer com que pessoas possam ter dignidade, o que, seguramente, se inicia e caminha com o pronunciamento de V. Exª. Os meus cumprimentos.

A SRª JÚNIA MARISE (Bloco/PDT-MG) - Senador Arlindo Porto, incorporo o seu aparte com muita alegria, porque estamos aqui hoje, V. Exª e eu, praticamente de plantão em Brasília. Enquanto está sendo realizada uma audiência pública na Cidade de Mato Verde, no norte de Minas, promovida pela Assembléia Legislativa, estamos em Brasília, no Senado Federal, envidando esforços para que o Governo Federal se sensibilize e determine imediatamente as providências para socorrer as populações do norte de Minas e do Vale do Jequitinhonha.

Exatamente por isso, Sr. Presidente, estamos ocupando novamente a tribuna. Há vinte dias fizemos aqui o primeiro pronunciamento, para mostrar essa situação ao Governo e conclamar, pedir socorro ao Presidente da República, para que Sua Excelência determinasse imediatamente aos órgãos do Governo a liberação de recursos e encaminhasse cestas básicas, porque as populações do norte de Minas Gerais, do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri já estavam sofrendo as conseqüências da seca avassaladora que atinge aquela região.

No entanto, as providências não foram tomadas. Até hoje o Ministério do Planejamento não liberou os recursos prometidos, e apenas algumas dezenas de cestas básicas chegaram àqueles Municípios, não atingindo ainda a totalidade da população, que está realmente passando fome neste momento.

Trago nesta oportunidade um quadro desolador. Precisamos habilitar melhor a Sudene, dar àquele órgão melhores condições e mais recursos, fortalecendo-o para que implemente programas efetivos de geração de empregos e crie frentes de trabalho para a construção de barragens e açudes. Desse modo, pode-se fazer com que a população se sinta mais protegida nesses momentos tão graves da seca, que assola, ano a ano, há várias e várias décadas, as regiões do Nordeste, as regiões de Minas Gerais, como o norte de Minas e o Vale do Jequitinhonha.

Quero ainda acrescentar - e isso foi lembrado aqui pelo Senador Arlindo Porto - que o Senado Federal já aprovou projeto nosso que integra o Jequitinhonha na área da Sudene.

A propósito, a imprensa hoje divulga uma denúncia que considero grave, de um Parlamentar, Deputado Federal, representante inclusive de Minas Gerais na Câmara dos Deputados, Deputado Sérgio Miranda. S. Exª mostra o desvio de recursos da Sudene para o pagamento da dívida pública.

Ora, Sr. Presidente, quando verificamos que os minguados recursos da Sudene não estão sendo aplicados nos programas de combate à seca, no atendimento às populações carentes dos Municípios que integram a Sudene, e estão sendo desviados para o pagamento da dívida pública, sentimos enorme perplexidade, pois o Governo praticamente confisca os recursos das áreas sociais para fazer face ao pagamento da dívida pública!

Concluindo, Sr. Presidente, queremos fazer aqui, mais uma vez, a nossa conclamação - faço isso certamente em nome também do Senador Arlindo Porto. Estamos hoje em Brasília envidando esforços junto ao Governo Federal, no momento em que, em Mato Verde, no norte de Minas Gerais, estão os prefeitos reunidos com vários deputados estaduais, para discutir e debater a seca que atinge aquela população.

A nossa preocupação, diante dos desdobramentos que poderão ocorrer e que já estão sendo citados pela própria imprensa de Minas Gerais, é com aquela população que não tem água para beber nem alimento para matar a fome e poderá também - não desejamos isso -, sem ter o que comer, chegar ao ponto de promover saques em supermercados para tentar sobreviver.

Não queremos isso. Desejamos que o Governo, nesta hora tão difícil, faça com que aquela população tenha, pelo menos, o direito à dignidade de viver e à alimentação.

Era o que eu tinha a dizer.

Obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/05/1998 - Página 7726