Discurso no Senado Federal

ELOGIOS A ATUAÇÃO DO INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - IDEC.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA POPULAR.:
  • ELOGIOS A ATUAÇÃO DO INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - IDEC.
Publicação
Publicação no DSF de 09/05/1998 - Página 7812
Assunto
Outros > ECONOMIA POPULAR.
Indexação
  • NECESSIDADE, DESENVOLVIMENTO, BRASIL, AREA, PROTEÇÃO, DIREITOS, CONSUMIDOR, CIDADÃO.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO NÃO-GOVERNAMENTAL (ONG), DEFESA DO CONSUMIDOR, ESPECIFICAÇÃO, AÇÃO COLETIVA, CONTRIBUIÇÃO, JURISPRUDENCIA, DEMOCRACIA, ACESSO, JUSTIÇA, MELHORIA, MERCADO INTERNO.
  • SOLICITAÇÃO, EXECUTIVO, REFORÇO, ORGÃO REGULADOR, FISCALIZAÇÃO, BENEFICIO, PROTEÇÃO, CONSUMIDOR.

O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a preocupação com o respeito aos direitos do cidadão e do consumidor é ainda incipiente em nossa sociedade. Com intolerável freqüência, a opinião pública nacional é abalada pelo acontecimento de grandes “acidentes” de consumo, os quais, muitas vezes, atingem a dimensão de tragédias e, quase sempre, acabam constituindo novos exemplos de impunidade. A explosão do Shopping de Osasco e o desabamento do edifício Palace 2, eventos que cobraram alto preço em vidas humanas, são apenas alguns exemplos recentes do profundo descaso com a incolumidade física e patrimonial dos consumidores.

           De qualquer maneira, o fato incontestável é que as vítimas dessas tragédias ou seus familiares não lograram ainda obter a devida reparação pelos danos morais e materiais que sofreram, não obstante o considerável lapso temporal já decorrido no caso do shopping.

           Em outras ocasiões, o atropelo aos direitos do consumidor não chega a ter seu custo expresso em vidas humanas, pelo menos de maneira imediata e aparente. Mesmo assim, o volume dos prejuízos econômicos e o número de cidadãos lesados faz com que o fato assuma contornos de grande escândalo.

           Sr. Presidente, todos esses exemplos constituem evidência de que vivemos em uma sociedade ainda pouco consciente dos direitos do cidadão e do consumidor. Não se pode negar, contudo, a conquista de alguns importantes avanços institucionais ao longo da presente década. A promulgação da lei das ações civis públicas e do Código do Consumidor, juntamente com a consolidação e o maior enraizamento social dos movimentos e organizações de defesa do consumidor representam autênticos marcos históricos a comprovar que as relações sociais no Brasil estão em processo de franca evolução.

           Nesse contexto histórico, a trajetória de algumas organizações serve para espelhar a evolução havida no conjunto da sociedade. Uma das organizações que marcou sua presença ao longo desta década é, sem dúvida alguma, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - Idec.

           Em interessante artigo publicado na Folha de S. Paulo mês passado, dois dirigentes da entidade, Marilena Lazzarini e Vidal Serrano Jr., traçam um breve histórico da atividade do órgão, em seus 11 anos de funcionamento, e analisam com percuciência as lições proporcionadas por essa experiência.

           Fundado em 1987, o Idec é uma associação civil independente e sem fins lucrativos. Desde sua criação, a entidade já ajuizou 1 mil 180 processos judiciais coletivos, parte deles objetivando a defesa de direitos de toda a sociedade - os chamados interesses difusos - e os demais em defesa exclusivamente dos direitos de seus associados.

           A primeira e importante lição que se pode extrair da experiência do Idec é que “a defesa coletiva do consumidor pela via judicial transcende os efeitos normais do processo”. Em outras palavras, quando uma associação ajuíza uma ação buscando a tutela de um direito coletivo que vinha sendo lesado, acaba por ter como resultado de sua iniciativa mais do que a solução do caso concreto, definida na sentença judicial. Além da obtenção do provimento jurisdicional, aquela ação contribuirá efetivamente para mobilizar a massa dos consumidores e para a defesa de toda a coletividade.

           Analisadas sob a ótica de um contexto social mais amplo, as ações coletivas ajuizadas pelas associações, pelos sindicatos ou pelo Ministério Público, muito além da busca de uma sentença ou decisão condenatória, produzem outros importantes efeitos de cunho político-social. Servem elas para democratizar o acesso à Justiça e para gerar informações de caráter mobilizador. Tendo em mente a gravíssima situação brasileira no que tange à enorme dificuldade de acesso ao Judiciário, principalmente por parte da população carente, é fácil constatar a relevância que assumem essas ações coletivas. Constituem elas um instrumento desburocratizado e bastante econômico para a representação judicial do interesse de milhares de consumidores.

           Outro aspecto extremamente positivo dessas ações é a mudança qualitativa que elas produzem na prestação jurisdicional, com reflexo no comportamento das empresas no que concerne às relações com os seus consumidores. É que, evidentemente, o escopo das ações coletivas - tanto no que se refere à natureza das pretensões aduzidas quanto no que tange à dimensão do que nelas se pleiteia - produz sempre grande impacto junto aos fornecedores. Desse modo, são eles levados a terem comportamento mais cauteloso e a incrementarem os serviços de atendimento ao consumidor em suas empresas.

           Tudo isso acaba contribuindo para aprimorar o mercado de consumo, tornando-o mais ajustado, mais equilibrado, mais harmônico. Progressivamente, vai sendo reduzido o número de lesões aos direitos dos consumidores.

           Quanto ao efeito das ações coletivas e dos inquéritos civis instaurados pelo Ministério Público no sentido de produzirem a maior mobilização dos movimentos de defesa do consumidor, basta lembrar o grande interesse despertado na imprensa e na opinião pública por esses processos.

           Sr. Presidente, até passado recente, os consumidores não passavam de marionetes nas mãos dos fornecedores. Desarticulados e sem consciência de seus direitos, eram facilmente manipulados, sendo-lhes freqüentemente impingidos produtos da pior qualidade, que colocavam em risco sua saúde e segurança. Embora ainda tenhamos um longo caminho pela frente, é inegável que o mercado de consumo está, hoje, mais sensível. Os consumidores começam a ter consciência de que a orientação de seu poder de compra representa eficaz instrumento de pressão contra os maus fornecedores. Ao mesmo tempo, cresce a influência das associações civis na elaboração de normas e regulamentos ordenadores das relações de consumo.

           Um outro exemplo da positiva influência exercida pelas entidades de defesa do consumidor são os programas de testes comparativos de produtos levados a cabo por algumas delas. Apenas o Idec já realizou 90 desses programas nos últimos seis anos, atividade que influenciou significativamente a qualidade de diversos produtos, especialmente nos aspectos de saúde e segurança. São exemplos expressivos os produtos elétricos, como chuveiros e soquetes, e os da área de saúde, como preservativos, testes de gravidez e alimentos.

           Sr. Presidente, há um aspecto na experiência das entidades de defesa do consumidor que interessa de perto a nós, homens públicos. No exercício de suas atividades, essas organizações constataram que os órgãos reguladores e de fiscalização têm uma atuação deficiente e inteiramente dissociada do objetivo de proteger a saúde e a segurança do consumidor. Ao realizar seus testes comparativos, o Idec detectou não apenas que muitos produtos ostentam alto índice de inadequação em relação às normas e regulamentos nacionais. Mais do que isso, os testes levaram ao questionamento dos próprios instrumentos normativos, pois nestes foram encontradas inúmeras falhas que diminuem o nível de proteção ao consumidor.

           Em outras palavras, falham os órgãos reguladores, que se mostram incapazes de elaborar um figurino normativo adequado à eficaz proteção do consumidor; e falham os órgãos de fiscalização, que não coíbem a permanência nas prateleiras de produtos fabricados em desacordo com as normas e regulamentos vigentes.

           Evidentemente, essa deficiência na atuação dos órgãos reguladores e de fiscalização está íntima e indissoluvelmente ligada à precariedade de suas infra-estruturas materiais e humanas. Sirvo-me, portanto, desta oportunidade para encarecer às autoridades que ocupam cargos no Poder Executivo - nos níveis federal, estadual e municipal - a necessidade de se melhor aparelhar os órgãos reguladores e de fiscalização, a fim de que tenham atuação eficiente na proteção à saúde e à segurança do consumidor.

           Afinal, se vivemos um momento histórico em que o nível de consciência dos consumidores acerca de seus direitos se eleva; em que os movimentos e organizações de consumidores se sedimentam e se enraizam no tecido social; em que novos e importantes instrumentos legislativos - tais como o Código do Consumidor - vêm a lume, não pode o Governo deixar de fazer a sua parte nessa relevante tarefa de aprimoramento das relações de consumo no Brasil. Urge, portanto, destinar os recursos que forem necessários ao pleno aparelhamento dos órgãos reguladores e fiscalizadores, lembrando que de sua atuação eficiente depende, em grande medida, a proteção eficaz à saúde e à segurança do consumidor.

           Adequadamente aparelhados, os órgãos reguladores poderão melhor desempenhar sua função, elaborando instrumentos normativos mais aperfeiçoados, sem brechas autorizadoras do fabrico de produtos perigosos ou de baixa qualidade. Da mesma forma, os órgãos fiscalizadores, dotados da infra-estrutura necessária ao seu bom funcionamento, estarão mais atuantes na detecção de produtos fabricados sem observância das normas e regulamentos vigentes.

           Todos os novos instrumentos de afirmação da cidadania que já mencionei - conscientização, organização, peças legislativas - advieram do esforço integrado das associações civis, dos sindicatos, do Ministério Público, dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e mesmo de setores mais conscientes do empresariado. As conquistas alcançadas por meio dessa integração de esforços servem para comprovar que o melhor caminho a ser trilhado, na busca da permanente - e ainda tão necessária - evolução de nossas relações de consumo, continua a ser o da mobilização social, promovendo a integração entre a cidadania e os setores mais sensíveis do Estado e do poder econômico.

           No que concerne ao papel do Governo nessa caminhada, volto a enfatizar a necessidade de se aparelhar adequadamente os órgãos reguladores e de fiscalização, para que possam ter atuação eficiente na proteção à saúde e à segurança do consumidor.

           Era o que eu tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/05/1998 - Página 7812