Discurso no Senado Federal

VISITA AO MUNICIPIO DE POÇO REDONDO, NO ESTADO DE SERGIPE, UM DOS MAIS ATINGIDOS PELA SECA NAQUELE ESTADO. FALTA DE VONTADE POLITICA PARA RESOLVER OS PROBLEMAS DA SECA NA REGIÃO NORDESTE DE FORMA EMERGENCIAL.

Autor
José Eduardo Dutra (PT - Partido dos Trabalhadores/SE)
Nome completo: José Eduardo de Barros Dutra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA.:
  • VISITA AO MUNICIPIO DE POÇO REDONDO, NO ESTADO DE SERGIPE, UM DOS MAIS ATINGIDOS PELA SECA NAQUELE ESTADO. FALTA DE VONTADE POLITICA PARA RESOLVER OS PROBLEMAS DA SECA NA REGIÃO NORDESTE DE FORMA EMERGENCIAL.
Publicação
Publicação no DSF de 13/05/1998 - Página 8068
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, ORADOR, ANTONIO CARLOS VALADARES, SENADOR, PEDRINHO VALADARES, DEPUTADO FEDERAL, ERIVALDO CHAGAS, DEPUTADO ESTADUAL, MUNICIPIO, POÇO REDONDO (SE), ESTADO DE SERGIPE (SE), APURAÇÃO, SITUAÇÃO, CALAMIDADE PUBLICA, REGIÃO.
  • DENUNCIA, FALTA, VONTADE, NATUREZA POLITICA, GOVERNO FEDERAL, APRESENTAÇÃO, PROPOSTA, PROJETO, SOLUÇÃO, CARATER PERMANENTE, SECA, REGIÃO NORDESTE.
  • DEFESA, NECESSIDADE, ADOÇÃO, MEDIDA DE EMERGENCIA, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, VITIMA, SECA, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO, MUNICIPIOS, INTERIOR, ESTADO DE SERGIPE (SE).
  • COMENTARIO, ENCAMINHAMENTO, CENTRAL UNICA DOS TRABALHADORES (CUT), PROPOSTA, CONSELHO DELIBERATIVO, FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR (FAT), APROVAÇÃO, VERBA, AUXILIO, POPULAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.
  • REGISTRO, RECEBIMENTO, CORRESPONDENCIA, VEREADOR, MUNICIPIO, CARIRA (SE), ESTADO DE SERGIPE (SE), SOLICITAÇÃO, NEGOCIAÇÃO, DIVIDA, PEQUENO PRODUTOR RURAL, FINANCIAMENTO, BANCO DO NORDESTE DO BRASIL S/A (BNB).

O SR. JOSÉ EDUARDO DUTRA (Bloco/PT-SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, pretendo tratar do mesmo assunto que foi exposto pelo orador que me antecedeu, Senador Ney Suassuna: a seca do Nordeste.

Quero registrar que ontem eu, o Senador Antônio Carlos Valadares, o Deputado Federal Pedrinho Valadares, do PSB, e o Deputado Estadual Erivaldo Chagas, também do PSB de Sergipe, fizemos uma visita ao Município de Poço Redondo, no sertão sergipano. Entre os 45 municípios de Sergipe que estão sendo afetados pela seca, este é, sem dúvida, o que está sofrendo mais.

Antigamente era impossível prever a seca, mas essa não é mais a realidade que vivemos. A tecnologia possibilita, com meses de antecedência, prever fenômenos climáticos que levam à seca, a enchentes etc.. Esta Casa, inclusive, formou uma comissão para apresentar sugestões práticas ao Governo Federal no sentido de se minorarem os efeitos do fenômeno El Niño, que iria causar enchentes no sul do País e seca no Nordeste. Relatórios do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais alertavam o Governo para a situação a que chegaria o Nordeste brasileiro.

O fato, Sr. Presidente, Srs. Senadores, é que o principal problema do Nordeste não é a seca; é a cerca. É a cerca do latifúndio; é a cerca em torno de propriedades aquinhoadas com verbas federais para perfurar poços artesianos e resolver o problema da seca nessas propriedades; é a cerca que impede a cidadania de milhões de brasileiros em função da falta de vontade política do Governo Federal em apresentar propostas e projetos que venham a resolver esse problema tão grave que assola os nordestinos. Já é cansativo citar exemplos de outros países, como Israel, que resolveu de forma permanente a situação.

Gostaria de registrar que o Município de Poço Redondo, que visitamos, fica a 18km do rio São Francisco e, no entanto, a situação de seus moradores é a mais calamitosa possível. É um Município - quem conhece o Nordeste e suas feiras sabe que, em tempos de chuva, estas são grandes, com pessoas comprando - que possui tradicionalmente a feira mais movimentada. E o que vimos - eu, o Senador Antonio Carlos Valadares e os Deputados Pedro Valadares e Benivaldo Chagas- é uma situação de calamidade pública. A feira estava montada, os feirantes com alguma mercadoria para vender - charque, frango -, mas ninguém compra nada porque não há dinheiro. É a situação de calamidade de quem não pode comprar e dos que conseguem levar algo para vender na feira e não vendem porque não há quem compre.

No entanto, o Governo prefere desviar a atenção, prefere criminalizar pessoas, sob a alegação de que estão incitando os saques. Na revista Veja ou IstoÉ desta semana, se não me engano, há uma frase emblemática, de alguém que participou de um saque: “O cabeça do saque é a barriga vazia”.

Não adianta querer criminalizar pessoas, até porque, por mais competente que seja, a pessoa ou liderança que faz o proselitismo político não iria convencer ninguém a saquear um supermercado para pegar comida se não houvesse um motivo forte, que é exatamente a fome.

Nesse Município de Poço Redondo, ouvi duas entrevistas concedidas à Rádio Liberdade, de Sergipe: uma, do Governador Albano Franco, que visitou Poço Redondo há uns 20 dias, dizendo que lá chegariam as cestas básicas, que ele arrumaria frentes de trabalho e que tomaria providências para minorar a situação dos moradores daquele Município; outra, do Prefeito de Poço Redondo, que não é do PT, não é da Oposição, mas, sim, aliado do Governador, membro do Partido da esposa do Governador. Esse Prefeito deu sua entrevista dez dias depois, dizendo que a ida do Govenador Albano Franco a Poço Redondo só fez piorar as coisas, porque ele chegou lá e prometeu cestas básicas, prometeu recursos, prometeu verbas, prometeu frentes de trabalho, o povo acreditou e foi atrás do Prefeito. Só que o Governador não cumpriu essa promessa, e o povo começou a achar que o Prefeito está escondendo os recursos, está desviando as cestas básicas, está enrolando o povo. Dessa forma, o Prefeito é que acaba ficando mal perante a população.

Penso que neste momento são necessários todos os esforços para se tomarem medidas emergenciais, além de medidas a médio e longo prazo e de projetos que venham a resolver, de forma definitiva, o problema da seca. Projetos há; recursos há. Vimos aqui dois Senadores da Base Governista dizerem exatamente isso, citando o caso dos bancos. Então, não se pode afirmar que só a Oposição está dizendo que o dinheiro está sendo mal utilizado para salvar bancos. É necessário, neste momento, que haja uma vontade política para resolver o problema emergencial da população, independentemente da discussão de projetos.

A CUT - Central Única dos Trabalhadores - está encaminhando oficialmente uma proposta ao Codefat - Conselho Deliberativo do FAT -, para que se aprove uma verba especial e emergencial que diminua o sofrimento da população nordestina assolada pela seca.

Ainda com relação à seca, recebi correspondência de dois Vereadores - um do PT e outro do PFL - do Município de Carira, Sergipe, que também está sendo atingido pela seca. Os vereadores falam sobre os financiamentos do Banco do Nordeste do Brasil no Programa de Geração de Empregos e Renda, com recursos do FNE e do FAT.

No ano passado, tive oportunidade de intermediar uma reunião da Associação de Moradores de Porto da Folha, em Sergipe, que haviam contraído empréstimos junto ao BNB, por ironia do destino, em função de uma enchente ocorrida naquele Município no ano passado. Essas pessoas perderam grande parte de seus negócios, na área de produção de laticínios ou de tijolos, e estavam com dificuldades de honrar seus compromissos. Registro que, de um modo geral, os pequenos tomadores de empréstimo junto aos bancos oficiais, o pobre em geral tem vergonha de ficar devendo. Não há inadimplência por parte de pequenos proprietários, de pequenos produtores junto ao Banco do Brasil ou junto ao Banco do Nordeste. Se há, é muito pequena. A inadimplência fica a cargo dos grandes. Parece-me que, no Brasil, os mais ricos é que gostam de dever às instituições oficiais. Os pequenos proprietários de Porto da Folha conseguiram, no passado, negociar junto ao Banco do Nordeste a renegociação de suas dívidas. Estamos recebendo, agora, uma reivindicação de pequenos produtores do Município de Carira, relativa a empréstimos junto ao Banco do Nordeste. O vereador Geofrâncio de Jesus Reis, do PFL, aprovou na Câmara dos Vereadores uma indicação para que fossem requeridas, junto ao Presidente da Câmara dos Deputados, providências para que haja uma prorrogação do prazo de pagamento da dívida desses pequenos produtores.

Na justificação, o Vereador diz o seguinte:

À época dos empréstimos, o litro de leite financiado foi ao preço médio de R$0,30 (trinta centavos), enquanto que uma vaca estava no patamar de R$800,00 (oitocentos reais); hoje, o leite não passa de R$0,18 (dezoito centavos) para o produtor, e uma vaca não se vende por mais de R$400 (quatrocentos reais). Isso significa dizer que esses produtores estão impossibilitados de efetuar os devidos pagamentos, tendo em vista que o seu patrimônio, diante do exposto, no mínimo, foi reduzido pela metade.

Outra correspondência que recebi foi a do Vereador José Monteiro Neto, do PT também de Carira, solicitando a intermediação nossa para alertar a direção do Banco do Nordeste com o intuito de que estabeleça esse processo de negociação da dívida dos pequenos produtores, porque eles querem pagar. Eles não são como os grandes proprietários que gostam de dar calote no Banco do Brasil e no Banco do Nordeste. Eles querem pagar os empréstimos contraídos, mas, pelo menos, solicitam um processo de renegociação, porque, em função da seca e da queda brutal na sua capacidade de produção, efetivamente não têm condições de pagar essas dívidas.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, eu gostaria de registrar mais uma vez a nossa posição em relação a esse problema, que hoje está colocando milhões de nordestinos em situação muito difícil. Façamos as ações emergenciais, encontremos recursos para gerar as frentes de trabalho e para as cestas básicas, mas tenhamos também vontade política por parte da classe dominante brasileira e de suas elites políticas, para que se evite transformar a miséria do povo brasileiro, particularmente do povo nordestino, em uma reserva de mercado eleitoral. O fato é que essa situação de penúria a que é submetido o povo nordestino é utilizada principalmente nesse período de eleições. É lógico que um cidadão que está sem comer, que não tem emprego, que não tem como alimentar seus filhos é muito mais suscetível de vender seu voto, de colocar sua cidadania - que seria o exercício do voto - a serviço de quem lhe trouxer a esmola mais rápida ou maior.

Sr. Presidente, por mais que se faça o discurso de modernidade, por mais que se diga que o Brasil está no primeiro mundo, por mais que se mostre de forma propagandística os nossos avanços nas telecomunicações, a quantidade de telefones celulares que temos no Brasil, a quantidade de declarações de imposto de renda enviadas pela Internet, por mais que se mostrem nossos exemplos de “primeiro-mundismo”, enquanto continuar convivendo com situações como essa, o Brasil poderá, até para efeito propagandístico, dizer que está no primeiro mundo, mas vamos continuar tendo a grande maioria da população fora da faixa que separa a barbárie da cidadania.

      Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/05/1998 - Página 8068