Discurso no Senado Federal

GRITO DE ALERTA, DURANTE PASSEATA REALIZADA POR CRIANÇAS DO DISTRITO FEDERAL, QUE REIVINDICAM O DIREITO DE FICAR NA ESCOLA.

Autor
Ramez Tebet (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MS)
Nome completo: Ramez Tebet
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • GRITO DE ALERTA, DURANTE PASSEATA REALIZADA POR CRIANÇAS DO DISTRITO FEDERAL, QUE REIVINDICAM O DIREITO DE FICAR NA ESCOLA.
Aparteantes
Djalma Bessa, Eduardo Suplicy, Joel de Hollanda, Levy Dias, Lúdio Coelho, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/1998 - Página 8371
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, CHEGADA, DISTRITO FEDERAL (DF), MARCHA, CRIANÇA, DEFESA, DIREITOS, EDUCAÇÃO, ORGANIZAÇÃO, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB).
  • GRAVIDADE, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), EXPLORAÇÃO, TRABALHO, CRIANÇA, ESPECIFICAÇÃO, ZONA RURAL, NECESSIDADE, MOBILIZAÇÃO, CLASSE POLITICA.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, venho a esta tribuna falar de passeata, de marcha, mas de uma marcha diferente de tantas quantas ao longo de minha vida tenho participado ou presenciado.

Em verdade, desde os meus tempos de estudante eu participava de passeatas preparadas pelos universitários. Passeatas de universitários todos já viram; algumas delas entraram para a História do Mundo, como a que movimentou a democrática França em 1968, ao tempo de Charles de Gaulle.

Temos visto passeatas dos trabalhadores sem terra em favor da reforma agrária. Temos presenciado passeatas de professores em busca de melhores salários e da qualidade do ensino no Brasil. E a tantas outras passeatas temos assistido: marchas que mudaram o rumo da História, que impulsionaram o Congresso Nacional, como ocorreu recentemente, no impeachment do ex-Presidente Fernando Collor de Mello.

Mas, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, ontem presenciei uma marcha diferente, realizada por cerca de cinco mil crianças de até quatorze anos de idade, que já percorreram vinte e um dos vinte e sete Estados que compõem a Federação brasileira. Estiveram com o Presidente da República e com Congresso Nacional. São crianças que nos estão dando, parece-me, um grito de alerta, porque vieram nos pedir aquilo que tínhamos, e temos, obrigação de fazer por elas; são crianças que estão pedindo o direito de estudar, o direito de serem crianças. Percorreram o Brasil dizendo que querem o direito de sonhar, que não podem mais perambular pelas ruas, que não podem mais trabalhar, por exemplo, nas carvoarias do Mato Grosso do Sul, dizendo-nos que não é lá o seu lugar. Essas crianças estão nos dizendo que querem escola, que querem sonhar, que querem ter esperança, que querem brincar.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, isso é uma evolução. Esse é o maior grito de alerta que pode ser dado para que olhemos para a dramática situação da educação no País. Até agora, tenho ouvido vozes levantarem-se, no Congresso Nacional, clamando contra essa gravíssima injustiça social: crianças trabalhando nas carvoarias do Mato Grosso do Sul, a exploração do trabalho infantil nos sisais da Bahia, na colheita do fumo no Rio Grande do Sul, nas plantações de cana-de-açúcar no Nordeste, entre outros lugares. Mas agora são elas mesmas que, convocadas e lideradas pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil, fazem essa marcha, chamando a atenção, por certo, da sociedade e das classes dirigentes para o mais grave problema que a Nação brasileira enfrenta, a meu ver.

Sr. Presidente, são crianças gritando palavras de ordem. Há os que falam que é preferível dar trabalho a elas do que vê-las como pedintes nas ruas ou praticando infrações. E a resposta das crianças é: “Sim, é melhor trabalhar. Mas é muito melhor estudar do que trabalhar, pois estamos na idade de estudar, de aprender, de sonhar, de ter em nossas mentes um mundo melhor, e não de ficar trabalhando em condições as mais precárias e anômalas!”

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, é esse o grave problema social que o País atravessa. Por isso venho a esta tribuna, nesta manhã de quinta-feira. Quero fazer o registro dessa passeata, que, a meu ver, foi a mais sincera realizada no Brasil nos últimos tempos; foi a mais comovente. Ela muito me sensibilizou, tocou fundo no meu coração. Já não mais são jovens de 18 anos, já não mais são adultos que vão às ruas, que percorrem as metrópoles, que fazem marchas do interior em direção à capital. São as próprias crianças que estão percorrendo este Brasil para pedir por melhores dias para elas, que querem ser, são e serão o futuro do nosso País.

Há muitas coisas a serem feitas. Sei que elas são responsabilidade do Congresso Nacional, mas não apenas do Congresso Nacional. As crianças querem leis que as protejam. Leis já temos, e muitas. Podemos até aperfeiçoá-las. Mas o que podemos fazer ainda é redobrar a nossa vontade política para solucionar esse problema aflitivo e angustiante. As próprias crianças, ao fazer essa marcha, não estão apenas chamando a nossa atenção, mas estão clamando por socorro da classe política.

O Sr. Joel de Hollanda (PFL-PE) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Concedo o aparte ao Senador Joel de Hollanda.

O Sr. Joel de Hollanda (PFL-PE) - Nobre Senador Ramez Tebet, quero congratular-me com V. Exª pelo registro que faz da importante marcha realizada ontem, em Brasília, por crianças de todo o País. Foram as crianças recebidas pelo Presidente do Congresso Nacional, Senador Antonio Carlos Magalhães, pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Michel Temer, e também pelo Presidente da República. Tem razão V. Exª quando chama a nossa atenção para o esforço que todos precisamos fazer para diagnosticar e, mais do isso, equacionar o problema das crianças que trabalham, das crianças que estão nas carvoarias, nos canaviais do Nordeste, nas plantações de sisal, enfim, em todos os setores econômicos do País, contribuindo, com o seu trabalho infantil, para o sustento de suas famílias - mas ficando fora da escola. Como ex-Secretário de Educação do Estado de Pernambuco, posso dizer e reafirmar, alto e bom som, que lugar de criança é na escola e não nas carvoarias, nos canaviais ou nas plantações de laranja. Devemos fazer um esforço para que as crianças, sobretudo na idade de 7 a 14 anos, tenham acesso à escola. Em Pernambuco, não obstante todas as dificuldades, temos um programa, já bastante adiantado, de retirada das crianças dos canaviais, para serem mandadas para as escolas. Trata-se de um trabalho desenvolvido pelo Governo Federal, através do Projeto Mão Amiga, em parceria com o Governo do Estado e as prefeituras, e que está dando resultados importantes: cerca de 30 mil crianças já deixaram os canaviais na região para irem à escola. Mas sei que é preciso fazermos mais, como ressaltou V. Exª, é preciso darmos prioridade ao problema. É preciso que mais recursos sejam alocados, para que não apenas 30 mil crianças deixem os canaviais, mas, talvez, 300 mil, que trabalham no Nordeste, em São Paulo, no Paraná, em Mato Grosso. É preciso que elas saiam das frentes de trabalho e vão para a escola. Portanto, cumprimento V. Exª pela oportunidade e pela importância de seu pronunciamento, pelo registro que faz dessa grande marcha realizada pelas crianças em Brasília. Muito obrigado.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS.) - Senador Joel de Hollanda, recolho, com muita alegria, o seu aparte, porque ele vem de um homem como V. Exª, que conhece a fundo os problemas educacionais deste País, que tem não só a experiência de Parlamentar mas também a de homem do Nordeste; que tem vivência do assunto, pois exerceu o cargo de Secretário de Educação, que honrou e no qual muito fez, do Governo do Estado de Pernambuco. Portanto, o aparte de V. Exª enriquece o meu pronunciamento.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, esse problema não existe apenas no Brasil, mas no mundo. Mas das 200 milhões de crianças do mundo nessa situação, o nosso País, segundo dados do IBGE, possui cerca de três milhões e meio, três milhões e oitocentas mil crianças abaixo de 14 anos que são forçadas ao trabalho ilegal. Essa cifra, meus caros Senadores, de quase 4 milhões de crianças com menos de 14 anos trabalhando de forma ilegal, em lugares insalubres, positivamente é um número que assusta, que atemoriza e que se constitui, por si só, no maior grito de alerta que pode ser dado à Nação brasileira.

O Sr. Djalma Bessa (PFL-BA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-RS) - Com muita satisfação, Senador Djalma Bessa.

O Sr. Djalma Bessa (PFL-BA) - Senador Ramez Tebet, V. Exª aborda um assunto realmente relevante para o País, e até para o mundo. Atente V. Exª para o fato de que, até há bem pouco tempo, no Brasil, não se falava em criança, não se tomava conhecimento da criança; faltava-lhe escola. E é possível que, já a essa época, ela trabalhasse dessa maneira. Mas hoje, não. Há uma conscientização nacional de que a criança precisa ser assistida, precisa ser educada, precisa ter escola. O trabalho da criança chama-se escola, educação, instrução. Admitir-se que uma criança trabalhe já é um absurdo. E absurdo maior é ser esse trabalho em atividades, como V. Exª salientou, insalubres e perigosas. Chegamos até a admitir um raciocínio realmente extravagante, ou seja, que esse trabalho realizado pelas crianças ocorra por dois motivos: primeiro, por um salário menor, e, segundo, porque nenhum adulto aceita realizá-lo. É realmente terrível o que está acontecendo em nosso País. E que está, pela nossa cultura, produzindo pivetes. Por quê? Porque simplesmente as crianças não são assistidas, são abandonadas e ficam nessa situação terrível. Devemos raciocinar. Trata-se realmente de uma situação difícil, complicada, e que merece toda a atenção. Mas não é só isso, porque a criança vai se desenvolver e se tornará o adulto de amanhã. Está aí o retrato daquilo que pode ser o nosso País daqui a 10, 20 ou 30 anos. V. Exª tem, portanto, os meus parabéns, porque essa marcha, como V. Exª bem disse, não é em favor de salário, de habitação, de emprego; não é por terra, mas é uma marcha da esperança, que deve ter todo o nosso respaldo, todo o nosso apoio e toda a solidariedade da Nação. Essa criança é que estará, dentro de pouco tempo, nos substituindo. V. Exª, portanto, está abordando um assunto do maior interesse para o País. É preciso que se atente para essa situação. É preciso que se dê atenção a essa criança, para que ela tenha condições de estudar, de se educar e instruir, e de passar a ser cidadão e não uma pessoa com sérias dificuldades, com doenças e com defeitos de toda a sorte. V. Exª tem, portanto, as minhas congratulações e as minhas palmas pela abordagem de um tema que, realmente, é do interesse não só do País - e V. Exª está se referindo ao nosso País - mas também do mundo.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Nobre Senador Djalma Bessa, V. Exª chegou ontem a esta Casa, para ocupar a vaga do atual Ministro da Previdência Social. Mas V. Exª é um homem do Nordeste, é um homem com vivência parlamentar. Sei que, por vários anos, V. Exª foi Deputado Estadual, na Bahia; V. Exª honrou a Bahia também como Deputado Federal e agora está tendo a oportunidade de honrá-la como Senador da República.

Por tudo isso, o aparte de V. Exª reforça - e isso é muito para mim - as minhas palavras nesta tribuna. V. Exª diz bem quando afirma que não se busca melhor salário, não se busca um pedaço de chão. Sabe o que as crianças estão buscando, o que elas pediram ? Sabe qual foi o grito dessas crianças enquanto marchavam ? “Eu quero ser gente, quero crescer como gente, eu quero um mundo melhor!” V. Exª sabe que são essas crianças o Brasil de amanhã, e me conforta, Senador Djalma Bessa, abordar um tema como esse. Estamos falando hoje sobre um assunto cruel, dramático, atual, mas estamos falando com os olhos voltados para o amanhã, com os olhos voltados para o futuro da nossa Pátria, que depende da educação dessas crianças, que depende da melhoria da qualidade de vida do nosso povo e da nossa gente. Essas crianças são o futuro do nosso País. Portanto, ao abordarmos esse assunto, estamos sem nenhuma pretensão que não seja falar para o amanhã, querendo registrar para amanhã, querendo dizer que temos que resolver o problema imediatamente, para que, hoje, essas crianças não sofram, e para que, amanhã, o Brasil seja uma pátria melhor, mais humana ainda e mais cristã.

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Ramez Tebet?

O Sr. Romeu Tuma (PFL-SP) - Concede-me V. Exª um aparte, Senador Ramez Tebet?

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Senador Romeu Tuma, vou pedir permissão a V. Exª, pois o Senador Lúdio Coelho já havia pedido o aparte. Logo a seguir, terei muita honra em ouvi-lo.

O Sr. Lúdio Coelho (PSDB-MS) - Agradeço ao Senador Romeu Tuma. Senador Ramez Tebet, V. Exª está tratando de um assunto que envolve toda a família brasileira. O trabalho da criança, principalmente no campo, exige reflexão de todos nós. Parece-me que ninguém obrigaria a criança a trabalhar se não houvesse necessidade. A maioria das crianças que está trabalhando, em nosso País, é oriunda de famílias sem recursos. Essas crianças ajudam a manter seus irmãos e seus pais. Senador Ramez Tebet, penso que o movimento das crianças recomenda uma reflexão do poder público brasileiro a respeito, principalmente, da agricultura brasileira. O nosso País é enorme, tem água em abundância, terra fértil, pessoas competentes, mas temos uma produção agrícola que nada representa. É no campo que a maioria das crianças trabalha, nos canaviais, nos engenhos, nos alambiques ou nas hortas. Quero, ao apartear V. Exª, chamar a atenção para este aspecto: que a proteção da criança, em nosso País, depende da melhoria das condições de vida das populações de renda menor, espalhadas por toda a parte em nosso País. Era isso que tinha a dizer. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Senador Lúdio Coelho, V. Exª traz a experiência do homem que trabalha no campo praticamente desde que nasceu. É a grande experiência de V. Exª que está falando. E é verdade, V. Exª tem razão, as crianças não estão trabalhando no campo, nos canaviais, porque querem trabalhar. Estão lá porque não há outro jeito, outra maneira; elas precisam ajudar as suas famílias.

Nós que conhecemos o campo no Brasil - V. Exª conhece melhor do que eu -, sabemos que lá estão as piores condições, ainda que no local de trabalho existam ou possam existir boas condições de trabalho, porque sabemos que no campo brasileiro não há uma infra-estrutura mínima. Perto das propriedades rurais brasileiras, em locais acessíveis, não existem escolas nem sequer postos de saúde.

Temos, no Estado de Mato Grosso do Sul, propriedades rurais em Municípios nos quais os prefeitos enfrentam dificuldades, apesar dos bons salários que oferecem, por exemplo, para médicos. Eles não conseguem médicos que queiram servir nos seus Municípios. Portanto, de qualquer forma, o campo brasileiro está desassistido, e a criança trabalha ali, longe da escola, longe de qualquer assistência, sem falar na insalubridade, que ocorre praticamente na maioria dos locais onde as crianças estão trabalhando.

No Estado de V. Exª, no Estado de Levy Dias, no meu Estado, Mato Grosso do Sul, que sabemos que é pioneiro, no Brasil - graças ao programa do Governo Federal -, na tentativa de erradicação do trabalho infantil, estamos longe ainda de fazer aquilo que deveríamos, efetivamente, fazer em favor das nossas crianças, que é, sem dúvida alguma, retirá-las do trabalho e colocá-las em escola, em escolas boas, para que elas possam realizar o seu sonho de crianças, que é o de serem gente.

Concedo o aparte ao nobre Senador Romeu Tuma.

O Sr. Romeu Tuma (PFL-SP) - Senador Ramez Tebet, pouco terei a acrescentar. Serei rápido, porque logo começará a Ordem do Dia. V. Exª está explorando, com muita competência, com muito sentimento, o drama do trabalho do menor. Isso faz parte de movimentos internacionais e a Abrinq, no meu Estado, fez o movimento do selo para as indústrias que não utilizam a mão-de-obra infantil para a exploração do seu comércio. O Senador Lúdio Coelho se referiu a vários tipos de atividade onde é explorada a mão-de-obra infantil. Lembro-me de campanhas de vários anos nas carvoarias, o que até hoje se verifica. O que acontece? A criança vai ao trabalho para completar a renda familiar. Penso que V. Exª está direcionando o seu discurso para a política de compensação. O Estado tem que ter uma política para compensar a família e colocar o menor na escola. Discutimos, inclusive em cima de projetos do Senador Suplicy, da Renda Mínima, o projeto de compensação para a família que precisa do trabalho do menor e o coloca na escola para um futuro melhor para a criança e para o País. Quero cumprimentá-lo pelo direcionamento do seu discurso, com tanta emoção, com tanta veemência, defendendo a participação do Estado na manutenção dessas crianças na escola e longe do trabalho escravo, combatendo a mão-de-obra infantil.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Senador Romeu Tuma, agradeço porque V. Exª lembra que algo está sendo feito, mas, convenhamos, é muito pouco, é quase nada. Parece até que estamos acordando agora para um problema que é mais do que secular. Leis nós temos. A Organização Internacional do Trabalho proclama essa proibição, a nossa Constituição bem toca no assunto, todavia o problema cada vez se apresenta mais crônico, mais grave.

Ouvi o sinal da campainha do nosso Presidente Antonio Carlos Magalhães, que ontem, junto com o Presidente da Câmara Michel Temer, teve a oportunidade de receber os jovens, essas crianças menores de 14 anos que realizaram uma marcha buscando melhores condições de vida, dizendo e alertando a Nação brasileira que eles querem é ser gente, eles querem sonhar, essas crianças querem ter o direito de ter esperança. E foi isso também que o Presidente da República ouviu de uma criança do nosso Estado do Ceará, lá, junto com outros Estados do Nordeste, castigado pela seca. Foi isso que ele ouviu do menino José Simão. Houve uma frase do menino José Simão, no trecho do discurso que dirigiu ao Presidente da República, que é a mais importante e com a qual pretendo encerrar o meu pronunciamento: - Muitos falam que é melhor trabalhar do que ficar por aí vagabundeando, mas queremos dizer a V. Exª que é muito melhor estudar do que trabalhar, porque queremos ser gente, queremos ter esperança.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Ramez Tebet?

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Ouço o aparte do Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Serei muito breve. Quero apenas lembrar a V. Exª a importância da Marcha contra o Trabalho Infantil e as proposições que essas crianças estão levantando, no sentido de que se expandam por todo o Brasil os programas de renda mínima e da bolsa-escola. Só não consigo compreender as razões pelas quais o Presidente Fernando Henrique Cardoso ainda não regulamentou a proposta, ainda que tão restrita e que precisa ser melhorada, aprovada pelo Congresso e sancionada em 10 de dezembro último, transcorridos já 150 dias, em que pese o art. 10 da Lei nº 9.533. Sabe-se que o Presidente teria um prazo de 60 dias para editar os atos regulamentadores da lei. Assim, eu gostaria de saber se as crianças, ao dialogarem com o Presidente e proporem que logo se institua a renda mínima em todo o País, conseguiram que Sua Excelência ficasse sensível ao apelo delas, representantes dos cerca de três milhões de brasileiros que estão trabalhando, ainda que na faixa dos 7 aos 14 anos de idade.

O Sr. Levy Dias (PPB-MS) - Senador Ramez Tebet, V. Exª me permite um aparte?

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - Agradeço e acolho com alegria o aparte do Senador Eduardo Suplicy e concedo o aparte ao nobre Senador Levy Dias.

O Sr. Levy Dias (PPB-MS) - Confesso que meditei muito antes de pedir este aparte a V. Exª, porque, ontem e anteontem, o Senador Ney Suassuna falava sobre a seca. Repetirei quase o mesmo que disse ontem. Fico vendo na televisão a criançada, visitando Brasília e o Presidente da República e levando o seu manifesto, e indago a mim mesmo o que irá acontecer amanhã, na semana que vem, no mês ou no ano que vem, porque tudo isso é interessante para a mídia, mas a ação efetiva, única forma de resolver qualquer problema que exista - e este é um problema secular, como disse V. Exª e o Senador Ney Suassuna -, precisa ser feita. Conheço o drama da seca na pele, Senador Ramez Tebet, porque sou filho de lavradores e nasci em uma pequena propriedade rural; nunca conheci um brinquedo na minha vida. Aos sete anos, comecei a trabalhar; aos onze anos, com uma caixinha de engraxate, ajudava a sustentar minha família. Conheço toda essa trajetória, e veja V. Exª que pouco se faz, porque de nada adianta resolver o problema da criança, se os seus pais não têm emprego, são analfabetos e moram numa favela. Eles não podem esperar regulamentação, leis ou decretos, porque precisam da comida hoje! Quando se fala do problema da água no Nordeste, pergunto a V. Exªs se algum de nós, aqui no Senado, conhece o drama da seca. Temos água - e mineral! - para beber no momento em que quisermos. Então, o que está faltando em nosso País, tanto no escalão superior da República, quanto no Governo do Estado e nas Prefeituras, é uma ação conjunta, efetiva, séria e extremamente humana.

O SR. RAMEZ TEBET (PMDB-MS) - V. Exª tem razão, Senador Levy Dias. Não estou na tribuna condenando as crianças que trabalham, mas aqueles que as permitem trabalhar, principalmente em ambientes insalubres e perigosos.

Estou aqui para tentar ajudar este País a dar resposta ao amanhã. O que vai acontecer amanhã depende do nosso trabalho de hoje. Vamos auxiliar essas crianças; vamos colocá-las nas escolas. Elas estão pedindo o direito de ter esperança, o direito de sonhar; elas estão pedindo, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, um brinquedo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/1998 - Página 8371