Pronunciamento de Casildo Maldaner em 14/05/1998
Discurso no Senado Federal
PONDERAÇÕES SOBRE A PARTICIPAÇÃO DOS JOVENS NO PROCESSO ELEITORAL, A PROPOSITO DO TERMINO DO PRAZO PARA O ALISTAMENTO ELEITORAL NO ULTIMO DIA 6.
- Autor
- Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
- Nome completo: Casildo João Maldaner
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
ELEIÇÕES.:
- PONDERAÇÕES SOBRE A PARTICIPAÇÃO DOS JOVENS NO PROCESSO ELEITORAL, A PROPOSITO DO TERMINO DO PRAZO PARA O ALISTAMENTO ELEITORAL NO ULTIMO DIA 6.
- Aparteantes
- Josaphat Marinho.
- Publicação
- Publicação no DSF de 15/05/1998 - Página 8412
- Assunto
- Outros > ELEIÇÕES.
- Indexação
-
- COMENTARIO, NUMERO, ALISTAMENTO ELEITORAL, BRASIL, APREENSÃO, OMISSÃO, JUVENTUDE, PARTICIPAÇÃO, POLITICA, DESVALORIZAÇÃO, VOTO.
- COMENTARIO, HISTORIA, BRASIL, PARTICIPAÇÃO, JUVENTUDE, MOVIMENTO ESTUDANTIL, UNIÃO NACIONAL DOS ESTUDANTES (UNE), ENGAJAMENTO, IDEOLOGIA, SOCIALISMO, OPOSIÇÃO, GOVERNO.
- SUGESTÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), AMPLIAÇÃO, PRAZO, ALISTAMENTO ELEITORAL.
O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobres Colegas, tecerei algumas considerações sobre o prazo para alistamento eleitoral, que se esgotou no último dia 6.
A procura não foi a esperada e daí se depreende que alguma coisa não vai bem, pois estamos a menos de cinco meses das eleições gerais de 1998 e o panorama político-institucional indica que o sabor da competição está insosso e o clima, monótono. Acredito que tal assertiva repousa no ineditismo do fenômeno da reeleição e nas suas implicações estratégicas. Porém, a nossa preocupação é que tal apatia tenha contaminado a juventude brasileira, que parece também afundar numa indiferença eleitoral, aí sim, deveras inquietadora. As pesquisas mostram que a maioria esmagadora dos nossos jovens não acredita na força do voto e, por isso, simplesmente ignora a sua importância na realização de uma eleição.
Se, de um lado, esse estado desalentador dos jovens brasileiros reflete o processo por que atravessa o País, de outro, alerta a nossa sociedade para o perigo de um futuro lúgubre, a curto prazo, quando a alienação política poder-se-á transformar em condição permanente de nossas relações com o poder público. Ao invés do aperfeiçoamento do regime democrático, para o qual tanto lutamos, esse desinteresse provoca exatamente o contrário, na medida em que arrefece a vontade popular.
Desde o final da trágica Segunda Guerra, a participação dos jovens nos debates e nas decisões políticas tem assumido, no mundo inteiro, uma feição menos dinâmica, paulatinamente mais discreta e inibida, dentro e fora dos foros de tradicional competência. As exceções ficaram por conta do espetacular movimento estudantil de 1968, no Brasil, e do histórico episódio dos estudantes chineses na Praça Celestial.
Em contraste com a de outras nações, a juventude dos anos 50 e 60 demonstrava um engajamento extraordinário no processo de transformação política e cultural. Vale recordar a iniciativa da formação e organização das centenas de centros acadêmicos, de diretórios universitários e da legendária UNE, União Nacional dos Estudantes, construção e gerência dos revolucionários Centros Populares de Cultura (os famosos CPCs), que tanto contribuíram para a formação de talentosos artistas.
Acredito que isso vem ao encontro do pronunciamento, que há pouco ouvimos, do Senador Carlos Patrocínio. O aparte do Senador Gerson Camata alertava-nos para a realização de uma revolução no meio universitário brasileiro, porque, hoje, há uma certa apatia dos seus acadêmicos. Penso que devemos reinventar a universidade brasileira, principalmente neste momento em que enfrenta paralizações, greves.
O Sr. Josaphat Marinho (PFL-BA) - Permite-me V. Exª um aparte?
O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Com muita honra, ouço o eminente Senador Josaphat Marinho.
O Sr. Josaphat Marinho (PFL-BA) - Ouço, com vivo interesse, sua manifestação, nobre Senador. Tive oportunidade, há poucos dias, de escrever artigo a esse respeito, lamentando a indiferença do meio, sobretudo universitário, para a vida política e o destino do País. Tomei por base até a manifestação revelada pelo Presidente do Tribunal Superior Eleitoral, que fez apelo aos que estão completando 16 e 18 anos para que se tornem eleitores. E isso é do nosso vivo interesse, porque essa mocidade que está aperfeiçoando sua inteligência pode e deve ser uma força saliente nas transformações gerais do País. Não será, entretanto, se permanecer distante da vida política ou a ela alheia. V. Exª presta um relevante serviço, despertando também o interesse dos jovens. Não se trata de pedi-los que sigam os partidos, que adotem os partidos atuais; talvez deles eles sejam críticos. Mas, o importante é que assumam um posição política, inclusive para concorrer no sentido de que a vida partidária brasileira seja mais orgânica, mais programática, menos pessoal e mais em defesa do interesse coletivo.
O SR. CASILDO MALDANER (PMDB-SC) - Com muita honra, Senador Josaphat Marinho, recolho as ponderações de V. Exª, principalmente por partiram de V. Exª. Na verdade, sentimos que o tema é presente. Mas há uma certa inibição e apatia, como disse, não só em relação ao alistamento, ao exercício verdadeiro da cidadania - inclusive havia um prazo para isso, tendo sido feitas manifestações até do Presidente do Superior Tribunal Eleitoral, como disse V. Exª - aliás, faço alusão a esse respeito em meu pronunciamento. Nas próprias universidades, nos centros acadêmicos, parece-me que não há estímulo, não há vontade de fomentar, exteriorizar aquela garra, aquele sangue que circula nas veias da juventude, demonstrados em vários momentos, não só aqui no Brasil, mas do mundo. Vejo, nesse momento em que as nossas universidades federais estão paralisadas, que os estudantes estão alheios, apáticos, sem saber o que farão. Não há aquela movimentação, como já vimos muitas vezes no passado.
Continuando, Sr. Presidente, em contraste com as outras nações, a juventude dos anos 50 e 60 demonstrava um engajamento extraordinário no processo de transformação política e cultural. Vale recordar a iniciativa da formação e organização de centenas de centros acadêmicos, de diretórios universitários, da legendária UNE - União Nacional dos Estudantes, construção e gerência dos revolucionários Centros Populares de Cultura (os famosos CPCs), que tanto contribuíram para a formação de talentosos artistas, de homens públicos, de empreendedores. Sr. Presidente, fiz questão de repetir esse parágrafo pela sua importância, para recordar um pouco do que foi, na verdade, a nossa juventude brasileira.
Com ingresso marcadamente selado na era JK, mas cujo auge se viu registrado posteriormente nas gestões de Jânio Quadros e João Goulart, a retomada da participação dos jovens brasileiros na condução da política nacional caracterizou-se como ponto indispensável para a busca do consenso, do equilíbrio e da lucidez no complexo xadrez do Poder Público no Brasil.
Mesmo durante os anos da ditadura, quando o regime militar se encarregara de desarticular toda rede mobilizadora da juventude urbana, ainda assim o papel dos estudantes na resistência contra o autoritarismo se fez presente e imprimiu um tom de indiscutível relevância histórica. Evidentemente, aos olhos de nossa contemporaneidade, temos que admitir a influência esmagadora que as ideologias de esquerda exercem sobre o comportamento e a mentalidade da juventude, à época, no Brasil. Sob o manto hegemônico da promessa revolucionária socialista, o marxismo e as doutrinas daí derivativas configuravam o grande arcabouço teórico, a partir do qual a juventude do Terceiro Mundo orquestrava seus planos políticos para a almejada conquista de soberania e independência de seus povos.
Movidos, então, por essa força persuasiva, os jovens brasileiros tinham consciência absoluta da elevada posição que ocupavam no cenário político nacional, a tal ponto que a compreendiam como condição sine qua non para o atendimento dos seus objetivos de radical transformação do País.
Sr. Presidente, cumpre reconhecer também que a profunda indignação da juventude brasileira com o perverso quadro socioeconômico nacional antecedeu, sim, qualquer inclinação dos estudantes ao modelo socialista, comunista ou mesmo anárquico. Isso fazia brutal diferença, pois significava, antes de tudo, que os jovens não estavam mais dispostos a tolerar os fracassados modelos de Estado e de governo, tradicionalmente implementados pela “gerontocracia” brasileira.
Definitivamente, a população jovem estava - como embalada por um cântico cívico - irritada com a situação de histórica mendicância e atraso, tomando para si o gancho das reformas rumo à modernização político-institucional. Intrépida, por vezes atrevida, impôs-se nacionalmente como voz legítima e, portanto, como voz poderosamente influente no cenário político.
Por isso mesmo, seus atos e discursos eram atentamente acompanhados pelos governos e autoridades constituídas, que não tardaram a controlar seus passos e reprimir suas ações. A partir de 68, quando da edição do Ato Institucional nº 5, a repressão junto às universidades se intensificou dramaticamente, inviabilizando por mais de uma década a participação política de maciça parcela da juventude. Ser jovem virou sinal de perigo para as autoridades militares e sinônimo de desordem e subversão.
As últimas manifestações de que se têm registro são as Diretas Já, ocorrida em 84 e na década de 90, quando, os jovens “caras-pintadas”, invadiram as ruas exigindo o impedimento de Governo do então Presidente Fernando Collor. Lograram êxito. Mas a euforia não durou muito. Após a deposição de Collor, a impressão que se tem é que houve certo desapontamento quanto aos rumos do processo.
Desde então, percebo que nada, ou quase nada, de impactante aconteceu na vida do jovem brasileiro que o despertasse para um novo ciclo de participação política. Como reflexo, no último dia 6 de maio, a Justiça Eleitoral encerrou período de cadastramento e recadastramento dos novos eleitores para o pleito de outubro próximo. Para estarrecimento de todos nós, o comparecimento de novos votantes se limitou a um número bem menor do que o previsto. Apenas 1,5 milhão de jovens, na faixa entre 16 e 18 anos, foram cadastrados pelos Tribunais Regionais Eleitorais em todo o País, o que corresponde a menos que metade da quantidade registrada em 89, quando se alcançou o extraordinário cadastramento de 3,3 milhões de jovens votantes.
Segundo os dados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral, em 94, ano das últimas eleições gerais, se inscreveram cerca de 2 milhões de eleitores na mesma faixa etária. Ora, a dedução lógica disso é que o afastamento dos jovens das urnas se faz progressivamente, sem qualquer perspectiva da reversão de triste quadro.
Diante dessa realidade surge o questionamento: votar ou não votar? Por que os jovens não querem votar? Generalizando de forma injusta, alegam que os políticos são corruptos e egoístas e insensíveis ao interesse coletivo e às necessidades angustiantes do povo. Outros não votam por não conhecer os candidatos ou para não sentirem culpa por uma eventual escolha infeliz. Há, também, os que acreditam que não participando, têm maior liberdade para criticar. Isto sem contar os que entendem que o candidato melhor não tem chances e que pensam ser inútil votar.
A verdade é que as razões para o desinteresse pelo voto são, em primeira análise, inconsistentes, pois falhas e limitações são próprias do ser humano e o político não poderia ser diferente. Porém, há aqueles em que as virtudes se sobrepujam aos defeitos, conforme podem ser constatadas pela nossa história.
O nobre colega e brilhante jurista Ricardo Braga Monte Serrat, em seu livro Reforma do Judiciário, assim se manifestou:
“Em regra há bons candidatos em todos os pleitos. Quando acontece a hipótese rara de todos serem ruins, o país é ajudado se votamos no menos imperfeito. Se os concorrentes forem desconhecidos, é nosso dever esforçarmo-nos por conhecê-lo, pois está em jogo o futuro do país. Pior do que errar na escolha é não ter tentado acertar, e aquele que não teve coragem para participar não tem autoridade moral para fazer críticas”.
E prossegue:
“Quem já se deu conta de que esses votos faltantes poderiam ter alterado o resultado de quase todas as eleições que tivemos? Presidentes, governadores e prefeitos que não deixaram saudade poderiam não ter sido eleitos. E quantos candidatos honestos e competentes deixaram de ser eleitos por causa de pessoas que não deram valor ao seu direito de votar ou acharam que seu voto não faria diferença? Quem deixou de votar nos melhores ajudou a eleger os piores”.
É esta a grande conclusão desse grande jurista.
Como se depreende das preocupações do jovem magistrado, a juventude brasileira exerce fundamental papel nos destinos desta Nação. Na oportunidade, faço questão de frisar que o cerne da solução do problema reside, também, na maior capacidade de a política brasileira justificar suas distinções partidárias, convicções ideológicas e seus projetos de mudança. Ou melhor, à proporção que a juventude puder discernir os vários projetos de Brasil que estão em jogo, então se definirão, no meio da comunidade jovem, alinhamentos e engajamentos políticos fundamentais às transformações de que o país necessita e exige.
Creio, Sr. Presidente, que a nossa responsabilidade seja a de mostrar um novo quadro político onde prevaleça a transparência nas decisões internas, nas relações com os demais Poderes e, principalmente, com a sociedade que nos delegou poderes para representá-la. Em suma, é preciso que a juventude se desvencilhe dessa letargia momentânea e se atrele a paradigmas de consciência social e nacional que lhe restitua a indispensável e necessária motivação pela participação política.
Há ainda algumas considerações, Sr. Presidente e nobres Colegas, que não poderia deixar trazer, quando estamos praticamente na antevéspera de uma decisão nacional, ou seja, eleições gerais no País. É fundamental despertarmos para isso, porque a juventude brasileira, já no passado, demonstrou o que pode fazer no mundo inteiro. Sentimos que, hoje, conforme disse anteriormente, há uma certa apatia na movimentação, desde as nossas Universidades, que estão em greve e indefesas e que não têm motivação de ir para a luta.
Por isso é necessário, em relação às eleições gerais que se aproximam, que se insira o verdadeiro direito de se exercer a verdadeira cidadania do jovem no País, não pecando pela omissão. É melhor até errar participando do que se omitindo. Isso é conhecido por todos.
A inserção dos jovens nessas decisões, com essa força, esse brio, essa vontade, é indispensável. Até diria que, embora o prazo tenha se extinguido, conforme determinação da Justiça Eleitoral, no último dia 6 de maio, pelo resultado que demonstrou queda dessa motivação e da vontade de inscrição dos jovens para se habilitarem a exercer a verdadeira cidadania, a Corte do Tribunal Superior Eleitoral e seu Presidente poderiam examinar a possibilidade de - quem sabe -, numa exceção, abrir um certo prazo de algumas semanas para que os jovens que, por uma razão ou outra, não se habilitaram a exercer esse verdadeiro sentido da cidadania brasileira ainda possam aproveitar esse momento.
A Justiça Eleitoral poderia oferecer essa oportunidade a milhões de jovens que sei que estão em condições de exercer esse papel, mas estão apáticos, retraídos. Eles devem se inserir no verdadeiro contexto das decisões nacionais.
Essa é uma sugestão que deixo ao Tribunal Superior Eleitoral, neste momento, em que a participação de todos é fundamental, desde o Chuí ao Oiapoque, do leste ao ocidente deste País.
Sr. Presidente, nobres colegas, essas eram algumas considerações que tinha que trazer, no dia de hoje, para a reflexão do País inteiro.