Pronunciamento de Romeu Tuma em 26/05/1998
Discurso no Senado Federal
REGISTRO DO DEBATE EM QUE S.EXA. PARTICIPOU, JUNTO A CONSULTORIA JURIDICA PUBLICA DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS.
- Autor
- Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
- Nome completo: Romeu Tuma
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
- REGISTRO DO DEBATE EM QUE S.EXA. PARTICIPOU, JUNTO A CONSULTORIA JURIDICA PUBLICA DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS.
- Aparteantes
- Eduardo Suplicy.
- Publicação
- Publicação no DSF de 27/05/1998 - Página 9294
- Assunto
- Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
- Indexação
-
- PARTICIPAÇÃO, ORADOR, DEBATE, FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS (FGV), ASSUNTO, FUNÇÃO, ESTADO, DESENVOLVIMENTO, AMBITO, IDEOLOGIA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA FRENTE LIBERAL (PFL).
- ANALISE, PROCESSO, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, FUNÇÃO, ESTADO, REDUÇÃO, PROBLEMA, ORDEM SOCIAL, PROMOÇÃO, EDUCAÇÃO, PESQUISA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, OBJETIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.
- COMENTARIO, SITUAÇÃO, VAGNA APARECIDA RIBEIRO, MÃE, CRIANÇA, VITIMA, SEQUESTRO, PAI, FUGA, PAIS ESTRANGEIRO, LIBANO.
O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, vou tentar, dentro dos minutos que restam desta sessão, reportar-me a um debate do qual participei ontem, da Consultoria Júnior Pública da Fundação Getúlio Vargas, entidade que congrega os alunos de graduação da Escola de Administração de Empresas de São Paulo.
Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, integro um partido político que possui uma linha programática definida pelos princípios liberais, uma linha bem clara no que se refere ao papel do Estado. Deve ele respeitar o primado da liberdade individual e proclamar-se como democrático e de direito. Reger-se-ia, assim, pela eqüidade, pela justiça e pelo respeito aos direitos humanos. Faço esta chamada, Sr. Presidente, porque o debate teve como tema “Papel do Estado e desafio do desenvolvimento”. Além disso, suas dimensões precisariam ficar restritas ao mínimo necessário para ele, com eficiência e agilidade, poder cumprir uma missão natural, básica e inarredável, qual seja, ministrar oportunidades iguais e realização pessoal para todos, através da garantia de acesso à educação, à saúde e à segurança públicas, as principais - senão únicas - justificativas reais de sua existência.
Hoje, entretanto, em virtude da globalização da economia, vivemos um período emergencial que afeta todos os povos e, por conseqüência, os conjuntos de poderes políticos que esses povos delegam, exercem diretamente ou lhes são impostos. Esta realidade, queiramos ou não, aí está a desafiar governantes quanto à própria capacidade de amenizar o impacto social causado pela disseminação do conceito de que o mercado global, qual uma divindade pantófaga, deve ser cultuado e aplacado: a ele devem ser imolados os deficientes e virgens tecnológicos. Conceito falacioso que, a prosseguir, produzirá mais e mais violência em escala nacional e internacional, num mundo em que a ameaça de conflitos atômicos continua bem palpável.
Todavia, o fato é que o atual estágio da humanidade ainda não admite a supressão de nenhum Estado e estes não podem submeter-se ao mercado supranacional, sob pena de se transformarem em meros instrumentos de dominação estrangeira. Aceitar regras de mercado global acima de interesses pátrios, como se fossem apanágio da sonhada eliminação de fronteiras que separam povos há milênios, é transformar a cidadania em submissão sub-reptícia. Isto é, veríamos a cidadania transformar-se em simples rótulo para uma forma de submissão impessoal, esmaecida, difusa, difícil de diagnosticar e combater porque seria inoculada através de um falso senso de liberdade com segurança, segundo o qual todos poderiam fazer tudo o que almejassem, desde que agissem de acordo com as “regras” de um mercado transnacional autocéfalo, portanto desregrado. Na verdade, a única regra seria a vontade dos dominadores.
Afinal, ao que me conste, a palavra “pátria” não foi suprimida e continua a ter seu antigo significado, Sr. Presidente. Ainda é o designativo de casa em escala maior, do lar de um povo ou nação, do lugar onde nascemos, da nossa terra, da grande herança para nossos filhos e seus descendentes.
Evidentemente, todos os acontecimentos históricos, especialmente as revoluções - e talvez estejamos vivendo a mais ampla, silenciosa e perigosa revolução da História - apresentam aspectos bons e ruins. Durante séculos, a humanidade sonhou com o momento em que o mundo se transformaria numa aldeia global. Muitas teorias políticas, ideologias e movimentos libertários foram moldados com esse ideal, na busca daquele momento. E muito sangue inocente correu, Sr. Presidente e Srs. Senadores. Finalmente aconteceu o paradoxo: a diminuição das barreiras entre as nações está decorrendo exatamente daquilo que costumava figurar, em teoria, como sendo seu maior entrave e principal motivo para a eclosão de guerras xenófobas. Ou seja: a queda das fronteiras está se acelerando em função da procura, por corporações transnacionais, do domínio de mercados consumidores regionais e de fontes de matérias-primas, tecnologia e mão-de-obra a eles vinculadas.
Será que, agora, a dominação econômica poderá expandir-se ao máximo, graças aos novos meios de informação e à tecnologia de ponta monopolizada por imensas corporações supranacionais que escapam ao controle dos Estados? Há indícios que sim, Sr. Presidente - e são inquietadores, senão alarmantes.
Na prática, temos um longo caminho a percorrer, até que as coisas possam se ajustar, aclarar e acalmar, até que a concorrência desigual entre países ricos e pobres deixe de parecer um fosso intransponível e surjam mecanismos de controle que tornem o processo de globalização menos doloroso; mecanismos que reduzam os efeitos negativos desse processo no campo social, principalmente o desemprego e a diminuição da renda familiar; mecanismos que garantam distribuição de renda coerente com a explosão de progresso global e que fortaleçam a autodeterminação dos países em desenvolvimento, permitindo-lhes preservar o bem comum, a liberdade e a própria soberania. Aí está, a meu ver, uma missão para o que se pode definir como social-liberalismo.
No atual contexto, o Estado ganha um novo e crucial papel, qual seja o de amenizar os danos sociais que possam advir da globalização e, ao mesmo tempo, promover os avanços educacionais e tecnológicos necessários ao desenvolvimento sustentado, principalmente pelo incentivo de parcerias entre os setores produtivos e as universidades para pesquisa e os projetos. Na economia globalizada, o fator hegemônico preponderante é a posse de conhecimento técnico que permita a produção de bens e serviços cada vez em maior quantidade, com mais qualidade e menor preço, o que implica automatização e dispensa de mão-de-obra qualificada ou não. Isto é, trata-se de um fator hegemônico, gerador de desemprego generalizado, que nenhuma utopia viável parece apta a tolher.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Patrocínio) - Senador Romeu Tuma, permita-me interromper V. Exª para prorrogar a sessão por mais cinco minutos, para que V. Exª conclua o seu pronunciamento.
O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Agradeço a compreensão de V. Exª.
Tenho observado uma preocupação geral com esses aspectos do novo papel do Estado dentro da globalização da economia, mas não vi, até agora, nenhuma proposta concreta de sistema normativo realmente capaz, em minha opinião, de harmonizar as razões de Estado e as de mercado global, em benefício do desenvolvimento nacional e do progresso social, com a rapidez que a estonteante velocidade dos acontecimentos está a exigir.
O Brasil necessita de um sistema normativo que o preserve de ações arquitetadas para rebaixá-lo no mercado global, que acelere nosso desenvolvimento e que reduza os problemas acarretados pela globalização à nossa indústria e ao nosso empresariado, em muitos casos já reduzidos a meros apêndices de cartéis estrangeiros.
Sr. Presidente, gostaria que constasse do meu discurso algumas análises que fiz para dialogar com os alunos, e os textos referentes ao papel do Estado, ao Grupo dos Oito, ao Brasil e à economia, ao desemprego, à privatização, em parágrafos em separado.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Concede-me V. Exª um aparte?
O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Ouço V. Exª com prazer.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Cumprimento-o por haver realizado o debate, pois houve muito interesse por parte dos alunos da Fundação Getúlio Vargas que ali compareceram.
O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Esqueci de mencionar, pela pressa, que se encontravam presentes no debate o candidato Ciro Gomes, o Ministro Luís Carlos Bresser Pereira, o empresário Luiz Norberto Pascoal e o mediador, jornalista Luiz Nassif.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Se V. Exª me permite, aproveito este final de tarde para transmitir-lhe um assunto que acredito esteja preocupando-o também. Refiro-me ao caso - e assim o faço porque V. Exª tem relações especiais com o Líbano - da Srª Vagna Aparecida Bandeira, que se dirigiu ao Líbano porque seu marido havia levado suas duas crianças. Uma Deputada de São Paulo, da região de Guarulhos, Dalila Figueiredo, resolveu preocupar-se tanto com o caso que viajou com ela. Em virtude da legislação do Líbano, está sendo muito difícil para essa mãe recuperar suas crianças. Na verdade, houve praticamente um seqüestro por parte do pai das crianças, que as levou do território brasileiro. Essa mãe está realizando uma greve de fome, hospedada na Embaixada do Brasil no Líbano em companhia da Deputada Dalila Figueiredo. Sei que o Ministro Interino das Relações Exteriores está empenhado em realizar um esforço e avaliei que seria importante, neste final de tarde, conclamar os Governos brasileiro e libanês para realizar esforços de entendimento com respeito a esse direito tão importante de a mãe de poder ter as suas crianças, sobretudo para que possa haver, obviamente, o melhor entendimento entre o pai, a mãe e seus próprios filhos. Trata-se de uma questão que envolve, inclusive, as relações diplomáticas do Brasil, mas também cabe aqui o apelo humanitário. Como V. Exª tem um relacionamento de ascendência com o Líbano, talvez possa colaborar para a solução desse problema.
O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Senador Eduardo Suplicy, não estou alheio ao problema. Tenho acompanhado-o de perto, principalmente quanto à parte humanitária, de sentimento.
Somos, V. Exª e eu, bem casados, vivemos harmoniosamente com nossas esposas, temos os nossos filhos e sabemos o valor do amor da mãe por eles - amor este que nos deixa numa boa distância quando se tem de discutir o sacrifício que um de nós faz em favor dos filhos. A mãe sempre nos supera.
Por isso, humanitária e normalmente, as legislações concedem à mãe o direito de, sempre, em questão de discussão e de separação, ficar com os rebentos até uma determinada idade, prevalecendo ao pai a oportunidade de visitá-los de acordo com as decisões judiciais. As leis também conseguem definir harmonicamente o que é fundamental para os pais e para seus descendentes quando o casal tem qualquer antagonismo com o fato de viverem juntos.
Ainda ontem, recebi a informação do Itamaraty, por intermédio da nossa assessoria, de que a Embaixada do Brasil no Líbano está trabalhando firme para tentar um acordo, visto que, naquele país, evoca-se o aspecto religioso do muçulmano. Nesse caso, a prevalência do pátrio poder é exercido pelo pai, tendo, portanto, a mãe dificuldade em conseguir trazer os filhos de volta por meio da legislação.
Em tese, realmente houve falsificação de documentos e uma série de outros crimes que o Direito Internacional pode reconhecer. Mas, no Líbano, prevalece o aspecto religioso em detrimento do que se poderia discutir.
Penso que, por esse caminho, será difícil. A própria comunidade, em respeito ao sofrimento dessa mãe - temos visto pela televisão -, teria de convencer o rapaz a ceder em parte, para que possam fazer, harmonicamente, um acordo e conviver em paz, em benefício da educação dos filhos, que não devem ser criados num ambiente traumático e, provavelmente, sem reconhecer a mãe no futuro.
V. Exª tem razão. Temos de nos unir também na busca de uma solução humanitária que possa favorecer essa mãe.
Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.