Discurso no Senado Federal

CUSTO ABUSIVO DO PEDAGIO COBRADO NAS RODOVIAS PRIVATIZADAS NO ESTADO DO PARANA.

Autor
Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO PARANA (PR), GOVERNO ESTADUAL.:
  • CUSTO ABUSIVO DO PEDAGIO COBRADO NAS RODOVIAS PRIVATIZADAS NO ESTADO DO PARANA.
Aparteantes
Leomar Quintanilha.
Publicação
Publicação no DSF de 03/06/1998 - Página 9641
Assunto
Outros > ESTADO DO PARANA (PR), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, PRIVATIZAÇÃO, RODOVIA, ESTADO DO PARANA (PR), CRITICA, FALTA, DEBATE, SOCIEDADE, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, DENUNCIA, ILEGALIDADE.
  • CRITICA, SUPERIORIDADE, VALOR, PEDAGIO, RODOVIA, ESTADO DO PARANA (PR), INJUSTIÇA, COBRANÇA, AUMENTO, PREÇO, MERCADORIA, EXPORTAÇÃO.
  • NECESSIDADE, INVESTIGAÇÃO, EXCESSO, GASTOS PUBLICOS, ESTADO DO PARANA (PR), PUBLICIDADE, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, IRREGULARIDADE, FAVORECIMENTO, EMPREITEIRO, SETOR, TRANSPORTE.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, vivemos em um cenário de globalização, onde há muitas teses em discussão; uma delas é a função que o Governo deve exercer junto à sociedade. Por isso, o Senado Federal tem autorizado o Governo da União a promover as privatizações e, enfim, a entregar à iniciativa privada tarefas que o Estado não tem desempenhado com eficiência, atendendo aos anseios da sociedade. Porém, quando se defende a tese da privatização, é preciso ter-se em conta que ela deve ocorrer sob regras, sob critérios e, sobretudo, sob o manto da honestidade e da seriedade.

Quando perguntaram ao ex-Presidente da República, João Baptista de Oliveira Figueiredo, se era a favor ou contra o programa de privatização, ele respondeu que era a favor da privatização, mas não que se entregasse o patrimônio público a algumas empresas para dele tirarem lucros exorbitantes. Essa frase do ex-Presidente define bem o que estou querendo dizer no início do pronunciamento sobre o meu Estado. Inclusive, penso que este assunto não é provinciano, pois interessa a todos os Senadores; enfim, a todo o País, pois o que se faz no programa de privatização tem que ser, no mínimo, refletido pela sociedade do meu Estado e do meu País.

Refiro-me à privatização das rodovias do Estado do Paraná e o que cerca a privatização dessas rodovias, já que temos rodovias que fazem a ligação das principais cidades do Estado: de Foz do Iguaçu a Paranaguá, passando por Cascavel, Guarapuava, Curitiba; de Paranavaí até o porto de Paranaguá, passando por Maringá, Apucarana, Londrina, enfim o chamado “Anel de Integração”, assim denominado pelo Governo do Estado, que perfaz 2.035 ou 2.050 quilômetros.

Na verdade, esses 2.050 quilômetros já foram asfaltados há muitos anos por governos anteriores, que se utilizaram dos impostos pagos pelos paranaenses para construir essa benfeitoria, essa infra-estrutura rodoviária do Estado do Paraná, que tem sido, aliás, uma das responsáveis pela atração de investimentos no Estado. Lá, temos uma malha estadual de 12.450 quilômetros asfaltados e uma malha rodoviária federal de 3.450 quilômetros.

Pois bem, toda essa malha rodoviária, assim como a ferroviária, foi construída pelo Poder Público. E se o Poder Público construiu, não foi com outro dinheiro senão o dinheiro do contribuinte arrecadado dos impostos, em especial o IPVA, que foi instituído neste País para permitir a construção e conservação das rodovias.

O Governo do Estado, sem discutir com a sociedade e sem discutir, especificamente, o processo de privatização das rodovias com a Assembléia Legislativa, loteou esses 2.050 quilômetros entre as empreiteiras do Paraná, que passaram a construir os postos de pedágio, em número de 26, o que dá uma média de 80 quilômetros entre um posto de pedágio e outro. De todos esses 2.050 quilômetros, temos alguns trechos duplicados: de Paranaguá a Curitiba, em torno de 100 quilômetros; de Curitiba a Castro, em torno de 150 quilômetros, são 250 quilômetros que, somados com o trecho de Londrina a Maringá, mais 100 quilômetros, são 350 quilômetros e um pequeno trecho entre Foz do Iguaçu e São Miguel do Iguaçu, mais 30 a 40 quilômetros. Ficamos, portanto, com algo em torno de 350 quilômetros de rodovias duplicadas no anel de integração que o Governo entrega à iniciativa privada.

Há, no entanto, vários pontos que têm que ser discutidos. Primeiro, o preço que será cobrado por quilômetro nessa rodovia, que é o maior do País - R$0,034 por quilômetro nas rodovias de mão única e R$0,045 nas rodovias já duplicadas. Se isso não fosse suficiente para levantar a indignação das transportadoras, dos produtores e do setor produtivo em geral, porque eles pagarão um preço acima do que se cobra em rodovias já duplicadas e em perfeitas condições no País, como, por exemplo, no Estado de São Paulo e até no Rio Grande do Sul, há também outros pontos que eu quero, aqui, comentar, já que estamos diante de um processo que pode atropelar a ética, a moral e até a dignidade na Administração Pública, como tem ocorrido no meu Estado.

Esse processo de privatização das rodovias está muito longe de ser ético, moral e justo e talvez esteja muito longe até de ser legal, isso porque, no meu Estado, quando se privatiza e se colocam os postos de pedágio nessas rodovias, não existe outra alternativa para aqueles que não querem pagar o pedágio, como ocorre em outros países desenvolvidos do mundo, em que se coloca a cobrança de pedágio, mas sempre se oferece a alternativa de uma secundária para quem não queira pagá-lo. No Paraná, não. Se quiser passar, deve-se pagar o pedágio.

Portanto, temos que analisar se o pedágio é bom, e bom para quem. Em primeiro lugar, vamos analisá-lo sob o ponto de vista da produção, não apenas a produção agrícola, mas a agroindustrial, aquela que vem do interior para o porto de Paranaguá e que, obrigatoriamente, tem que passar e pagar os inúmeros pedágios. Para que se tenha uma idéia, quem sai de Foz do Iguaçu e vai até o porto passa por dez postos de pedágio e o pior: em rodovias de mão única. Os caminhões, transportando renda e emprego, vão pagar para ir até o porto e para retornar à região de origem. Em uma rodovia de pista única, parece-me que isso é inédito no mundo e é, no mínimo, injusto.

Quando um caminhão sai da zona de produção, vamos supor, do oeste do Paraná e vai para o porto de Paranaguá, carregado de soja, vai deixar nos postos, para cada tonelada, cerca de R$5,00. Fazendo-se um comparativo entre os custos dos fretes cobrados aos produtores, porque isso é cobrado ao produtor já que é descontado do preço do seu produto, verificamos que uma tonelada de soja, nos Estados Unidos, é colocada no porto com um custo de US$8,00; na Argentina, US$15,00 e no Brasil, US$32,00. Isso nos confere uma desvantagem enorme na competitividade com esses que são os maiores competidores do Brasil em termos de exportação de soja. Soma-se aí o custo mais alto do porto que, no nosso caso, é de US$9,00 a média; no caso da Argentina, US$5,00 e no caso dos Estados Unidos, US$3,00. Tudo isso somado com o tributo faz com que a competição com os nossos concorrentes seja de uma desigualdade brutal.

No momento em que se discute a redução do custo Brasil - tema de discurso em qualquer governo, em qualquer parlamento -, vemos o Governo do Paraná transferindo um custo que vai roubar dos produtores a possibilidade de competir nesse mercado cada vez mais competitivo.

Em um cálculo bastante rápido, podemos chegar à conclusão que para cada saca de soja serão US$0,25 que ficarão nos postos de pedágio, o que não é pouco, porque para um produtor de 10 mil sacas, ficarão nos postos de pedágio R$2,5 mil, o que é muito dinheiro. Se quisermos considerar o valor em sacas, para cada caminhão que sai da zona de produção serão cerca de 10 sacas de soja e 19 sacas de milho que ficarão nos postos de pedágio.

Se é ruim para os produtores, será ruim também para os consumidores, porque as carretas que transportarão os produtos a serem consumidos pela população do Estado terão que pagar também o pedágio, e, com certeza, esse custo será repassado ao consumidor.

Quero fazer um cálculo para chamar a atenção daqueles que transportam as riquezas, os proprietários de caminhões. Quando uma carreta sai, com aproximadamente 30 toneladas de qualquer produto, em direção ao Porto de Paranaguá, ao passar pelos pedágios ele vai deixar, na ida, R$140 reais, e, na volta, mais R$140 reais, porque o pedágio é cobrado duas vezes - na ida e na volta, quando o caminhão retorna, batendo carroceria -, o que significa R$280 reais por viagem. Levando-se em conta que os caminhões fazem, em média, dez viagens ao mês, cada carreta deixará nos postos de pedágio R$2,8 mil. Se multiplicarmos esse valor pelos doze meses do ano, cada carreta terá deixado R$33 mil por ano nos postos de pedágio. E se multiplicarmos por três anos esse valor, essa carreta terá deixado R$99 mil nos postos de pedágio, o que corresponde ao valor de uma carreta. Em três anos, transportando qualquer produto, o dono da carreta terá perdido o seu veículo para o Governo do Paraná ou para os empreiteiros que ganharam os trechos de estradas loteados já construídos.

É justo impor sobre os produtores, sobre as transportadoras e os caminhoneiros mais esse custo exorbitante e insuportável? Porque, em 3 anos, os caminhoneiros terão perdido o seu instrumento de trabalho, o caminhão. Se essa situação é ruim para o produtor, para os transportadores e para os caminhoneiros, deve ser boa para alguém. Para quem? Aliás, aquela proposta do Senador Pedro Simon, de se apurar a corrupção em obras públicas em nosso País, deveria ser colocada em prática, porque cabe muito bem apurar sobretudo esse relacionamento promíscuo entre alguns Governos e algumas empreiteiras. É preciso que passemos a investigar esses atos e esses contratos, que, muitas vezes, ficam nas gavetas, confidencialmente escondidos, já que não podem revelar a verdade escandalosa, como no caso dos pedágios no Paraná.

Prestem atenção no cálculo que vou fazer. Irei demonstrar para onde está indo o Paraná e o dinheiro do contribuinte do meu Estado, o mesmo contribuinte que pagou, no ano passado, R$210 milhões de IPVA aos cofres públicos e não viu um quilômetro de estrada ser asfaltado nem recuperado. O Governo diz que não tem dinheiro. Talvez isso ocorra porque tenha gasto em propaganda R$140 milhões, um recorde absoluto. O Estado de São Paulo, por exemplo, do Governador Mário Covas, que arrecada sete vezes mais do que o Paraná, gastou R$21 milhões. Fiz essa comparação só para termos a dimensão da exorbitância, do exagero e da ganância do Governador do meu Estado em aparecer na mídia: ele gastou para isso sete vezes mais do que gastou o Estado de São Paulo.

Busquei os custos das obras que serão feitas nesse anel de integração e gostaria de chamar a atenção para os números. Para recapear e construir a terceira faixa ou o acostamento nas rodovias teremos um custo, por quilômetro, de R$250 a R$300 mil. Se já temos 350 quilômetros de estradas duplicadas em 2.050, restam, portanto, 1.700 quilômetros nos quais fazer as obras que estão sendo exigidas no contrato de concessão das rodovias. Se multiplicarmos R$300 mil por 1.700 quilômetros, chegaremos a R$510 milhões para fazer todas as obras exigidas pelos contratos de concessão.

Pois bem, R$510 milhões é o custo de toda a obra a ser feita no anel de integração. Aí, o Secretário dos Transportes, num debate na Assembléia Legislativa, depois de assinados os contratos, afirmou que a arrecadação, nos 24 anos de concessão, chegará a R$13 bilhões. Se dividirmos R$13 bilhões por 24, obteremos R$548 milhões por ano. Ora, se as empreiteiras vão arrecadar do contribuinte do Paraná R$548 milhões por ano - segundo o Secretário dos Transportes, não sou eu que estou dizendo - e todas as obras custarão R$510 milhões, sobrará uma gorjeta de R$38 milhões na arrecadação de um ano. Como todas as obras serão feitas em um ano, nos outros 23 anos as empreiteiras vão arrecadar e juntar todo o dinheiro do contribuinte. Como eu disse, esse pedágio vai pesar nos ombros do produtor, do caminhoneiro e do consumidor, porque não é apenas quem usa a rodovia que vai pagar, mas também o contribuinte que consome qualquer produto no Estado, a quem o custo do frete será repassado.

É muito triste vermos isso acontecer no momento em que estamos discutindo qual é o verdadeiro papel do Estado. O Paraná, antes modelo de administração, passa agora por uma administração vexatória e calamitosa, porque, ao transferir o direito de cobrança para os empreiteiros, o Governo do Paraná não vai arrecadar, segundo o Secretário, nem ao menos um centavo. Mas isso não significa que os contribuintes não pagarão, porque eles pagarão. A diferença é esta: em um ano, pagam-se todas as obras. Restam 23 anos para jogar nos cofres das empreiteiras um dinheiro que vai custar muito caro para o contribuinte do Estado.

O Sr. Leomar Quintanilha (PPB-TO) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Com muita honra, Senador Leomar Quintanilha.

O Sr. Leomar Quintanilha (PPB-TO) - Nobre Senador Osmar Dias, com a propriedade e a seriedade que sempre nortearam as ações de V. Exª nesta Casa, algumas colocações que traz, esta tarde, à consideração das Srªs. e Srs. Senadores são revelações extremamente preocupantes. Gostaria de continuar atento às suas informações sobre o custo das obras que estão sendo feitas, principalmente no seu Estado, mas mais particularmente gostaria de comentar o custo do pedágio hoje cobrado dos usuários das rodovias no Paraná. Isso é extremamente preocupante em um País que insiste em privilegiar a modal rodoviária como sistema mais importante de transporte de carga pesada a longa distância, em um país continental, como o Brasil, que age diferentemente dos outros países que têm extensão territorial e que já entenderam que o transporte rodoviário é importante sim, mas como alimentador e integrador de modais diversas que possam baratear o custo do transporte. Ora, outros países tratam a ferrovia e a hidrovia como formas de transporte complementares às rodovias, estabelecendo uma matriz de transporte que possa, efetivamente, oferecer transporte de custo razoável. Os cálculos que V. Exª faz com o preço do pedágio cobrado no Paraná, que, em três anos, se iguala ao preço de um veículo de transporte, a carreta, são extremamente preocupantes, porque certamente o custo adicional desse pedágio não ficará exclusivamente com os transportadores; ele certamente penalizará o produtor e a ponta, ou seja, o consumidor. Entendo que a preocupação que V. Exª hoje traz à apreciação da Casa merece a reflexão, o estudo, a análise dos Srs. Senadores, porque não é mais possível que convivamos com essa realidade perversa e brutal, que não alivia em nada nem a situação do consumidor nem a do produtor. Quero me associar, portanto, às preocupações de V. Exª, agradecendo a oportunidade que me dá de participar de suas reflexões.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB-PR) - Muito obrigado, Senador Leomar Quintanilha.

            Nem mesmo no caso do transporte intermodal o produtor vai ter como escapar da cobrança do pedágio, porque a ferrovia iniciada no Governo Álvaro Dias e concluída no Governo do nosso Colega Requião também foi privatizada e entregue a um grupo de empreiteiros. Seu custo foi R$300 milhões e a concessão pelo período de vinte e quatro anos custará R$20 milhões ao grupo de empreiteiros.

            Algo estranho está acontecendo no Paraná. O Governo que, com o dinheiro do produtor, do contribuinte, do usuário, do consumidor, construiu uma ferrovia por R$300 milhões, entrega-a para ser explorada por um grupo de empreiteiros por R$20 milhões, que poderão ser pagos em dois ou três anos, não tenho dúvida - no caso das rodovias, um ano será suficiente para pagar todas as obras.

Supondo que toda a rodovia deva ser duplicada - esqueçam a possibilidade de se recapeá-la e de fazer acostamento; vamos dizer que o Governo vá fechar a minha boca duplicando a rodovia -, ao custo aproximado de R$1 milhão por quilômetro, nos 1.700 quilômetros do anel de integração que falta duplicar o gasto seria de R$1,7 bilhão, Sr. Presidente. Não serão arrecadados R$13 bilhões? Mas aí dizem que é preciso roçar o capim na beira da pista, pintar o meio-fio, instalar telefone, comprar ambulância e manter funcionários para operar, e tudo isso representa um custo. Mas será que tudo isso vai custar R$11 bilhões, Sr. Presidente?

Para resumir, a cobrança de pedágio no Paraná é prejudicial a toda a sociedade, menos aos empreiteiros e àqueles que terão a campanha financiada por eles. Para esses, com certeza, ela será muito bem-vinda e motivo de muitas festas, como aquelas às quais tenho assistido no Paraná.

Mas o povo do Paraná não está satisfeito e saberá dar o troco, Sr. Presidente. E dará o troco, porque a cobrança de pedágio nas rodovias do Paraná é imoral e injusta. Não sei se é ilegal ou não, já que esse aspecto ainda está sendo discutido. Mas que é uma grande patifaria, isso é!

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/06/1998 - Página 9641