Discurso no Senado Federal

ALERTA PARA O PERIGO QUE REPRESENTA A IMUNIDADE DE JUIZES.

Autor
Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO.:
  • ALERTA PARA O PERIGO QUE REPRESENTA A IMUNIDADE DE JUIZES.
Publicação
Publicação no DSF de 04/06/1998 - Página 9775
Assunto
Outros > JUDICIARIO.
Indexação
  • NECESSIDADE, REVISÃO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, JUDICIARIO, BRASIL, GARANTIA, JUIZ DE DIREITO, IMUNIDADE, AUTORIDADE JUDICIARIA, OBJETIVO, PREVENÇÃO, ABUSO, RESULTADO, IMPUNIDADE, CIDADÃO, QUALIDADE, MAGISTRADO.

O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB-PR. Para uma comunicação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o Congresso Nacional e o Senado da República, principalmente, discutem a redução de algumas absurdas imunidades parlamentares. Não me refiro às necessárias e democráticas prerrogativas, mas ao abuso das imunidades que, pela sua própria existência, fazem com que pessoas que têm complicações com a justiça proponham suas candidaturas para se tornarem imunes ao abrigo do Congresso Nacional.

Mas, hoje, quero falar sobre o outro lado da questão, que é a absoluta imunidade e impunidade dos juízes. E quero falar de um caso que ocorreu e ocorre comigo no Paraná. Durante as eleições em que concorri para o Governo do Estado, um Juiz de Direito, membro do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, tendo sido Relator de um feito onde se discutia a legalidade de uma propaganda eleitoral da minha coligação - na época eu era candidato ao Governo do Estado - considerou a propaganda ilegal e a suspendeu. Não satisfeito, no entanto, com a suspensão e como punição tirou do ar toda a propaganda televisiva da minha coligação.

Durante o período em que a propaganda ficou suspensa, o juiz determinou que se veiculasse no ar um despacho de sua autoria de forma permanente e integralmente. O despacho me acusava de, ao invés de utilizar o tempo de televisão para elevar o nível da campanha - e essa era a opinião do juiz e não a minha -, distorcer o seu cunho finalístico para as críticas pessoais de trocas de ofensas, que considerava lastimáveis. E chamava a minha propaganda, como candidato, de propaganda caracterizada por desatinado ataque ao adversário. Era a opinião do juiz; não era a minha e não era a opinião do povo do Paraná que, ao fim e ao cabo, elegeu-me.

Submeteu o seu despacho ao Tribunal, mas determinou a sua imediata veiculação na televisão, funcionando claramente como um juiz partícipe do processo eleitoral e fazendo contrapropaganda à propaganda do PMDB e à minha própria candidatura. O inusitado fato de um despacho desse tipo ter sido veiculado na televisão causou estranheza a muita gente, inclusive a jornalistas e políticos que se pronunciaram reiteradas vezes sobre a matéria, questionando o juiz pelas medidas que havia tomado.

Como candidato, senti-me prejudicado pela forma da publicação do despacho, que colocava em dúvida toda a minha campanha eleitoral, favorecendo, evidentemente, o meu adversário. Tomei medidas judiciais, tais como, recursos internos e externos, inclusive com representação contra o juiz ao Tribunal e reclamação junto à OAB, considerando que o juiz havia cometido crime eleitoral ao participar da campanha na qualidade de juiz, fazendo veicular a sua opinião pessoal no horário do programa eleitoral da coligação do PMDB.

Esses fatos foram noticiados nos jornais e as representações foram aos poucos arquivadas. O espírito corporativo do Judiciário impediu que elas progredissem. Apesar de tudo isso, o juiz não sofreu nenhuma punição e eu fui eleito Governador do Paraná. No entanto, após a minha eleição e o arquivamento das reclamações e processos contra o juiz, depois de arquivado todos os procedimentos contra o juiz, inclusive com manifestação de surpresa e desacordo, especialmente da Ordem dos Advogados do Paraná, em dezembro de 1994, o juiz ingressou com uma ação ordinária de reparação de danos morais contra mim, por meio de um advogado, ex-desembargador, que havia sido Presidente da Associação dos Magistrados, na contenda que estabeleci com o Judiciário, no momento em que pretendia fixar o salário dos juízes sem submetê-lo a uma lei, que é um ato jurídico complexo, com a participação do Executivo e do Legislativo.

Utilizando palavras de jornalistas, notícias de jornais e petição de advogado, o juiz se diz ofendido e me processa por danos morais. Alega que se sentiu ofendido com uma frase de um artigo publicado na Folha de S. Paulo pelo jornalista Newton Rodrigues. Tenta fazer crer que tudo que foi escrito nos jornais fora causado pelo candidato Roberto Requião, então disputando a eleição do Paraná.

Apesar de não haver nenhuma acusação direta, nenhuma palavra ou ato do próprio candidato, no caso eu pessoalmente, não haver nenhuma prova direta ou indireta de que eu tenha falado ou agido contra o juiz, além das representações legais que o meu advogado promoveu, ainda mais havendo prova de que eu não pedira nem propusera ou sugerira a jornalistas que escrevessem contra o juiz, em agosto de 1997, fui condenado a uma indenização em uma ação civil.

É evidente que da sentença caberia recurso com efeito suspensivo que garantiria a suspensão até que a causa fosse definitivamente julgada. No entanto, como forma de me constranger, por um pedido do juiz, foi concedido, segundo o art. 466 do Código de Processo Civil, hipoteca judiciária de bem de minha propriedade, um modesto apartamento que havia comprado para minha filha.

Estou querendo, Sr. Presidente, trazer à consideração do Senado Federal o perigo que significa essa impunidade absoluta dos juízes singulares. Todos os processos a que fui submetido em função da minha querela legal com o Judiciário do Paraná têm sido resolvidos favoravelmente a mim e arquivados nos tribunais superiores. Porém, o exercício do meu mandato tem sido atrapalhado por uma sucessão de processos. Não há nenhum cabimento que um juiz hipoteque um bem de um Senador, em cima de um processo rigorosamente absurdo, apenas para constrangê-lo.

Hoje, está pendente de recurso, no Tribunal de Justiça do Estado, ação na qual fui condenado a pagar 200 salários mínimos e também a hipoteca de uma propriedade que eu havia destinado a minha filha menor. A distribuição ocorreu em 11 de maio de 1998, foi designado como Relator o Desembargador Newton Luz; Revisor, o Desembargador Telmo Cherem; e Juiz, o Sr. Sérgio Arenhart, várias vezes convocados para falar no tribunal onde tramita o meu recurso.

Trago esse problema pessoal, porque se trata também de um problema universal. “Quem quer ser universal deve cantar a sua aldeia”, aconselha-nos Marshall Mcluhan. E é preciso que reflitamos não apenas sobre a impunidade dos parlamentares, mas sobre a utilização da Justiça, do múnus público que é outorgado a um juiz no momento em que ele corporativa ou, pessoalmente, se utiliza do seu poder jurisdicional para constranger parlamentares de uma forma sórdida e absurda. A minha vida econômica e pública tem sido atrapalhada pelas vinganças promovidas pelo Judiciário do Paraná pelo simples fato de que eu exigi que eles cumprissem a lei, que não aumentassem os seus próprios salários sem submeter a sua proposta à Assembléia Legislativa e ao Governador do Estado. E é importante que se reflita sobre isso no momento em que nós abrimos mão de imunidades que são prerrogativas do cargo, que não são privilégios, porque os privilégios devem ser afastados, e corremos o risco de nos colocarmos na mão do desejo mesquinho e ridículo de vingança de juízes singulares.

Muito obrigado, Sr. Presidente, fundamentalmente pela tolerância em relação ao tempo que excedi.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/06/1998 - Página 9775