Discurso no Senado Federal

RELATO DA VISITA DA PASTORAL PARLAMENTAR CATOLICA BRASILEIRA AO VATICANO, NA SEGUNDA QUINZENA DE MAIO, E DA AUDIENCIA COM SUA SANTIDADE, O PAPA JOÃO PAULO II.

Autor
José Alves (PFL - Partido da Frente Liberal/SE)
Nome completo: José Alves do Nascimento
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA.:
  • RELATO DA VISITA DA PASTORAL PARLAMENTAR CATOLICA BRASILEIRA AO VATICANO, NA SEGUNDA QUINZENA DE MAIO, E DA AUDIENCIA COM SUA SANTIDADE, O PAPA JOÃO PAULO II.
Publicação
Publicação no DSF de 06/06/1998 - Página 10009
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • PARTICIPAÇÃO, ORADOR, VISITA OFICIAL, COMISSÃO, IGREJA CATOLICA, PAIS ESTRANGEIRO, VATICANO, AUDIENCIA, PAPA, DISCUSSÃO, NECESSIDADE, COMBATE, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, INJUSTIÇA, NATUREZA SOCIAL, MUNDO, ESPECIFICAÇÃO, BRASIL.

O SR. JOSÉ ALVES (PFL-SE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, tendo participado, juntamente com outras autoridades, dentre as quais três membros desta Casa, os Senadores Jonas Pinheiro, Esperidião Amin e Pedro Simon, de uma comissão oriunda da Pastoral Parlamentar Católica do Brasil, liderada pelo Senhor Vice-Presidente da República, Dr. Marco Maciel, em visita ao Vaticano, onde fomos recebidos com nossos familiares, em audiência, por Sua Santidade o Papa João Paulo II, gostaria de acrescentar algumas considerações sobre o importante significado dessa missão, já relatada ao Senado da República pelos Senadores que me antecederam nesta iniciativa e transcreveram nos Anais desta Casa os pronunciamentos oficiais desse encontro de extraordinária importância para todos nós.

Integrantes de uma comitiva de 125 participantes, e acompanhados por um bispo, Dom Antônio do Carmo Cheuiche, há muito dedicado, no Rio Grande do Sul, à Pastoral da Política, estivemos em Roma durante a segunda quinzena de maio, quando fomos recebido por Sua Santidade, saudado pelo nosso Vice-Presidente, que, num dos trechos de seu pronunciamento, lembrou Pio XI, quando afirmou que “a política, depois da religião, é a mais nobre atividade do ser humano”, o que pode ser considerado como estímulo e desafio.

Durante a missa, celebrada na Catedral do Vaticano, a Basílica de São Pedro, Dom Geraldo Magela Agnello, antigo Bispo de Londrina, e hoje a mais elevada autoridade eclesiástica brasileira na Cúria de Roma, saudou a nossa comitiva durante a homilia com palavras da mais consagrada sabedoria cristã

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, estar ali, ouvindo a mensagem de Sua Santidade, estimulando o nosso trabalho e apontando a direção que poderíamos seguir dentro do pensamento da Igreja, ouvindo Dom Geraldo Magela naquela cerimônia religiosa, tão densa de ensinamentos e sabedoria, verdades já tantas vezes repetidas, e de valor tão inquestionável, lembrei-me da indiferença que ainda prevalece no mundo, por falta de solidariedade, com relação à convivência cristã, gerando a fome, a miséria e a violência, em contraste com a ostentação e a concentração de riqueza em poucas mãos.

Nesta breve visita, pudemos ouvir e nos reciclar sobre os postulados dos vários concílios e encíclicas que atualizam e consolidam o pensamento da Igreja e do Evangelho para os nossos dias, tais como a Rerum Novarum, Concílio Vaticano II, Populorum Progressio, Pacem in Terris, Quadragésimo Anno, Centésimus Annus e a Carta Apostólica de Sua Santidade, intitulada Tertio Millennio Adveniente.

Destes pronunciamentos, Sr. Presidente, quero ressaltar alguns tópicos e afirmativas que muito me sensibilizaram pela solidez de suas afirmações:

Nas palavras do Papa:

- “Sinto-me feliz por acolher, junto aos túmulos dos apóstolos Pedro e Paulo, a vós que representais hoje, aqui em Roma, o Parlamento da nobre e querida Nação brasileira”.

- “Entre as vossas missões, uma das mais importantes é, sem dúvida, o aperfeiçoamento do corpo legislativo, a fim de que as leis estejam ao serviço da vida e de todas as pessoas”.

- “Conheço o vosso esforço por defender os princípios que têm sua origem no Evangelho da Vida. Sei bem que não vos é fácil... O direito à vida; o da dignidade da família e o da instrução religiosa nas escolas; a defesa das prerrogativas essenciais, que exigem o mais fino e delicado respeito pela mulher brasileira e pela infância; o dever de garantir o direito ao trabalho e sua justa remuneração; o combate à seca, o empenho por garantir uma reforma agrária efetiva, justa e eficiente”.

Nas palavras de Dom Geraldo Magela Agnello, se reportando alguns editos papais:

- “A solidariedade não é um sentimento de vaga compaixão ou enternecimento superficial pelos males sofridos por tantas pessoas próximas ou distantes. Pelo contrário, é a determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum; ou seja, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos”.

- “a defesa firme da vida e da família como “santuário da vida” e da dignidade da pessoa...”

- “a promoção da justiça social, quer na vida interna de cada Nação, como também na convivência das Nações e dos Estados, como condição indispensável para que se possa chegar a uma verdadeira paz...”

- “o acesso, tornado possível e assegurado a todos, ao trabalho e à justa remuneração, à moradia digna, à educação, à saúde, à previdência e assistência social”.

E, no que diz respeito às perseguições que muitas vezes sofrem os políticos, lembrou Cristo quando disse “tenham confiança que eu venci o mundo”.

Em seu pronunciamento de saudação ao Papa, o Vice-Presidente Marco Maciel, referindo-se com lucidez e profundidade, à Igreja, à riqueza de sua doutrina social, e lembrando que o nosso País é privilegiado pelas três visitas que Sua Santidade realizou à nossa Pátria, recordou as próprias palavras de Sua Santidade no livro Cruzando o Limiar da Esperança: “a utilidade essencial da fé consiste no fato de que, por meio dela, o ser humano realiza o bem”.

Como bem destaca Dom Lucas Moreira Neves, presidente da CNBB, ao referir-se à viagem, em seu artigo “Parlamentares no Vaticano”, é inerente ao homem público cristão “um compromisso com a defesa da pessoa humana e com a promoção dos seus direitos”. E o político cristão, por ser católico, torna-se ainda mais comprometido com o enfrentamento desse desafio, porque tem a consciência das necessidades do ser humano, como filho adotivo de Deus, criado à sua semelhança.

Lamentavelmente, em nosso País, ainda existe um profundo abismo entre ricos e pobres, entre privilegiados e excluídos. E Sua Santidade, com sua lúcida visão de pastor universal, ofereceu, como sobejamente tem feito em toda sua iluminada existência, reflexões aos parlamentares brasileiros, como um alerta “à coerência cristã na gestão de vida pública”, lembrando que a conduta dos políticos de uma nação de predominante tradição católica, deve ser compatível com os princípios de moralidade e respeito à cidadania e direitos sociais.

Recordou-nos o Papa João Paulo II que o cargo político é, acima de tudo, um serviço ao bem comum de todo o país representado, em especial dos mais carentes e desassistidos.

Fez-nos refletir, Sua Santidade, sobre o testemunho que devemos dar, como Parlamentares católicos, nessa luta por um humanismo cristão, buscando trabalhar em prol de uma legislação positiva voltada ao respeito pelos valores éticos e direitos naturais do ser humano.

Como nordestino, tenho vivenciado e testemunhado o grande sofrimento que tem afligido as regiões mais pobres de nosso País. Como médico, tenho sentido as aflições e angústias dos que não desfrutam do direito aos mínimos serviços de saúde pública. Como homem de origens rurais, tenho assistido à trágica deterioração do campo, onde a fome e a miséria campeiam, à espera de soluções que nunca chegam. Como homem do sertão, cresci com o fantasma das repetidas e esperadas secas, como agora está ocorrendo no nosso sofrido Nordeste.

Sinto-me, portanto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, mais do que nunca, ao partilhar da sabedoria de nosso líder espiritual maior, João Paulo II, no dever de expressar, neste plenário, como tenho feito reiteradamente, minha indignação pela fragilidade, para não dizer ausência, de um programa de governo que contemple as demandas sociais do povo brasileiro, órgão que tem sido do exercício dos seus direitos de cidadania e justiça social.

Creio que todos nós, Parlamentares cristãos, que tivemos o privilégio de partilhar da bênção e severas advertências do Sumo Pontífice, aprendemos mais do que uma lição de amor.

Colhemos, naquela oportunidade, o exemplo de grandeza e sabedoria, de um espírito altivo, embora curvado pela inclemência da idade e da fragilidade física, como a profetizar que os tempos - embora de incertezas e embates - são novos tempos, onde já não cabem a cegueira e a intolerância política, o favorecimento dos mais fortes em detrimento dos mais fracos e, tampouco a inércia e a omissão no trato da coisa pública e dos interesses maiores da população.

Eu reverencio a liderança espiritual do Papa João Paulo II porque ele é solidário com todos aqueles que não aceitam a injustiça, a exclusão social e as dificuldades criadas pelos privilégios que têm impedido a felicidade cristã do ser humano.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/06/1998 - Página 10009