Discurso no Senado Federal

ANALISE DOS PROBLEMAS MACROECONOMICOS BRASILEIROS, ATRIBUINDO O DESEMPENHO MEDIOCRE DA ECONOMIA, A PARTIR DE 1994, AS DIRETRIZES EQUIVOCADAS DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO. INCONSISTENCIA DAS POLITICAS DE INCENTIVO A EXPORTAÇÃO E REDUÇÃO NA SOBREVALORIZAÇÃO CAMBIAL.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • ANALISE DOS PROBLEMAS MACROECONOMICOS BRASILEIROS, ATRIBUINDO O DESEMPENHO MEDIOCRE DA ECONOMIA, A PARTIR DE 1994, AS DIRETRIZES EQUIVOCADAS DO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO. INCONSISTENCIA DAS POLITICAS DE INCENTIVO A EXPORTAÇÃO E REDUÇÃO NA SOBREVALORIZAÇÃO CAMBIAL.
Aparteantes
Jefferson Peres, Lauro Campos, Roberto Requião.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/1998 - Página 9909
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • DEBATE, PROBLEMA, ECONOMIA NACIONAL, ANALISE, DESEQUILIBRIO, DEFICIT, DIVIDA PUBLICA, BALANÇO DE PAGAMENTOS, RESPONSABILIDADE, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO.
  • COMENTARIO, PROGRAMA DE GOVERNO, DIRETRIZ, ECONOMIA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), ESPECIFICAÇÃO, ATENÇÃO, CORREÇÃO, POLITICA CAMBIAL.
  • CRITICA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE, CONGRESSO NACIONAL, OPOSIÇÃO, CANDIDATO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
  • REGISTRO, COMENTARIO, EMPRESARIO, PREVISÃO, CONTINUAÇÃO, INVESTIMENTO, CAPITAL ESTRANGEIRO, BRASIL, INDEPENDENCIA, RESULTADO, ELEIÇÕES.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco-PT/SP. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Senador Geraldo Melo, Srªs. e Srs. Senadores, é com satisfação que subo à tribuna para responder ao desafio lançado pelo Senador Jefferson Péres, do PSDB, em seu pronunciamento de sexta-feira retrasada, quando propôs que iniciássemos um debate franco, civilizado, aberto e transparente sobre os problemas macroeconômicos brasileiros. Foram essas as suas palavras. O pronunciamento do Senador Jefferson Péres foi, como sempre, relevante e claro, revelando mais uma vez o seu domínio das questões econômico-financeiras. Constitui, sem dúvida, um ponto de partida para que possamos iniciar um diálogo fecundo, como ele propôs, sobre os graves dilemas da política econômica brasileira e suas conseqüências sociais.

Comecemos pela discussão das causas que nos levaram às dificuldades atuais, pois, sem um diagnóstico claro da origem dos problemas, não será possível iniciar uma avaliação fundamentada das alternativas de que dispõe o País para resolvê-los. O Senador Jefferson Péres, com elogiável franqueza, fez referência ao “enorme desequilíbrio macroeconômico do País” - essas foram suas palavras textuais. Esse enorme desequilíbrio está no que ele chamou de “déficits gêmeos”, o déficit público e o déficit do balanço de pagamentos em conta corrente.

Qual a origem desse “enorme desequilíbrio macroeconômico”? Esse é um primeiro aspecto que precisa ser discutido. Foram choques externos ou variáveis internacionais que produziram esses dois déficits? O Governo procura, às vezes, passar essa impressão, mas a sua argumentação não é convincente. Ao contrário do que aconteceu em outros períodos de nossa história econômica, não foram variáveis externas fora do nosso controle que geraram esses desequilíbrios.

Nos anos recentes, desde que o Plano Real foi lançado, em 1993/94, o ambiente externo tem sido, sob vários pontos de vista, benigno ou favorável a nós. As taxas de juro, nos principais centros financeiros internacionais, por exemplo, têm sido bastante reduzidas. Não sofremos perdas em termos de troca nesse período; ao contrário, a relação entre preços médios de exportação e importação parece ter evoluído a nosso favor. O comércio internacional tem crescido a taxas elevadas nos últimos anos. Não houve recessão mundial.

É verdade que tivemos choques externos que afetaram a oferta de capitais estrangeiros para a economia brasileira. Foi o que aconteceu em 1995, com a crise no México, e, agora em 1997/98, com a instabilidade desencadeada a partir do leste da Ásia. Mas é preciso destacar que a economia brasileira não teria sido tão atingida por esses choques financeiros externos, se a política econômica brasileira não tivesse produzido os desequilíbrios que nos tornaram extraordinariamente dependentes da disponibilidade de capital externo. Países que seguiram políticas macroeconômicas mais prudentes, mais consistentes, sofreram pouco ou nada nos períodos de instabilidade financeira internacional. O Chile, por exemplo, praticamente não sentiu o “efeito tequila” de 1995. Taiwan também não foi muito afetada pela crise no leste da Ásia, apesar de estar muito próxima do epicentro da crise recente.

O imenso desequilíbrio atual da economia brasileira é, portanto, bem diferente daquele que tivemos nos início dos anos 30, em conseqüência da Grande Depressão que atingiu a economia mundial e do colapso do preço do café, que era, então, nosso principal produto de exportação. Os desequilíbrios dos anos 70 e início dos anos 80, para dar outro exemplo, também podiam ser atribuídos, em parte, a choques internacionais. Nesse período, tivemos dois choques do petróleo, em 1973/74 e 1979/80, e duas recessões mundiais, em 1974/75 e em 1980/82. A partir de fins de 1979, tivemos um brutal choque de juros internacionais em função da política monetária adotada nos Estados Unidos.

Nada disso aconteceu nos anos recentes. No essencial, os nossos imensos desequilíbrios atuais, vale dizer, os nossos déficits fiscais e de balanço de pagamento em contas correntes, foram made in Brazil, são produto da imprudência e da irresponsabilidade da política macroeconômica brasileira dos anos recentes, especialmente das políticas seguidas no início do Plano Real, em 1994/95.

Também não podemos dizer, Senador Jefferson Péres, que os desequilíbrios mencionados por V. Exª tenham sido um legado de períodos anteriores ao Plano Real . Nesse ponto, os dados do próprio Governo parecem claros. Considere os dados fiscais, tomando como déficit operacional, que exclui a correção monetária da dívida pública. Em 1991/93, nos três anos imediatamente anteriores ao ano calendário em que foi lançada a reforma monetária do Plano Real, o déficit médio do setor público consolidado (incluindo o Governo Federal, o Banco Central, os Estados, os Municípios e as empresas públicas) foi de apenas 0,9% do Produto Interno Bruto. Pois bem, nos últimos três anos, no período 1995/97, esse mesmo déficit, no mesmo conceito e com a mesma abrangência, subiu para 4,3% do PIB, em média. Nos doze meses até fevereiro deste ano, último dado disponível, o déficit operacional já alcançava 5% do PIB. Note-se que esse aumento do déficit ocorreu a despeito de significativa elevação da carga tributária, que passou nesse período de cerca de 25 a 26% do PIB em 1992/93, para a faixa de 29 a 30% do PIB nos anos mais recentes.

O déficit de balanço de pagamentos em conta corrente também não é um legado do período anterior ao Plano Real. Nos anos anteriores ao Plano Real, o Brasil apresentava uma posição de conta corrente equilibrada ou até superavitária. Em 1992, por exemplo, tivemos um superávit comercial de US$15,2 bilhões e um superávit na conta corrente de US$6,1 bilhões. Em 1993, o superávit comercial foi US$13,3 bilhões e o déficit em conta corrente inferior a U$1 bilhão. A partir de fins de 1994, o Brasil começou a registrar déficits substanciais na balança comercial e, sobretudo, na conta corrente. Em 1997, chegamos a um déficit em conta corrente de nada menos do que U$33,4 milhões.

Vamos, então, estabelecer um primeiro ponto, Senador Jefferson Péres. O que foi que provocou a deterioração substancial da conta corrente do nosso balanço de pagamentos e das nossas contas públicas? Não foram eventos internacionais e nem o resultado de heranças recebidas de períodos anteriores. Trata-se, fundamentalmente, dos resultados das decisões de omissões da política macroeconômica brasileira de 1994 para cá. Sem admitir com total franqueza esse ponto, não há como iniciar um diálogo fecundo.

V. Exª usa a expressão “déficits gêmeos” para se referir aos déficits fiscal e externo. É uma expressão popularizada por alguns economistas e bastante difundida na imprensa, mas pode dar margem a mal entendidos. Pode sugerir, por exemplo, que esses dois déficits têm uma origem comum ou que se movem juntos. Nenhuma dessas duas proposições é verdadeira ou necessariamente verdadeira.

Em épocas de recessão, por exemplo, o déficit externo tende a diminuir, ao passo que o fiscal tende a aumentar. A queda da demanda interna, por um lado, deprime as importações e gera excedentes exportáveis. Por outro lado, tende a deprimir a receita tributária e pressionar certo tipo de gasto público, como o seguro-desemprego.

Na verdade, os fatores que causaram o desequilíbrio externo tiveram pouco impacto líquido direto sobre as contas públicas. O desequilíbrio externo tem origem fundamentalmente no segundo semestre de 1994, quando o Governo combinou uma valorização abrupta da taxa cambial - uma maxivalorização cambial da ordem de 30% em termos reais - com uma abertura muito agressiva do mercado interno às importações e um certo descaso no que diz respeito à promoção de exportações. Quero ressaltar que quem qualificou a política econômica de abertura do começo do Plano Real dessa maneira, como “muito agressiva”, foi o atual Presidente do Banco Central, Sr. Gustavo Franco, em trabalho sobre Plano Real, editado pelo Departamento da PUC do Rio de Janeiro.

O resultado era previsível. A economia brasileira adquiriu uma propensão perigosa ao desequilíbrio externo, que se manifesta com particular agudeza quando a economia cresce de forma um pouco mais significativa, ou quando acontece alguma turbulência nos instáveis mercados financeiros internacionais.

Desde 1995, pressionado pelos efeitos da crise mexicana e, mais recentemente, pela crise no leste da Ásia, o Governo brasileiro vem tentando corrigir o estrago provocado pela política econômica da fase inicial do Plano Real. A política, com relação às importações, já não é tão liberal; tem havido um esforço de estimular as exportações com mecanismos creditícios e mudanças tributárias; desde 1997, o Banco Central está tentando corrigir gradualmente a taxa de câmbio real em relação ao dólar. O Governo tenta, também, conter o déficit público.

Infelizmente, os desequilíbrios acumulados são grandes e as medidas têm sido tardias e insuficientes. O déficit em conta corrente vai cair um pouco em 1998, mas continuará perigosamente alto. O déficit fiscal não dá sinal de queda e pode ficar acima do nível registrado em 1997.

No ponto em que chegamos, depois de anos de ligeireza na condução de política econômica, o raio de manobra do Governo brasileiro, e em particular do Banco Central, é muito reduzido. Não há soluções simples ou indolores. O Senador Jefferson Péres tem razão quando aponta uma inconsistência entre a proposta de aceleração das minidesvalorizações cambiais e a preocupação em diminuir as taxas básicas de juros praticadas pelo Banco central, quando realizadas concomitantemente. Só em circunstâncias particulares - quando ocorre, por exemplo, uma diminuição dos juros no exterior, ou das estimativas de risco cambial e soberano associado a aplicações no Brasil - é que se torna possível combinar aceleração das minidesvalorizações com queda dos juros básicos.

Quero esclarecer, entretanto, que o economista do PT e assessor de Lula, Guido Mantega, ao fazer as propostas citadas pelo Senador Jefferson Péres, estava falando a título pessoal. Aliás, ele próprio fez questão de frisar, em entrevista de 29, 30 e 31 de maio na Gazeta Mercantil, que estava falando em seu nome, que não há ainda diretriz definida do PT sobre o assunto. E, ainda ontem, na Folha de S.Paulo, destacou que “pensamos em corrigir a sobrevalorização com cautela e da forma mais prudente possível.” O programa de governo da candidatura Lula ainda está em fase de elaboração e não cabe confundir opiniões individuais com a plataforma econômica que será apresentada brevemente pelo meu Partido e os demais partidos que apóiam Lula brevemente.

Preciso, finalmente, fazer nova recomendação ao prezado Presidente Antonio Carlos Magalhães.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães. Faz soar a campainha)

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Vou concluir, Sr. Presidente.

Não fica bem ao Presidente do Congresso Nacional ficar fazendo terrorismo cunho eleitoral. Suas declarações, ontem, de que “Fora daí (da reeleição de Fernando Henrique) seria o caos” e que “o próprio PT sabe que ele (Lula) não tem condições de governar o País”, não condizem com a percepção dos segmentos representativos e responsáveis, muito menos com a avaliação que nós, do PT, temos sobre as condições melhores de Lula do que as de Fernando Henrique Cardoso para governar o Brasil.

Ainda ontem, o Presidente da maior instituição financeira privada brasileira, Lázaro Brandão, do Bradesco, afirmou que a ascensão de Lula nas pesquisas de intenção de voto não assusta o empresariado, pois, segundo ele, o País vive uma democracia com regras definidas. Também o Presidente da Federação de Comércio do Estado de São Paulo, Abram Szajman, afirmou em artigo na Folha de S.Paulo, hoje, que um eventual segundo turno não altera em nada a visão que os empresários e investidores estrangeiros têm do Brasil. Deles se pode imaginar tudo, menos que rasguem dinheiro ou apliquem mal os seus dólares, referindo-se ao conhecimento que todos têm da importância da economia brasileira e das enormes possibilidades de investimentos aqui existentes, que continuarão com o Governo Lula, se eleito. Também o ex-Presidente do Banco Central, Gustavo Loyola, conforme registra hoje a Gazeta Mercantil, afirmou ontem, em São Paulo, que, mesmo Fernando Henrique Cardoso não sendo reconduzido ao cargo, os investidores estrangeiros continuarão no Brasil. Gustavo Loyola disse acreditar que o PT tem economistas em condições de fazer um projeto consistente.

Como amigo do Presidente Antonio Carlos Magalhães, recomendo a S. Exª que reflita melhor sobre a própria experiência da História e que não faça aqui o papel análogo ao do ex-Governador do Rio de Janeiro, Sr. Carlos Lacerda, que, com semelhante tipo de terrorismo em relação ao ex-Presidente João Goulart, contribuiu para levar o Brasil a viver quase três décadas de regime militar, com todas as dificuldades que tivemos. E ele, que imaginava constituir-se o Presidente civil por causa de todo o movimento que fez, acabou sendo até afastado pelo regime militar para cuja criação acabou contribuindo. Não faça, por outro lado, o papel do Comandante do Titanic ao perceber que estava naufragando. Sr. Presidente; procure preservar-se.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Jefferson Péres (PSDB-AM) - Nobre Senador Eduardo Suplicy, sinto-me honrado pelo o fato de V. Exª ter subido à tribuna, aceitando o desafio explícito que fiz, para iniciarmos nesta Casa um debate elevado em torno de questões macroeconômicas. Não vou responder a V. Exª agora. Não caberia no aparte, mas prometo fazê-lo brevemente. Falei, em meu discurso, que me preocupava muito o fato de o Senado estar deixando de ser, como foi no passado, um grande fórum de debates. Aqui discutem-se certamente questões importantes, mas, em um passado remoto e também recente, lembro-me de que era aqui, neste plenário, que se travavam as grandes discussões em torno das magnas questões nacionais. V. Exª não fala oficialmente em nome de Lula e do PT, que ainda está com o seu projeto em elaboração; eu não falo em nome do Governo, não sou o mais indicado para isso - deveriam ser os líderes -, mas, como concordo basicamente com a atual política macroeconômica que está sendo seguida, entendi necessário que a Nação comece a saber com clareza o que pensam pelo menos alguns expoentes do PT, como V. Exª, a fim de que ela, esclarecida, possa tomar decisões em um ano eleitoral. Também não sou o indicado para fazer a defesa do Senador Antonio Carlos Magalhães, que aqui está presente, mas aceito-lhe a declaração como uma provocação no bom sentido. Acho que a candidatura de Lula poderá levar ao pânico se não soubermos com clareza as suas propostas; se ele colocar com absoluta transparência para a Nação o que pretende fazer ao chegar ao Governo, creio que o pânico não acontecerá. De forma que penso que eu, V. Exª e o Senador Antonio Carlos Magalhães estamos prestando um serviço não apenas à Nação, mas também ao próprio PT.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Agradeço muito as palavras do Senador Jefferson Péres. S. Exª lançou um desafio extremamente construtivo e benéfico para os trabalhos do Senado, e esperamos estar à altura desse diálogo. Pode ter a certeza, Senador Jefferson Péres, como o Senador Antonio Carlos Magalhães, que o PT, em breve, apresentará um programa consistente visando ao interesse do País, da Nação brasileira, o qual debateremos em profundidade. V. Exª apontou um fato importante: seria uma inconsistência se houvesse, ao mesmo tempo, as desvalorizações com a baixa da taxa de juros. Outros economistas do PT, em artigos recentes, também mostraram que poderia haver alguma inconsistência, inclusive economistas independentes.

O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Permite-me V. Exª um aparte?

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT-DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Sr. Presidente, gostaria de, concluindo o meu pronunciamento, conceder os apartes aos Senadores Roberto Requião e Lauro Campos.

O Sr. Roberto Requião (PMDB-PR) - Senador Eduardo Suplicy, essa preocupação com o plano de governo é hoje de todos os brasileiros. Eu, por exemplo, sou Senador da República pelo Estado do Paraná e ainda não conheço o plano de governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. O caos está estabelecido no País. Ontem veio às minhas mãos, por uma gentileza da CNI, uma pesquisa nacional CNI/Ibope, realizada entre 8 e 13 de maio, onde se revela, com toda a clareza, o pânico de 75% dos brasileiros diante da possibilidade concreta da perda do emprego. Esse modelo globalizante se suporta na internacionalização da economia, com a importação dessas indústrias sem raízes - o conceito não é meu, é de John Kenneth Galbraith -, indústrias que têm como princípio básico o lucro - negando as teses da Rerum Novarum, por exemplo, que estabeleceu no mundo católico a função social da empresa - e a substituição de duzentos homens por uma máquina. O desemprego é enorme, o pânico chega às famílias, e eu considero o candidato do PT - embora ainda brigue para que o meu PMDB velho de guerra apresente um candidato na convenção do dia 28-, o Lula, a quem tive a oportunidade de conhecer melhor nesses últimos meses, um grande brasileiro, um sujeito decente e com um nível intelectual invejável. O Lula é aquilo que o Fernando Henrique não é. O Lula é o intelectual orgânico definido por Antonio Gramsci: o homem que é capaz de pensar as soluções administrativas para o País e, ao mesmo tempo, tem presente na sua vida a dureza da vida do trabalhador, o sentimento das pessoas mais pobres. A substituição do Fernando Henrique pelo Lula, se o PMDB não lançar um candidato, acaba com o caos, restabelece a confiança e abre novos caminhos, sem a menor sombra de dúvida, para o Brasil.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - V. Exª completa o meu pensamento.

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Magalhães) - Eu pediria a V. Exª que, logo que possível, terminasse o seu pronunciamento, porque temos que entrar na Ordem do Dia.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Pediria ao Senador Lauro Campos que, com o seu honroso aparte, conclua por mim.

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PT-DF) - Aproveito o ensejo para parabenizar tanto o Senador Jefferson Péres quanto V. Exª, que propõem que se faça esse debate tão urgente. Neste tempo em que o dinheiro anda tão escasso, como o tempo é dinheiro, o tempo também está escasso, muito escasso. Muita gente, obviamente, não gosta de gastar nem tempo nem dinheiro. Mário Amato também levantou idéias como essas e lançou-as contra o Luiz Inácio Lula da Silva, dizendo que, se Lula fosse eleito, os empresários paulistas da Fiesp, que ele presidia, iriam se mudar do Brasil para Miami. Agora vejam só o que acontece, parece até uma coisa orquestrada: a Folha de S.Paulo de terça-feira, 02 de junho, afirma: “Bolsa de São Paulo fecha em baixa de 2,44%; projeção de juros aponta alta e títulos da dívida externa brasileira caem”. Manchete: MERCADO REAGE A CRESCIMENTO DE LULA, atribuindo, portanto, ao crescimento de Lula a queda da Bolsa, quando, nesse mesmo dia, na Rússia, a Bolsa caiu 10,2%. Mas, no dia seguinte, quando as cotações nas Bolsas subiram, esqueceram de atribuir essa alta à elevação de Lula. Ora, se, num dia, ele foi o responsável pela queda, mas continuou na dianteira no dia seguinte, então deveria ser responsável também pela retomada da cotação dos títulos. Como o tempo é muito escasso, resumindo, eu diria que o caos hoje é muito maior do que quando Fernando Henrique Cardoso assumiu o poder. A dívida pública estava em US$150 bilhões; hoje, está em US$306 bilhões. Vários mecanismos foram se esgotando ao longo desses quatro anos. Sua Excelência e o Sr. Bresser Pereira falaram, na revista Esquerda 21, que estamos no caos. Parece-me que, no princípio, era o caos, e o princípio será Lula; mas, obviamente, do caos se fez a luz, do caos se fez a vida. Então, estamos agora neste novo caos, que vai ser o princípio de uma nova reorganização da sociedade e dos destinos do Brasil.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT-SP) - Muito obrigado, Senador Lauro Campos, V. Exª lembra muito bem: o caos está aí já, hoje, e é preciso observar que as labaredas, conforme assinala o economista Paulo Nogueira Batista, em seu artigo de hoje na Folha de S.Paulo, estão aí muito altas. A fogueira está em andamento. Literalmente houve fogueira muito forte lá em Roraima. Está havendo problemas seriíssimos de pobreza; e muito mais graves hoje do que há dois ou três anos, no Nordeste brasileiro, nas cidades. Em sua entrevista a Boris Casoy, o Presidente Fernando Henrique diz que somente o desemprego havia piorado, dentre os indicadores sociais, esquecendo-se de que, em conseqüência disso, haviam piorado muito os índices, por exemplo, de violência, de criminalidade em todo o Brasil. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/1998 - Página 9909