Discurso no Senado Federal

APELO AO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO PARA REDEFINIÇÃO E VALORIZAÇÃO DO PAPEL DO CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA MULHER - CNDM, COM MEDIDAS CONCRETAS COM VISTAS A UMA MELHOR INTEGRAÇÃO DA MULHER NA SOCIEDADE.

Autor
Júlio Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/MT)
Nome completo: Júlio José de Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO.:
  • APELO AO PRESIDENTE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO PARA REDEFINIÇÃO E VALORIZAÇÃO DO PAPEL DO CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA MULHER - CNDM, COM MEDIDAS CONCRETAS COM VISTAS A UMA MELHOR INTEGRAÇÃO DA MULHER NA SOCIEDADE.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/1998 - Página 9946
Assunto
Outros > FEMINISMO.
Indexação
  • ANALISE, DISCRIMINAÇÃO SEXUAL, MULHER, BRASIL, MUNDO, AMBITO, LEGISLAÇÃO, TRABALHO.
  • AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, MULHER, MERCADO DE TRABALHO, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, ECONOMIA INFORMAL, FALTA, APLICAÇÃO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VALORIZAÇÃO, CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA MULHER (CNDM), PARTICIPAÇÃO, POLITICA NACIONAL.

           O SR. JÚLIO CAMPOS (PFL-MT. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, a discriminação do trabalho feminino continua a ser uma triste realidade não só no Brasil, mas em todo o mundo moderno. Na Europa, por exemplo, as mulheres além de serem discriminadas pelo sexo, são segregadas, também, pela nacionalidade. Mas, provavelmente, é naquele continente que a questão se torna mais apaixonante. Além da discriminação indireta, luta-se agora contra a discriminação aparente, em foros judiciais. A presunção da discriminação, usada em muitas ações judiciais européias, não é mais da responsabilidade do querelante, uma vez que transfere o ônus da prova para o autor da medida tomada. A igualdade torna-se necessária, pois, tanto do ponto de vista jurídico, quanto do social.

           O princípio da igualdade entre homens e mulheres é universal, e, entre nós, está expresso na Constituição. Lá fora, a Corte de Justiça das Comunidades Européias - CJCE, por exemplo, afirmou, em 1978, que “a eliminação da discriminações fundadas sobre o sexo faz parte dos direitos fundamentais”.

           Não é de hoje essa discussão. Há 300 anos, com o advento da Revolução Industrial, em 1767, o trabalho da mulher nas tecelagens começou a ser importante para a organização e para a produção. Quando foram extintas as corporações de ofício e o salário foi achatado, os homens viram a necessidade de empregar suas mulheres e seus filhos nas indústrias, para garantir a sobrevivência familiar. Desde essa época, os salários femininos e os de menores de 18 anos são inferiores aos dos homens.

           Não são de hoje, também, as lutas. As reclamações começaram a aparecer e algumas leis surgiram visando à proteção do trabalho feminino, especialmente no que se referia à duração da jornada de trabalho, ao trabalho noturno, aos labores perigosos e insalubres, ao repouso semanal, à gravidez, à maternidade e, finalmente, à moralidade, como resumiu o Prof. Mangano, citado no artigo de Guilherme Basso, publicado na Revista do Ministério Público do Trabalho, n. 2, de setembro de 1991.

           Do ponto de vista científico, também, há muito a situação do trabalho feminino vem sendo discutida e analisada, por sociólogos, economistas e especialistas em direito do trabalho. As diferenças de tratamento entre o trabalho masculino e o feminino são verificadas não só na contratação, mas também na remuneração e na igualdade de tratamento nas condições de trabalho.

           Nos dias de hoje, a globalização aumenta a miséria, a fome e o desemprego. Provoca, em muitas regiões, verdadeira exclusão social. E sempre que esse fenômeno ocorre, as mulheres são as mais atingidas. A ONU levantou dados que mostram que o trabalho, remunerado e não-remunerado, executado pelas mulheres corresponde a 11 bilhões de dólares. Mas, por outro lado, as mulheres, responsáveis por 2/3 de horas trabalhadas no mundo, recebem apenas 10% da massa salarial e detêm somente 1% da propriedade.

           Sr. Presidente, o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, realizado no segundo semestre de 1996, revelou que, no Brasil, existem 2 milhões de mulheres a mais do que homens. Mostrou, também, que aumentou o número de mulheres chefes de família e que diminuiu a taxa de natalidade, hoje, de 2,32.

           Mas apesar de as mulheres terem aumentado a participação no mercado de trabalho e de apresentarem grau de escolaridade maior do que os homens, continuam sendo discriminadas, recebendo salários inferiores no desempenho de tarefas iguais. Dados da RAIS de 1995, mostraram que o rendimento médio dos homens ficava em 6,1 salários mínimos - SM, enquanto o das mulheres era de apenas 4,6 SM. Já entre os profissionais com curso superior, os homens percebiam 17,3 SM e as mulheres, somente 10,1 SM.

           No Brasil, onde o desemprego cresce assustadoramente, as mulheres estão se lançando no mercado informal de trabalho, sem direitos trabalhistas e sofrendo, na própria pele, as conseqüências da miséria, da fome, da mortalidade infantil, da prostituição, da violência. No atual governo, a situação das mulheres agravou-se, pois as conquistas obtidas na Constituição de 1988 existem, hoje, praticamente, apenas no papel.

           No entanto, a participação da mulher brasileira no mercado de trabalho é cada dia maior. Quase 40% do total de vagas disponíveis são ocupadas por mulheres, que ganham cerca de 30% a menos que os homens. As desigualdades salariais atingem todos os níveis. As operárias da Grande São Paulo recebem, praticamente, a metade do salário pago aos homens. Nos serviços de atendimento ao público, conforme informa a Revista IstoÉ, de 30 de agosto de 1995, as mulheres têm um salário médio de 371 reais contra 478 dos homens; e os executivos percebem l.181 reais, enquanto as executivas ganham 1.135 reais.

           Como se isso não bastasse, existem outras discriminações quanto ao trabalho feminino. Não são poucas as firmas que exigem de suas candidatas a emprego teste de gravidez ou atestado de laqueadura das trompas. As mulheres alcançaram grandes conquistas na Constituição de 1988. Conseguiram o direito à igualdade de oportunidades e à isonomia salarial com os homens. Entretanto, a isonomia não ocorre na prática. Fica apenas na letra da lei. É preciso, pois, que as mulheres continuem unidas, lutando para eliminar as desigualdades salariais. Outros fatores de discriminação existem, como a cor. Ser negra, por exemplo, piora a situação.

           Segundo Li Lim, economista da Organização Internacional do Trabalho - OIT não basta aumentar a oferta de emprego para as mulheres. É preciso melhorar as condições de trabalho, obedecendo às normas internacionais do trabalho com aplicação do princípio do valor comparado, concedendo a mesma remuneração para trabalhos similares e eliminando as disparidades salariais; também é reclamada melhoria da saúde e segurança para as trabalhadoras, eliminando os perigos ambientais e inerentes aos locais de trabalho, especialmente para as mulheres grávidas; igualmente importante é a adoção de medidas para a redução da vulnerabilidade do mercado de trabalho e a garantia da liberdade para associar-se a sindicatos e fazer livre negociação, entre outras.

           Li Lim observa que, apesar dos avanços, “as atividades econômicas das mulheres seguem concentrando-se fundamentalmente nas formas de emprego precárias caracterizadas por baixa remuneração e baixa produtividade, percebendo salários menores que os homens”. A discriminação do trabalho feminino, de acordo com a OIT, é verificada em todo o mundo, independentemente do nível de desenvolvimento de cada país.

           Sr. Presidente, neste ano de eleições, em que os candidatos à Presidência preparam seus programas de Governo, mais importante se torna a clara definição de políticas públicas sobre a ótica do gênero, a fim de que as mulheres brasileiras possam votar na defesa de seus direitos, optando com segurança entre os diversos candidatos.

           Examinamos a discriminação ainda existente contra a mulher, especialmente quanto ao setor do trabalho, mas não nos podemos esquecer que, no Brasil, morrem, a cada ano, cerca de 600 mil mulheres, durante a gravidez ou no momento do parto. O número de mulheres infectadas pela epidemia de AIDS também cresce assustadoramente. Em 1985 tínhamos uma mulher infectada para 35 homens, hoje essa relação passou de 1 para 3.

           A participação da mulher na vida pública ainda é irrisória. Poucas mulheres ocupam cargos de segundo escalão nos Ministérios. E não temos, hoje, nenhuma Ministra. A representação legislativa é pequena, especialmente na Câmara dos Deputados: 33 Deputadas e 6 Senadoras.

           Muito lentamente, vamos caminhando para atingir a igualdade entre homens e mulheres. Cabe aos Governos da União e dos Estados a adoção de políticas públicas sob a ótica do gênero, a fim de que a mulheres possam, finalmente, exercer na sociedade brasileira o papel que lhes cabe.

           Apelamos ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que redefina e valorize o papel do Conselho Nacional de Direito da Mulher - CNDM, concretas com vistas a uma melhor integração da mulher na sociedade. Indispensável a presença da mulher na tomada de decisões nacionais, na elaboração das políticas econômicas, culturais e sociais do País. Só assim a mulher sedimentará suas conquistas e exercerá, com plenitude, sua cidadania.

           Na esperança de que o Governo Federal tenha sensibilidade suficiente para resolver as discriminações e desigualdade que atingem a mulher brasileira, deixamos aqui o nosso apelo, para a adoção definitiva de políticas públicas sérias e eficientes, sob a ótica do gênero, a fim de que nossas mulheres possam, finalmente, ocupar na sociedade um papel de destaque.

           Finalmente, é preciso grande esforço de esclarecimento e mobilização do eleitorado feminino, quer para escolha dos melhores candidatos, quer para o estabelecimento de compromissos claros, enfáticos que dêem às mulheres um mínimo de esperança quanto ao voto que depositarão nas urnas. Este o apelo que faço, desta tribuna, a todas as eleitoras do País e, especialmente, do meu Estado, Mato Grosso.

           Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/1998 - Página 9946