Discurso no Senado Federal

RELATORIO DA VIAGEM REALIZADA A NOVA IORQUE, POR OCASIÃO DA SESSÃO ESPECIAL DA ASSEMBLEIA GERAL DA ONU, SOBRE A PREVENÇÃO AO TRAFICO E CONSUMO DE DROGAS ILICITAS.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DROGA.:
  • RELATORIO DA VIAGEM REALIZADA A NOVA IORQUE, POR OCASIÃO DA SESSÃO ESPECIAL DA ASSEMBLEIA GERAL DA ONU, SOBRE A PREVENÇÃO AO TRAFICO E CONSUMO DE DROGAS ILICITAS.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 10/06/1998 - Página 10102
Assunto
Outros > DROGA.
Indexação
  • PARTICIPAÇÃO, ORADOR, ACOMPANHAMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, SESSÃO ESPECIAL, ASSEMBLEIA GERAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), DISCUSSÃO, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA.
  • ANALISE, PREJUIZO, SOCIEDADE, MUNDO, ESPECIFICAÇÃO, BRASIL, RESULTADO, CONSUMO, DROGA.
  • SAUDAÇÃO, PROPOSTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRIAÇÃO, SECRETARIA, AMBITO NACIONAL, OBJETIVO, COMBATE, DROGA, RESULTADO, INICIATIVA, CONGRESSO NACIONAL, CONTENÇÃO, EXPANSÃO, TRAFICO INTERNACIONAL.
  • ANALISE, INICIATIVA, GOVERNO BRASILEIRO, EMPENHO, APROVAÇÃO, LEGISLAÇÃO, IMPEDIMENTO, LAVAGEM DE DINHEIRO, REGULAMENTAÇÃO, PORTE DE ARMA, FINANCIAMENTO, REEQUIPAMENTO, VIGILANCIA, ESPAÇO AEREO, Amazônia Legal, AUMENTO, APLICAÇÃO, RECURSOS FINANCEIROS, DESTINAÇÃO, RECUPERAÇÃO, DEPENDENTE, ENTORPECENTE, OBJETIVO, EFICACIA, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, DROGA.

O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, acabo de regressar de Nova Iorque, onde fui acompanhar o Senhor Presidente da República na Sessão Especial da Assembléia Geral das Nações Unidas, dedicada ao problema mundial das drogas.

O evento revelou a firme disposição da comunidade internacional de aprofundar os esforços de cooperação internacional no combate ao tráfico ilícito de entorpecentes, assim como na prevenção do uso ilícito de drogas e na reabilitação dos usuários.

Consolida-se um grande consenso mundial sobre a urgência e a prioridade que devem ser atribuídas à luta contra as drogas. Para além de um debate estéril sobre a responsabilidade de países produtores, países consumidores e países de trânsito, o que se verificou nessa Sessão Especial da Assembléia Geral foi a consciência da gravidade da ameaça que as drogas representam às sociedades contemporâneas e da necessidade de que um problema que é, por sua natureza, transnacional, seja objeto de cooperação ativa e genuína entre todos os países afetados.

Srªs. e Srs. Senadores, entre os temas elaborados previamente para discussão durante a Sessão Especial, que vai até o dia 10, há vários itens importantíssimos para a luta contra a produção, venda, demanda, tráfico e distribuição de estupefacientes e substâncias psicotrópicas. Fez-se referência especial às chamadas drogas legais, que são as anfetaminas e os produtos vendidos em farmácias, com ou sem receitas, muitas vezes sob o manto da ilegalidade. Esses anfetamínicos têm sido consumidos de maneira exagerada pela população, por má orientação ou por dependência química.

Além disso, foi abordada a luta contra a lavagem de dinheiro. O Brasil já teve a oportunidade de ver aprovada, neste Parlamento, lei sobre o assunto, a qual já se encontra em vigor, portanto atendendo aos anseios da comunidade internacional. Hoje, discute-se a forma de lavagem de dinheiro na Ciudad del Este, no Paraguai.

Senador Lauro Campos, V. Exª, que é um economista, sabe que há um aproveitamento do mecanismo legal para que o dinheiro que circula nesse mercado seja transformado em dólares e, posteriormente, encaminhado a um banco no exterior, já transformado em dinheiro quente, conforme pudemos observar durante as investigações dos precatórios. Hoje, há vários paraísos fiscais sob a mira do conjunto internacional de medidas para a luta contra o tráfico de drogas, o tráfico de armas e crimes conexos. Assim, ao tentarem atacar principalmente o sistema econômico do crime organizado do tráfico de drogas, as autoridades e a sociedade vão conseguir minimizar o problema, enfrentando-o de frente, pois é próprio dos cartéis atingir o poder econômico e os bens conseguidos através de mecanismos ilícitos de lavagem de dinheiro.

Discutiu-se, também, o problema da extradição, inclusive dos não estrangeiros que praticam o delito em outros países e se refugiam nos seus próprios, criando dificuldades de ordem constitucional para a extradição. Durante os debates, chegou-se até a propor a criação de um tribunal internacional para julgamento daqueles que se envolvam com o tráfico ou chefiem as grandes quadrilhas do tráfico de drogas.

Assistência judicial recíproca e entrega vigiada. Já se discutiram muito esses temas no Brasil. São providências que ajudam, e muito, as atividades da polícia internacional. Trata-se de acordos multilaterais ou bilaterais para controle, identificação e prisão das grandes quadrilhas internacionais, que têm os seus componentes fragmentados em vários países. Às vezes, por causa de impedimento legal, perde-se a prisão e identificação de uma quadrilha. Devemos atingir, de pronto e fortemente, a sua estrutura financeira dessas organizações.

Sr. Presidente, nessa reunião especial da ONU foram discutidas medidas no sentido de que sejam alterados alguns dispositivos da Carta de Viena. São providências que objetivam prevenir a fabricação, a importação e a exportação principalmente de precursores e produtos químicos empregados na indústria ilícita de substâncias psicotrópicas. Foi debatida também a mudança da legislação e dos sistemas de fiscalização. Aliás, o Brasil já vem atendendo a esse ponto. A Receita Federal tem feito um trabalho sério nesse sentido, com acordos internacionais. Inclusive o Banco Central, dentro da atual legislação sobre lavagem de dinheiro, tem procurado estabelecer acordos e mecanismos junto aos paraísos fiscais para conseguir, no mínimo, a fiscalização de bancos brasileiros que possuam agências nesses locais. Dessa forma, talvez possamos impedir que a livre circulação do dinheiro sujo em nosso País permita-o retornar como investimentos ou dinheiro limpo.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, temos presenciado jovens matarem pai e mãe, que objetivam impedir ou que cerceiam a possibilidade do uso de droga, ou que, através de pequenos roubos, tentam agredir a própria família para a compra de drogas. Essa é uma situação bastante alarmante. Sr. Presidente, temos visto, nas ruas de nossas cidades, crianças que até ontem cheiravam cola - todos tomamos conhecimento dessa reportagem pela televisão e jornais - e hoje usam o crack, que é vendido com a maior desfaçatez a essas crianças. Portanto, o acesso às drogas tem encontrado muita facilidade.

Sr. Presidente, não vou dar explicações médicas, mas o crack destrói partículas do cérebro, e o seu usuário tem a vida limitada a poucos anos. Qual seria o futuro dos jovens que usam o crack? Nenhum. Eles partem para a violência: assassinam e estupram sem nenhuma restrição. Eles não separaram o bem do mal, passam a ser autômatos, guiados apenas pelos reflexos que a droga provoca em seu comportamento.

Sr. Presidente, o criminoso, ao agir na busca do produto da sua ação criminosa, o roubo, por exemplo, tem um comportamento, mas aquele que está sob o efeito de droga tem outro, porque procura violentar a vítima, com um aspecto de vingança, comportamento que é explicável em razão do comprometimento cerebral. Esse criminoso age com violência indiscriminada. Creio que a isso se deve o aumento da violência e da criminalidade. Não podemos, de jeito nenhum, acreditarmos que a droga não contribui para o aumento da violência. Sr. Presidente, temos que ter muito cuidado para não banalizar a discussão a respeito das drogas.

Sr. Presidente, na medida em que achamos que os problemas do nosso vizinho não nos dizem respeito - ao invés de ser um drama, passa a ser uma comédia ou uma novela da qual todos querem saber o próximo capítulo - nada se resolverá. Não, não é assim. A desgraça pode amanhã bater à nossa porta. Devemos, portanto, buscar mecanismos junto às autoridades, à estrutura do Estado para combatermos diretamente o uso ilícito das drogas.

A nossa política sempre esteve voltada para a repressão. Essa discussão realizada pela ONU busca, sem dúvida nenhuma, estabelecer um mecanismo mais abrangente. Até então, os países-vítimas, que eram os de consumo, sempre criticavam os de fabricação, transporte e ocultação, entre os quais o Brasil está inserido. Isso não mais ocorre. A consciência internacional sabe que a pressão consumidora, sem dúvida nenhuma, estimula a produção.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, estamos no caminho certo. A proposta do Presidente da República para criar uma secretaria antidrogas vem na hora certa. Isso decorre de várias medidas que este Congresso, por intermédio de propostas governamentais ou de iniciativas próprias, tem buscado para combater a droga. O que não podemos - e é importante o mecanismos jurídico - é não ficarmos a reboque do crime. Temos que nos antecipar no que diz respeito às medidas de prevenção e repressão, com eficácia, a fim de nos tornarmos um País livre do crime organizado, que vem crescendo em detrimento do consumo de drogas.

Sr. Presidente, peço permissão para ler um trecho do pronunciamento do Senhor Presidente da República na Sessão Especial sobre as Drogas, da Assembléia das Nações Unidas, a respeito das normas para o combate ilícito de drogas, o consumo, a prevenção e a recuperação de usuários.

Diz o Senhor Presidente da República:

“O Brasil não cruzará os braços diante das drogas, um inimigo insidioso que ameaça o equilíbrio das famílias, a vida dos jovens e o tecido básico da sociedade.

O problema das drogas exige que sejamos claros e francos. É preciso clareza para compreender os fatores que o condicionam e franqueza para tomar sem hesitações as decisões necessárias para combatê-lo.

Vivemos em um mundo que se tornou pequeno. As distâncias e os acidentes geográficos deixaram, no mais das vezes, de serem obstáculos para circulação de pessoas, de bens e de idéias.

Não faltam elementos positivos nessas novas circunstâncias, oportunidades de crescimento e prosperidade.

É fundamental, porém, que a crescente permeabilidade das fronteiras não funcione como um incentivo à disseminação de atos criminosos nem facilite sua impunidade.

Pessoas, bens, serviços, tecnologia e informação devem ter sua circulação facilitada. Não o crime. Não as drogas.

Desde a assinatura da Convenção de Viena contra o Tráfico Ilícito de Drogas, em 1988, alcançamos um novo plano na cooperação internacional.

No correr desta década, foi possível começar a ver a realidade com novos olhos. E poucos países terão escapado de uma surpresa negativa quanto à força e à extensão do impacto do narcotráfico e delitos conexos sobre suas populações.

Com o tempo, chegamos todos à conclusão de que seria necessário tratar do problema de forma abrangente. Limitar a ação do Estado a um aumento da repressão provou-se insuficiente. Ficou claro que as ações de prevenção, a recuperação dos dependentes e a luta contra os delitos conexos eram também fundamentais.

A droga afeta e destrói o que o ser humano tem de mais precioso, a liberdade e a dignidade.

Se precisamos redobrar nossos esforços de prevenção, e se precisamos ser duros com o crime, com o tráfico, devemos ter igual empenho no tratamento e na recuperação do dependente de drogas, vítima do que é provavelmente a maior doença social de nosso tempo.

Quanto à prevenção, ela não deve ser apenas atemorização, mas antes a revelação de caminhos que facilitem ao jovem aceitar o desafio de ser senhor de si mesmo, diante de uma realidade muitas vezes difícil.

A guerra contra as drogas só será vencida se for conduzida em várias frentes simultaneamente. Nela, o êxito será medido, acima de tudo, pela capacidade de assegurar um futuro sem drogas à juventude de nossos países.

Sabemos hoje que a cooperação internacional é vital no combate a crimes de natureza transfronteiriça. De certa forma, todos os nossos países são afetados pelas diferentes dimensões do problema do tráfico de drogas: a produção, o trânsito, a comercialização e o consumo.

Alcançamos uma linguagem comum, baseada no conceito de responsabilidade compartilhada. Isso é o que permite uma atuação mais coesa da comunidade internacional.

Diz o Presidente: Estou aqui para assegurar-lhes que o Brasil continuará a honrar sua parcela de responsabilidade nesse esforço.

Temos participado com empenho das iniciativas regionais e multilaterais contra o narcotráfico. No âmbito bilateral, mantemos acordos de cooperação com todos os países da América do Sul e, cada vez mais, buscamos estabelecer parcerias com outras nações.

É fundamental, para nós, a estreita cooperação que mantemos com nossos parceiros no Mercosul.

No âmbito interno, o combate às drogas é objeto de uma aliança ampla entre todas as forças políticas desta Nação, o que torna possível levar adiante a atualização das leis de combate ao crime organizado.

Foi aprovada legislação sobre lavagem de dinheiro, controle de precursores químicos, “tiro de destruição” para proteção de nosso espaço aéreo, registro e porte de armas, financiamento adicional para reequipamento de política, vigilância aérea da Amazônia e combate ao crime organizado em geral. Além disso, aumentamos os recursos disponíveis para a recuperação de dependentes de drogas e para as campanhas educativas de prevenção.

Estamos conscientes de que muito ainda resta por fazer, mas passos importantes já foram dados.

Estamos enviando uma mensagem clara a nossos jovens: a de que uma vida com drogas é escravidão, autodestruição e morte.

Qualquer tentativa de sugerir o contrário - qualquer glamourização do uso de drogas - é perigosa e enganadora. É mentira.

E estamos enviando uma mensagem igualmente clara aos que lucram com a ignomínia desse comércio: a de que não encontrarão no Brasil qualquer tolerância com suas atividades.

É nesse sentido que estou anunciando a proposta de criação de uma “Secretaria Nacional Antidrogas”, com a missão de definir a política nacional em matéria de drogas e coordenar todas as ações governamentais de prevenção, repressão e recuperação;

Alea jacta est, Sr. Presidente, a sorte está lançada, e achamos que esse é o início de uma luta sem quartel e que a droga e os cartéis serão derrotados no nosso País, se Deus quiser, para um futuro promissor de nossa juventude.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - Permite V. Exª um aparte?

O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT-SP) - É importante o registro que V. Exª faz do pronunciamento do Presidente Fernando Henrique Cardoso, na ONU, de sua preocupação com respeito às drogas. E obviamente avalio como muito importante o registro que faz com respeito sobretudo aos jovens que, em nosso País, muitas vezes são levados a uma atividade criminosa, e às vezes até com respeito a seus parentes quando chega o desespero da procura de uma droga da qual ele se torna dependente. Há diversas concepções sobre qual a melhor maneira de tratar do assunto. Houve uma notícia ontem nos meios de comunicação a respeito do manifesto que inúmeras personalidades do mundo haviam assinado e que saiu no jornal New York Times, também assinado por pessoas como o economista Milton Friedman e o Presidente de Honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva. Ainda não conheço o teor desse manifesto, mas como V. Exª estava nos Estados Unidos, pergunto se o conheceu e se porventura analisou o seu conteúdo.

O SR. ROMEU TUMA (PFL-SP) - Senador Eduardo Suplicy, V. Exª como eu temos acompanhado atentamente as discussões acerca da questão das drogas e até nesta última quarta-feira na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania conseguimos aprovar a nova lei de drogas, que será encaminhada ao plenário, quando serão feitas ponderações pelo Sr. Senador José Eduardo Dutra, que, tendo favoravelmente em nome do PT, adiantou que as faria.

Não conheço o texto a que V. Exª se referiu, apenas tomei conhecimento porque na entrevista coletiva que o Senhor Presidente deu à imprensa depois da reunião de Nova Iorque foi citado. Havia sido publicado naquele dia, não tendo chegado ainda ao nosso conhecimento.

Penso tratar-se de um tema tão importante que essas discussões visam direcionar a estrutura do Estado para um melhor aproveitamento, principalmente de verbas - escassas - para se fazer um combate eficiente, sem nos esquecermos da outra ponta: a prevenção. Temos que diminuir a possibilidade de um público que fique à mercê dos traficantes, o que só se conseguirá com o envolvimento da sociedade na área de prevenção.

Parece-me que são críticas, segundo o que a imprensa disse, e nenhum deles citou qualquer fato do documento, apenas que foi publicado. De toda forma, pela importância do tema, espero que V. Exª e eu analisemos e tragamos a discussão a este plenário em breve.

Quero agradecer a V. Exª pelo aparte. Acho importante o envolvimento de todos nós nessa discussão.

O Senador Lúcio Alcântara, como médico que é, sabe da importância desses temas. S. Exª é praticamente um orientador que tenho nesta Casa no que diz respeito a temas médicos. Eu tenho me saído bem, porque seus ensinamentos são rigorosamente corretos e até seu espírito democrático me ajuda a raciocinar, principalmente no que diz respeito à parte legal, que obriga a consulta a uma especialidade médica.

Sr. Presidente, quero agradecer a V. Exª pela oportunidade de fazer o meu pronunciamento, pedindo que conste dos Anais documentos relativos ao meu discurso de hoje.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/06/1998 - Página 10102