Discurso no Senado Federal

PREOCUPAÇÃO COM OS RISCOS DO DESEMPREGO AO LONGO DOS ULTIMOS TRES ANOS E AS CONSEQUENCIAS DA POLITICA DE JUROS ALTOS NA RETOMADA DO CRESCIMENTO E NA OFERTA DE EMPREGO NO PAIS, E, EM ESPECIAL, NO ESTADO DE MATO GROSSO.

Autor
Carlos Bezerra (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/MT)
Nome completo: Carlos Gomes Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE EMPREGO.:
  • PREOCUPAÇÃO COM OS RISCOS DO DESEMPREGO AO LONGO DOS ULTIMOS TRES ANOS E AS CONSEQUENCIAS DA POLITICA DE JUROS ALTOS NA RETOMADA DO CRESCIMENTO E NA OFERTA DE EMPREGO NO PAIS, E, EM ESPECIAL, NO ESTADO DE MATO GROSSO.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/1998 - Página 10824
Assunto
Outros > POLITICA DE EMPREGO.
Indexação
  • ALTERAÇÃO, MERCADO DE TRABALHO, BRASIL, MUNDO, MOTIVO, TECNOLOGIA, GLOBALIZAÇÃO, GRAVIDADE, DESEMPREGO, ANALISE, SITUAÇÃO, ESTADO DE MATO GROSSO (MT).
  • NECESSIDADE, ATUAÇÃO, GOVERNO, TREINAMENTO, MÃO DE OBRA, UTILIZAÇÃO, TECNOLOGIA, OBJETIVO, COMBATE, DESEMPREGO.
  • COMENTARIO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, MINISTERIO DO TRABALHO (MTB), FUNDO DE AMPARO AO TRABALHADOR (FAT), OBJETIVO, QUALIFICAÇÃO, TRABALHADOR, REITERAÇÃO, ORADOR, ALTERAÇÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.

           O SR. CARLOS BEZERRA (PMDB-MT. Pronuncia o seguinte discurso) - Sr. Presidente, Srªs.e Srs. Senadores, a situação do emprego, no mundo, é alarmante. Em todo o planeta, o já combalido mercado de trabalho passa por profundas transformações - muitas delas traumáticas -, causadas pela globalização e pelo fantástico progresso tecnológico dos últimos 20 anos.

           O novo processo de acumulação capitalista prega o uso intensivo de informação, a horizontalização das grandes unidades produtivas e o sistema de produção flexível, provocando mudanças relevantes nas relações com fornecedores.

           Dos trabalhadores exige-se grande variedade de habilidades: flexibilidade, soluções criativas, alto grau de engajamento na empresa e capacidade para tomar conhecimento de todo o processo produtivo. Mais do que poupar mão-de-obra, as novas tecnologias estão levando a deslocamentos inéditos de trabalhadores formalmente empregados, causando a proliferação das mais diversas formas de subemprego e desemprego.

           Os números são impressionantes. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), existem hoje, no mundo, perto de 800 milhões de desempregados, o nível mais alto desde a Grande Depressão, nos anos 30. Além do desemprego, também causa preocupação o processo de crescente precarização dos postos de trabalho. Somando-se os contingentes de desempregados e de subempregados, em todo o mundo, chega-se perto de um bilhão de pessoas. Ou seja, aproximadamente, 30% de toda a força mundial de trabalho.

           Esse quadro leva a uma constatação crucial: uma economia mundial crescentemente integrada pelo fluxo de comércio internacional e de investimentos, embora gere benefícios, acaba provocando sérios deslocamentos sociais - o que impõe novos obstáculos à autonomia da política interna para formular uma resposta social que sirva de contrapeso. Exemplo disso é a crescente influência das opiniões e juízos de um mercado financeiro, cada vez mais globalizado, sobre decisões nacionais de política econômica.

           Nos países em desenvolvimento, com exceção dos asiáticos, a precariedade do emprego manifesta-se, sobretudo, pela queda dramática das taxas de produtividade e pelos baixíssimos níveis de escolaridade da mão-de-obra empregada.

           O Brasil convive com mazelas que vão das formas mais hediondas de trabalho - como o trabalho forçado por dívida e a exploração infantil - até o desemprego tecnológico. A tendência estrutural à utilização de técnicas poupadoras de mão-de-obra é uma realidade, e se tem intensificado, desde o início da década, sendo responsável por uma redução do emprego industrial da ordem de 35%.

           O aspecto fundamental da crise do emprego é, porém, a baixa produtividade do trabalho, causada, não apenas pelo decepcionante desempenho do sistema educacional básico, mas, também, por altas taxas de rotatividade da mão-de-obra, que desestimulam programas de treinamento e qualificação profissional.

           Sr.Presidente, desde o meu primeiro pronunciamento nesta tribuna, em maio de 1995, venho advertindo para os riscos do desemprego. Ao longo desses três anos, tenho alertado, reiteradas vezes, para as funestas conseqüências da política de juros altos na retomada do crescimento e na oferta de empregos.

           Hoje, quero destacar um outro ponto que está a descoberto na ação governamental, ou, pelo menos, de uma ação sistemática e abrangente, que é a preparação da mão-de-obra, em face de novas e diferentes demandas, como estratégia de combate ao desemprego.

           Sei que as ações a serem empreendidas para enfrentar o desemprego devem ser de natureza múltipla. Embora um papel fundamental nessas ações caiba à própria sociedade, especialmente às entidades representativas dos trabalhadores e dos empregadores, ninguém contesta que cabe ao Estado o papel decisivo.

           Não se pode delegar ao mercado a tarefa de definir políticas públicas (industriais, agrícolas e agrárias, de competição e de competitividade), a partir das quais se poderá viabilizar uma inserção soberana e democrática de nosso País na ordem internacional. Dessas definições dependem não só a construção de uma sociedade mais justa, mas também, entre outras, a nossa capacidade exportadora, essencial para a consolidação da estabilização.

           Existem também ações que se situam, simultaneamente, nos âmbitos estrutural e conjuntural. A política clássica nesse campo é aquela voltada para a qualificação e a requalificação profissional. Seu aspecto conjuntural reside no fato de propiciar aos desempregados auxílio adicional ao longo do período em que estão às voltas com a tarefa de encontrar nova ocupação. Ao contrário do benefício do seguro-desemprego, essa política não é passiva nem se esgota a curto prazo. Seus efeitos são duradouros, pois ela fornece aos trabalhadores condições de aprimorar e diversificar sua própria capacidade de trabalho.

           Agora que proliferam as estatísticas dando conta da explosão do desemprego, o Ministério do Trabalho propôs uma expansão modesta dos recursos destinados à capacitação dos trabalhadores. A proposta inicial prevê a meta de 2,3 milhões de treinandos, para um dispêndio restrito a R$ 523 milhões.

           São números ainda muito tímidos e certamente aquém da demanda que vem sendo captada em todos os estados e municípios. Ao Fundo de amparo ao Trabalhador (FAT) poderia competir financiar, pelo menos, aquele contingente de trabalhadores sob sua responsabilidade direta: os beneficiários do seguro desemprego. Esses somam, na média do último triênio e em números redondos, 4,3 milhões de pessoas. Para atendê-las, a proposta orçamentária para o exercício de 1999 precisa ser ampliada para um volume de recursos da ordem de R$ 980 milhões - número plenamente compatível com as disponibilidades financeiras do FAT.

           Sr. Presidente, tudo que foi dito, até aqui, a propósito da situação nacional e mundial, em relação ao fenômeno do desemprego, é de tal forma genérico e abrangente que se repete, mantidas, naturalmente, as necessárias correções de escala, em todos os estados brasileiros.

           Assim, a exemplo do que ocorre em todo o País, também o meu Estado do Mato Grosso vem sofrendo as conseqüências da crise do desemprego e da não-qualificação dos trabalhadores. Nunca foi tão apropriado o adágio segundo o qual “falar da minha aldeia é falar do mundo”.

           Recente pesquisa realizada em 93 bairros da Grande Cuiabá apontou uma taxa de desemprego de 14,6%. Essa taxa é relativamente alta se comparada com a taxa de desemprego de outras capitais do País. Os cálculos utilizados foram os mesmos da metodologia do IBGE, que avaliou em 8,18% a taxa de desemprego em nível nacional. Embora a enquete não aponte que a causa do desemprego ocorra por culpa do nível de instrução dos candidatos, segundo seu realizador, o economista Emanuel Daubian, percebe-se que a crise da falta de emprego atinge em maior grau as pessoas de pouca qualificação profissional.

           Com relação à participação percentual de cada setor no desemprego total, a maior parte da falta de emprego foi demonstrada no setor de serviços, cujo percentual atingiu 37,6%, contra a menor parcela de 3,7% no setor da indústria. Já em relação ao comércio, esse nível chega a 22% por ser extremamente dependente dos demais segmentos.

           De acordo com o superintendente da Federação do Comércio do Estado de Mato Grosso, Pedro Nadaf, a redução da mão-de-obra na capital já chegou ao limite máximo. Ou seja, as empresas ligadas ao comércio não têm demitido em massa como o setor da indústria para evitarem suas próprias falências.

           Analisando a situação do desemprego em meu Estado, ocorre-me, Srªs. e Srs. Senadores, em que pese a universalidade da questão, que o seu enfrentamento requer medidas genéricas e específicas. Entre as primeiras, encontram-se aquelas referentes à redução da taxa de juros, à modernização da legislação trabalhista e ao incentivo e à retomada do crescimento. As segundas compreendem iniciativas que levem em conta as especificidades de nossas diferentes realidades regionais.

           Em relação ao Estado de Mato Grosso, por exemplo, não se pode ignorar algumas características locais que influenciam diretamente a questão do desemprego. Mato Grosso é, hoje, o 10º exportador brasileiro e o primeiro da região Centro-Oeste. As exportações mato-grossenses, em 1997, cresceram 40,62% em relação ao ano anterior, totalizando R$ 927,09 milhões. Em primeiro lugar na pauta de exportações de Mato Grosso está a soja, com 85,13% da participação total - R$ 789,18 milhões. Os grãos responderam por R$ 430,82 milhões, enquanto a soja triturada ficou com R$ 303,75 milhões e, o óleo, R$ 54,60 milhões.

           Dessa forma, uma definição de política de preparação de mão-de-obra para o Estado deverá levar em conta a importância da atividade agrícola, coisa que o País não tem feito nos últimos tempos. Afinal, a redução de 5,4 milhões de hectares na área plantada no Brasil já desempregou 2 milhões de trabalhadores rurais na última década. Somados aos desempregados indiretos, esse número chega a 3 milhões de pessoas desocupadas pela atual crise agrícola.

           Por último, outra questão que aflige a economia mato-grossense, com nefastos reflexos no emprego, é o problema das dívidas industriais, que exige um equacionamento imediato. Em Mato Grosso, acima de mil empresas do setor estão aguardando uma solução para a questão do endividamento, que já ultrapassa a cifra de R$ 100 milhões.

           De acordo com estudos da Federação das Indústrias do Estado de Mato Grosso (FIEMT), a súbita retração do mercado e a crise de liquidez exigiu, nos últimos anos, o comprometimento do capital de giro das empresas, utilizado para atender às obrigações contraídas no cenário favorável anterior e no pagamento de juros e amortização de parcelas dos financiamentos contraídos. A crise acabou provocando o fechamento de empresas industriais, a redução drástica das atividades de produção e a dispensa em massa de funcionários.

           A melhor alternativa para resolver o problema do endividamento industrial, a meu ver, é o Programa de Reestruturação Industrial, proposto recentemente pelo presidente da FIEMT, Carlos Antônio de Borges Garcia, e encaminhado ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso.

           O modelo, segundo a proposta, contemplaria o aporte de recursos para capital de giro, o que garantiria a recuperação da capacidade operacional da maioria das empresas, com a recontratação dos empregados demitidos - cerca de 20 mil - no segmento industrial.

           Sr. Presidente, ao finalizar essas breves considerações sobre o crescente fenômeno do desemprego, reitero o apelo de outros pronunciamentos, acrescentando-lhes uma variação. Assim, enfatizo os reclamos pelo controle do impacto da abertura comercial, pela redução dos juros extorsivos, e pela qualificação da mão-de-obra, adicionando-lhes recomendações de que essas medidas não se façam sem levar em conta as conjunturas regionais e as vocações econômicas das unidades federativas.

           Era o que eu tinha a dizer.

           Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/1998 - Página 10824